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Organização cognitiva: o sujeito epistêmico

3.2 O CENÁRIO DA EPISTEMOLOGIA GENÉTICA

3.2.2 Organização cognitiva: o sujeito epistêmico

O assimilar e o acomodar são as portas para que haja o desenvolvimento do sujeito. Segundo Piaget (1973), não há aprendizagem sem o desequilíbrio, ou seja, sem que a certeza ou o conhecimento do sujeito seja questionado ou perturbado. Somente dessa forma ocorre a busca por novas reequilibrações. Esse ciclo dialético de desequilíbrio e equilibrações progressivas é indispensável ao desenvolvimento.

Isso se manifesta quando novos elementos provocam o desequilíbrio e fazem o sujeito buscar novas direções, o qual, por sua vez, faz com que o que for assimilado seja diferente do anterior, gerando, assim, equilibrações majorantes, onde o novo equilíbrio é superior ao anterior. Sendo assim, a inteligência desenvolve-se em razão de uma tendência interna de melhorar permanentemente as condições de equilíbrio, por meio de constantes trocas com o meio. É uma forma de se organizar, organizando o mundo.

Para Piaget (1976), o desequilíbrio é importante, pois se tudo está em equilíbrio, o sujeito não ativa seus sistemas e não faz novas implicações significantes. Por isso, o equilíbrio cognitivo difere de um equilíbrio mecânico (que se conserva sem modificação). O autor o considera como dinâmico por estar em constante troca com o meio, porém preserva o sistema de significação.

Disso decorre o valor da interação – são as trocas com o meio que desencadeiam a assimilação, sendo essa a incorporação de uma realidade externa, por meio de uma interpretação que o sujeito faz, atribuindo um ou mais significados. A assimilação não é uma simples absorção das experiências sensoriais, mas é um fenômeno interpretativo, em que ocorre a incorporação de dados aos esquemas já existentes.

O sujeito não fica preso ao objeto, ao contrário, é ativo e seletivo na assimilação, porque, ao interagir com objetos e situações novas, generaliza suas condutas, e, a partir de esquemas já adquiridos, começa um processo exploratório da sua atividade cognitiva, possibilitando um caminho de novas descobertas encontradas no seu percurso.

Entretanto, para avançar nesse caminho de descobertas e de um novo saber, é preciso que ocorra um movimento de acomodação, que se manifesta enquanto o sujeito procura entender o objeto de conhecimento. Como esse objeto impõe resistência, não é possível compreendê-lo apenas com as hipóteses e os conhecimentos prévios que o sujeito já tem.

Assim, para que o sujeito compreenda essa informação, é necessário que mude a forma de entender o objeto, para depois assimilá-lo. Nisso se constitui a acomodação, que propicia a modificação dos esquemas para poder assimilar a nova situação e se manifesta por uma pressão do real junto aos esquemas, nos quais o sujeito incorpora o mundo externo à sua rede de significação.

Nesse processo de construção de estruturas mentais, é necessário um equilíbrio entre a acomodação e a assimilação. Esse equilíbrio se manifesta pela adaptação. Piaget (1987) explica que isso ocorre porque o caráter dela é ativo e existe, então, uma relação entre a função que permite a troca do sujeito com o meio (adaptação) e garante uma coesão interna do sujeito (organização).

Essa relação desencadeada pelo meio é que faz com que a adaptação também seja indissociável da organização, isso porque “é adaptando-se as coisas que o pensamento se organiza e é organizando-se que estrutura as coisas.” (PIAGET, 1976, p. 19).

Desde o começo da vida do sujeito, sua atividade cognitiva é uma constante tentativa de compreender o mundo, passar da totalidade indiferenciada para a diferenciação específica (VALENTINI, 2005). No caminho, o sujeito tem o seu sistema de significação como o ponto inicial e referência para as novas adaptações. Caso esteja em situação de equilíbrio, o sujeito não necessita fazer acomodações. Entretanto, se surge ao sujeito algo novo, que exija uma adaptação, e essa, por sua vez, perturbe seu equilíbrio, ele se vê obrigado a ativar outros sistemas de significação.

Para Piaget (1976), os sistemas de significação são constituídos pela atividade humana e pela sua capacidade de inferir. Essa capacidade constitui os significados dos esquemas, isto é, um sistema é formado pelas implicações das significações. O sistema de significação é o assimilável que se manifesta por meio da atividade de um esquema, ou seja, a leitura do significado da ação. Exemplificando, o que pode ser visto é algo visível. Por conseguinte, a aquisição do conhecimento é um processo de organização dos sistemas de significações, processados por meio da assimilação e acomodação.

Considerando o entendimento de Piaget de que a construção de novos conhecimentos é propiciada pelos desequilíbrios, que ativam os processos de imaginação e criação, é importante que os educadores propiciem situações de ensino que possam desequilibrar ou colocar em xeque as certezas provisórias dos alunos e dos grupos, provocando modificações internas dos mecanismos cognitivos, com vistas ao progresso da inteligência.

Com base nessa constatação, a fim de que ocorram ações de cooperação entre os sujeitos, é fundamental que o educador promova situações desafiantes às suas estruturas, para que possam desencadear desequilíbrios e momentos de troca entre os alunos. A cooperação, nessa teoria, diferencia-se da ajuda, pois o ajudar significa fazer pelo outro, promovendo no outro uma dependência, em razão da qual ele fica a esperar que outrem solucione por ele os problemas (RANGEL, 1992).

Já a cooperação implica enfrentar solidariamente os problemas, ou seja, trocar e construir soluções e novos saberes junto aos outros, em que nenhum dos sujeitos sabe, a priori, a resposta. Dessa forma, torna-se fundamental a interação social, a troca com o outro. Nesse processo de trocas cooperativas, emerge a solidariedade, que é própria do conhecimento autônomo. Os mecanismos que compõem a cooperação serão aprofundados a seguir.

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