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ORIGEM DA CÉLULA EUCARIONTE

No documento DIVERSIDADE DOS SERES VIVOS (páginas 115-120)

As células procariontes de bactérias e de arqueas não possuem nú-cleo definido. Nelas, o material genético fica no citoplasma, ao contrário das células eucariontes, nas quais o núcleo abriga os cromossomos. En-tretanto, muitas outras diferenças separam os dois tipos de células. Por exemplo, a célula procarionte é geralmente menor que a eucarionte, seu genoma está arranjado em um único cromossomo circular solto no cito-plasma, e ela não possui organelas nem membranas complexas. A Figura 1 ilustra as principais diferenças entre essas células.

Figura 1: A célula eucarionte e a célula procarionte.

Vários passos evolutivos separam esses dois tipos de células. Nesta aula iremos discorrer sobre a evolução das estruturas que diferenciam a célula procarionte da eucarionte.

Os primeiros fósseis de eucariontes datam de 1,8 bilhão de anos, en-quanto os primeiros procariontes são muitos mais antigos, como a ciano-bactéria de 3,5 bilhões de anos.

Portanto, obviamente, o sentido da evolução ocorreu de procariontes para eucariontes (Figura 2). Mas como isso aconteceu?

Figura 2: Evolução de procariontes para eucariontes.

A maior parte dos pesquisadores da área acredita que a origem da célula eucarionte se deu através de uma seqüência de eventos de endos-simbiose. Nesse caso, simbiose pode ser definida como uma associação física de longa duração entre organismos de diferentes espécies. A prin-cipal teoria de origem da célula eucarionte é conhecida como endossim-biôntica serial (ou SET, derivada do inglês serial endosymbiosis theory). De acordo com essa teoria, as células nucleadas ou eucariontes são derivadas de comunidades de bactérias integradas.

A teoria endossimbiôntica serial diz que três classes de organelas das células eucariontes – cílios e flagelos, mitocôndrias e cloroplastos – ori-ginaram de bactérias simbiontes. As células eucariontes teriam evoluído por um processo denominado endossimbiose serial, termo que se refere à aquisição e à integração de bactérias numa seqüência determinada.

Quando essa associação se torna permanente e obrigatória chama-mos de simbiogênese, e os organischama-mos originais se unem para formar um novo organismo.

A célula eucarionte é formada por DNA nuclear envolto em uma membrana e pelo citoplasma, externo ao núcleo e rico em ribossomos. A seqüência de nucleotídeos do DNA serve de molde para a fabricação do RNA-mensageiro. As “mensagens” são lidas nos ribossomos do cito-plasma de forma que a seqüência da proteína é determinada. O núcleo tem um papel fundamental neste cenário. Sua origem é, portanto, o pas-so mais importante para a compreensão da origem dos eucariontes.

Figura 3: Fusão de uma arquea Thermoplasma e uma bactéria espiroqueta for-mando uma célula flagelada. O núcleo apareceu como?

LYNN MARGULIS é uma das principais pesquisadoras na área e ela acredita que a célula eucarionte se originou da fusão de uma arquea (Thermoplasma) e de uma bactéria (espiroqueta), formando uma célula flagelada, como mostra a Figura 3. A própria membrana nuclear pode ter sido conseqüência também dessa fusão. Na realidade, uma célula eu-carionte possui várias membranas, tais como a nuclear, a plasmática, a do retículo endoplasmático etc. Todas elas são contínuas, fluidas e dinâ-micas. A autora justifica sua afirmativa dizendo que, na maior parte dos organismos, as membranas tendem a crescer vigorosamente quando a célula sofre uma invasão microbiana. Assim, as membranas intracelu-lares, incluindo a nuclear, podem ter sido conseqüência direta da fusão (ou invasão) da bactéria espiroqueta com Thermoplasma.

