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CAPÍTULO IV REVISÃO DA LITERATURA

IV.5. A orquestração

O conceito de orquestração surge associado a uma perspetiva sociocultural da aprendizagem e do desenvolvimento, onde a aprendizagem surge como um processo social onde os/as alunos/as criam os seus próprios conceitos, ferramentas e ações através da comunicação e interação, na sala de aula, entre alunos-alunos e professor- alunos (Rogoff, 1990; wertsch, 1998; citados em Carlsen, Hundeland, & Erfjord, 2009). A orquestração de atividades matemáticas pressupõe que o/a professor/a crie um ambiente de aprendizagem de modo a que os/as alunos/as se envolvam, partilhando ideias e argumentos.

Kennewell (2001; citado em Hundeland, Erfjord, & Carlsen, 2017; p.1853) vê que na orquestração, o educador tem de planear, pensar em frente, atuar no momento, seguir as questões e comentários das crianças, adaptar questões para cada criança, etc – um papel importante e nada fácil.

A noção de orquestração inclui ênfase nas questões do/a professor/a e comentários às respostas das crianças na conversação, a preparação das sessões e a conceção do ambiente de aprendizagem (Carlsen, Hundeland, & Erfjord, 2009). Numa perspetiva sociocultural de aprendizagem e desenvolvimento, o uso de questões pelo/a professor/a, tem um papel fundamental na orquestração do processo de aprendizagem das crianças. O questionamento é um processo descrito como a boa vontade para surpreender, colocar questões e procurar compreender, colaborando com outros na tentativa de lhes dar respostas. Nesta colaboração todos estão envolvidos em ação e reflexão. Trabalhando juntos, cada um podia aprender algo sobre o mundo dos outros (Carlsen, Hundeland, & Erfjord, 2009).

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Questões dos Professores

Carlsen, Hundeland, & Erfjord, (2009) registaram a comunicação e a interação entre crianças e professores/as e identificaram seis tipos de questões, analisando também que especies de resposta os vários tipos de questões que emergiram. Algumas das categorias de questões eram mais dominantes do que outras e algumas categorias originaram mais respostas dos/as alunos/as que outras. Estes autores focram-se no papel das questões na prática comunicativa e não exclusivamente no conteúdo que estava a ser tratado. As seis categorias de questões: sugerir ação; aberta; pedir argumentação; convidar à resolução de problemas; refrasear; concluir; também, tiveram em conta as respostas das crianças (Tabela 3).

Tabela 3 - Tipos de questões colocadas pelo professor

categorias Definições/Exemplos

1 – Sugerir ação

As questões dentro desta categoria são caraterizadas por iniciar ações físicas entre as crianças e não, somente, por iniciar uma resposta oral.

“Podes contá-las e ver se são tantas quanto estas?”

2- Abertas

Questões dentro desta categoria inquirem o conhecimento das crianças relativamente ao problema que elas estudam.

“Como é que podemos decidir qual delas é a mais pesada”.

3- Pedir argumentação

Esta categoria inclui questões colocadas que seguem uma expressão da criança. O conteúdo destas questões inclui que à criança lhe é pedido para dar razões ou justificações para a sua resposta ou opinião. “Porque é que pensas assim?”

4- Convidar à resolução de problemas Algumas questões incluem um problema ou desafio. Estas questões dão oportunidades

63 para raciocinar, bem como, motivar em relação à experimentação e resolução de problemas.

“É possível estimar quantos ursinhos precisas para que sejam tão pesados quanto o urso grande?”

5 –Refrasear

Muitas vezes as crianças respondem com palavras únicas ou pequenas falas, as quais precisam de ser refraseadas como questões. Os professores fazem emergir conhecimento de conteúdo específico através destas questões.

Criança: “Isso é mais!”

Professor: “Achas que é o mais pesado?”

6 – Concluir

Esta categoria é usada para descrever as questões onde o professor promove uma relação (matemática) ou observação. O alvo destas questões parece ser a aprovação das crianças ou o reconhecimento delas para uma questão específica.

“Eles têm o mesmo peso?”

Nota: Tipos de questões colocadas pelo professor adaptado de Erfjord, Carlsen, & Hundeland (2009).

Autoridade e Agência

De acordo com a perspetiva sociocultural, a interação adulto-criança, assim como o uso de ferramentas, são reconhecidos como elementos fundamentais que constituem o processo de aprendizagem. Ferramentas como a linguagem matemática, o papel e o lápis, os materiais concretos, entre outros, são utilizados como artefactos mediadores para que os indivíduos comuniquem e interajam em contextos colaborativos. Existem dois aspetos importantes no que diz respeito à eficácia no apoio à aprendizagem da

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matemática: distribuição de autoridade e oportunidade para os/as alunos/as exercerem agência.

