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1.2 O Regime de Metas de Inflação: objetivos, características e operacionalização

1.2.3 Operacionalidade do Regime de Metas

Um elemento central na operacionalidade do RMI diz respeito ao papel das expectativas inflacionárias do público. Observa-se que tanto em Svensson (2010, p. 2), quanto em Mishkin (2011, p. 6), o regime de metas assume que as expectativas de inflação são um dos principais canais de transmissão da política monetária, cabendo ao policymaker a gestão de expectativas inflacionárias. Isto porque as expectativas de inflação afetam as decisões de preços e salários e, conseqüentemente, a inflação. Dessa forma, a condição fundamental para estabilização da inflação corrente pelo BC diz respeito a sua capacidade de ancorar as expectativas do setor privado em linha com a meta de inflação. Neste sentido, a capacidade do BC manter as expectativas ancoradas revela o grau de credibilidade da política monetária. (SVENSSON, 2010, p. 3).

Por outro lado, é importante observar que Svensson (1997) afirma que o conceito inflation forecast targeting, ao invés de inflation targeting, define melhor o regime de metas. Conforme o autor esclarece em outro trabalho, como há defasagem entre a implantação da política monetária e seus efeitos sobre a economia, a política monetária é mais efetiva se guiada por previsões (SVENSSON, 2010, p. 2). Assim, as ações da Autoridade Monetária devem antecipar qualquer possível ameaça ao cumprimento da meta, sendo executada, portanto, em num cenário prospectivo. Dessa forma, a política monetária procura atingir a inflação corrente antes que aquela ameaça inicial ao cumprimento da meta faça efeito.

Svensson (1996, p. 1) afirma que outra justificativa para o regime ser inflation forecast targeting se refere ao fato de que a previsão da inflação apresenta correlação com a meta de inflação além de ser uma variável mais facilmente controlável pelo BC do que a inflação corrente. Segundo Bernanke et al (1999, p. 32), os policymaker utilizam toda informação relevante capaz de prever o comportamento futuro da inflação tal como modelos estruturais, análise de indicadores antecedentes e pesquisa de expectativas junto ao público. Então, a previsão da inflação é a meta intermediária que orienta as decisões do BC em relação à execução da política monetária.

Sendo assim, o RMI é um processo em dois estágios: no primeiro, o BC prevê a inflação e a compara com a meta. E no segundo, caso haja divergência entre a previsão e a meta de inflação, o BC toma as decisões de política monetária com

alteração na taxa de juros para trazer a inflação para trajetória de metas. Neste sentido, o regime de metas possibilita um feedback com uma ótica forward-looking (GREEN, 1996).

Em termos operacionais, segundo o Bank for International Settlements (BIS) (2008a, p. 3), a implantação da política monetária consiste em três elementos centrais: 1) política de sinalização; 2) utilização dos instrumentos; 3) monitoramento dos objetivos operacionais. Inicialmente o BC sinaliza as intenções da política monetária por meio do anúncio de uma meta para a taxa de juros de curtíssimo prazo (overnight), denominada taxa de juros básica. Entretanto, para garantir que a taxa de juros efetiva permaneça alinhada com a meta, o BC gerencia a liquidez diária do mercado de reservas bancárias no open market. Dessa forma, o open market se refere às operações de compra e venda de títulos públicos com o mercado bancário com o objetivo de contrair ou expandir a liquidez. Portanto, a administração de liquidez do mercado de reservas bancárias, obtida por meio das operações de mercado aberto, é a forma pela qual a Autoridade Monetária mantém a taxa de juros de mercado próxima à meta.

