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4 PASSOS QUE ESTETICIZAM A VIDA DA/NA CIDA DE

4.1 Um pouco sobre a cidade

Figura 1. Vista parcial da cidade de Criciúma, Santa Catarina

Durante a imigração europeia no Brasil, no final do século XIX, 22 famílias italianas advindas do norte da Itália chegaram a Criciúma25 com esperança de fazer dessas terras catarinenses seu novo lar. Segundo Naspolini Filho (2009), esses 145 italianos chegaram ao Brasil, no porto da ilha das Flores, no estado do Rio de Janeiro, no dia 16 de dezembro de 1879, de onde pegaram outro navio para Santa Catarina, chegando a Criciúma no dia 06 de janeiro de 1880, depois de viajarem a pé e de carroça. Foi assim que as terras que hoje a compreendem, até então habitada por alguns índios de tribos c arijós26, começaram a ser desbra- vadas. “Aos poucos o mato foi sendo cortado e a madeira utilizada para construir as casas. No lugar do mato foram feitas roças. Nas roças os italianos plantavam milho e feijão cujas sementes foram doadas pelo governo brasileiro” (Naspolini Filho, 2009, p. 35). Nessa época, a prin- cipal atividade econômica era a agricultura. Apesar das inúmeras difi- culdades encontradas nas novas terras, os italianos decidiram permane- cer e começaram a construir casas, escolas e estradas. E assim,

[...] aos poucos, foi iniciada a urbanização do cen- tro, daquele banhadão que era cortado por um p e- queno rio. Nas margens desse rio – que é o rio Criciúma – foram construídas algumas casas e a colônia foi tomando jeito. E no sul foi crescendo... [...] de todas as vilas fundadas e colonizadas pelos italianos, de Santa Catarina, a que mais prosperou foi Cresciuma27 (Naspolini Filho, 2009, p. 37)

Enquanto a vila foi crescendo, mais imigrantes chegaram. Naspo- lini Filho (2009) descreve que os poloneses chegaram em 1890 e quase duas décadas depois vieram os alemães e os congoleses da África, sendo que os espanhóis foram os últimos a chegar. Cada um contribuiu com sua cultura para a construção da cidade de Criciúma, atualmente com aproximadamente 200 mil habitantes.

Para homenagear as diferentes etnias que passaram a habitar a c i- dade todos os anos, no mês de setembro, acontece a tradicional Festa das Etnias, onde, além de diferentes apresentações artístico-culturais, a feira gastronômica é destaque. Inicialmente essa festa era realizada na

25 Criciúma pertencia à comarca de Araranguá - SC, cuja emancipação ocorreu em 1925,

após desmembramento desta.

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Não existem registros históricos de como eles desapareceram.

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Praça Nereu Ramos28, a principal da cidade, que paulatinamente assu- miu notoriedade e tornou-se uma tradição entre as festas de Santa Cata- rina. Em decorrência, o espaço físico para a festa ampliou-se. Recente- mente, a festa vinha sendo realizada no Pavilhão de Exposições José Ijair Conti, mas, com a inauguração do Parque das Nações no final de setembro de 2011, lugar que rememora as etnias, além ser destinado a lazer e esporte, a festa das etnias passará a acontecer ali.

Em 1913, foram descobertas as primeiras jazidas de carvão, cujo auge foi entre 1940 e 1970, período em que Criciúma ficou conhecida como a “Capital Brasileira do Carvão”, o que gerou empregos e atraiu investidores. Nascimento (2004) afirma que o espaço urbano dessa c i- dade foi constituído nesse período que teve a mineração como a princ i- pal atividade econômica. As mudanças em suas características urbanas implicaram mudanças nos modos de habitar a cidade. Assim,

Na medida em que a cidade se modernizou, no sentido da difusão e do aprofundamento de rela- ções capitalistas de trabalho, a vida urbana foi se transformando, morrendo aquela modalidade de relações mais íntimas e pessoais no espaço públi- co, e surgindo relações de distanciamento e im- pessoalidade, que caracterizam a moderna vida pública [...]. (Nascimento, 2004, p. 168)

As possibilidades que a cidade oferecia fizeram com que a popu- lação fosse crescendo notavelmente, e assim a imigração continuou sendo a marca da cidade.

