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O OCIDENTE “VERSUS” O ORIENTE EM SYRIANA

Diversas interpretações disputaram o significado dos ataques terroristas do dia 11 de setembro de 2001. O governo e seu incentivo a filmes patrióticos mostra a insistência a construir o acontecimento como legitimação das políticas externas do país em meio ao Oriente Médio, o que foi pouco tratado até a invasão do Iraque. É neste ponto que se nota que sem as imagens é impossível compreender o processo histórico que envolve o 11 de Setembro e a luta contra o terrorismo. A TV teve um papel fundamental na disseminação dos atentados e posteriormente ao acompanhar as ações intervencionistas dos EUA no Afeganistão e no Iraque. Sendo que num primeiro momento contribuiu para o discurso da política antiterrorista, ao propagar e intensificar a ideia dos árabes enquanto potencias terroristas.

Esses elementos tem uma aproximação direta com os atentados a Nova Iorque e ao Pentágono, em setembro de 2001, e causaram um efeito no cinema de Hollywood não pelo acontecimento em si, mas pela interpretação e significação do mesmo. Isso afetou diretamente o horizonte de expectativas do público por conta da espetacularização televisiva, que acentuou a concepção do Oriente ameaçador, inimigo do Ocidente, somado ainda com a tradicional aproximação da Casa Branca com produtores/distruidoras de Hollywood (que em muitos momentos mediaram o que é ideal ser lançado ou produzido), e também pelo receio dos diretores, roteiristas, produtores, etc.

Syriana apresenta-se enquanto uma contra análise da Guerra ao Terror,

mostrando que existem outros fatores por trás das explicações simplificadoras baseadas no 11 de Setembro e na concepção orientalista estadunidense. Em Syriana não existem lugar para uma via unilateral, os EUA atuam no Oriente Médio há décadas, seja por vias convencionais e mais ainda por ações clandestinas que visam a afirmar sua posição de superioridade sobre diversas regiões no Oriente Próximo. No filme, se vê a atuação dos EUA, ao menos desde os anos de 1980, para além da memória histórica de uma tragédia justificada no ódio dos árabes islâmico ao Ocidente, mais precisamente nos EUA.

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As primeiras sequências de Syriana se passam no Oriete Médio e trazem uma apreciação do arábe não como uma ameaça, mas de alguém que levanta cedo e vai trabalhar, ao mesmo tempo em que representa uma outra face do arábe.

Um som soa da Minarete, torre da Mesquita, que anuncia as cinco chamadas diárias para as orações. O sol nasce em meio à poluição. Um ônibus para, um grupo de homens tenta embarcar, mas alguns destes são impedidos por três homens, que também afastam um senhor idoso. Na fila, há um close em um martelo. Então, um pequeno grupo olha diretamente para a câmera. Corte para a legenda: “SYRIANA”. Na tela uma tomada panorâmica da cidade, o intertexto apresenta: Teerã, Irã. É de manhã, som alto, uma mulher muçulmana abotoa suas calças e veste seu turbante e segue para fora do recinto. Se trata de uma festa, a música está bem alta. Bob Barnes, interpretado por George Clooney, socializa com Arash Amiri em meio a outras pessoas, parecem íntimos. Nota-se que Barnes sabe falar muito bem a língua local, ele conversa com Arash sobre quando quer concluir uma negociação, e este que responde: “Depois da oração”. Corte, Barnes entra com Arash Amiri e seu irmão, ambos do partido Xiita, em um prédio aparentemente abandonado, ele está com uma pasta da qual retira duas baterias e as instala em dois mísseis FIM-92 STINGER para testá-los. Arash arrasta um dos mísseis para uma sala e o outro é colocado próximo a saída. Barnes fica confuso e os questiona, sem resposta. Enquanto os Amiri saem, Bob conta o dinheiro e segue curioso até a outra sala, então é confrontado por um homem de turbante com uma arma. Barnes tenta dialogar, mas ele não fala farsi e o homem sai do prédio. Ao caminhar para fora do prédio, Barnes passa pelos Amiri, que guardam um dos mísseis no porta-malas de um carro, após entrarem no carro, uma explosão. Barnes segue seu caminho sem olhar para trás.187

