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Os anos de 1980: Novas instituições empresariais e propostas de intervenção

1.1 A gênese do movimento de RSE

1.1.2 Os anos de 1980: Novas instituições empresariais e propostas de intervenção

Dentre as novas entidades surgidas nos anos de 1980 no meio empresarial podemos sublinhar aqui o nascimento do Instituto Liberal, do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI) e do Pensamento Nacional das Bases Empresariais (PNBE). Estas três instituições, de certa forma, se destacaram por sua vocação mais abrangente, articuladora de interesses mais amplos do que os tradicionalmente assumidos pelas instituições patronais.

O Instituto Liberal, criado em 1983, tem como objetivo divulgar a concepção de mundo liberal (ou neoliberal que começava a se delinear naquele momento), visando incutir na opinião pública, especialmente políticos, intelectuais e estudantes, uma visão positiva deste modelo de sociedade. Para isso, os líderes empresariais que compõem estas instituições formularam uma série de mecanismos de propagação dessas idéias, como revistas, panfletos, reuniões, congressos, conferências, traduções de clássicos da literatura liberal e outros38. O IEDI, por sua vez, criado em 23 de maio de 1989, representa um conjunto de interesses restritos à indústria e à política industrial. Importantes industriais, representando empresas e grupos de diversos ramos, principalmente as paulistas, mas não só, participaram da fundação dessa instituição e têm mantido nela destacada atuação.

Segundo Bianchi (2001), o PNBE difere profundamente das entidades acima mencionadas: “[...] porque ele almeja representar um setor do empresariado. Em segundo lugar, porque não é uma entidade voltada explicitamente para a elaboração de propostas ou

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Segundo Diniz e Boschi (2004), tal flexibilização das estruturas corporativas pode ser vista como uma certa “americanização” da representação dos interesses – seja no sentido de um maior pluralismo, seja pela adoção de táticas de lobby junto ao Congresso –, uma maior profissionalização das antigas e novas organizações e, sobretudo, uma crescente ênfase no caráter voluntário da ação coletiva.

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Sobre os Institutos Liberais ver: GROS, Denise. B. Institutos Liberais e neoliberalismo no Brasil da Nova República. Porto Alegre, 2003. 253 f. Tese (Doutorado em Ciências Sociais) – Departamento de Ciência Política, Universidade Estadual de Campinas, 2003.

para a difusão de uma ideologia, mas uma associação de empresários com vistas à ação.39”. Tratou-se de uma tentativa de superação do abismo que separava "representantes" e "representados", portanto, uma tentativa de superar a crise de representatividade. Para os empresários que se aglutinavam no PNBE, o pequeno grupo de empresários que comandava a FIESP não conseguia naquele momento crucial, de redemocratização do país, de convocação da Assembléia Constituinte e do agravamento da crise econômica, com o fracasso do Plano Cruzado, formular uma plataforma empresarial que abragesse todas as questões abordadas pela Constituinte. À época o Presidente da Fiesp, Luís Eulálio Bueno Vidigal, lançou um programa do empresariado para a Constituinte que dava conta apenas de questões referentes à iniciativa privada e às entidades patronais (BIANCHI, 2001).

Outro fator que impulsionou o nascimento do PNBE foi a baixa capacidade de representação do tradicional complexo de confederações e federações40. Para os líderes do PNBE havia na Fiesp um espaço muito limitado para a discussão da sociedade, pois discussões sobre a reforma agrária, a inflação, o sistema de governo a ser adotado nem entravam na pauta para o debate sobre o papel do empresário naquele momento fundamental da história do país. Sendo assim, se em um primeiro momento o PNBE tentou obter espaço dentro da FIESP – nascendo informalmente dentro dela em 198741 e com o objetivo de construir propostas a serem apresentadas pelos empresários à Assembléia Constituinte – as dificuldades encontradas pelo movimento levaram-no à institucionalização formal em 1990. Por sua origem claramente atrelada ao complexo industrial (FIESP/CIESP), tal movimento, naturalmente, manteve nos primeiros anos uma marcante presença de industriais. Contudo, contrariando a tendência inicial do movimento, ao longo dos anos de 1990, os empresários do setor de serviço passaram a ser predominantes nos quadros da entidade42.

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De fato, ao tentarmos articular um esforço comparativo entre os três movimentos destacados – ainda em seu início, no começo dos anos de 1990 – podemos perceber também que no caso do IEDI e do IL ocorre uma sobreposição das lideranças que as compõem com aquelas presentes nas antigas associações empresariais, como a FIESP. Por sua vez, o PNBE formava- se por meio da iniciativa majoritária de pequenos e médios empresários (Boschi e Diniz, 1992).

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Logo, o PNBE se fez em oposição à FIESP e também à CNI. Como bem frisou Bianchi (2001), uma oposição contra as restrições à participação democrática naquelas entidades, o que pode ser identificado na tentativa pela cúpula da Fiesp, ao final dos anos 80, de transformar as eleições diretas do Ciesp em um sistema de colégio eleitoral, ou seja, na institucionalização do voto indireto, indo na contramão das reformas democráticas que vivia o país naquele momento.

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Vejamos nas palavras de Bianchi (2001, p.53) o impacto causado pelo nascimento do PNBE: “No início do mês de junho de 1987, cerca de 2600 empresários compareceram ao Anhembi, em São Paulo, para participar de uma audiência pública com o então ministro da fazenda Luís Carlos Bresser Pereira. A reunião foi convocada com o objetivo de debater as propostas a serem apresentadas pelos empresários à Assembléia Constituinte. Manifestação como essa no meio empresarial nunca tinha sido vista. Ainda mais que a reunião havias sido convocada por algumas jovens lideranças, cujos nomes só eram até então conhecidos por aqueles que acompanhavam o dia-a-dia dos sindicatos patronais”.

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Emerson Kapaz, em entrevista realizada por Bianchi (2001), afirmou que a predominância do setor de serviços no PNBE ocorrera devido ao próprio crescimento deste tipo de atividade nas economias brasileira e mundial.

O PNBE, principalmente na primeira metade dos anos de 1990, destacou-se pela defesa da cidadania – manteve um discurso marcado pela tentativa de construção de uma “democracia social” no Brasil – animando seus membros a se envolverem em projetos concretos de intervenção social. De fato, o que pretendiam os líderes daquele movimento era demonstrar que havia soluções para os graves problemas que assolavam o país (GOMES, 2007). Nesse sentido, podemos afirmar que elementos fundamentais do ideário da RSE estiveram constantemente presentes no discurso daquela entidade. Buscaremos identificar tais questões a seguir, por meio de uma exposição mais profunda da trajetória do PNBE, dividida em duas frentes de ação: a primeira pautada no discurso político-econômico da entidade e a segunda voltada para o discurso e para as ações sociais dela.