Criciúma é a quinta maior cidade de Santa Catarina, e é referên- cia econômica e industrial no sul do Estado. Também é a cidade em que cresci ouvindo falar dos mineiros, trabalhadores que durante muito tempo foram os mais lembrados nesse lugar, seja pelos feitos ou pelos riscos. Com o passar dos anos, vi seus contornos mudarem, assumindo ares de cidade grande. Inúmeros edifícios, diversas concessionárias de veíc ulos, restaurantes, bares, pizzarias, escolas, igrejas, shoppings, grandes super- mercados, indústrias têxtis e cerâmicas, diferentes construtoras, entr e outros lugares agora compõem a cidade do “amarelo, branco e preto”. Essas são as cores do time de futebol – o Criciúma – conhecido como Tigre, time catarinense que possui mais títulos e “orgulho” da cidade. Em 1991, o Criciúma foi campeão da Copa do Brasil, o que ajudou a

cidade a ficar conhecida no âmbito nacional. Um fato que chama a aten- ção dos que aqui circulam é que os ônibus da cidade e as placas de trân- sito são amarelo e preto lembrando o “Tigre”, apesar das cores da sua bandeira serem as mesmas da bandeira da Itália. Nesse contexto citadino encontram-se automóveis circulando, pessoas chegando, saindo, habi- tando, (re)visitando. São milhares tecendo relações nessa urbe. Como catarinense, já percorri esse Estado de Leste a Oeste, Norte a Sul, e de incontáveis cidades que conheci em minhas andanças, Cric iúma está entre aquelas que vi seu desenvolvimento econômico expandindo-se significativamente. Por outro lado, vi também seus problemas ambien- tais agravaram-se.

Criciúma é a única cidade brasileira que tem uma mina de carvão aberta à visitação pública. A Mina Modelo Caetano Sônego, inaugura- da em 1984, foi desativada em 2009 por questões de segurança, e substi- tuída em 2011 pela Mina de Visitação Octávio Fontana. A cidade também possui um monumento em homenagem aos homens do carvão de Criciúma, gestado em decorrência do impacto do carvão na história da cidade e a importância dada aos mineiros que enfrentaram os riscos à saúde e segurança para desempenhar um trabalho que foi preponderante para o seu crescimento econômico. Enquanto as reflexões acerca do trabalho do mineiro enalteciam o fortalecimento da figura do trabalha- dor na cidade, via movimentos sociais, as famílias tradicionais de alto poder econômico preocupavam-se com o signo da cidade, que deixava de ser dos imigrantes europeus para ser associada principalmente ao que gerara a sua expansão econômica: o “carvão”. A imagem da capital do carvão destoava dos ideais de beleza e deixava a imagem dos imigrantes e de seus descendentes como algo superado pelo “carvão”. Foi assim que a cidade passou a ser repensada por grupos de empresários e políti- cos ligados aos ideais de modernização, que tinham como escopo reto- mar a imagem da cultura da imigração gestada no início, mas, sobretudo transformá-la em seus aspectos urbanos, e garantir a diversific ação da sua economia, o que de fato ocorreu. A mineração que impactou tanto essa cidade foi enfraquecendo, por um lado, porque esses recursos se esgotam e, por outro, porque a gestão política da cidade visava assumir outros desenhos nesse cenário. Além disso, do ponto de vista econômi- co, o carvão internacional tornou-se mais barato. Em consequência, o Governo Federal fechou as carboníferas públicas, incentivando a impor- tação do carvão. A Escola Técnica General Oswaldo Pinto da Veiga – SATC, hoje também Faculdade SATC, cumpriu o papel educativo de dar suporte técnico para as carboníferas, estendendo esse trabalho para as demais indústrias posteriormente. As indústrias carboníferas entendi-

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am o desenvolvimento baseado na exploração dos recursos naturais como se fossem inesgotáveis, e sob a lógica de que os recursos naturais, ao serem extraídos, utilizados e descartados, poderiam ser considerados lixo. O principal lixo do carvão, pirita, era normalmente jogada a céu aberto, poluindo o ar, as águas e causando problemas de saúde à popula- ção, como, por exemplo, doenças respiratórias.

