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4 O IMPACTO AMBIENTAL E O SISTEMA DE LICENCIAMENTO AMBIENTAL

4.2 O SISTEMA DE LICENCIAMENTO AMBIENTAL E AS OBRAS PÚBLICAS

Considerando os impactos ambientais já em grande escala alertados em outros estudos, as raras condições, circunstâncias de irreversibilidade e dificuldade de reparação dos danos muitas vezes causados ao meio ambiente, o sistema de licenciamento ambiental nasce como uma forma administrativa e preventiva instrumentalizada de contenção de práticas lesivas ao meio ambiente.

Essa instrumentalização se faz pela concessão de licenças – com fundamento no Direito Constitucional e Administrativo, sendo este último mais adequado ao desenvolvimento do presente trabalho.

No âmbito da gestão ambiental, o sistema de licenciamento é um dos mais importantes instrumentos em razão da sua composição, haja vista que as atividades econômicas se vinculam ao meio ambiente pela sustentabilidade, por isso a sua importância.

O conceito de licenciamento ambiental está estabelecido no art. 1º, I da Resolução nº 237/97-CONAMA:

Art. 1º - Para efeito desta Resolução são adotadas as seguintes definições:

I - Licenciamento Ambiental: procedimento administrativo pelo qual o órgão

ambiental competente licencia a localização, instalação, ampliação e a operaçãode

empreendimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais, consideradas

efetiva ou potencialmente poluidoras ou daquelas que, sob qualquer forma, possam causar degradação ambiental, considerando as disposições legais e regulamentares e

as normas técnicas aplicáveis ao caso.

Na lição de Granziera (2014, p. 420) é “instrumento de análise dos empreendimentos e atividades potencial ou efetivamente degradadores ou poluidores à luz da necessidade de proteção do ambiente, de acordo com a lei”.

Para Fiorillo (2010, p. 205): “licenciamento ambiental, por sua vez, é o complexo de etapas que compõe o procedimento administrativo, o qual objetiva a concessão de licença ambiental”.

O sistema de licenciamento ambiental tem seu fundamento inicial na Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento – Rio/92, pois se vincula em maior grau ao princípio da precaução estabelecido no princípio 15:

De modo a proteger o meio ambiente, o princípio da precaução deve ser amplamente observado pelos Estados, de acordo com suas capacidades. Quando houver ameaça de danos sérios e irreversíveis, a ausência de absoluta certeza científica não deve ser utilizada como razão para postergar medidas eficazes e economicamente viáveis para

prevenir a degradação ambiental.8

É a partir do conceito estabelecido pela Resolução nº 237/97 e a sua vinculação ao princípio da precaução é que podemos compreender a função do licenciamento ambiental como um procedimento voltado ao controle do desenvolvimento econômico, a partir da apreciação de estudos previamente estabelecidos relativos às atividades que envolvem o uso de recursos naturais, indicam poluição e degradação ambiental e, também apresentam medidas mitigadoras e compensatórias para minoração dos impactos identificados.

A sua função, segundo Granziera (2014, p. 421), “não é inviabilizar a implantação do empreendimento”. A sua função precípua “é a de buscar todos os meios possíveis para essa implantação, a menos que os riscos de danos evidenciem a falta de segurança quanto aos efeitos desse empreendimento no futuro”, segundo o disposto no art. 10 da Lei nº 6.938/81.

O licenciamento ambiental tem natureza administrativa, como conceituado por Fiorillo (2005), pois decorre do poder de polícia, e por isso se fundamenta também nos princípios da prevenção e da supremacia do interesse público sobre o particular, o que o torna um instrumento de controle e de restrição da atividade humana com reflexos nas atividades econômicas, por isso também fundamentado no princípio do desenvolvimento sustentável, segundo Granziera (2014, p. 422).

A concretização do licenciamento como medida de controle, ocorre com a expedição de uma autorização formal, atendidos aos requisitos legais exigidos para o exercício de determinada atividade, denominada licença.

Para Mendonça (2007, p. 56), “a licença é considerada como uma técnica administrativa voltada à limitação do exercício do conteúdo de direitos subjetivos”. Tem natureza de autorização sob condições impostas ao particular que o sujeitam a atender, para que este possa exercer determinada atividade constituída de direitos que se sujeitam à prévia autorização por imposição legal.

