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3 PRÁTICAS DE GESTÃO JUDICIÁRIA EM VARAS DO TRABALHO

3.3 Gestão processual aplicada

3.3.2 Delegação da prática de atos afetos ao juiz

3.3.2.3 Operacionalidade

Além de atentar a certos limites, conforme definidos legalmente, a delegação do exercício da atividade jurisdicional, também por se tratar de exceção à indelegabilidade, deve observar algumas cautelas, basicamente de três ordens: (i) formais, ligadas à previsão dos atos passíveis de delegação e à documentação de sua operacionalidade nas situações concretas; (ii) materiais, ligadas ao aperfeiçoamento dos recursos materiais disponíveis e à qualificação dos servidores a quem delegada a prática de atos; e (iii) de controle, ligadas à avaliação do desempenho dos atos praticados em razão da delegação.

A adoção de cautelas de ordem formal – própria, somente, aos atos cuja prática pode ser delegada integralmente aos servidores, porquanto, fora dessa hipótese, os atos afetos ao juiz são considerados como por ele mesmo praticados, embora contando com auxílio dos servidores – se justifica em atenção ao princípio do devido processo legal, que, como exposto, entre outras finalidades visa a submeter o exercício da atividade jurisdicional a procedimentos previamente ordenados, aptos a permitir aos jurisdicionados o conhecimento antecipado quanto às regras disciplinadoras de sua participação no processo.

de (i) apontar, tanto quanto possível, cada um dos atos apanhados pela delegação e, (ii) sendo necessário, em razão da ausência de disciplina legal correspondente, detalhar os demais aspectos inerentes à sua prática pelos servidores – pense-se, por exemplo, no prazo a ser assinado quando da prática de ato consistente em vista obrigatória envolvendo um laudo pericial.

Se é certo que a edição de atos normativos é indispensável em se tratando de (i) atos de administração e atos de mero expediente sem caráter decisório – porque as hipóteses são de delegação judicial –, e (ii) atos decisórios cujo conteúdo pode ser disciplinado pelo juiz prévia e abstratamente com a finalidade de atender situações concretas verificadas com maior frequência ou pode ser explicitado, na situação concreta, em momento posterior à sua prática, quando não oferecer prejuízo à regularidade do procedimento – porque as hipóteses são fundadas na outorga, ao juiz, de âmbito maior de atuação discricionária no trato da matéria –, dúvidas podem surgir quanto aos atos meramente ordinatórios.

A despeito de traduzir modalidade de delegação legal, o tratamento conferido pelo legislador é de caráter geral, sem preocupação com situações específicas, em relação às quais, então, remanesce a pertinência de apontar os atos abrangidos pela delegação e detalhar os demais aspectos inerentes à sua prática pelos servidores, finalidades que podem ser atingidas mediante a edição de atos normativos pelo juiz.

A edição de atos normativos, aqui recomendada, exige que o juiz, (i) a partir da realidade vivenciada na respectiva unidade jurisdicional, (i.a) identifique e catalogue as situações que realmente autorizam e justificam a delegação e (i.b) qualifique os servidores para o desempenho a contento da atividade delegada, e (ii) discipline claramente, quando necessário, os demais aspectos inerentes à prática dos atos delegados.

Particularmente quanto à identificação e catalogação das situações que autorizam e justificam a delegação, é recomendável que os atos normativos disponham de modo exemplificativo, e não exaustivo, em razão das inumeráveis hipóteses que podem ocorrer na realidade. Com isso, confere-se aos servidores alguma dose de discricionariedade no exame de situações não catalogadas e se lhes permite a prática de atos em situações concretas que apresentam semelhanças com aquelas já catalogadas – e, em razão dessa proximidade, possam recomendar tratamento uniforme – e em que o ato a ser praticado é imperativo da boa lógica que decorre da consideração do(s) ato(s) até então já praticado(s).

E, de outro lado, é indispensável a documentação mínima, pelos servidores, da prática dos atos apanhados pela delegação, por meio de certidão ou termo lançado nos autos, cujo

conteúdo registre (i) o ato a ser praticado em razão da delegação – providência que se justifica em virtude de o ato praticado pelo servidor substituir o ato que seria praticado pelo juiz e, nesse contexto, precisar exibir o mesmo conteúdo – e (ii) o fundamento normativo que a autoriza – em homenagem à segurança que deve resultar da prática de atos processuais, em especial aqueles de competência do juízo (entenda-se, do juiz e dos seus auxiliares).

A adoção de cautelas de ordem material, por sua vez, encontra fundamento na possibilidade de alguma adaptação da estrutura das Varas do Trabalho à transferência, aos servidores, de atribuições originariamente afetas ao juiz.

Essa adaptação passa pela qualificação dos servidores, dotando-os de conhecimento suficiente a identificar a ocorrência das situações que autorizam a prática de atos objeto de delegação e a conferir o tratamento processual adequado, segundo as finalidades da delegação. E, quanto aos atos decisórios indelegáveis cujo conteúdo, na prática, é redigido pelos servidores da Secretaria, a qualificação deve incluir prévia e rotineira orientação aos servidores sobre, entre outros aspectos, posicionamentos adotados pelo juiz, formas como o juiz se expressa por escrito – visando à manutenção de um padrão de redação – e, em especial quando consistir em sentença, conclusões sobre elementos fáticos a serem considerados no ato decisório.

Na mesma linha, particularmente quanto a atos cuja prática é objeto de delegação mediante identificação precisa da situação que a precede, os sistemas informatizados de acompanhamento processual podem ser aperfeiçoados de modo a, constatado o registro de ocorrência de atos coincidentes com aqueles que antecedem os atos a serem praticados em razão da delegação, emitirem uma espécie de alerta sobre a possibilidade de prática, pelo mesmo servidor, do ato subsequente, inclusive identificando esse ato subsequente. Assim, por exemplo, efetuado o registro, no sistema de acompanhamento processual, de ocorrência consistente em apresentação, por uma das partes, de cálculo destinado à liquidação da condenação, o sistema sinaliza tratar-se de ato motivador da prática subsequente, pelo servidor – e, pois, sem qualquer participação do juiz –, de ato consistente em abertura de prazo de dez dias, à parte contrária, para manifestação sobre o cálculo.

Por fim, cumpre ao juiz exercer o controle das tarefas executadas pelos servidores em razão da delegação, aspecto melhor examinado linhas adiante. Mas, principalmente quanto aos atos decisórios indelegáveis cujo conteúdo, na prática, é redigido pelos servidores da Secretaria, sobreleva a importância de o juiz promover a efetiva conferência da minuta proposta – e não, ao contrário do que sugerem alguns exemplos extraídos da realidade forense,

simplesmente firmá-la, sem maiores cuidados na avaliação do seu conteúdo.