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Origem e Motivação do Comportamento Infrator

No documento alinepereiradeavellar (páginas 67-70)

As entrevistadas apresentaram diferentes percepções acerca da origem e da motivação do comportamento delituoso (considerado pelo Sistema de Justiça como tal) dos filhos. A justificativa mais freqüente, no entanto, apontada por cinco das nove mães, foi a “influência de amigos”. Em resumo, para cinco das nove entrevistadas, os seus filhos teriam sido conduzidos a determinadas ações por ascendência de outros, não por desejo próprio, ou seja, em certo sentido, seriam vítimas de terceiros.

caso de estupro. Segundo a técnica em enfermagem, o filho envolveu-se com “más companhias” por ser pouco supervisionado, no período em que freqüentava a casa da avó paterna, localizada num bairro vizinho ao seu.

“Lá no meu bairro, as amizades dele são poucas, entendeu? Os meninos são mais caseiros, mas lá onde aconteceu tava demais da conta! O Abelardo tinha uma liberdade fora do normal! Um dia eu fui lá ver o que o Abelardo estava arrumando. Eu fui prá casa da vó dele e fiquei esperando ele chegar. Ele chegou quase à meia-noite. No meu bairro, isso nunca aconteceu. Quer dizer, alguma coisa tinha que dar lá mesmo! Lá eles ficam mesmo brincando muito na rua” (ANA, 32 anos, mãe de Abelardo, 15 anos).

Já na percepção da dona-de-casa Renata, 37 anos, mãe de Ramiro, 13 anos, envolvido no mesmo caso de violência sexual, foi a aproximação de Abelardo, sobrinho de seu marido, que alterou os hábitos e condutas dos demais adolescentes.

“O mais prá frente deles (dos cinco jovens envolvidos no caso de estupro) é o Abelardo. Os quatro juntos nunca deram trabalho prá gente! Iam prá capoeira, prás atividades do colégio e depois prá dentro de casa. Sempre foi deles, dos quatro. Mas o Abelardo passou a ir prá lá no final de semana e não dava sossego para os outros. Não sei se foi ele que levou eles, mas (...) depois que o Abelardo chegou, começou. Foi no dia do treino de futebol que aconteceu esse negócio (estupro). Na minha opinião, os quatro não faria isso. Não sai da minha cabeça, a frieza do Abelardo no dia. (...) Essa história me marcou muito, a frieza do Abelardo” (RENATA, 37 anos, mãe de Ramiro, 13 anos).

As mães dos outros dois jovens entrevistados implicados no mesmo caso de estupro apresentaram respostas distintas das demais, quando indagadas sobre a origem e a motivação do comportamento delituoso dos filhos. Para a dona-de-casa Marialda, 31 anos, mãe de Mathias, 13 anos, foi o próprio temperamento do adolescente que o conduziu ao ato infracional.

"Não sei (silêncio). No começo, eu falei onde foi que eu errei. No momento, tem uma menina atazanando o Mathias. Eu fui na porta da casa da mãe dela, e falei: não quero a sua filha como nora! O Mathias é um menino bom, mas muito ciumento!" (MARIALDA, 31 anos, mãe de Mathias, 13 anos).

Já a empregada doméstica Raquel, 38 anos, mãe de Ramon, 13 anos, evidenciou a negação ao ato infracional.

“Eu não posso afirmar para você uma coisa concreta (origem ou motivação do comportamento delituoso), porque eles já estavam acostumados a brincar naquele lugar. Você acha que o que vocês fizeram foi certo?, eu perguntei prá ele (Ramon). E ele (Ramon) me disse: eu sei que ela (vítima) sempre vai lembrar disso, mas eu tenho certeza que ela não vai lembrar de uma coisa ruim, porque a gente não fizemo nada do que ela não queria” (RAQUEL, 38 anos, mãe de Ramon, 13 anos).

Graça, 52 anos, mãe de Gaspar, 15 anos, acusado de abuso sexual, e Paula, 38 anos, mãe de Patrício, 16 anos, acusado de porte de arma, responsabilizaram as “más companhias” pelo envolvimento dos filhos em atos infracionais.

"Ah...(pausa) Acho que foi companhia. Piorou mais, quando ele foi estudar a noite na Escola Normal. Ele tinha, acho, treze anos. Aí que piorou mesmo. Ele começou a chegar tarde em casa, meia-noite, meia-noite e meia, não dormia em casa” (GRAÇA, 52 anos, mãe de Gaspar, 15 anos).

"Ah...Eu acho assim o Patrício tava andando com uns menino da mesma idade dele que aprontava no colégio, vivia tendo reclamação...Eu nunca tive do Patrício, mas eu ficava com medo do Patrício fazer as mesmas coisas...(...)” (PAULA, 38 anos, mãe de Patrício, 16 anos).

Ainda segundo Paula, o envolvimento freqüente de adolescentes em ações desviantes é devido à aplicação, pelo Sistema de Justiça, de punições brandas: “(...) os menores hoje acho que eles teria de ter um corretivo mais drástico em qualquer situação” (PAULA, 38 anos, mãe de Patrício, 16 anos).

Já a manicure Bianca, 37 anos, mãe de Baltazar, 18 anos, que cumpria medida socioeducativa por furto, avaliou o comportamento do filho como resultante de uma enfermidade: a dependência química.

"Olha, em primeiro lugar que, assim, que o que aconteceu (ato infracional/ furto) não foi vício de roubar, entendeu? Isso não! Graças a Deus, dentro de casa tem muita coisa de valor que nunca sumiu, entendeu? Foi uma loucura, sei lá, na hora de ter usado a cola!" ( BIANCA, 37 anos, mãe de Baltazar, 18 anos).

Elis, 42 anos, por sua vez, demonstrou sentimento de culpa e frustração pelo fato de o filho Elias, 17 anos, ter sido acusado de tráfico de drogas. Segundo a empregada doméstica, o comportamento desviante do filho é resultante da convivência do jovem com o pai, que nunca teria sido um “bom exemplo”. Na infância, Elias teria visto o pai, embriagado, agredir a mãe inúmeras vezes.

“Você acha que a gente morando num lugar onde as pessoas tratam a gente como se fosse qualquer coisa isso revolta a criança ou é a convivência? Morando com o pai dele, igual, eu separei, como ele tratava meus filhos. Será que é que eu não soube educar ou é o gênio do pai deles? Acho que é os dois, né? Eu sempre dou conselho para ele: não fica naquela esquina, é perigosa. Fica mais prá cá que dá prá gente ver. Estuda Eduardo (filho caçula), porque o Elias é inteligente, ele vivia estudando, depois ele deixou, mudou e aí eu achava que por causa da vizinha achar que ele está assim que a culpa é minha. Ele via o pai me bater. Isto é ruim para a criança, não é? Eu falei que a culpa não é minha, é a convivência. Porque, igual eu, eu achava que eu podia ser, desculpa da palavra, uma pinguça, uma pessoa que bebesse, vivesse em farra, na bagunça. Mas não! Eu fui bem criada!” (ELIS, 42 anos, mãe de Elias, 17 anos).

No documento alinepereiradeavellar (páginas 67-70)