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CAPÍTULO 3 DAS MUDANÇAS NAS MISSÕES DE PAZ À MINUSTAH

3.1 ONU: NASCE A ESPERANÇA DA PAZ COLETIVA, NÃO PARA TODOS

3.1.1 Operações de paz no campo dos conceitos

Segundo Eduardo Uziel (2015), se considerarmos a história, será possível observar que as missões de paz foram acontecendo de forma improvisada pela ONU, pois na Carta de São Francisco não há menção quanto a esse proceder. A falta de uma definição estaria na dificuldade da ONU em dar nomes a fenômenos. Nesse sentido, as definições dos conceitos relacionados com a manutenção de paz e operação de paz é polêmica e indefinida.

O autor esclarece:

Não há uma decisão das Nações Unidas que defina o que são operações de manutenção da paz. Na década de 1970, quando foi feita uma tentativa de defini-las, o Comitê Especial de Operações de Manutenção da Paz não chegou a uma conclusão. Nem mesmo sobre a terminologia existe um acordo – alguns preferem peace operations, outros, peacekeeping

operations, outros peacekeeping missions ou ainda peace forces52 (UZIEL, 2015, p. 28, grifo do autor).

Essa polêmica abre para interpretações e permite que alguns países considerem o termo peace operations (operação de paz) mais assertivo, pois, julgam ser um termo mais amplo que abrange tipos variados de missão de paz, podendo também, as peace operations, serem reportadas por organizações próprias de vários países sem estar ligadas a ONU (UZIEL, 2015, p. 29).

Seguindo essa lógica, o país que decida liderar uma peace operations, avalia se respeita os princípios que regulam as missões de paz - como foi o caso da invasão do Iraque pelos Estados Unidos, como já citado. Ou seja, o uso da força ou intervenções sem consentimento das partes envolvidas fica a critério do país interventor, conforme acordos regionais.

Por esse motivo, há uma diferenciação com base na qual as peacekeeping operations (manutenção da paz) representariam um termo considerado menos abrangente e, segundo o argumento, deveriam estar contidas dentro das disposições do termo peace operations da ONU (UZIEL, 2015, p. 29).

De modo contrário, há os países que argumentam que a peacekeeping operations seja independente do peace operations. Em geral, os países que defendem essa posição são os em desenvolvimento que compõem as operações de paz da ONU como contribuintes de tropas.

52 Para esse trabalho, na tentativa de não se vincular a nenhum conceito/termo, a autora optou por usar o termo

Ademais, também defendem essa postura os países membros do Movimento dos Países não Alinhados (MNA). Esses grupos de países entendem que a peace operations se trata de um termo muito ambíguo e traria a possibilidade de ser usado em intervenções de forma a atender interesses de países ocidentais os quais poderiam desconsiderar a soberania dos não ocidentais.

Alega-se a vulnerabilidade a uma intervenção peace operations internacional como exemplo as intervenções da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) (UZIEL, 2015, p. 30). Tendo em vista que peace operations não traz intrínseco, em sua disposição, a obrigatoriedade de consentimento do país anfitrião.

Essa divergência não foi solucionada. No entanto, cabe salientar que a ONU é, também, um campo político. Nesse sentido, acaba espelhando os interesses dos Estados envolvidos nas missões de paz. Essa tendência fica evidenciada nos órgãos intergovernamentais da própria ONU que “não primam pela coerência em suas decisões e

costumam estabelecer missões de paz cujos nomes variam ou introduzem novos termos sem qualquer rigor conceitual” (UZIEL, 2015, p. 28).

Soma-se a isso o fato de que há sempre questões políticas envolvidas quando um país está em conflito. Assim, as decisões do CSNU são carregadas de tendências ao definir em qual termologia uma missão será empenhada, conforme as conveniências políticas dos Estados-membros. Nesse sentido, assumindo o termo peace operations os Estados-membros podem se valer não apenas de seu status de membro permanente no Conselho de Segurança da ONU, como também podem se colocar como autônomos, ao tratar de seus assuntos de paz, ou ausência dela, nas intervenções que lideram.

Diante dessas ponderações a respeito das controvérsias entre o termo peace operations e peacekeeping operations, é possível notar que, apesar da ONU ter sido instituída para o estabelecimento da paz internacional e, fundamentalmente, as missões de paz da ONU serem um instrumento para esse fim, percebeu-se que os interesses individuais dos Estados- membros estão sempre à espreita em relação às condutas que possam ser tomadas para a promoção da paz desde que isso não interfira em seus assuntos políticos e/ou econômicos.

Entretanto, Juliana de Paula Bigatão (2015, p. 25) entende que, “embora a

organização [ONU] possa ser constrangida pelos Estados [membros], ela também possui uma agenda própria e uma cultura organizacional que resulta em interesses e comportamentos próprios”. A mesma autora ressalta que as missões de paz seriam um

instrumento para que a ONU pudesse exercer sua autonomia, um mecanismo ad hoc - as missões -, que estabelece: imparcialidade, consentimento do país anfitrião e uso da força

somente em autodefesa. Isso impossibilita que dissensos interfiram na hora de ativar a segurança coletiva por incompatibilidade de interesses dos membros do CSUN (BIGATÃO, 2015, p. 25).

Cabe salientar que, “os princípios básicos das operações de manutenção da paz foram

inicialmente compilados pelo Secretariado após a experiência da UNEF, em Suez [1948]”

(UZIEL, 2015, p. 31). Tais princípios previamente estabelecidos e regimentados pelo Departamento de Operações de manutenções da paz (DPKO) são: imparcialidade em prestar apoio para ambas as partes no sentido de ajudá-las a chegar à paz; consentimento das partes; uso da força somente em legitima defesa (UZIEL, 2015, p. 31).

Com efeito, considera-se que durante esses setenta anos de atividade das missões de paz ocorreram mudanças substanciais no contexto social, político e econômico mundial, visto que os conflitos também mudaram. Assim, na medida em que foram ocorrendo essas mudanças, as missões de paz foram, entre acertos e erros, tentando se adequar às novas necessidades de solução de conflitos.

Para melhor elucidar, no próximo tópico serão descritas as transformações mais pontuais que ocorreram na evolução das missões de paz que refletem as mudanças no cenário dos conflitos mundiais.