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Capítulo II – PROBLEMÁTICA

1. Objectivos

Segundo Weigel et al. (2006a) e Norman (2007) é relevante compreender e caracterizar as crenças dos pais, pois são estas que orientam ou regulam os comportamentos e práticas de literacia. As crenças são construídas a partir das histórias individuais e das normas culturais de cada família e manifestam-se nas características do meio familiar, nas práticas parentais, nos comportamentos e na natureza das interacções. De forma mais específica, as crenças sobre literacia referem-se às ideias que os pais consideram verdadeiras sobre o que é literacia e sobre o que é ser literado (Norman, 2007). Além da ideia que os pais têm, uns sentem que o seu papel tem impacto nas competências de literacia emergente dos filhos, enquanto outros pais não têm o mesmo tipo de crença, subvalorizando o seu papel no desenvolvimento desta (Weigel et al., 2006a, 2006b).

No seguimento do que foi referido, Lynch et al. (2006) referem que o conhecimento das crenças dos pais sobre literacia é um aspecto chave para compreender as diversas actividades e rotinas de literacia familiar. O facto dos pais terem crenças diferentes sobre a aprendizagem da leitura e escrita, bem como o seu papel neste tipo de aprendizagem junto dos filhos, poderá, eventualmente, ajudar a compreender a diversidade de práticas familiares (e.g., Cole, 2011; Lourenço, 2007; Mata, 2002, 2006; Mata & Pacheco, 2009), bem como os diferentes ambientes de literacia familiar (e.g., LeFevre & Sénéchal., 1999; Roskos & Twardosz, 2004; Mata, 2006; Wasik & Hendrickson, 2004).

A ideia de que as crenças orientam as práticas é visível quando se analisam também os estudos que caracterizam as práticas de literacia familiar. Assim, nos vários tipos de práticas identificadas, é comum surgirem diversas designações, que se podem agrupar em dois grupos: 1) entretenimento e dia-a-dia (Lourenço, 2007; Mata, 2002, 2006; Mata & Pacheco, 2009) ou práticas informais (Sénéchal & LeFevre, 2002) e, 2) práticas de treino (Lourenço, 2007; Mata, 2002, 2006; Mata & Pacheco, 2009) ou práticas formais (Sénéchal & LeFevre, 2002) ou práticas de ensino (Norman, 2007). O que observamos é uma convergência e consonância na caracterização do tipo de crenças e do tipo de práticas, o que faz com que ambas remetam para dois grandes grupos, umas mais holísticas, e outras mais tecnicistas.

Assim, no seguimento destas ideias colocamos como primeiro objectivo do nosso estudo a caracterização e análise das relações entre as crenças dos pais

sobre a aprendizagem da leitura e escrita dos filhos, as práticas e o ambiente de literacia familiar.

A evidência desta diversidade de crenças, práticas e ambientes de literacia familiar tem levado as investigações a considerar as características sociais e culturais das famílias, uma vez que as práticas não ocorrem num vazio, mas inseridas num contexto social e cultural particular (e.g., DeBaryshe, 1995; Li & Rao, 2000; Saracho, 2002, 2007; Serpell et al., 2002; Vernon-Feagans et al., 2004; Weigel et al., 2006a, 2006b). Assim, segundo Vernon-Feagans et al. (2004) as investigações mais recentes têm-se centrado nos aspectos demográficos e nas características gerais das famílias, como por exemplo, o nível de escolaridade dos pais e/ou estatuto socioeconómico e sociocultural, para assim compreender as diferenças entre as várias culturas familiares.

No entanto, a análise deste tipo variáveis não tem sido consistente e conclusiva. Se por um lado, há estudos que evidenciam uma relação mais linear entre nível de educação e de literacia dos pais e as suas crenças (e.g., DeBaryshe, 1995; DeBaryshe et al. 2000; Lynch et al., 2006; Weigel et al., 2006a, 2006b), há outros estudos (e.g., Susperreguy et al., 2007) que indicaram uma ausência de diferenças significativas entre crenças ditas didácticas e o nível de educação das mães, e a ausência de uma relação significativa com o que os pais pensam que podem fazer no âmbito da leitura e escrita com os filhos a frequentar o último ano do pré-escolar. Assim, como ainda há estudos que concluem que os pais alternam entre crenças mais holísticas e mais tecnicistas, acreditando que os dois tipos de abordagens se completam (Norman, 2007).

Partindo do pressuposto que a cultura familiar está ligada a determinadas crenças dos pais, e que estas condicionam e orientam as práticas de literacia familiar, parece-nos importante considerar um segundo objectivo de estudo que diz respeito à análise da relação entre o estatuto sociocultural dos pais, as crenças sobre a aprendizagem da leitura e escrita, as práticas e o ambiente de literacia familiar.

Um outro aspecto que tem sido considerado no âmbito da literacia familiar é o facto das práticas familiares terem algum impacto no desenvolvimento dos conhecimentos de literacia emergente das crianças, e consequentemente, nas competências iniciais de leitura (e.g., DeBaryshe, 1995; LeFevre & Sénéchal, 1999; Lourenço, 2007; Hood et al. 2008; Sénéchal & LeFevre, 2002; Sénéchal et al., 1996a, 1996b, 2002; Mata, 2006; Mata & Pacheco, 2009; Weigel et al., 2006a, 2006b).

Alguns estudos com crianças portuguesas (Lourenço, 2007; Mata, 2006; Mata & Pacheco, 2009) indicam consistência na relação entre práticas de literacia familiar e o desenvolvimento da literacia emergente. No entanto, os estudos referidos

apresentam diferenças ou contradições que nos parecem relevantes clarificar na nossa investigação. Por exemplo, sobre a relação entre práticas e ambientes de literacia familiar e conceptualizações infantis sobre a escrita, o estudo de Mata (2006) não confirmou esta associação, mas constatou a existência de variáveis que não são independentes das práticas dos pais (e.g., a precocidade com que foram iniciadas as interacções de leitura e escrita partilhadas; o conhecimento de livros e autores por parte dos pais) que revelaram associações significativas com as conceptualizações infantis sobre a escrita.

Assim, no seguimento do que foi referido, definimos como terceiro objectivo de estudo caracterizar os conhecimentos de literacia emergente das crianças, e por último, como quarto objectivo analisar a relação entre as variáveis parentais (crenças e práticas de literacia), ambiente de literacia familiar e o desenvolvimento dos conhecimentos emergentes de literacia das crianças.

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