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OS ARTIGOS CIENTÍFICOS PUBLICADOS EM REVISTAS JURÍDICAS

2. O DIÁLOGO COM A PRODUÇÃO ACADÊMICA ACERCA DAS

2.8 OS ARTIGOS CIENTÍFICOS PUBLICADOS EM REVISTAS JURÍDICAS

Ao nos debruçarmos na leitura e análise de cada trabalho encontrado no sítio do

Google Acadêmico, deparamo-nos com uma pesquisadora em comum em quase

todos os trabalhos pesquisados: Juliana Ferrari de Oliveira Pagani. A pesquisa desta professora foi tomada por base em quase todos os trabalhos, razão pela qual decidimos aprofundar as buscas que tivessem citado a autora em questão.

Para tanto, buscamos no sítio da Google o nome da pesquisadora supracitada e encontramos, portanto, outros três trabalhos dos quais dois tinham sensível afinidade ao tema objeto de nossa dissertação: (i) “Docência em Direito no Brasil: uma carreira profissional?”, artigo de autoria de Luciana Barbosa Musse e Roberto Freitas Filho, publicado na revista jurídica da Presidência da República (MUSSE; FREITAS FILHO, 2015); e (ii) “A formação pedagógica do docente em direito como importante ferramenta de aperfeiçoamento do ensino jurídico no Brasil”, artigo publicado igualmente em revista jurídica – Âmbito Jurídico -, de autoria de Flávia Aguiar Cabral Furtado Pinto (PINTO, 2012).

Não obstante ambos os artigos não se dediquem especificamente a respeito de currículo integrado, indiretamente fazem referência ao assunto quando discutem as diretrizes curriculares do curso de Direito após o advento da Carta Magna de 1988, bem como quando tratam da LDBEN conjuntamente com as sucessivas resoluções editadas pelo Conselho de Educação, do MEC.

No que concerne ao primeiro artigo (Docência em Direito no Brasil: uma carreira profissional?), busca-se responder à indagação acerca da docência em Direito no Brasil no sentido de ser ela uma carreira ou um trabalho. Para responder a essa questão, foram utilizados dados do Observatório do Ensino de Direito (Direito FGV, 2013), dados estes que também foram por nós analisados no capítulo relativo ao perfil do curso de Direito e seus docentes. Foram utilizados igualmente neste artigo documentos oficiais e legislação sobre educação superior e ensino jurídico, e analisadas bibliografias internacional e nacional sobre docência na educação superior e docência em cursos jurídicos.

Após a análise crítico-reflexiva sobre noções como profissão, profissionalização, profissionalidade, identidade docente e formação docente, os autores se dedicaram à realidade da docência jurídica no Brasil, constatando que essa atividade não é reconhecida socialmente como uma autêntica profissão pela maioria dos seus praticantes. Constatou-se, outrossim, que a alteração dessa realidade requer o reconhecimento da docência como carreira jurídica, o que demanda uma preparação para a docência, desde a graduação, por intermédio da oferta de conteúdos pedagógicos, desenvolvimento de competências e habilidades próprias da atividade docente e estágio docente.

A licenciatura no curso de graduação de Direito poderia, ao nosso ver, ser uma possibilidade para aqueles que gostariam de seguir a carreira docente no ensino superior, sendo aí, um locus para a primeira formação didático-pedagógica cuja continuação deveria ser na pós-graduação “stricto sensu” e “lato sensu” como requisitos obrigatórios – e não preferencial, como exige a legislação atual – para o magistério superior. Acrescentando-se a isso, poder-se-ia exigir, igualmente, um estágio obrigatório ao lado de professores já experientes antes de efetivação da carreira docente, de modo que o professor iniciante esteja mais bem preparado para

praticar currículos com abordagens metodológicas interdisciplinares, tal como requer a LDBEN e as resoluções relativas às diretrizes do MEC.

No tocante ao segundo artigo, “A formação pedagógica do docente em direito como importante ferramenta de aperfeiçoamento do ensino jurídico no Brasil”, foi este destacado por nós nesta revisão de literatura porque diz respeito à formação pedagógica dos professores do curso de Direito, especificamente, apontando para o fato de que tal questão nunca fora considerada relevante pelos próprios docentes, razão pela qual tal artigo serviu de fonte para desenvolver o capítulo que trata do perfil docente deste curso em nossa dissertação.

