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A observação direta intensiva se deu por meio da observação propriamente dita e da realização de entrevistas.

Havia a informação de que algumas experiências de alfabetização de jovens e adultos em acampamentos e assentamentos do MST se realizavam de forma espontânea ou vinculadas a outros modelos pedagógicos que não o do Movimento. Tais experiências, não menos interessantes do ponto de vista científico, fugiam ao objetivo desta pesquisa em virtude de não apresentarem vínculo orgânico com a Pedagogia Sem Terra.

Assim, optei por pesquisar a Alfabetização de Jovens e Adultos do Acampamento 2 de Julho - em Betim, Região Metropolitana de Belo Horizonte -, na qual a presença de integrantes dos coletivos Estadual e Nacional de Educação do MST e do Coletivo de

Educação do Acampamento era freqüente e tinha o objetivo de subsidiar didaticamente as práticas docentes da alfabetizadora.9

2.3.1 A observação propriamente dita

A observação foi feita em duas etapas: de 19 a 30 de março de 2001, foram observadas as oito primeiras aulas do ano letivo; de 20 a 25 de setembro de 2001, foram observadas as duas aulas do período. As aulas aconteciam de segunda a quinta-feira, das 19 às 21h, e, quando era o caso, as reposições eram feitas nas sextas-feiras. Mas não só as aulas foram observadas. Esses dias eu passei no Acampamento e me deslocava daí apenas nos finais de semana. Desta forma, a observação inclui também momentos de planejamento das aulas, de conversas com ou entre as educadoras fora da situação de entrevista, de conversas no percurso casa-escola-casa e outras tantas situações cotidianas.

Decidi fazer primeiramente a observação, de modo que as práticas escolares em observação não fossem influenciadas pelas entrevistas.

Todas as aulas seriam gravadas, mas, por um desajeito meu diante da minha primeira experiência de “invadir” uma sala de aula com um gravador, apenas as aulas do segundo período de observação foram gravadas. Assim, as aulas do primeiro período constam apenas das notas de observação, que trazem a reprodução fiel, tanto quanto possível, das falas e algumas observações pessoais minhas. Quanto à gravação, em virtude do equipamento adotado e da intenção de privilegiar a captação da voz da alfabetizadora, foi feita acompanhando-se os deslocamentos da alfabetizadora pela sala de aula, o que em alguns momentos era constrangedor: eu parecia a sombra dela.

O início do ano letivo foi escolhido pressupondo-se que, caso houvesse a intenção de discutir os objetivos da alfabetização, este seria um momento privilegiado para tal. O

9 Esta Alfabetização realizava-se por meio de convênio estabelecido pelo Programa Nacional de

Educação na Reforma Agrária - PRONERA. Tal programa, surgido da reivindicação dos movimentos sociais rurais, é uma parceria entre o Governo Federal (Ministério Extraordinário da Política Fundiária - MEPF -, Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - INCRA -, Ministério da Educação e Desporto - MEC - e Ministério do Trabalho - MTb), universidades e movimentos sociais rurais e tem por objetivo “desencadear um amplo processo para Educação de Jovens e Adultos nos assentamentos da Reforma Agrária” (MEPF/INCRA, 1998).

Na Alfabetização de Jovens e Adultos do Acampamento 2 de Julho, este convênio incluía a Universidade Estadual de Minas Gerais - UEMG -, a Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado de Minas Gerais - FETAEMG - e o MST. Dada a especificidade do objeto proposto, essas outras entidades não foram incluídas como universo desta pesquisa.

retorno no decorrer do ano letivo foi a oportunidade para gravar algumas aulas e ter uma visão do andamento da Alfabetização.

A observação se deu, pois, na vida real, individualmente e de forma não estruturada, procurando-se registrar fatos marcantes de qualquer natureza, porém com especial atenção para fatos que pudessem estar relacionados ao fenômeno das variedades lingüísticas e seu tratamento no processo de alfabetização.

Quanto à classificação da observação em participante ou não-participante, em princípio, prevalece o segundo tipo, pois eu me guiei pelo esforço de, relativamente às práticas escolares, ser uma espectadora ou, nos momentos em que isso não foi possível, procurei seguir as orientações que guiavam a alfabetizadora.

Na prática, porém, a observação aconteceu em um misto de atitudes participantes e não- participantes, em decorrência do contexto. Eu estava hospedada no Acampamento, conhecia de antemão alguns de seus integrantes, havia sido apresentada como uma pessoa solidária ao Movimento. Assim, desde a minha chegada, integrei-me não só às atividades domésticas da casa na qual eu estava alojada, como também aos momentos de confraternização da vizinhança, inclusive com os alfabetizandos. Era um passeio na roça de milho, uma ida à beira do rio Paraopeba - divisa dos municípios de Betim e Juatuba -, uma ida à cidade para comprar a bebida que iria abastecer os homens do Acampamento durante a semana, ou para levar ao posto de saúde mais próximo o menino que havia sido atacado por marimbondos...

Aliava-se a tudo isso o fato de, em virtude de aquela ser a primeira experiência docente da alfabetizadora, as integrantes dos coletivos Estadual e Nacional de Educação do MST que acompanhavam a alfabetização local me haverem pedido para auxiliar a alfabetizadora quando elas não estivessem no Acampamento. Como em alguns momentos eu era a única pessoa ali que poderia prestar tal “socorro”, acatei o pedido, esforçando-me para não imprimir os meus pressupostos teóricos à prática que eu estava observando. Deste modo, nos momentos nos quais eu intervinha na prática docente, seja acompanhando a alfabetizadora no planejamento das aulas, seja em alguns poucos momentos substituindo-a em sala de aula ou respondendo ao pedido de auxílio de algum alfabetizando, procurava guiar-me pelo que já havia observado daquelas outras educadoras.

2.3.2 As entrevistas

Utilizei a técnica de entrevista focalizada. Antes de iniciar a gravação, expunha para a entrevistada os objetivos desta pesquisa, tomando o cuidado, tanto quanto possível, para que tal exposição não viesse a conduzir as respostas a serem dadas, e, ainda, discorria acerca dos tópicos da entrevista, quais sejam:

a) a trajetória da entrevistada no Movimento e na Educação;

b) a existência de educadores na família da entrevistada;

c) os estudos, o conhecimento e a prática da entrevistada e a orientação do Movimento a respeito do fenômeno das variedades lingüísticas;

d) posicionamentos acerca do “certo” e do “errado” em termos de linguagem.

Foram entrevistadas a alfabetizadora de jovens e adultos do Acampamento 2 de Julho (esta entrevista foi realizada ao ar livre, em uma área comum do Acampamento), a integrante do Coletivo Estadual de Educação do MST responsável por acompanhar a alfabetização em pesquisa (esta entrevista foi realizada na casa do MST em Belo Horizonte, situada na região da Lagoinha) e a integrante do Coletivo Nacional de Educação do MST que acompanha a Educação no Acampamento (esta entrevista foi realizada na Secretaria Estadual do MST, situada na área central de Belo Horizonte).