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O surgimento de movimentos sociais do campo e a Pedagogia de

1. HISTÓRIA DA ESCOLA MULTISSERIADA

1.5 Caminhada da educação e da escola multisseriada no campo

1.5.2 O surgimento de movimentos sociais do campo e a Pedagogia de

A união estabelecida pelo governo entre os ideais de desenvolvimento nacional e o populismo, levaram a criação e implementação de campanhas e programas ministeriais diversos para a educação e alfabetização de jovens e adultos das classes populares, tanto urbanas quanto rurais, objetivando o comparecimento dos mesmos às urnas - uma vez que ser alfabetizado era condição para obter direito ao voto (SAVIANI, 2010).

Neste contexto, surgem os Centros Populares de Cultura (CPC) e mais tarde o Movimento de Educação de Base (MEB), que

(...) tiveram como sustentação ideológica o trabalho desenvolvido pelas ligas camponesas, sindicatos em favor dos desprotegidos da zona rural, cuja culminância se deu com a promulgação do Estatuto do trabalhador rural, lei 4.214, sancionada em 2 de Março de 1963 (LEITE, 2002, p.40).

Este direcionamento, porém, não esteve presente no MEB desde sua criação em 1961, sendo o referido movimento, em sua origem, de responsabilidade da igreja católica, por meio da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). A direção do movimento veio a ser concedida à participantes populares mais tarde, somente então adquirindo caráter de luta, conscientização e politização (SAVIANI, 2010).

Em relação às raízes dos movimentos populares do campo, Leite (2002) lembra as investidas de Francisco Julião em prol do estabelecimento de direitos dos trabalhadores rurais na década anterior, bem como a ação pastoral de alguns bispos da igreja católica, que através de trabalho social favoreceram a criação de grupos de alfabetização de adultos e educação popular no campo.

Nesta dinâmica, na primeira metade da década de 1960,

a expressão educação popular assume, então, o sentido de uma educação do povo, pelo povo e para o povo, pretendendo-se superar o sentido anterior, criticado como sendo uma educação das elites, dos grupos dirigentes e dominantes, para o povo, visando a controlá-lo, manipulá-lo, ajustá-lo a ordem vigente (SAVIANI, 2010, p.317).

As críticas estabelecidas frente às propostas advindas do governo, assim como a ampliação dos movimentos populares - entre eles as lutas camponesas por reforma agrária e educação de base - geraram reação por parte do governo, que buscando conter o referido empenho, empreendeu paralelamente às ações da “Aliança para o Progresso”, programas setoriais diversos vinculados a situações de assentamento, expansão produtiva agrícola e educação informal para populações rurais (LEITE, 2002).

Em tal conjuntura, surgiu a proposta de Paulo Freire, que se aproximava das tendências escolanovistas de Dewey, das idéias de Anísio Teixeira, bem como de trabalhos educacionais desenvolvidos por movimentos da igreja católica. Tal proposta se deu no âmbito da educação popular, vindo de encontro às intencionalidades e práticas da educação vigente ao visar estabelecer o processo educacional enquanto prática libertadora, problematizadora e conscientizadora, levando os sujeitos a iterarem-se dos problemas nacionais e a participarem de debates e lutas políticas. Assim, a mesma influenciou e veio a subsidiar amplamente lutas de movimentos de educação popular, que passaram a reivindicar uma educação que permitisse ao povo se libertar da citada manipulação de opinião estabelecida pelo governo (em diversos meios de comunicação). Desta forma, houve em todo país grande adesão a tal proposta, não apenas enquanto forma de resistência, mas como método de alfabetização de adultos (GHIRARDELLI JR, 2008; LEITE, 2002).

Apesar de toda mobilização social estabelecida no referido período na direção de concretizar uma educação que atendesse aos interesses dos “populares”, frente à crise do modelo desenvolvimentista, houve: o desenvolvimento das ondas migratórias, o golpe militar em 64, a anulação dos direitos civis, o desenvolvimento do milagre econômico e a aproximação do Brasil ao Fundo Monetário Internacional. Em decorrência dos referidos eventos, a extensão se instituí de forma contundente no meio rural, freqüentemente prejudicando e até mesmo tomando o reduzido espaço destinado à educação formal disponível naquele contexto (LEITE, 2002).

Conforme Romanelli (1998), a partir de 1964, dois períodos determinantes foram estabelecidos no sistema educacional brasileiro: o do estabelecimento dos convênios MEC - USAID e o do desenvolvimento destes.

O primeiro, conforme a mesma, correspondeu à implementação do regime militar e das medidas adotadas para recuperação econômica do país: neste momento, as demandas por educação haviam crescido fortemente e o governo empenhava-se na repressão de pressões

populares, que evidenciavam a profunda crise estabelecida no sistema educacional. Ainda neste primeiro período, empregando as dificuldades enfrentadas enquanto justificativa, o governo firmou convênios entre o MEC e a Agency for International Development (AID) onde, por meio de auxílios técnicos e financeiros, foi conferida a segunda a tarefa de organizar o sistema educacional brasileiro (p.197).

No segundo período apontado pela autora, esforços foram empreendidos para “adequar o sistema educacional ao modelo de desenvolvimento econômico que então se intensificava no Brasil” (p. 196), no qual foi implementado o “Plano Decenal de Desenvolvimento Econômico e Social” para o período de 1967 a 1976 – (lançado por meio do Ministério do Planejamento no governo de Castelo Branco), que atribuía aos processos educacionais rurais e urbanos a função de habilitar minimamente os trabalhadores para sua inserção no mercado de trabalho e melhoria de qualidade de vida.

A busca de adaptação do sistema educacional brasileiro ao modelo de desenvolvimento econômico em questão implicou no estabelecimento de reformas diversas, entre elas, as leis 5.540 de 1968 (referente à estruturação do ensino superior) e a 5.692 de 1971 (para estruturação do ensino de 1º e 2º grau).

Leite (2002) aborda as propostas para educação instituídas neste período considerando que vieram em atendimento à crise, mas especialmente às demandas por dominação e controle social evidenciadas no governo militar, apontando para a implementação aberta de preceitos para o fortalecimento e sustentação deste, num período em que a educação foi reconhecida e efetivamente utilizada enquanto instrumento de inculcação ideológica.

Em relação à lei 5.692, ainda sem apresentar qualquer proposta para a educação rural - mantendo elitismo no processo escolar nacional - , interferiu de forma contundente nesta, uma vez que levou as secretarias estaduais de educação à criarem estratégias diversas em suas buscas por adequação frente às novas regras. Uma destas foi a descentralização, que visando dinamizar a estrutura dos sistemas de ensino acarretou na transferência gradativa e concreta da atribuição de ofertar ensino fundamental aos municípios.