No RMI, em especial, a execução da política monetária privilegia a calibragem da taxa de juros tendo como referência uma função de reação à lá Taylor11.

rt = (1-α)[r* + Et (πt+1) + Ygt-1+ (πt-1– π*)] + α rt-1 + s3 (1) Onde: rt é a taxa de juros de juros de curto prazo anunciada pelo BC; r* é a taxa de juros real de equilíbrio; Et (πt+1) é a expectativa para inflação do período seguinte; Ygt-1 é o hiato do produto medido como o desvio do produto efetivo em relação ao potencial; rt-1 é a taxa de juros do período anterior; α é um parâmetro maior que zero (ARESTIS; SAWYER, 2002, p. 3-4). Pela função de reação, é possível observar que o BC altera a taxa de juros quando a expectativa de inflação muda, o produto efetivo se distancia do potencial e a inflação do período anterior difere da meta estipulada. Dessa

11 A função de reação do BC recebe o nome do economista John Taylor, pois o autor em trabalho de

1993 encontrou uma correspondência entre a taxa de juros adotada pelo Federal Reserve Bank (Fed) e aquela descrita pela seguinte função: r = p + 0,5y + 0,5 (p-2) + 2. Dessa forma, o autor sugeriu que o Fed utilizava uma regra na definição da taxa de juros. (TAYLOR, 1993, p. 202-203).

forma, pode-se observar que as variáveis da função de reação no RMI são alimentadas pelo menos por outras duas equações:

Ygt = a0 + a1 Ygt-1 + a2 Et (Ygt+1) – a3 [rt – Et (πt+1)] + s1 (2) πt = b1Ygt + b2πt-1 + b3Et (πt+1) + s2 (3)

A equação (2) é uma tradicional curva de demanda IS com a incorporação de elementos de otimização temporal. A curva de demanda indica que o hiato do produto depende da sua defasagem, da sua expectativa para o próximo período e da taxa de juros real. A equação (3) é uma curva de Phillips com elementos forward-looking e backward-looking que relaciona a taxa de inflação com sua defasagem, com o hiato do produto e com a expectativa para a inflação futura. Assim, a transmissão da política monetária ocorre da seguinte forma: o BC define a taxa de juros nominal (rt). Para uma dada taxa de inflação, o juro nominal altera a taxa de juros real, que por sua vez, influencia o hiato do produto (Ygt+1) na curva IS. Por fim, o hiato do produto atinge o objetivo da política que é alterar a taxa de inflação (πt+2), conforme indica a curva de Phillips.

Neste sentido, de acordo com a literatura que justifica a adoção do RMI, o BC deve ajustar a taxa de juros para seu nível neutro. Segundo Blinder (1999, p. 54), a taxa de juros neutra é aquela que iguala o produto efetivo ao produto potencial, isto é, a taxa de juros para a qual o hiato do produto é zero (Yg = 0). Assim, se a taxa de juros corrente for menor (maior) que a taxa neutra, a inflação aumenta (diminui). Para o autor, a política monetária neutra (taxa de juros neutra) é coerente com uma inflação estabilizada no médio prazo.

Sendo assim, a calibragem da taxa de juros pela Autoridade Monetária tem a intenção de influenciar as expectativas de inflação, a demanda agregada e, no limite, a taxa de inflação. Ocorre que a taxa de curto prazo tem pouco efeito sobre a demanda agregada. Então, segundo Freedman e Otker-Robe (2010, p. 8), as ações do BC devem ter a capacidade de influenciar as taxas de maturidades maiores as quais alimentam a demanda agregada. Isto é, ao manipular as taxas de curto prazo, alteraria, por arbitragem, as taxas de maturidades maiores ao longo da curva de rendimento. É

importante observar que a função de reação no RMI não é uma regra estrita que o policymaker deve seguir, antes, é um guia, que junto com outras informações, servirão de base para a tomada de decisão do BC. Conforme Svensson (1999, p. 616) afirma, na prática os BCs utilizam mais informações no processo de tomada de decisão.

Portanto, a taxa de juros de curto prazo, determinada no mercado de reservas bancárias por meio da administração diária de liquidez, é o principal instrumento do RMI. Para o único objetivo da política monetária no regime de metas (estabilidade de preços), o BC calibra a taxa de juros quando as expectativas de inflação se alteram ou quando a demanda agregada se expende a uma taxa diferente daquela que o BC previa. Assim, as ações do BC no que se refere a alterações na taxa de juros são tomadas preventivamente quando há algum risco ao cumprimento da meta no horizonte da política.