Essa conceituação pode ser direcionada para o licenciamento ambiental, pois sugere um ato administrativo de compatibilização da atividade a ser desenvolvida pelo particular (interesse parcial) com os demais interesses sociais da coletividade, por esta razão verifica-se que para a tutela do meio ambiente o legislador da matéria valeu-se de muitos instrumentos do Direito Administrativo.

Isso fica muito claro quando estudamos a composição do licenciamento ambiental, cujo fundamento está inscrito na Lei nº 6.938/81, no Decreto nº 99.274/90 e na Resolução nº 237/97-CONAMA, e tem como objetivo formal, singular e concreto conter a prática de ações que possam degradar o meio ambiente. O seu conteúdo tem natureza obrigacional voltado à Administração e ao destinatário do licenciamento, o que sustenta a definição da licença ambiental como ato administrativo, segundo Mendonça (2007, p. 57):

Enquanto ato administrativo, a licença qualifica-se como ato jurídico típico, previsto em lei como figura hábil ao alcance de determinados fins de interesse público. Corresponde a uma manifestação de vontade da Administração que produz efeitos jurídicos assinalados em lei como próprios ao alcance de interesses qualificados da sociedade postos sob gestão e controle estatais.

Quando se faz referência à licença como instrumento de contenção de práticas lesivas ao meio ambiente, estamos diante de outra característica da licença. Ainda que tenha eficácia declaratória, é intrínseco à sua expedição o conteúdo do poder de polícia

exercido pela Administração Pública, pois tem caráter limitador repressivo ou preventivo, em consequência da aplicabilidade de normas já tipificadas.

Por isso pode-se compreender a licença ambiental como um instrumento não só de controle dos empreendimentos, mas, de forma preventiva, de planejamento, em razão da sua essência em compatibilizar de forma positiva a iniciativa do particular com os programas e políticas de governo que possam envolver questões de ordem ambiental, especialmente, as que de qualquer modo possam causar degradação ao meio ambiente.

Portanto, a concessão de licença ambiental ao empreendimento só acontecerá se o projeto que apresentar potencial poluidor ou degradação ambiental, cumprir todas as etapas do processo administrativo previsto para o licenciamento.

Isso reafirma nosso entendimento, alhures já manifestado de que trata-se de um procedimento que para ser atendido Pelo Poder Público, na qualidade de empreendedor da obra pública, deve observar seus os requisitos legais a partir da elaboração do Projeto Básico, que não os atendendo pode frustrar a contratação e a implementação de qualquer política pública dependente da construção do empreendimento, p. ex. uma escola, uma unidade de saúde.

É, portanto, importante instrumento de política e proteção do meio ambiente híbrido, como assevera Granziera (2014, p. 410), pois além da sua finalidade de controle, visa ainda à conciliação do desenvolvimento econômico com a preservação do meio ambiente (art. 170 CF). Sem, contudo comprometer ou se tornar um impeditivo ao exercício do direito constitucional da liberdade empresarial e do uso da propriedade privada.

A Lei nº 6.938/81 foi o marco para a exigência do prévio licenciamento do empreendimento, recepcionado pela Constituição Federal/88, no art. 225, § 1º, V, e que não afastou o ente público, enquanto empreendedor da obra pública, dessa obrigatoriedade, nos termos do art. 10 da lei ordinária, in verbis:

Art. 10 - A construção, instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais, considerados efetiva e potencialmente poluidores, bem como os capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental, dependerão de prévio licenciamento de órgão estadual competente, integrante do Sistema Nacional do Meio Ambiente - SISNAMA, e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis - IBAMA, em caráter supletivo, sem prejuízo de outras licenças exigíveis.

O sistema de licenciamento ambiental, nos termos da Resolução nº 237/97-CONAMA, consiste em três etapas: de outorga da licença prévia, outorga da licença de instalação e outorga da licença de operação.

A outorga de licença prévia, está prevista no artigo 8º da Resolução nº 237/97-CONAMA, cuja concessão ocorre na fase de planejamento do empreendimento. A outorga de licença da instalação é precedida da licença prévia e seu conteúdo se constitui da aprovação do projeto executivo após análise da convergência dos planos e programas às medidas de controle

ambiental e demais condicionantes. E, a outorga da licença de operação ou de funcionamento, tem por conteúdo a autorização do empreendimento, após a verificação do efetivo cumprimento do que consta nas licenças anteriores, pois é concedida após a realização da vistoria e da confirmação do funcionamento dos sistemas de controle ambientais.