Uma outra teoria para explicar o aparecimento do núcleo é a da ci-tose. A citose é um processo celular no qual a membrana celular se do-bra internamente formando um vacúolo, como mostra a Figura 4. Por exemplo, na fagocitose, a célula absorve uma partícula sólida e forma um vacúolo com essa partícula em seu interior. O vacúolo formado se

LYNN MARGULIS É uma das princi-pais defensoras da SET. Essa autora discorda da visão de Carl Woese, sobre os três

domí-nios. Para ela, ape-nas dois grandes grupos existem: os procariontes (sem origem simbiônti-ca) e os eucarion-tes (com origem

funde com o LISOSSOMA. É possível que o núcleo celular tenha se originado de um desses vacúolos.

Figura 4: Fagocitose.

Se esse processo simples de fagocitose é o responsável pelo apa-recimento do núcleo, por que o mesmo processo não se deu com as bactérias atuais? Na realidade, as bactérias atuais não fazem fagocitose, porque a membrana que envolve as células de bactérias é muito rígida e não consegue se dobrar para formar um vacúolo. Essa membrana é chamada de parede celular. Como elas não conseguem dobrar a pare-de celular rígida, para absorver nutrientes, as bactérias pare-devem absorver molécula por molécula pela parede celular. Para se alimentar de objetos sólidos, elas devem secretar enzimas digestivas no meio externo e ab-sorver molécula por molécula do objeto, num processo extremamente dispendioso energeticamente. O outro grande grupo dos procariontes, as arqueas, também possui uma membrana semi-rígida que envolve cada indivíduo. Essa membrana, porém, não é considerada uma parede celular, porque não chega a ser tão rígida como a de bactérias.

Hoje sabemos que as arqueas e os eucariontes possuem um ancestral comum que não é compartilhado pelas bactérias. Em tal contexto, po-deríamos imaginar um cenário mais detalhado do que aquele apresen-tado na Figura 2. Neste novo cenário, os primeiros organismos

possuí-LISOSSOMA É uma organela celular, caracteriza-da por um vacúolo com enzimas digestivas em seu interior

am uma parede celular que além de proteger o interior do organismo, dá sustentação à célula. Depois, essa parede foi perdida nas linhagens que deram origem aos eucariontes e às arqueas (Figura 5).

Figura 5: Filogenia de arqueas, bactérias e eucariontes mostrando a perda da parede celular e o ganho do núcleo.

Assim, como um passo aparentemente tão desvantajoso (i.e., perda da parede selular) ao organismo portador poderia ter sido selecionado e mantido na população original? Naturalmente, não podemos pensar no desaparecimento da parede para que a bactéria pudesse ser capaz de fa-zer fagocitose, porque isso implicaria a previsibilidade da evolução pela seleção natural, o que não acontece. A seleção natural atua no presente do organismo e não no futuro. Ou seja, a reprodução diferencial age sobre o que o organismo é e não sobre o que ele pode ser.

Então, uma possível explicação do desaparecimento da parede celu-lar, sem recorrer à previsibilidade da evolução, seria a seguinte: algumas bactérias antigas adquiriram capacidade antibiótica de bloqueio da sín-tese da parede celular em outras bactérias.

Bactérias sem parede celular são extremamente frágeis e, portanto, a maior parte delas (sem parede) deve ter sido extinta quase que imedia-tamente, aumentando a disponibilidade de nutrientes para as secretoras de antibióticos.

Dentre todas as linhagens que perderam a parede, duas delas – ou uma delas, já que as duas são relacionadas – , descobriram uma saída para essa fragilidade. A primeira, a linhagem das arqueas, desenvolveu uma membrana celular rígida inteiramente nova a partir de pseudo-mureína, e não de peptidoglicanos. A segunda, a linhagem dos euca-riontes, desenvolveu um esqueleto molecular interno — o citoesqueleto

— , dando sustentação à célula. Um dos pesquisadores mais respeitados nessa área de evolução da vida e da origem da célula eucarionte é JOHN MAYNARD SMITH.

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