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O sistema previdenciário público e sua política de proteção social

A necessidade de criar um ordenamento jurídico de proteção social sempre

foi uma preocupação em face dos riscos futuros, quanto às formas de subsistência e

até mesmo como fonte de recurso frente ao medo da miséria e das incertezas do

porvir. Foi esse sentimento que influenciou a elaboração e o aperfeiçoamento das

leis de proteção social. Como bem se pode perceber, o direito da seguridade social

pública já existe há bastante tempo, desde o Decreto-lei 72/66, que unificou os vári-

os institutos até então existentes no antigo INPS.

Modernamente, a previdência social “constitui um serviço público criado e

mantido pelo Estado, embora haja a participação dos segurados e das empresas no

seu custeio e, em numerosos sistemas nacionais, na sua própria gestão”.

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Também

é considerada “uma modalidade de seguro, ou seja, um seguro social”

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de caráter

obrigatório. Sua administração é incumbência do órgão competente do Poder Execu-

51 DERANI, Cristiane. Privatização e serviços públicos: as ações do Estado na produção econômica. São Paulo: Max Limonad, 2002. p. 28.

52 LEITE, Celso Barroso (Coord.). Um século de previdência social: balanço e perspectivas no Brasil e no mundo. Rio de Janeiro: J. Zahar, 1983. p. 23.

tivo, destinado a aplicar a matéria, o Ministério da Previdência Social, e não decorre

apenas da vontade das partes. Com isso, o Regime Geral de Previdência Social

passa a ser administrado por uma autarquia federal, componente da administração

indireta federal, denominada INSS. É um órgão dotado de personalidade jurídica de

direito público, que exerce a função precípua de organizar a previdência social. Tam-

bém cabe ao INSS a responsabilidade direta na administração do custeio previden-

ciário, em razão de sua capacidade ativa na cobrança das contribuições previdenciá-

rias.

O sistema previdenciário brasileiro encontra-se estruturado na Constituição e

nas leis ordinárias que complementam o sistema, e conta com os seguintes regimes:

Regime Geral de Previdência Social, para o setor privado (arts. 194, 195 e 201); Re-

gime de Previdência Privada ou Complementar, que abrange tanto o setor público

quanto o privado (art. 21, inc. VIII, e art. 202, caput e parágrafos); Regime de Previ-

dência do Setor Público, instituído pela União, pelos estados e pelos municípios (art.

40). Cabe destacar que, neste estudo, tal classificação será apenas ilustrativa, e foi

trazida à discussão apenas para servir como base para uma melhor compreensão a

respeito da estrutura e do funcionamento do sistema de previdência.

O atual sistema de previdência social adotado pelo Brasil é mantido pela

pessoa jurídica de direito público. É de filiação compulsória e se efetiva por meio de

contribuições individuais de natureza tributária. E, no que se refere ao financiamento

dos benefícios, há dois regimes básicos e opostos entre si: o regime de repartição e

o regime de capitalização.

No regime de repartição, os segurados contribuem de imediato para um fun-

do único que é responsável pelo pagamento de todos os benefícios do sistema. No

caso, os trabalhadores de hoje custeiam os benefícios dos aposentados. A reparti-

ção parte da idéia de solidariedade entre os indivíduos. Mas também sofre críticas

com relação ao envelhecimento da população, na medida em que vem ocorrendo a

inversão da pirâmide etária, pois, no futuro, de acordo com estatísticas, um maior

número de idosos irá depender de um menor número de jovens para a manutenção

de seus benefícios. Esse regime também é influenciado pelas taxas de natalidade e

pela expectativa de vida da população. A correção baseia-se no estímulo ao aumen-

to das taxas de natalidade e nas modificações dos requisitos para obter os benefíci-

os, como o aumento de idade ou a redução dos valores pagos.

Já no regime de capitalização, os recursos arrecadados são investidos pelos

administradores do fundo durante um período, para que o capital se acumule, visan-

do a atender, conforme as prestações devidas, os segurados no futuro. Os valores a

serem pagos irão variar de acordo com as taxas de juros e a partir das opções de in-

vestimento dos administradores. A capitalização inspira-se em técnicas de seguro e

de poupança, pois quanto mais longo for o período da acumulação, mais vantajoso

será para o contribuinte. As desvantagens desse regime estão na depreciação do

capital e nas dificuldades de administração.

No que se refere à legislação, o sistema previdenciário público é regido pela

legislação ordinária e consta no Capítulo II, Título VIII, da Constituição Federal de

1988. Adota-se o regime de repartição de custos, no qual os trabalhadores em ativi-

dade contribuem para o sustento dos benefícios atuais; e os futuros benefícios des-

ses trabalhadores atuais irão depender da futura geração de trabalhadores. Esse

sistema depende da arrecadação da classe dos trabalhadores e, por isso, também

enfrenta problemas diante da recessão econômica e do desemprego, os quais serão

objeto de destaque quando for abordada a crise do Estado Providência.

