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4. Livro de Artista

4.2 Origem histórica

Quando se analisa o enquadramento histórico desta temática existem uma série de incongruências. Vários são os académicos que se dedicam ao estudo das origens e ao consequente percurso histórico do Livro de Artista. Verificamos que há distintas abordagens acerca do momento do aparecimento das primeiras manifestações que cada um considera como sendo “o primeiro Livro de Artista”, variando sobretudo pelas características que cada investigador coloca na respetiva definição deste conceito.

De acordo com Sara Bodman (2005) o formato Livro de Artista provém de muitos momentos históricos e tradicionais da confeção de livros. Na delimitação memorável deste conceito está presente o gosto pelo livro como forma de arte, que remonta aos primeiros manuscritos iluminados, conhecidos também como iluminuras, aos livros iniciais do Islão, aos pergaminhos japoneses e chineses e aos hieróglifos egípcios em papiro. De modo a enfatizar o conteúdo da mensagem, os formatos mencionados usavam elementos decorativos na ornamentação do texto. A emergência da sua condição de artesão, daquele que conhecemos hoje como artista, dá-se no Renascimento, e é justamente com este novo estatuto que o seu trabalho ganha uma crescente autonomia, o que por sua vez, proporciona uma independência no campo artístico. Assim, cabe à arte do livro servir o pensamento plástico do artista e autor, distanciando-se das características externas tais como: a decoração, a ilustração e a documentação. Conforme outros trabalhos artísticos, tais como uma pintura ou uma escultura, a criação de um Livro de Artista torna-se numa prática autónoma. (Jameson, 2009) É devido, no entanto, ao facto destes livros fornecerem a exploração de qualidades tácteis e sensoriais que não permite que esta tipologia se enquadre em nenhuma forma artística especifica.

Conforme Drucker (2004) existem várias obras, importantes, na tónica da experimentação artística e técnica, que impulsionaram o aparecimento dos Livro de Artista. O moderno gosto pelo livro e pela criação artística do mesmo deve o seu lugar ao emblemático William Blake (1757-1829). Devido essencialmente à sua intensa atividade de interação entre a literatura e a arte, Galciani Neves (2009)

considera Blake um precursor dos Livro de Artista. Com a obra “Songs of Innocence” datada de 1789, o artista dispõe estrategicamente as imagens num campo poético de texto onde ambos os elementos coabitam no mesmo espaço, compilando uma obra única. Neste trabalho a imagem e o texto não se subordinam, mas interagem na totalidade, vivendo de mãos dadas, compondo assim um espaço exclusivo de fruição, no qual nenhum é passível de ser experienciado isoladamente. O artista utiliza várias técnicas artísticas que exploram o potencial do livro em si, criando de forma independente todo o processo de produção, desde o texto, à gravura, à ilustração, à tipografia, às impressões e terminando na encadernação.

Volvido um século, mas ainda no Reino Unido, William Morris estreia a sua famosa editora The Kelmscott em 1891, produzindo para cima de cinquenta livros num curto espaço de tempo. Tanto nos pormenores, como nos encaixes e ornamentos dos volumes e das capas em si, o propósito desta personalidade ímpar era de demonstrar um perfeccionismo extremo, tanto a nível técnico como artístico. Os livros de Morris (1891) são objetos de design que primam tanto pela beleza como pela funcionalidade tal como afirma Neves (2009). Até ao período do pós Segunda Guerra Mundial continuam a produzir-se livros com os mesmos princípios de qualidade, particularmente no que diz respeito à encadernação e aos acabamentos finais, de acordo com Bodman, (2005).

Avançando para o início do século XX, o mercado europeu de arte de então é dominado pelo francês Ambroise Vollard, um dos mais importantes negociantes de arte e galeristas do seu tempo. Através da sua cuidada seleção de artistas e escritores o trabalho do artista plástico, pela primeira vez, equiparar-se-á ao trabalho do escritor. O também editor parisiense reúne muitos artistas e escritores durante a sua notável carreira que se estende de 1895 até à sua morte em 1939. Vollard patrocina e publica trabalhos de ilustres tais como: Honoré de Balzac, Pablo Picasso, Paul Verlaine, Paul Valéry, Edgar Degas, Gustave Flaubert, entre muitos outros.

Um novo paradigma irrompe já na segunda metade do século, mais especificamente na década de 1960, quando os artistas tomaram conta deste

mercado da arte, produzindo este tipo de objeto pouco comercial (Bodman, 2005). A edição fine press de livros de artista que seguem a tradição de livre de luxe mantêm a sua popularidade no mundo contemporâneo. Várias são as editoras que continuam a publicar sobre esses princípios, denotando-se a colaboração com artistas e escritores no âmbito da produção de edições limitadas. O sucesso destas editoras cresceu no século XX inspirando artistas a aventurarem-se na publicação dos seus próprios trabalhos. Com o aparecimento da fotocópia, no final da década de 1960, o artista avista a possibilidade de realizar todo o percurso sem intermediários, publicando as suas ideias em manifestos e imagens, distanciando- se do limitador consumo em galerias, vigente até então. (Feria, artigo14) Assim sendo, alguns artistas constituem as suas próprias editoras, evitando qualquer tipo de censura e garantindo uma independência económica face ao mercado tradicional. Destes artistas destacam-se os seguintes: Sol Le Witt funda a Printed Matter, Ed Ruscha cria a Heavy Industry Publications, e Michael Baldwin e Terry Atkinson unem-se em 1968 para criar a Art & Language Press,(Isabel Baraona15).

Nesta revolucionária década foram publicados vários livros de artista emblemáticos, de celebrados autores tais como: Andy Warhol, Edward Ruscha e Sol Lewitt. Um grupo radical de grande influência, a Umbrella of Fluxus (1978) destaca-se neste seguimento, tendo influenciado a publicação de vários artistas. Alguns dos artistas associados ao grupo são: John Cage, Yoko Ono e Joseph Beuys, nomeadamente pela experimentação em eventos e performances. Estas atividades tiveram um papel relevante na contemporaneidade do Livro de Artista, dado que despoletaram outras manifestações. (Sara Bodman, 2005)

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