Desse ponto de vista, Ruver (1992) considera que o desenvolvi- mento deve ser pensado como de natureza multifacetada, abrangendo os aspectos sociais, econômicos, culturais e ambientais. A autora investi- gou as políticas de saúde na cidade de Cric iúma correlacionando-as à problemática ambiental, ressaltando que, dentre os recursos destruídos pela mineração do carvão na cidade, a água está entre os principais agravantes, posto que atualmente todos os rios da cidade estão destruí- dos. O Shopping Della Giustina, localizado no centro da cidade, foi construído em cima do rio Criciúma. Seu estacionamento, nos momen- tos de tempestade, alagava, causando prejuízo aos s eus usuários. As lojas do centro da cidade também eram tomadas pelas águas da chuva, várias vezes, principalmente durante o verão, prejudicando o comércio. Atualmente a Prefeitura, com uso de verbas federais, está reali- zando obras na tentativa de solucionar o problema. Isso aponta que a lógica de “progresso” da cidade desconsiderou sua sustentabilidade. Grande parte da cidade é minerada em seu subsolo, mas nos bairros enobrecidos, como, por exemplo, o Pio Correa, que também era coberto de pirita, o solo foi recuperado, enquanto historicamente os pobres fo- ram morar nos terrenos piritosos, em situação de degradação ambiental, o que afetava significativamente a saúde dessa população (Ruver, 1992). Cabe dizer que as reinvindicações desses moradores junto ao Poder Público foram sendo atendidas gradativamente. Contudo, ainda restam as áreas degradadas que não foram recuperados em decorrência do alto investimento necessário, e com isso foram desvalorizadas financeira- mente. Uma parte dessa área culminou no “lixão”, conhecido como aterro sanitário e depois transformado em Centro de Triagem de Res í- duos Sólidos.

Nesse cenário em que os setores dominantes exploravam os re- cursos naturais, priorizando o aspecto econômico em detrimento dos demais, os catadores emergiram no contexto citadino, apropriando-se do descarte cotidiano na cidade, e inscrevendo-se nela sob a lógica da sus- tentabilidade, combinando os aspectos sociais, econômicos e ambientais às premissas dos movimentos ambientalistas e às atuais políticas de desenvolvimento sustentável.

No contexto da cidade, o carvão visualmente representava a polui- ção, o que foi sendo modificado nas décadas seguintes, ao ser coberto por camadas de terra que transformaram sua estética. Apesar disso, a “recuperação” do solo, se por um lado trouxe suas contribuições para a qualidade do ar, na cidade continua sendo limitada às condições de arbo- rização. A cidade tem poucos parques e áreas de preservação. É comum encontrarmos catadores habitando nessas áreas de precarização ambiental.

Com o enfraquecimento do setor carbonífero, emergiu o setor c e- râmico. A partir de 1947, a indústria cerâmica passou a assumir papel de destaque no contexto econômico da região e a cidade tornou-se a Capi- tal da Cerâmica. Nesse setor, a cidade é referência não só em nível nacional, mas conquistou projeção internacional. Além disso, o setor de vestuário, metalomecânica e plástico também são referência.

Se, por um lado, a cidade investiu em uma economia diversific a- da, por outro, o desenvolvimento foi marcado pelo aumento das desi- gualdades sociais. Criciúma é uma cidade de médio porte, que enfrenta problemas presentes nas grandes cidades, como: agravamento da polui- ção ambiental, engarrafamento no trânsito, violência e tráfico de drogas. Há muito a ser feito no contexto citadino.

4.2 OS BAIRROS EM QUE HABITAM OS SUJEITOS DA

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