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1.   Karol Szymanowski: contextualização histórica 5

1.3.   O Stabat Mater op 53 17

A origem do Stabat Mater pode estar relacionada à uma outra encomendada recebida por Szymanowski. Segundo Chylinska (1993, p. 207), no final de 1924 o compositor recebeu uma carta da princesa Edmont de Polignac. Patrona da música francesa, a princesa de Polignac costumava encomendar obras dos mais famosos compositores contemporâneos, que posteriormente eram apresentadas em uma sala de concerto em seu palácio. Em 1924 o pianista Arthur Rubinstein, amigo próximo de Szymanowski passou um mês na residência da Princesa, como seu convidado, e é provável que ele tenha falado do compositor para ela. Em suas correspondências Szymanowski informa a um amigo que a Princesa estava encomendando uma obra sua, pela qual pagaria 8000 francos. O compositor conta que apesar de o dinheiro não ser muito, seria suficiente para ele e sua mãe viverem em paz por alguns meses, e por isso aceitara a oferta, e já havia respondido a carta pedindo mais informações. Aguardando pela resposta da Princesa, ele começou a pensar em textos que ele pudesse usar, e contactou seu amigo Jaroslaw Iwaszkiewicz, que preparou três sinopses de esboços. O primeiro era Funeral para um Garoto do Interior, o segundo seria Triste Casamento, e o terceiro, Colheita. Segundo o amigo, todos seriam adequados para música cênica e para um grande intermezzo orquestral.

A princesa ainda não havia respondido, e Szymanowski estava impaciente. Após vários meses de expectativa, a princesa responde. Em sua carta ela diz que as obras compostas para ela por Strawinsky, Falla e outros eram executadas em seu palácio, e por isso seria impossível apresentar uma orquestra maior do que 25 músicos, e que, desta maneira, a peça a ser composta por Szymanowski poderia ser uma obra sinfônica simples, ou uma obra em forma de cena lírica, mas que não exigisse muitos cantores e que não causasse nenhum problema com a sua montagem e apresentação.

Szymanowski responde com outra carta, dizendo que já havia escolhido um

Requiem, a ser chamado Chlopskie Requiem (Requiem Camponês), apresentando

uma mistura de devoção, paganismo e um caráter rústico. A obra seria escrita para pequena orquestra, quatro solistas e coro a quatro vozes.

Apesar de Szymanowski estar disposto a compor a obra para a princesa, sua vida tomou outro rumo. Alusia, filha da irmã do compositor, Stasia Stanislawa, morreu tragicamente. Esta morte afetou Szymanowski profundamente, foi como perder sua própria filha. Ele escreve em uma carta que o texto que Jaroslaw havia feito era excelente, mas devido a problemas de natureza moral, seria muito difícil para ele trabalhar nesta obra. As perdas não pararam por aí. Após a morte de Alusia, Stasia deu à luz um bebê natimorto. O cunhado de Szymanowski, marido de sua outra irmã perdeu o emprego por causa de uma doença grave, e sendo assim, a irmã e a sobrinha passaram a ser responsabilidade de Szymanowski.

O compositor escreve em outra carta que todos esses problemas o impediam de terminar o Concerto que ele estava compondo para Rubinstein e a obra para a Princesa. Nesta carta ele diz que havia recebido a encomenda de um trabalho que ele precisaria terminar em março de 1926, de modo a ter dinheiro para viver. Este trabalho era o Stabat Mater, e esta carta de maio de 1925 é a primeira menção sobre a obra.

Quem comissionou o Stabat Mater foi Bronisław Krystall, que queria homenagear a morte de sua jovem esposa, uma violinista, com uma obra musical. A encomenda era financeiramente vantajosa e o compositor tinha total liberdade na escolha do tema. Szymanowski se lembrou de um texto que ele havia retirado anos antes de um jornal. Era o hino Stabat Mater traduzido para o polonês por Józef Jankowski11. Ele recebeu a permissão do tradutor para musicar o poema. No outono de

1925 o esboço da composição inteira estava pronto, e Szymanowski trabalhou na partitura de 20 de janeiro até 2 de março de 1926. Na carta que ele enviou para Krystall juntamente com o manuscrito ele escreveu que tentara dar à peça uma expressão direta para as belas e simples palavras do hino, e que se ele havia conseguido tal feito, só o tempo haveria de provar.

O Stabat Mater foi composto como cantata-oratório em seis movimentos para soprano, alto e barítono solistas, coro a quatro vozes e orquestra. O efetivo

                                                                                                                         

11 Jozéf Jankowski (1865 – 1935), poeta, dramaturgo, tradutor e jornalista, trabalhava em Varsóvia. Sua

tradução do Stabat Mater foi publicada na revista semanal Świat (Mundo) em abril de 1908 (no. 16, p. 7) (Wightman 1998, p. 138)

orquestral é composto duas flautas, dois oboés (o segundo também toca corne inglês), duas clarinetas, dois fagotes (o segundo também toca contrafagote), quatro trompas, dois trompetes, tímpano, quatro percussionistas (os instrumentos são triângulo, prato suspenso, tam-tam, bombo e glockenspiel), harpa, órgão (ad libitum), oito primeiros violinos, oito segundos violinos, seis violas, seis violoncellos e quatro contrabaixos.

2. O TEXTO DO STABAT MATER  

O Stabat Mater Dolorosa é um poema do séc. XII (WERSIN 2006, p. 317) ou XIII (DEFORD 2001, p. 234), de autoria não comprovada, cuja transmissão escrita passou a ocorrer a partir do séc. XIV (WERSIN 2006, p. 317). É usado na liturgia romana tanto como sequência quanto como hino. O texto descreve o sofrimento de Maria aos pés da cruz onde seu Filho foi crucificado.

2.1. O Stabat Mater na liturgia católica  

Os hinos e as sequências têm texto sacro, porém não bíblico, com rima e métrica estabelecidas. O tratamento do texto é silábico e a melodia pode ser substituída. Diferem dos corais gregorianos, que são individualmente elaborados, melismáticos, não são rítmicos nem métricos e a melodia tem uma maior relação com o texto.

Os hinos começaram a aparecer no séc. IV, enquanto as sequências surgiram no séc. IX, e no séc. XI já somavam algumas centenas (WERSIN 2006, p. 317). O Stabat Mater foi colocado em uso como sequência no final do séc. XV, na Missa da Compaixão da Virgem Maria (DEFORD 2001, p. 234). Até o Concílio de Trento (1545 – 1563) milhares de sequências faziam parte da liturgia católica (HOCHSTEIN 2011, p. 113). Muitas delas foram proibidas pelo concílio, inclusive o

Stabat Mater, restando somente quatro, que aparecem no Missale Romanum de 1570,

que são Victimae paschali laudes, Veni Sancte Spiritus, Dies irae, dies illa e Lauda Sion

Salvatorem (HOCHSTEIN 2011, p. 113). Em 1727 o papa Bento XIII reintegrou o Stabat Mater à liturgia. Seu uso como hino data da mesma época, e no Breviário

Romano era dividido em Stabat Mater (Vesperais), Sancta mater istud agas (Matinais) e Virgo virginum praeclara (Laudas) (DEFORD 2001, p. 234). No Liber Usualis o Stabat

Mater aparece como hino para a festa da sexta-feira após a Paixão (1424) e na Festa

das Sete Dores da Beata Virgem Maria no dia 15 de setembro como sequência (LU1634) (DEFORD 2001, p. 234).

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