Essas sequências iniciais trazem elementos que rompem com o cenário fílmico do período. Apresentam aspectos culturais e sociais do Oriente Médio, trabalhadores, a religião marcando o cotidiano, algo não muito comum no período. E mesmo não tendo uma menção direta sobre quem é Bob Barnes, estadunidense ou não, possivelmente alguns espectadores irão associá-lo como tal, em vista do seu comportamento e aspecto diferenciado em relação aos outros personagens. Sobretudo porque o mesmo possui relações com grupos que agem clandestinamente. De modo geral, não há uma distinção acentuada sobre quem é ocidental ou não, mas que há certa proximidade. Nota-se também um certo destaque sobre o personagem Bob Barnes: conhecer a cultura local, entender o idioma, que não o coloca sob umcaráter de dominação cultural, como por exemplo com este personagem falando o inglês com os outros personagens.

187 Syriana: a indústria do petróleo. [Syriana]. Direção de Stephen Gaghan. Roteiro de Stephen Gaghan.

EUA. Produzido por Warner Bros, Participant Media, 4M, Section Eight, FilmWorks, MID Foundation. Distribuição Warner Bros, 2005. 1DVD vídeo (128 min.); Colorido. [Narração nossa].

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Após estas sequências iniciais no Oriente Médio, Syriana busca apresentar como o cenário global se relaciona com eventos que ocorrem em função das reservas petrolíferas no Oriente Médio. Bem como é possível observar inúmeras situações em que toda perpecção do contexto de produção, o distanciamento fílmico do período, os discursos de W. Bush, a paranoia frente ao Oriente Médio, não passam de uma construção que se funda náquele orientalismo estadunidense da aplicação do “nós e o eles”. Isso se dá pelo jogo de imagens e também através da fala de alguns personagens. Vejamos:

Georgetown, Washington-DC, EUA. Dean Whiting (Christopher Plummer), dono da empresa de advocacia Whiting Sloan, conversa com Bennett Holiday (Jeffrey Wright), sobre a Connex Oil, a qual presta serviços, ter perdido um contrato de gás natural no Golfo Pérsico para uma empresa chinesa, e também que uma empresa de pequeno porte, a Killen Oil, conseguiu os diretos para exploração de um dos maiores campos de petróleo do mundo no Cazaquistão. Whiting ressalta que as referidas empresas pretendem se fundir se tornando Connex-Killen, mas o governo quer saber se existem irregularidades. Whiting quer que Holiday investigue para descobrir algo antes do governo. Houston, Texas. Vários advogados e executivos estão em reunião, Holiday está presente. Jimmy Pope (Chris Cooper), dono da Killen Oil, fala sobre a fusão com a Connex, mostrando um acentuado desconhecimento e estereotipação da cultura árabe. Na mesma cena um dos advogados da Whiting Sloan, Sydney Hewitt (Nicky Henson), faz uma pequena piada envolvendo a Suíça, dizendo que não pode escolher um lado, e apresenta Holiday a todos – Pope parece desconfortável com a presença de Holiday. Corte, em outra sequência, a bordo de um jato particular, Holiday e Hewitt conversam sobre a aprovação da fusão. Hewitt faz comentários irônicos sobre a fusão: que enquanto carros forem movidos a gasolina e não a água e enquanto continuar o caos no Oriente Médio, tudo correrá bem. Ao fim, Hewitt comenta que quando o governo aprovar a fusão, ambos terão casas luxuosas. Genebra, Suíça. Bryan Woodman (Matt Damon), consultor de energia, está em sua casa com sua esposa Julie (Amanda Peet) e seus dois filhos, Max e Riley (caçula) num momento de descontração durante o café da manhã. Na sequência, em off, uma voz feminina, noticiando a fusão das empresas Connex e Killen, que será a quinta maior empresa de gás e petróleo do mundo e que isso afetará 37 mil trabalhadores em 160 países – enquanto na tela são exibidas imagens de complexos de exploração de gás e petróleo, navios, trabalhadores e Leland Janus, diretor executivo da Connex, cumprimentando Jimmy Pope em uma coletiva de imprensa. Após narrativa em off, Janus discursa sobre os benefícios da criação da Connex-Killen Corporation. Suíça. Em off, ouve-se a entrevista de Brian Woodman (Matt Damon) noticiando a fusão da Connex-Killen, enquanto os vemos dirigindo por Genebra antes da referida entrevista, observando a diferentes paisagens: um prédio e o contraste entre o

outdoor da marca de relógios Rolex e abaixo o Arab Bank, e mais a

frente no Hotel President Wilson, um grupo de árabes e alguns homens de termo. Voz e imagem sincronizam temporalmente, Bryan está agora explanando sobre o cenário econômico petrolífero mundial. Corte, em seu escritório, Woodman conversa com seu filho, a ligação cai, seu chefe lhe conta sobre a festa do Emir Hamed Al-Subaai, que Woodman

