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A ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO E OS INSTRUMENTOS DE PROTEÇÃO AO OBREIRO DIANTE DA ATUAÇÃO DAS EMPRESAS

4 A PERSPECTIVA DOS DIREITOS HUMANOS SOB O ENFOQUE DA EXECUÇÃO DA ATIVIDADE EMPRESARIAL TÊXTIL

4.2 A ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO E OS INSTRUMENTOS DE PROTEÇÃO AO OBREIRO DIANTE DA ATUAÇÃO DAS EMPRESAS

TRANSNACIONAIS

Assim como a Declaração Universal dos Direitos Humanos representou grande papel na história desses direitos, a Organização Internacional do Trabalho, ao longo de sua criação, desempenhou significativo avanço quanto ao debate dos direitos humanos inseridos na esfera trabalhista. Desde 1919, ano de sua criação, a Organização já emitiu 188 convenções e 200 recomendações dispondo a respeito da proteção do obreiro em seu ambiente de trabalho90, inclusive, tratando especificamente da postura laborativa destes perante as empresas transnacionais, sendo essas últimas o objeto dessa seção.

A despeito da existência de importantes instrumentos anteriores, é devido a percepção do potencial lesivo das empresas transnacionais no âmbito das relações trabalhistas que ocorreu a edição da Declaração Tripartite de Princípios sobre as Empresas Multinacionais e a Política Social da OIT, adotada em 1977. Tal declaração refletiu a intenção de estimular as contribuições positivas ao progresso político e econômico dos países anfitriões em contraposição aos impactos negativos decorrentes da atuação corporativa, nesse sentido, ela se dirige “aos governos, às organizações de empregados e empregadores de países anfitriões e de origem das

89 WEISSBRODT, David. Business and Human Rights. In: University of Cincinnati Law Review. Vol. 74. 2005, p. 59-60.

90 ONU, Organização Das Nações Unidas. Organização Internacional do Trabalho. Disponível em: <https://nacoesunidas.org/agencia/oit/>. Acesso em: 25 jun. 2019

empresas, e às empresas multinacionais”91, de forma que estes “devem respeitar os direitos

soberanos dos Estados, obedecer às leis e regulamentos nacionais, dar a devida consideração às práticas locais e respeitar os padrões internacionais relevantes”92.

Quanto aos princípios presentes na Declaração, destaca-se o ponto 20, que assegura que os contratos entre empresas multinacionais e nacionais – para a fabricação de peças e equipamentos ou para uso de matérias-primas locais – não devem ser empreendidos como meio de multinacionais se esquivarem das responsabilidades incorporadas nos princípios do referido instrumento93. Essa disposição representa os esforços envidados pela OIT, que desde 1977, orienta que as empresas não se esquivem de suas responsabilidades através da adoção de contratos civis, costumeiramente utilizados por marcas do fast fashion mediante o emprego dos já mencionados contratos de facção.

Além disso, sobre a remuneração dos obreiros, a Declaração estipula que os salários, benefícios e condições de trabalho oferecidos por empresas multinacionais não devem ser menos favoráveis em relação a outros trabalhadores em posto de emprego similar, e todas as condições devem ser “adequadas para satisfazer as necessidades básicas dos trabalhadores e suas famílias”. Os governos, em seus papéis, especialmente em países em desenvolvimento, devem se esforçar para adotar medidas para assegurar que grupos vulneráveis também se beneficiem das atividades de empresas multinacionais94.

Outro importante avanço da OIT quanto à proteção dos trabalhadores da indústria da moda pode ser sinalizado com a aprovação, em 1998, da Declaração dos Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho. Verificada a necessidade de “reafirmar a permanência dos princípios e direitos substanciais inscritos na Constituição da Organização, assim como promover sua aplicação universal”95, a Declaração adotou o conceito de Trabalho Decente como eixo central dos quatro objetivos estratégicos sintetizados em seu teor, a saber: “liberdade sindical e reconhecimento efetivo do direito de negociação coletiva; eliminação de todas as formas de trabalho forçado; abolição efetiva do trabalho infantil; eliminação de todas as formas

91 Trecho original: “since the mid-1960s have requested appropriate action by the Governing Body in the field of multinational enterprises and social policy”. UNIVERSITY OF MINNESOTA, Human Rights Library.

Tripartite Declaration of Principles concerning Multinational Enterprises and Social Policy (1977).

Disponível em: <http://hrlibrary.umn.edu/links/tripartite.html>. Acesso em: 24 jun. 2019. 92 Ibid.

93 UNIVERSITY OF MINNESOTA, op. cit. Trecho original: “Such arrangements should not be used by multinational enterprises to avoid the responsibilities embodied in the principles of this Declaration”. 94 Ibid.

95 OIT, Organização Internacional Do Trabalho. Declaração da OIT sobre Princípios e Direitos

Fundamentais no Trabalho. Disponível em:

<http://www.ilo.org/public/english/standards/declaration/declaration_portuguese.pdf>. Acesso em: 25 jun. 2019.

de discriminação no emprego ou na ocupação”96. Outro importante destaque da Declaração corresponde ao fato de que esta passou a prever a necessidade de realização de relatórios globais, em que, a cada ano, uma das quatro categorias de princípios e direitos fundamentais seja abordada.

Por fim, enfatiza-se a adoção da Declaração sobre Justiça Social para uma Globalização Justa no ano de 2008. Em seu preâmbulo, o documento certifica que se trata da terceira declaração mais importante – desde a Constituição da OIT em 1919 – adotada pela Conferência Internacional do Trabalho. Tal instrumento, elaborado em um contexto de atenção às alterações promovidas pela globalização, colaciona fundamentos da Declaração de Filadélfia de 1944 e da Declaração sobre os Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho de 1998. O documento reforça a ideia de promoção de um desenvolvimento sustentável, segundo os objetivos social, econômico e ambiental.

Ademais, imprescindível consignar que um dos trechos mais relevantes desse instrumento tem por base a orientação de que “a violação dos princípios e direitos fundamentais no trabalho não poderá ser invocada ou utilizada como vantagem comparativa legítima”. Destarte, essa determinação vai de encontra às estratégias empresariais do fast fashion, visto que as grandes marcas do setor se utilizam da captação de mão de obra proveniente de países em desenvolvimento, que por violarem direitos básicos trabalhistas, conseguem produzir a baixo custo.

Em 2017 a Declaração sofre pequenas modificações, entre as quais se aponta a introdução do conceito de due dilligence, isto é, a necessidade de que as empresas promovam auditorias internas em suas estruturas, a fim de “identificar, prevenir, mitigar e explicar como eles lidam com seus impactos adversos reais e potenciais”97. Em outro trecho, a Declaração acrescenta a todos os Membros, ainda que não tenham ratificado as convenções fundamentais, a obrigação expressa de eliminar todas as formas de trabalho forçado ou compulsório e a abolição efetiva do trabalho infantil.

96 Ibid.

97 OIT, Organização Internacional Do Trabalho. Declaração da OIT Sobre Justiça Social para uma

Globalização Justa. Genebra, 10 jun. 2008. Disponível em:

<http://www.ilo.org/public/portugue/region/eurpro/lisbon/pdf/resolucao_justicasocial.pdf>. Acesso em: 25 jun. 2019.