O procedimento de forma geral para concessão das licenças está regulado no artigo 10 da Resolução 237/1997, segundo Oliveira (2010, p.108,109), tem as seguintes fases: de definição da documentação necessária; requerimento do interessado; análise dos documentos apresentados pelo interessado; solicitação de esclarecimentos ou complementação instrutória, se houver necessidade; audiência pública, quando couber e esclarecimentos posteriores, se necessários; emissão de parecer técnico e concessão ou não da licença pretendida.

E é na Lei nº 8.666/93 que o sistema de licenciamento ambiental vai buscar muitas definições necessárias para dar um parâmetro nos seus procedimentos, em especial quando fez referência ao Projeto Básico e ao Projeto Executivo9, especialmente na fase de concessão da Licença de Instalação.

Em que pese se tratar de um instrumento vinculado a um procedimento de ordem administrativa, o ato de concessão ou indeferimento do pedido de licenciamento pode se revestir de discricionariedade, mesmo sujeito à motivação, não se pode negar as licenças na esfera administrativa têm natureza de autorizações, e por isso e não havendo nenhum impeditivo legal, o administrador pode escolher os critérios o licenciamento, como alerta Granziera (2014, p. 429, 430):

Não há que falar, portanto, no caso das licenças ambientais, em atos essencialmente vinculados, por serem da categoria das licenças, mas em atos que podem ser vinculados, se todos os parâmetros a serem considerados constarem objetivamente das normas. Podem, todavia, ser discricionários, se a própria norma estatuir a possibilidade de escolha pelo administrador, dentre as alternativas, legalmente fixadas.

Existindo possibilidade de discricionariedade, no ato de concessão da licença ambiental pode ocorrer negociação entre a autoridade competente e o empreendedor, pois o licenciamento se dá no âmbito da gestão ambiental e o órgão licenciador pode ter a autorização legal para fazer exigências adicionais visando à compatibilização do empreendimento com os planos e programas em vigor, no que se refere à proteção ambiental.

Pelas etapas e pelas licenças que compõem o sistema de licenciamento ambiental, ainda que este tenha natureza de controle das atividades efetiva ou potencialmente poluidoras, a licença ambiental tem natureza administrativa, porém, mais próxima da autorização, em razão das suas características serem do direito ambiental.

Neste capítulo não trataremos da competência para emissão da licença ambiental, nos limitando a indicar aqui a sua previsão, de forma geral, na Lei Complementar nº 140, de 08 de dezembro de 2011, que revogou o art. 10 da Lei nº 6.938/81 e, estabeleceu a cooperação supletiva entre os entes federados10, deixando os Estados de serem os entes prioritários na atividade de licenciamento ambiental, o que trataremos no subitem seguinte de maneira mais específica.

Da pesquisa até aqui desenvolvida verificamos que o EPIA/RIMA são instrumentos de gestão ambiental que contribuem sobremaneira para o sistema de licenciamento ambiental, pois se destinam a orientar, informar e fundamentar a decisão administrativa, ato vinculado à concessão das licenças ambientais.

Além disso, ambos se vinculam aos princípios da prevenção e da precaução, o EPIA/RIMA com a indicação das medidas mitigadoras e o licenciamento ambiental, com o controle das ações degradantes, executado dentre outras formas pelo estabelecimento de critérios e padrões de qualidade ambiental e, de normas relativas ao manejo dos recursos naturais, sendo ambos pontos de destaque na contribuição do Poder Público para o desenvolvimento sustentável.

E é com os estudos sobre a elaboração do EPIA/RIMA e da execução do sistema de licenciamento ambiental, que vislumbramos indícios do nexo de causalidade entre a tramitação do processo de concessão das licenças ambientais e a aplicação da Auditoria Ambiental, como um possível programa de acompanhamento e monitoramento, posterior à concessão da licença, como veremos mais adiante.

4.3 O DEVER DO ESTUDO DE IMPACTO AMBIENTAL PARA O LICENCIAMENTO