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se recusa a ir, pois será no dia do aniversário de seu filho. Seu chefe insiste que o Emir é importante para a empresa e que ele pode levar a família e que os árabes adoram crianças. Durante esta cena, duas TVs estão ligadas, uma mostra as operações noturnas das tropas estadunidenses no Iraque e a outra apresenta o retrato de John D. Rockefellar.188 Ao sair o chefe de Woodman aponta para a TV e

comenta que Rockefeller fundou a Universidade de Chicago. Woodman aumenta o volume da TV para ouvir a gravação do coral de Rockefeller. Golfo Pérsico. Uma tomada panorâmica mostrando o complexo petrolífero da Connex, um trabalhador chama por outros que estão no alto das torres. Enquanto um grupo de trabalhadores segue em uma van, todos ouvem uma voz, através de megafones, informando aos trabalhadores que a empresa tem um novo proprietário. Depois, um grupo de engenheiros chineses falam aos trabalhadores, com tradução simultânea do mandarim para urdu por um paquistanês, informando que seus serviços não são mais necessários. Entre estes trabalhadores estão: Saleem Ahmed Khan e seu filho Wasin. O tradutor continua dizendo para os trabalhadores que seus vistos de imigração foram suspensos, e dentro de duas semanas poderão ser deportados. Em seguida vemos, Wasim e seu pai caminhando, ao fundo o campo de exploração de petróleo, e conversando sobre a sua terra natal, o Paquistão.189

Nas sequências descritas acima, diferentes personagens e tramas são apresentadas, sendo que todos estão relacionados e, mesmo que estes não percebam, todos são ou serão afetados pelas empresas petrolíferas em processo de fusão. Conforme o enredo de Syriana avança, observa-se que o filme trata dos jogos políticos e econômicos dos EUA frente à negociação do comércio petrolífero, claro, sem citar nomes, pois se passa num país fictício, localizado no Oriente Médio. O longa-metragem expõe o favorecimento das relações econômicas constituídas nas redes da política externa em detrimento das investigações da CIA sobre grupos terroristas. Seu objetivo é apresentar a a importância do petróleo para os EUA, pois a fim de deter o domínio sobre este recurso, a ameaça terrorista fica em segundo plano, dando lugar aos jogos políticos e econômicos.

Apesar dos diretores, roteiristas e atores afirmarem não haver uma mensagem política definida,190 a película é uma crítica ao imperialismo dos EUA, pois acentua

questões já expostas por Edward Said acerca da dominação deste país sobre o Oriente Médio, que se intensificou a partir da Segunda Guerra Mundial com vista a conquista de

188 GAGHAN, Stephen. Syriana Screenplay. Warnerbros, [20--]. Disponível em:

<http://pdl.warnerbros.com/wbmovies/syriana/site/med/Syriana-Screenplay.pdf>. Acesso: 02 set. 2014.

189 Syriana: a indústria do petróleo. [Syriana]. Direção de Stephen Gaghan. Roteiro de Stephen Gaghan.

EUA. Produzido por Warner Bros, Participant Media, 4M, Section Eight, FilmWorks, MID Foundation. Distribuição Warner Bros, 2005. 1DVD vídeo (128 min.); Colorido. [Narração nossa].

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reservas de petróleo.191 Syriana mostra a historicidade de tais relações e as mesmas

remetem a questões de uma concepção do Oriente Médio ligadas a prerrogativas econômicas, bem como geopolíticas. O que se nota é como o próprio cartaz de divulgação do filme apresenta: “Tudo está conectado”.192

Syriana permite a reflexão acerca das artimanhas econômicas e políticas dos

EUA para controlar zonas estratégicas, almejando objetivos para além da defesa da liberdade e da democracia, tais como controle geopolítico através da presença militar e de agências de inteligência há décadas. Sobretudo, seguindo as tradicionais orientações estratégicas dos EUA: controlar territórios como a Europa, a Ásia, em nosso caso específico o Oriente médio; dominar espaços aéreos e marítimos; por fim, dar passagem livre e segura do petróleo para os mercados internacionais.193 O que se vê não é apenas o

argumento composto pela dita Doutrina Bush, mas o embate com velhas artimanhas da economia e da política externa, e que acaba por mostrar que existe um processo histórico para além do recente marco.

