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Objectos – um novo estágio da sua evolução

Capítulo 3 Design como veículo para a diferenciação

3.2 Objectos – um novo estágio da sua evolução

Os objectos são resultado de um devir que, numa fase primitiva, se caracterizou por uma estrutura elementar, cuja potencialidade no desempenho de funções se encontrava ainda pouco explorada. Com o avançar da história, essa potencialidade foi sendo consecutivamente explorada,

promovendo uma constante reinvenção do objecto que, assim, foi adquirindo uma estrutura cada vez mais complexa e autónoma, aproximando-se pelo modo de funcionamento ao comportamento dos seres vivos (Rodrigues, 1990).

Em resultado da sua natureza homeostática e auto-reguladora (Rodrigues, 2001), os objectos, agora livres dos condicionalismos impostos pelos ideais modernos, ficam aptos a desempenhar competências no domínio do imaterial. Da incorporação destas qualidades, eles adquirem a capacidade de emocionar o sujeito, estabelecendo com ele relações de afecto, passando por isso a adquirir vida própria.

“Os objectos, hoje quase sujeitos, ganharão no futuro instinto de sobrevivência, adquirindo qualidades mutantes, que lhes permitam superar a perenidade funcional.” (Providência, 2001, p.24)

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Projecto desenvolvido por Adriana Cresto, no âmbito do concurso designing craft. Europe, cujo principal objectivo era juntar artesãos e jovens designers para a projecção e realização de objectos e acessórios para casa.

Design como veículo para a diferenciação

Ao adquirir linguagem própria o objecto autonomiza-se do sujeito, facto que lhe confere uma densidade vital e que justifica a sua presença no seio de uma cultura. Esta dinâmica enquadra-se naquilo a que Morace (1993) chama de desafio maiêutico, que compreende a geração de um novo sistema de valores e qualidades fundado numa análise reflexiva sobre a existência.

3.2.1 O papel dos objectos

Durante o processo de evolução humana foram sendo desenvolvidas capacidades inventivas, de modo a facilitar o desempenho das tarefas rotineiras e tornar a vida mais hábil. Por outro lado, foi também desenvolvida uma outra faculdade que se prende com maneira como o indivíduo recebe e interpreta aquilo que o rodeia, ou seja, a sua capacidade perceptiva que é responsável pela criação de classificações. Tem a função de organizar e ordenar a informação em padrões de acção, costumes, crenças ou outras formas de identidade específicas que caracterizam a cultura de uma comunidade. Cada objecto assume por isso, um significado específico mediante a cultura onde está inserido. No entanto, estes, ao fazerem parte dos rituais de cada comunidade, onde têm um papel específico, tornam-se também em agentes modificadores de comportamentos (López, 2005).

Mas se a cultura é o resultado destas manifestações contemporâneas, também o repertório histórico patente nos objectos tradicionais a influenciam e a conformam. É esta conjugação entre o património cultural e as novas significações, que o momento presente vai imprimindo às mais recentes produções culturais, que confere à cultura um carácter dinâmico e que, ao mesmo tempo, faz dela um referencial para qualquer ser humano.

As experiências passadas constituem o suporte onde assentam todas as dinâmicas e crenças do indivíduo, que o caracterizam e o posicionam numa estrutura social. Essa informação que lhe é transmitida pelas gerações precedentes constitui a base para a construção da sua personalidade e para o desenvolvimento das suas competências, ou seja, para o seu estabelecimento enquanto ente social.

Esse conhecimento transmitido constitui um conjunto de informação que foi sendo passado de geração em geração, adoptado e reajustado mediantes os contextos. Para a difusão desses dados a memória ocupa um papel primordial, na medida em que, através da sua capacidade de reter, recuperar, armazenar e evocar informações disponíveis na mente do indivíduo, permite a sua preservação (Viires, 2005). É a sua existência que permite ao indivíduo atribuir significados aos acontecimentos quotidianos, constituindo por isso a base do seu conhecimento. Com base nela, ele justifica os fenómenos e toma decisões.

Capítulo 3

Esses conhecimentos adquiridos constituem a essência da existência humana, por isso são reunidos, interpretados e organizados sob a forma de registo com o intuito de prolongar a sua presença. Mas a constante assimilação de memórias promove uma transferência daquelas que são menos utilizadas para o domínio do inconsciente, o esquecimento (Providência e Pombo, 2003). Na verdade, essas não deixam de existir, só que agora passam a situar-se num outro nível que escapa à nossa percepção. Voltam a assumir consciência quando o indivíduo é novamente confrontado com os estímulos que lhe estão associados, como é o caso de quando come um determinado tipo de bolo, quando sente um cheiro específico ou se depara com uma imagem e lhe faz relembrar momentos passados que a consciência já tinha dado como perdidos.

São essas lembranças colectivas que transformam o meio num lugar habitável, fixando o indivíduo a uma estrutura social e estabelecendo um feedback constante entre ele e a comunidade que o integra. A memória constitui assim a verdadeira essência das relações sociais. Os objectos, por veicularem uma determinada informação (ou estímulo) atribuída pela comunidade onde se inserem, desempenham um papel marcante na vida do indivíduo, não tanto por poderem serem uma demonstração de status e de riqueza, mas mais por materializarem memórias e significados que lhes atribui sentido à vida (Norman, 2004; Providência, 2001)

A favorite (sic) object is a symbol, setting up a positive frame of mind, a reminder of pleasant memories, or sometimes an expression of one’s self. And this object always has a story, a remembrance, and something that ties us personally to this particular object, this particular thing.3(Norman, 2004, p.6)

Assim, para além de um desempenho técnico, os objectos cumprem funções do âmbito afectivo, pela mensagem que veiculam e que constitui uma resposta às necessidades psicológicas do indivíduo. Essa mensagem não é mais que a significação de um conjunto de comportamentos, crenças e tradições adoptadas pelos grupos sociais, ou seja, é a interpretação de um sistema de referências aprovado e consolidado pelos entes sociais.

Os significados veiculados pelos objectos são por isso exclusivos de uma cultura específica e do património que ela incorpora. Assim, na criação dessa significação que é anexada ao objecto participam as condições do meio, as interacções estabelecidas entre os elementos do grupo e as memórias que dele fazem parte.

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“O objecto favorito é um símbolo, constituindo um estado de espírito positivo, uma lembrança de memórias aprazíveis, ou às vezes uma expressão de nós mesmos. Este objecto tem sempre uma história, uma recordação e algo que nos liga pessoalmente àquele objecto, àquela coisa em particular.” (T.L.)

Design como veículo para a diferenciação