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4 PASSOS QUE ESTETICIZAM A VIDA DA/NA CIDA DE

4.2 Os bairros em que habitam os sujeitos da pesquisa – breve relato

[...] O bairro penetra se inscreve na história do sujeito como

a marca de uma pertença indelével [...]

(M ayol, 2003, p. 44) O sujeito “assina” seu lugar no bairro. O bairro representa uma parte da cidade cujos lugares, trajetos cotidianos, a vizinhança, os pon- tos comerciais, postos de saúde, escolas, creches se inscrevem a partir de relações estéticas que contribuem para o sentimento de pertencimento e reconhecimento de si no lugar. O bairro é marcado pelas particularida- des de quem o habita cotidianamente.

A fixidez do habitat dos usuários, o costume recíproco do fato da vizinhança, os processos de reconhecimento – de identificação – que se estabelecem graças à proximidade, graças à coexistência concreta em um mesmo território urbano, todos esses elementos “práticos” se ofere- cem como imensos campos de exploração em vista de compreender um pouco melhor esta grande “desconhecida” que é a vida cotidiana.

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Tereza Cristina: o lugar de Zênia, Ximirruga e Titi

O bairro Tereza Cristina tem o mesmo nome da Ferrovia Tereza Cristina, localizada em Criciúma e é onde moram Zênia e Ximirruga29 e Titi, sujeitos desta pesquisa. Historicamente, esse lugar é marcado por muitos preconceitos. Diferente da ala nobre da cidade e também de ou- tras partes, tem um apelido que o desqualifica, Pedregal. Conforme pes- quisa realizada por Generoso (2001), o bairro ganhou o apelido de Pe- dregal devido a uma novela que passava na TV Tupi, onde se desenrola- va muita confusão na trama.

Na cidade, o bairro ficou mais conhecido pelo apelido que pelo nome. Zênia relata que, quando alguém de fora do bairro lhe pergunta onde habita, ela sempre cita o nome Tereza Cristina, isso porque, s e- gundo ela, as pessoas da cidade têm medo dos moradores do “Pedregal” e evitam circular por lá. Episódios como mortes de usuários de substân- cias psicoativas devedores para traficantes, disputas entre traficantes, embates de grupos de tráfico com policiais fizeram com que o lugar fosse temido e conhecido como palco de violências. É comum ouvir relato de alguém da comunidade que soube de uma morte relacionada ao tráfico. Entretanto, ali existem pessoas batalhando honestamente para sobreviver, como, por exemplo, os catadores que integraram esta pes- quisa. Sobre lugares e cidades, cabe dizer que

[...] são feitos de nomes, de significados fabrica- dos pela história dos homens. Não há uma cidade, um lugar que não seja feito de seu nome. O co n- trário disso é a negação da existência da vida dos lugares. Os lugares são produtos da existência – feita dos homens, do seu trabalho, da sua arte e dos significados que encaminham a cada objeto, a cada ser, a cada movimento. Por isso, os lugares são, também, o nome que os representam. A s u- pressão do nome implica o ocultamento da histó- ria, da identidade, a extinção de uma tessitura de vida, o distanciamento do significado que se dá ao

pequeno pedaço de mundo. (Hissa & Melo, 2008,

p. 299).

O termo Pedregal, inicialmente intitulado por seus moradores, transformou-se em um estigma, ao qual não querem estar associados.

Esse bairro já foi uma vila e, após muitos anos de luta e resistência, tornou-se o bairro Tereza Cristina, nome pelo qual querem que o rec o- nheçam.

O bairro é formado por apenas quatro ruas. Ali a prec ariedade se apresenta de diversas formas: ausência de lugares ao ar livre para o la- zer, pobreza, além da natureza degradada.

Viver para suprir apenas as necessidades básicas não é evidente- mente o que sonham. O acesso ao mínimo para qualidade de vida já devia estar assegurado, mas a condição que vivem denuncia que muito ainda precisa ser feito nesse lugar e no país. Outro aspecto a ser destac a- do é que, como ali vivem ex-presidiários e famílias de presidiários, é taxado como bairro de bandidos. De modo geral, os lugares mais pobres são associados à violência e a estereótipos diversos.

O sentimento de desqualificação social é evidente. Só o fato de morarem ali já implica serem olhados de outro modo, bem como pelas roupas que vestem e a aparência que revela a pele envelhecida pelo sol, como o caso de Zênia e Ximirruga. Os seus olhares, como os de Titi, por exemplo, são de trabalhadores que lutam em seu cotidiano para assegu- rar, além da sobrevivência, o mínimo de dignidade.

Anita Garibaldi, o lugar de Osmar e Te rezinha

O lugar em que moram Osmar e Terezinha é uma pequena vila que foi ocupada em 1992, mas seus moradores a chamam de bairro, por isso, ao longo do trabalho, também chamarei a vila Anita Garibaldi de bairro Anita Garibaldi. Nos bairros que o contornam, a população tem melhor qualidade de vida. Um fato que me chamou a atenção é que não são mencionados no mapa de Criciúma. Isso me surpreendeu, posto que foi ocupado há quase vinte anos. O Anita Garibaldi ocupa parte do terr i- tório do bairro São Luiz, e outra do bairro Fábio Silva.

Segundo o presidente da associação de moradores local, inicial- mente o lugar ficou conhecido como Moca, devido a um banheiro cole- tivo construído por seus moradores no início da ocupação e assim nomi- nado por eles. Embora conheça essa comunidade desde 1999, a primeira vez que ouvi seu apelido foi através de moradores do bairro Tereza Cris- tina, pois seus habitantes se referem ao bairro por seu nome.

Tenho um carinho muito especial por essa comunidade, por ser em que conheci o primeiro catador de material reciclável. Quando vou lá, recordo-me com alegria das primeiras vezes que adentrei esse lugar procurando por catadores.

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O presidente da associação dos moradores esclareceu que as ter- ras que ocupam foram concedidas ao INSS devido às dívidas da Carbo- nífera Catarinense, e até então os moradores aguardam pela legalização do loteamento. Segundo ele, a vila Anita Garibaldi foi escolhida por seus moradores em homenagem às mulheres que, no início da ocupação, travaram uma batalha, colocando-se na frente dos homens para defender a apropriação do lugar. Atualmente a comunidade é uma ZEIS – Zona Especial de Interesse Social, ou seja, uma porção do território destinada a atender prioritariamente assentamentos habitacionais para a população de baixa renda, ou para urbanização e regularização fundiária.

São Luiz, o lugar de Maria Denis

O bairro São Luiz é um dos mais antigos da cidade. Parte dele foi ocupada pelos moradores do Anita Garibaldi. Em termos de infraestr u- tura, o bairro São Luiz possui creche, posto de saúde, igreja, campos de futebol, restaurantes, pizzarias, farmácia, uma igreja com arquitetura diferenciada, indústrias, padarias, merc ados, dois postos de gasolina, floricultura, transportadoras, estacionamentos, frutarias, centro comuni- tário, entre outros. Segundo a presidente da associação de moradores, 90% das ruas são pavimentadas com calçamento ou asfalto, algumas ruas de lajota necessitam de revisão e outras de pavimentação. Aguardam a academia ao ar livre. A presidente esclareceu-me que os moradores do Anita Garibaldi são atendidos pelo Programa Saúde da Família – PSF do bairro Milanese porque não necessitam da assistência desse programa. Maria Denis, catadora integrante desta pesquisa, habita no bairro São Luiz, a rua que ela mora é asfaltada e próxima a uma madeireira.

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