Essa transição temporal em Syriana é visualmente transposta através do personagem Bob Barnes, agente da CIA em atuação no Oriente Médio, desde a década de 1980, que entra em confronto com as novas abordagens e modelos de ação dos EUA. Tais questões podem ser observadas quando Bob Barnes é confrontado por seus superiores nos EUA, sobre sua missão envolvendo os mísseis, na sequência exposta anteriormente.

EUA. Bob Barnes dirige por uma rodovia, a legenda apresenta: Langley-Virginia, Agência Central de Inteligência (CIA). Dois agentes, Fred Franks e a chefe de divisão falam sobre Bob Barnes, enquanto ele dirige pelo tráfego de Washington-DC. Os agentes estão preocupados com os memorandos de Barnes sobre o míssil entregue aos Amiri no Teerã, capital da República Islâmica do Irã. Franks comenta que convenceu a França e a Inglaterra que nada tiveram a ver a explosão que matou os irmãos Amiri. A chefe da divisão sugere que Barnes seja promovido. Durante esse diálogo, a interposições de cenas de Barnes dirigindo com os agentes dialogando. Corte. No corredor, Barnes aguarda por sua entrevista de promoção, enquanto isso ouvimos um homem falar sobre suas atividades de Barnes a uma banca, alguém faz

191 SAID, Edward W. O Orientalismo: o Oriente como invenção do Ocidente. São Paulo: Cia. das Letras,

1990.

192 Cartaz de lançamento de Syriana (2005). Disponível em:

<http://www.imdb.com/media/rm767267328/tt0365737?ref_=ttmd_md_nxt#>. Acesso em: 27 dez. 2014.

193 MEAD, Walter Russel. Poder, terror, paz e guerra: os Estados Unidos e o mundo contemporâneo sob

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piada com as missões de Barnes em Beirute na década de 1980. Antes de entrar Terry George, vice chefe da CIA e amigo de Barnes, fala que tudo está bem com o Irã. Corte, na sala, durante a entrevista Barnes tende a seguir um caminho contrário ao de sua entrevistadora, Marilyn Richards, vice conselheira de segurança nacional, que fala que a Índia, a Rússia, e mesmo a China serão aliadas, o problema é com Estados e economias falidas, como Marrocos e Paquistão, e acrescenta que o Irã é um aliado cultural natural dos EUA. Richards questiona Barnes se caso mantiverem o embargo energético, algum dia o Irã se tornará um governo amigável ao Ocidente e a iniciativa privada? Barnes diz que é uma situação complicada, porque, apesar de não parecer, os Aiatolás ainda controlam o país. Um dos componentes da CLT (Comitê pela Libertação do Irã) diz que o movimento reformista no Irã é uma das apostas do presidente dos EUA, elemento crucial para assegurar o petróleo para os EUA. Corte. Princeton, New Jersey. Jovens caminham pelo campus, Barnes conversa com seu filho, Robby Barnes, em uma lanchonete, ambos discutem o relacionamento familiar.194

Na sequência descrita acima, o personagem Barnes é apresentado ao público, um agente da CIA com vasta carreira no Oriente Médio e um cidadão comum, com seus problemas pessoais. Sobretudo, é motivo de piada para alguns de seus colegas e superiores, mas aparentemente é uma peça fundamental em meio aos objetivos da agência no Irã, já que possui proximidade e experiência no país. Quando a superiora de Barnes cita alguns potências, desenha um cenário no qual o EUA têm medo desses pequenos países que não se enquadram em seus termos, uma referência a situação da política antiterrorista, com os países do Eixo do Mal, termo imortalizado em discurso de George W. Bush, composto pelo Iraque, Coréia do Norte e o Irã. No fim do diálogo há o contraste exposto entre as novas entidades (CLT) em confronto com ordem estabelecida no Irã, os aiatolás.