O referido trabalho trata da metodologia de ensino empregada nos cursos de graduação e pós-graduação em Direito e chama a atenção para o fato de que, desde a criação das primeiras faculdades de Direito, surgidas durante o liberalismo e influenciadas pelos ideais positivistas da universidade de Coimbra, aludida metodologia permanece ortodoxa, mormente após o advento da Constituição da República Federativa do Brasil14 (CRFB) de 1988, que contribuiu para a valorização

das carreiras jurídicas, porém intensificou o processo de massificação do ensino voltado preferencialmente para a aprovação no exame da OAB e nos concursos públicos.

Apesar de a pesquisa sob análise ter revelado a desvalorização da formação pedagógica pelos próprios docentes, consideramos que isso tende a mudar, especialmente se forem promovidas ações de estímulo de formação continuada por meio de políticas institucionais.

14 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em:

3. O CURRÍCULO INTEGRADO E FORMAÇÃO DOCENTE: PRESSUPOSTOS E CONCEITOS PARA A CONSTRUÇÃO DAS PRÁTICAS NO CURSO DE DIREITO

Temos como objetivo neste capítulo dissertar sobre currículo integrado, seu conceito, suas peculiaridades, os fundamentos da interdisciplinaridade e sua metodologia, bem como a relação daquele para com a formação dos professores. Porém, antes de adentrarmos ao tema objeto deste capítulo, insta-nos discorrer, inicialmente, sobre o currículo em geral e seus desdobramentos ao longo história da educação brasileira.

O currículo aparece pela primeira vez como um objeto de estudo e pesquisa nos Estados Unidos da América por volta de 1920. Em conexão com o processo de industrialização e de imigração, que intensificaram a massificação da escolarização, houve uma mobilização por parte da administração da educação daquele país para racionalizar o processo de construção, desenvolvimento e testagem de currículos (SILVA, 2010).

O currículo era visto como um processo de racionalização de resultados educacionais, cuidadosa e rigorosamente especificados e medidos. Seria a especificação precisa de objetivos, procedimentos e métodos para a obtenção de resultados que possam ser precisamente mensurados.

O currículo moderno consolidou-se, na viragem do século XIX para o século XX, em torno de um “[...] círculo coerente de saberes (aquilo a que os gregos chamaram enkuklios païdéia e que viria a dar o conceito de enciclopédia, isto é, de ‘educação geral’)” e de uma estrutura escolar e didática para a sua transmissão (NÓVOA, 2003, p. 8).

Apesar de todas as inovações que ocorreram ao longo do século XX, esse círculo e essa estrutura mantiveram-se relativamente estáveis. Para Nóvoa (2003), eles revelaram-se incapazes de responder às novas necessidades educativas.

Há as chamadas teorias do currículo que buscam saber qual o conhecimento deve ser ensinado (“o quê?”), o que os alunos e alunas devem saber. Elas estão envolvidas, explícita ou implicitamente, em desenvolver critérios de seleção que justifiquem responder a essa pergunta. Uma vez decidido o que devem os alunos

saber, questionam as referidas teorias a razão, o motivo, o porquê de esses conhecimentos terem sido selecionados. Nesse sentido, categoriza-se o currículo na medida em que uma disciplina passa a ter maior ou menor importância em relação a outra, pois, afinal, o currículo busca, precisamente, modificar as pessoas que o seguirão (SILVA, 2010, p. 15).

Destarte, precede à pergunta sobre “o que” os alunos devem aprender, uma outra que está intimamente associada àquela: o que os alunos e alunas devem se tornar? Isso porque, dependendo da resposta, define-se, por meio do currículo, o que eles devem aprender. Definir o tipo de pessoa ideal, o ser humano desejável para uma determinada sociedade, se racional ou competitiva, se ajustada aos ideais de cidadania ou crítica aos arranjos sociais existentes, é justamente o que definirá a resposta à pergunta sobre o que deve conter o currículo e ser ensinado a esses alunos.

Por isso que Silva (2010) entende que, ao longo das práticas curriculares, tornamo- nos quem somos, pois, ao revés de pensar currículo tão somente como conhecimento, devemos pensar que o conhecimento que constitui o currículo está intrinsicamente envolvido naquilo que somos, naquilo que nos tornamos, formando nossa identidade.