De acordo com Erfjord, Carlsen, & Hundeland (2016), autoridade é um termo utilizado para reconhecer o responsável quando se trata de fazer contribuições matemáticas para um processo contínuo de resolução de problemas. Por outro lado, seguindo a perspetiva de Lange (2009; citado em Erfjord, Carlsen, & Hundeland, 2016), os autores definem agência como a "faculdade de uma criança para agir deliberadamente de acordo com a própria vontade e, assim, fazer escolhas livres" (p.1919). Neste sentido, Cobb et. al. (2009; citados em Erfjord, Carlsen, & Hundeland, 2016), assumem que a autoridade está intimamente ligada às possibilidades de os/as alunos/as exercitarem a agência.

Cobb et. al. (2009) seguindo as ideias de Pickering (1995; citados em Erfjord, Carlsen, & Hundeland, 2016; p.1919), distinguem duas formas de agência: agência concetual e agência disciplinar. A agência concetual diz respeito a “escolher métodos e desenvolver significados e relações entre conceitos e princípios” que são atributos familiares dentro da agência humana. A agência disciplinar é um padrão disciplinado específico de agência humana, tal como, rotinas em relação às manipulações de símbolos como, por exemplo, (b + c) = ab + ac. A noção de agência disciplinar descreve a passividade humana dentro de uma prática concetual. Assim, a agência disciplinar “leva-nos a uma série de manipulações dentro de um conceito estabelecido”. Para que os processos de aprendizagem matemática sejam efetivamente apoiados, a autoridade deve ser distribuída e os alunos devem ter oportunidades de exercer a agência concetual. Deste modo, Pickering (1995; citado em Erfjord, Carlsen, & Hundeland, 2016) introduziu o termo agência disciplinar para enfatizar que a agência, quando exercida dentro de uma prática concetual como a matemática, está intimamente ligada à disciplina em que se desenvolve.

Moreover, Boaler e Greeno (2000; citados em Erfjord, Carlsen, & Hundeland, 2016), acreditam que os/as alunos/as precisam de ter possibilidades de utilizar a sua própria língua, de ter oportunidades de pensar por si próprios, de ter oportunidades de fazer as suas próprias interpretações e de tomar as suas próprias decisões. Cobb et. al. (2009;

65 citados em Erfjord, Carlsen, & Hundeland, 2016), afirmam que é necessária experiência no exercício da agência concetual para que os/as alunos/as possam raciocinar sobre a utilidade das ferramentas disciplinares nos processos de resolução de problemas. Se a autoridade é mantida com o/a professor/a, os/as alunos/as têm apenas possibilidades de exercer uma agência disciplinar. Dentro de uma prática concetual, como fazer e aprender matemática num ambiente de jardim de infância ou numa sala de aula, existe, portanto, o que Pickering (1995; citado em citado em Erfjord, Carlsen, & Hundeland, 2016) chama de dança da agência. A agência concetual e a agência disciplinar podem estar interligadas e, alternadamente, assumir a liderança. No estudo levado a cabo por Erfjord, Carlsen, & Hundeland (2016), a criança e a prática concetual, isto é, uma atividade pedagógica matemática (APM), influenciam- se mutuamente. Os autores sugerem falar sobre atividades como situações em que a autoridade pode ser distribuída entre os atores, dando a cada um deles oportunidades para agir e exercer ações próprias interpretações e decisões.

Para resumir, tendo em linha de pensamento as ideias de Cobb et. al. (2009), Erfjord, Carlsen, & Hundeland (2016), utilizam o termo autoridade como algo que pode ser dado a outros. Neste caso, a autoridade é dada pelos educadores/as e professores/as às crianças. Quando a autoridade é dada, são criadas oportunidades nas quais as crianças podem exercer a agência. No entanto, como pode ser visto neste estudo, as crianças nem sempre aproveitam essas oportunidades para fazer uso da agência.

Assim, consideramos que a autoridade e a agência devem ser distribuídas cuidadosamente dentro das APM para que as crianças sejam apoiadas no seu processo de aprendizagem matemático. São necessárias oportunidades para exercer a agência concetual, contudo, os educadores e professores precisam de orquestrar as APM de forma a que as crianças possam exercer a agência. Ao mesmo tempo, os educadores/as e professores/as devem controlar as atividades, a fim de alcançar possíveis objetivos matemáticos de aprendizagem. Isso é necessário devido à limitada experiência matemática das crianças (Erfjord, Carlsen, & Hundeland, 2016).

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As abordagens do professor

Carlsen, Erfjord, Hundeland, & Monaghan (2016), analisaram a forma como os docentes interagem com crianças ao orquestrar as suas atividades quando usam ferramentas digitais, identificando três abordagens: Assistente, Mediador e Professor. O/A professor/a toma a abordagem de Assistente quando assiste as crianças em questões menores, por exemplo, iniciar e correr um software ou apontar à criança o que deveria fazer para se envolver com uma aplicação. A segunda abordagem Mediador, é quando o professor orquestra a atividade, por exemplo, lendo um texto ou ajudando a criança na interpretação dele, no ecrã; A abordagem Professor, é quando o/a professor/a usa questões e comentários sobre as interações das crianças com as aplicações, por exemplo, o/a professor/a ativamente escolhe as aplicações nas quais as crianças vão estar envolvidas e supervisiona o ritmo de interações da criança com os artefactos.

IV.6. Os programas de Matemática, Português, Estudo do Meio e

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