CLT trata de uma referência às recentes entidades criadas pelo governo Bush, podendo a partir disso se expor a possível relação com a Operação Iraque Livre

(Operation Iraqi Freedom). Esses apontamentos são um esforço de Syriana em construir

uma crítica às políticas antiterroristas, sobretudo, trazem elementos que cercam o processo histórico das relações entre o Ocidente e o Oriente. E se tratando de uma produção que busca ir além do marco, a crítica de Syriana explora a percepção do Oriente Próximo favorável aos interesses do país defensor do mundo livre e “representante” do

194 Syriana: a indústria do petróleo. [Syriana]. Direção de Stephen Gaghan. Roteiro de Stephen Gaghan.

EUA. Produzido por Warner Bros, Participant Media, 4M, Section Eight, FilmWorks, MID Foundation. Distribuição Warner Bros, 2005. 1DVD vídeo (128 min.); Colorido. [Narração nossa].

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Ocidente. De modo que lembra as colocações de Edward Said sobre o orientalismo estadunidense.

Em comparação [a Europa], o entendimento americano do Oriente parecerá consideravelmente menos denso, embora as nossas recentes aventuras japonesa, coreana e indochinesa deveriam agora estar criando urna percepção “oriental” mais sóbria, mais realista. Mais ainda, o grande aumento da importância do papel económico e politico dos americanos no Oriente Próximo (o Oriente Médio) assume urna grande porção do nosso entendimento desse Oriente.195

O cenário cinematográfico inicial, exposto no segundo capítulo, mostra a aproximação de Hollywood do governo, no qual as imagens se voltam a favor de uma política intervencionista no Oriente Médio, tipicamente republicana, que disseminaram uma visão simplória e caricata de povos do Oriente Médio, mesmo que em grande parte o foco fosse os arábes muçulmanos. De modo que isso se relaciona à utilização de diversos artifícios a fim de ligar os Atentados de 11 de Setembro como uma justificativa e um marco da luta contra o terrorismo. Ressaltando novamente que as imagens dos ataques terroristas foram incessantemente exibidas na mídia e, posteriormente, em instituições educacionais. As imagens dos atentados e a disseminação do terrorismo como novo mal encontram suporte não apenas na política de guerra preventiva, mas principalmente no imaginário social que se tem do Oriente Médio, raso e artificial, como aquelas disseminadas pelo próprio cinema, bem como pela mídia anos antes do que se intitulou Guerra ao Terror.

Golfo Pérsico. Numa pequena sala da Madrassa (escola religiosa), enquanto um grupo de jovens comem, entre eles Wasim e Farooq, todos ouvem o discurso de um clérigo: “Eles tentarão esconder a diferença para insinuar que muçulmanos que falam de religião são pessoas fanáticas ou retrógadas. Dirão que se trata de uma disputa por recursos econômicos ou domínio militar. Se acreditarmos nisso faremos o jogo deles e a culpa será toda nossa. Não é possível superar a cisão entre as necessidades humanas e a vida moderna através do livre comércio. Impossível. O divino e o mundano são um só conceito, o Alcorão. Nenhuma separação entre religião e estado, o Alcorão. Em vez de reis legislando e escravos obedecendo, o Alcorão. A dor da vida moderna não pode ser curada pela desregulamentação, privatização, reforma econômica ou redução de impostos. A dor de viver no mundo moderno

195 SAID, Edward W. O Orientalismo: o Oriente como invenção do Ocidente. São Paulo: Cia. das Letras,

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nunca será sanada por uma sociedade liberal. As sociedades liberais fracassaram. A teologia cristã fracassou. O Ocidente fracassou”.196

A declaração acima destaca a importância do Alcorão acima de qualquer (???), mesmo que o discurso opositor, EUA, destaque outras prerrogativas, o que importa é a defesa dos ensinamentos da religião islâmica, tudo vai muito além da economia liberal e do modo de vida Ocidental. Na contraposição ao discurso acima, as sequências abaixo mostram que não há uma distinção entre Ocidente e Oriente de forma unilateral, como se em cada um houvesse um consenso entre o “nós” e o “eles”, pois em inúmeras situações há conflitos, seja entre os EUA como entre os arábes.

França. Abordo de um iate luxuoso, o príncipe Meshal Al-Subaai conversa com um grupo de homens sobre sua formatura em Oxford e