Quanto à política de proteção social, segue-se o entendimento de que a pre-

vidência social é uma espécie de sistema de seguro social público, que assegura di-

reitos àqueles que contribuem.

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E, seguindo as palavras do professor Tavares: “A

previdência no Regime Geral de Previdência Social é conceituada como seguro pú-

blico, coletivo, compulsório, mediante contribuição e que visa cobrir os seguintes ris-

cos sociais: incapacidade, idade avançada, tempo de contribuição, encargos de fa-

mília, morte e reclusão.”

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Mais adiante, o mesmo autor ainda continua explicando:

“A previdência é direito social de fruição universal para os que contribuam para o sis-

tema. Ocorrendo um risco social – ‘sinistro’ (que afasta o trabalhador da atividade la-

boral), caberá à previdência a manutenção do segurado ou de sua família.”

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54 O art. 201 da Constituição Federal de 1988 trata da forma de organização da previdência social e dos casos que a mesma atenderá, da seguinte forma:

Art. 1º. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e aten- derá, nos termos da lei, a:

I – cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte e idade avançada; II – proteção à maternidade, especialmente à gestante;

III – proteção ao trabalhador em situação de desemprego involuntário;

IV – salário-família e auxílio-reclusão para os dependentes dos segurados de baixa renda;

V – pensão por morte do segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e dependentes, observado o disposto no § 2º.

55 TAVARES, Marcelo Leonardo. Direito previdenciário. 7. ed. rev. ampl. e atual. Rio de Ja- neiro: Lumen Juris, 2005. p. 29.

Assim, denota-se que a proteção social, mesmo sendo um dever do Estado,

também conta com a participação de todos os trabalhadores, os quais devem estar

empenhados na construção de uma sociedade que aplique os recursos econômicos

de forma justa, coerente e, acima de tudo, de maneira que se possa preservar e pro-

teger o cidadão com dignidade. Com isso, torna-se necessária a implantação de pro-

jetos para enfrentar a pobreza, medidas de prevenção de riscos e doenças, planos

previdenciários e assistenciais, bem como é imprescindível prestar assistência aos

desamparados. Nesse contexto, a presença da justiça também serve como referen-

cial à proteção dos direitos dos cidadãos, com vistas a manter a ordem social.

Nessa linha, é fundamental ter-se em mente a idéia de seguridade social,

conforme bem menciona Balera: “Do ponto de vista especificamente jurídico, pode-

se dizer que o sistema de seguridade social é instrumento de realização de justiça

social, protegendo assim os trabalhadores, seus primitivos destinatários, quanto to-

dos os necessitados.”

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Portanto, a seguridade social, por meio da previdência, atua

como um sistema de seguro social, com a possibilidade de ser complementada tam-

bém por programas assistenciais que servem para amparar as classes assalariadas

e outros grupos em emergência, decorrentes da cessação do salário ou de necessi-

dades especiais.

A seguridade social é financiada por toda a sociedade, de forma direta e in-

direta, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos estados, do

Distrito Federal, dos municípios e das contribuições sociais, conforme dispõe o art.

195 da CF/88. Dessa forma, as contribuições sociais constituem a única fonte de

custeio da seguridade social, contando com recursos advindos de dotações orça-

mentárias de todos os entes federativos. Como bem-explica Leite, a proteção social

consiste no conjunto de medidas que, tendo à frente a previdência social, permite à

sociedade atender a certas necessidades essenciais dos indivíduos que a compõem

isto é, de cada um de nós.

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Seguindo o entendimento do mesmo autor, em face da complexidade para

definir as necessidades de caráter social, pode-se dizer que elas são mais ligadas

às condições de vida, aos recursos de que cada pessoa precisa para conseguir um

padrão existencial que a sociedade considere aceitável, no sentido de ter pelo me-

nos um padrão mínimo de vida. Admite-se que esse mínimo varia grandemente de

57 BALERA, Wagner. Sistema de seguridade social. São Paulo: LTr., 2006. p. 15. 58 LEITE, op. cit., 1978, p. 21.

país para país, de região para região, de uma classe para outra, por vezes dentro de

uma mesma classe e até, não raro, de pessoa para pessoa.

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Dado o exposto, no regime geral de previdência social, mesmo que exista a

possibilidade de os segurados se filiarem à previdência privada, cabe destacar que a

base de todo o sistema ainda permanece sendo gerida e administrada pelo setor pú-

blico. E, seguindo a análise de Coimbra, não é outra a função do poder estatal, se-

não a de assegurar o bem comum da sociedade a que serve.

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