Da perspectiva pós-estruturalista, currículo é uma questão de poder. Selecionar as disciplinas curriculares é uma atividade que demonstra poder. Privilegiar um tipo de conhecimento em detrimento de outro é um exercício de poder. Racionalizar e identificar um tipo de identidade como ideal, e direcionar o currículo para ela, é uma operação de poder. E é justamente a questão do poder que separa as teorias tradicionais das teorias críticas e pós-críticas do currículo (SILVA, 2010).

Enquanto as teorias tradicionais do currículo pretendem ser teorias neutras, científicas e desinteressadas, as teorias críticas e pós-críticas, ao contrário, se contrapõem para afirmar que nenhuma teoria é neutra, científica ou desinteressada, pois todas estão relacionadas com o poder.

As teorias tradicionais se preocupam em responder à questão relativa ao “como” ensinar “o que” foi decidido para constar no currículo. Ocupam-se com a técnica,

com a organização do conteúdo curricular. Tratam de questões como ensino; aprendizagem; avaliação; metodologia; didática; planejamento; eficiência e objetivos. Já as teorias críticas e pós-críticas, por sua vez, não só questionam “o que” ensinar, como também “por que” ensinar este conteúdo e não aquele; por que preterir esta disciplina àquela, ou seja, se preocupam em relacionar o saber, a identidade e o poder (SILVA, 2010).

As teorias críticas tratam de questões como ideologia; reprodução cultural e social; poder; classe social; capitalismo; relações sociais de produção; conscientização; emancipação e libertação; currículo oculto e resistência; enquanto que, as teorias pós-críticas se envolvem com questões relacionadas a identidade, alteridade, diferença; subjetividade; significação e discurso; saber-poder; representação; gênero, raça, etnia, sexualidade e multiculturalismo.

Para Silva (2010), os conceitos de uma teoria nos direcionam a focar em algo que muitas vezes não teríamos prestado atenção até então. Ele acredita que as teorias críticas de currículo, ao deslocar a ênfase dos conceitos pedagógicos de ensino e aprendizagem (“como”), para os conceitos de ideologia e poder (“por que”), nos permitiram tratar a educação sob nova perspectiva. Por sua vez, ao enfatizar o conceito de discurso (descrição de algo sob uma perspectiva particular) em vez de ideologia, as teorias pós-críticas também despertaram um novo olhar para a questão atinente ao currículo.

O currículo é, pois, um dos locais privilegiados onde se entrecruzam saber e poder, representação e domínio, discurso e regulação. E é também no currículo que se condensam relações de poder que são cruciais para o processo de formação da identidade social porque ele corporifica relações sociais (SILVA, 1995).

Numa sociedade contemporânea como a nossa na qual conhecimento e poder estão intimamente entrelaçados, e no qual os saberes subjugam, torna-se relevante uma perspectiva educacional e curricular que possibilite o desenvolvimento de visões alternativas das relações de dominação e subordinação entre culturas e nações, de modo que os educandos tenham a oportunidade de avaliar estas relações de poder, seu caráter discursivo e os pontos produtivos do processo de representação do outro, do dominado, subordinado (SILVA, 1995).

Afirma Mossini (2010) que o ensino e o currículo jurídico, como vêm sendo ministrados, não vêm estruturados em práticas pedagógicas direcionadas para a emancipação do educando, mas sim a partir de algumas tradições culturais imbricadas às próprias práticas do poder, ao qual eram destinados e para o que se treinaram os bacharéis durante o período Imperial no Brasil.

Acredita, outrossim, a referida autora que

[...] a cultura jurídica tem resistência em aceitar a teoria crítica, ao desenvolvimento do raciocínio aberto e atento as demandas sociais. Tal cultura tem dificuldades de se libertar da cultura burocrática, tamanha a dose de preponderância entre os saberes técnico-normativos (ora chamados dogmáticos) e os saberes humano formativos. Os próprios propósitos da Faculdade de Direito no Brasil, desde a sua criação colaboram para esta arquetípica tradição da cultura, em que o Direito se resume apenas a ser a compilação de normas estrangeiras reunidas, não adaptadas a realidade social e estudadas sistematicamente (MOSSINI, 2010, p. 150-151).

Por esse motivo, o currículo é também o cruzamento de práticas diferentes e se converte naquilo que se denomina como prática pedagógica nas aulas e nas escolas. Esse campo epistemológico envolve necessariamente conhecimentos interdisciplinares e transdisciplinares (MOSSINI, 2010).