• Nenhum resultado encontrado

OPÇÃO PELO ESTUDO DE CASO

Para compreender a complexidade do ambiente imediato da criança cega, com suas peculiaridades idiossincráticas e com o seu potencial para facilitar ou impedir o desenvolvimento e a sua aprendizagem, foi feita a opção metodológica pela pesquisa qualitativa do tipo estudo de caso, pois, segundo André (2005):

[...] uma das vantagens do estudo de caso geralmente mencionada é a possibilidade de fornecer uma visão profunda e ao mesmo tempo ampla e integrada de uma unidade social complexa, composta de múltiplas variáveis. (p. 52).

Macedo (2006) refere que o estudo de caso arrola algumas características próprias, fundamentadas no pressuposto de que o conhecimento não se encerra de uma vez por todas, pelo contrário: “[...] haverá sempre um acabamento precário, provisório, portanto, o conhecimento é visto como algo que se constrói, que se faz e refaz constantemente”(p.89).

O estudo de caso, originário de uma tradição de pesquisa médica e psicológica, se refere à análise detalhada de um caso individual e explica a dinâmica e a patologia de uma doença rara (GOLDENBERG, 2005). Adaptado da tradição médica, veio a se tornar uma das principais modalidades da pesquisa qualitativa nas ciências humanas. É da autora a definição:

O estudo de caso não é uma técnica específica, mas uma análise holística, a mais completa possível, que considera a unidade social estudada como um todo, seja um indivíduo, uma família, uma instituição ou uma comunidade, com o objetivo de compreendê-los em seus próprios termos. (p. 33).

Alcançar, pois, um maior número de informações detalhadas sobre um ambiente dinâmico e complexo como a análise do microssistema fez com que o estudo de caso se configurasse, para nosso objeto de estudo, como um método importante de análise desse sistema, haja vista não ser possível obtê-la pela análise estatística. Nesse sentido, a experiência humana não pode ser confinada aos métodos nomotéticos de análise e descrição.

Para Yin (2010), o estudo de caso em muitas situações contribui com o conhecimento que temos dos fenômenos individuais, sociais, organizacionais e de grupo. Em todas essas situações, o estudo de caso surge do desejo de compreender fenômenos complexos. Contudo, o autor relata que muitos

pesquisadores demonstram desprezo com esse tipo de metodologia, pois se referem à falta de rigor da pesquisa; também citam a confusão entre o ensino do estudo de caso e a pesquisa do estudo de caso. “No ensino, a matéria-prima do estudo de caso pode ser deliberadamente alterada para ilustrar uma determinada questão de forma mais efetiva” (p. 29), o que jamais pode acontecer em uma pesquisa científica. Outra crítica sofrida por essa metodologia é que fornece pouca base para uma generalização. Dessa forma, Yin (2010 apud LIPSET; TROW; COLEMAN, 1956, p. 419-420) afirma:

[...] o estudo de caso, como experimento, não representa uma “amostragem”, e, ao fazer isso, seu objetivo é expandir e generalizar teorias (generalização analítica) e não enumerar frequências (generalizações estatísticas). Ou, como descrevem três notáveis cientistas sociais em seu estudo de caso único feito anos atrás, o objetivo é fazer uma analise “generalizante” e não “particularizante”. (p. 30, grifos do autor).

Nesse sentido e corroborando com o autor é que as seguintes questões foram compreendidas e cuidadas nesta pesquisa: a opção do estudo de caso se deu pelo fato da pesquisadora ter como objetivo entender um fenômeno da vida real em profundidade e em condições contextualizadas, in loco. Além do que a investigação no contexto do microssistema precisa ser analisada com as variáveis e os dados precisam ser convergidos.

Quanto às pesquisas qualitativas, Minayo (2004) propõe que a questão relativa ao significado e à intencionalidade é incorporada como inerente aos atos, às relações e às estruturas sociais, repercutindo sobre a possibilidade de se tornar científico ou não esse tipo de trabalho investigatório. Ao se considerar prioritário o entendimento mais profundo das relações sociais, não há como quantificar em números e variáveis essas relações, porém, torna-se significativa a obtenção de explicações a respeito dos meandros das relações sociais consideradas essenciais à vida humana.

Contudo, para a autora, a discussão crítica do método qualitativo não deve ser apenas uma abordagem alternativa, antes deve se voltar “[...] a aprofundar o caráter do social e as dificuldades de construção do conhecimento que o apreendem de forma parcial e inacabada” (MINAYO, 2004, p. 12). A autora continua afirmando:

O próprio termo “Metodologias Qualitativas” consagra uma imprecisão, uma dificuldade histórica das teorias de se posicionar frente à especificidade do social. Ele supõe uma afirmação da qualidade contra a quantidade, refletindo uma luta teórica entre o positivismo e as correntes compreensivistas em relação à apreensão dos significados. Se entendermos a interdependência e a inseparabilidade entre os aspectos quantificáveis e a vivência significativa da realidade objetiva do cotidiano, veremos a referida denominação como redundante e mesmo parcial. (p.13).

Como referido, diversos estudos centrado nas pessoas com deficiência visual estão disponíveis, como os de Araújo (2007), Siaulys (2006), Galvão (2004), Caiado (2003), Ormelezzi (2000). Porém, os autores que focam na família dessas pessoas são escassos, e em uma tentativa de obter o estado da arte desta temática, não houve sucesso. Todos os estudos com família pesquisados estão voltados para conhecer como a família reage a partir do diagnóstico de deficiência do seu filho, principalmente com Síndrome de Down e Paralisia Cerebral. Todavia, existe o reconhecimento da importância preponderante da família no processo de desenvolvimento da pessoa cega.

No entanto, por onde conhecer e qual a importância da família no desenvolvimento da pessoa cega são um grande entrave. Alguns estudos centrados na família em vulnerabilidade têm usado o referencial metodológico qualitativo dos processos familiares, visto que esta metodologia proporciona uma maior aproximação do fenômeno investigado.

Dessa forma, a escolha teórica para respaldar esta pesquisa privilegiou o Modelo Ecológico de Bronfenbbrener, centrado no processo, na pessoa, no contexto e no tempo, pois o mesmo permite analisar os diversos sistemas, sendo influenciado e influenciando o desenvolvimento, aqui especificamente, da criança que nasceu cega.

A partir dessas considerações teórico-metodológicas, serão caracterizadas as famílias estudadas e os seus diferentes atores, bem como os instrumentos utilizados na investigação. Posteriormente, será explicitado o processo da inserção no microssistema e os seus desdobramentos nos mesossistemas. A inserção ecológica foi priorizada neste estudo; e o modo como se constituiu o processo de entrada no microssistema será apresentado.