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Os filhos: a sucessão familiar nas atas batismais.

MAPA 04: Localização hidrográfica do Sítio Limoeiro na Ribeira do Jaguaribe.

2.4 Os filhos: a sucessão familiar nas atas batismais.

A continuidade da família se faz através da sucessão de filhos. Na Colônia e no Império, sendo a Igreja responsável pelos registros civis da população brasileira, a incorporação da criança nessa sociedade se dava através da certidão ou ata batismal lavrada pelos próprios padres, as quais preenchiam livros que compunham diversos arquivos da cúria espalhados atualmente em todo o Brasil. Mas o ato de batizar vai além de uma certidão, de um registro apenas. Assim como o casamento, o batismo era um Sacramento, o primeiro e, portanto, como os demais, carregado de significados, simbologia, bem como de normas com vistas à garantia da aceitação e da procura, imposto pelas Constituições Primeiras do Arcebispado da Bahia, que assim descrevem em seu livro, sobre a matéria, forma e efeitos do batismo.

O Baptismo é o primeiro de todos os Sacramentos, e a porta por onde se entra na Igreja Ctholica, e se faz, o que recebe, capaz dos mais Sacramentos, sem o qual nem-um dos demais fará nelle o seu effeito. Consiste este Sacramento na extrema ablução do corpo feita com água natural, e com palavras, que Chisto nosso Senhor instituio por sua fórma. A matéria deste Sacramento é a agoa natural, ou elementar, por cuja razão as outras agoas artificiais não são matéria capaz, para com ellas se fazer o Baptismo. A fórma são as palavras, ou em Latim: Ego te

batizo in nomine Patris, et Filli, et soiritus Sancti; ou em vulgar: Eu te batizo em nome do Padre, e do Filho e do Espírito Santo. O Ministro é o Parocho, a quem de officio compete baptizar a seus freguezes. (...). Causa o Sacramento do Baptismo effeitos Maravilhosos, por que elle se perdoão todos os pecados, assim o original, como actuaes, ainda que sejão muitos, e mui graves. É o baptizado adoptado em filho de Deos, e feito herdeiro da Gloria, e do Reino do Ceo. Pelo Baptismo professa o baptizado a Fé Catholica, a qual se obriga a guardar; e pode, deve a isso ser constrangido pelos ministros da Igreja. E por este Sacramento de tal maneira se abre o Ceo aos baptizados, que depois do Baptismo recebido morrerem, certamente se salvão, não tendo antes da morte algum peccado mortal. Quanto à necessidade, e importância deste Sacramento devemos crer, e saber, que é totalmente necessário para a salvação, e em tal fórma, que sem se receber na realidade, ou, quando não possa ser na realidade, ao menos no desejo, arrependendo-se com verdadeira contrição de seus peccados, com propósito firme de se baptizar tendo occasião para isso, ninguém se póde salvar, conforme o texto de Christo Senhor Nosso. Por tanto devem os pais ter muito cuidado em não dilatarem o Baptismo a seus filhos, porque lhes não succeda sahirem desta vida sem elle, e perderam para sempre a salvação.211

O texto é claro quanto à importância do batismo, só através dele se poderia fazer-se filho(a) de Deus e herdar o reino dos céus. Sua realização imbricava perdão dos pecados, entrada, aceitação e guarda da Igreja Católica e daí o direito para a realização dos demais sacramentos. Morrer sem ele significaria perder a salvação. Tamanho era o risco de se morrer sem o batismo que as leis dizem também que só em casos muito especiais, como por exemplo, crianças ou adultos que se encontravam em perigo de morte a uma distância que os impossibilitasse chegar à Igreja, o batismo poderia ser realizado “em qualquer lugar e por qualquer pessoa posto que seja leigo, ou excommungado, herege, ou infiel, tendo a intenção de batizar como manda a Santa Madre Igreja. E posto que o baptismo feito por qualquer das ditas pessoas fica valioso.”212 Nos registros de batismos da freguesia de Limoeiro

encontramos três casos de crianças batizadas in articulo mortis, ou seja, na hora da morte. Dois destes foi realizado na Matriz da vila, pelo padre Joaquim Rodrigues de Menezes e outro no Oratório Privado da Barra do Figuêredo, pelo padre Ambrosio Rodrigues Machado e Silva. Vejamos este assento.

211VIDE, D. Sebastião Monteiro da. Op. Cit. p, 12. 212 Idem, p. 17.

Maria, parda, filha legitima de Martinho José Chrisostomos e de Francisca Ângela do Espírito Santo, nasceu a 17 de Junho de 1878 e aos 21 de Julho do dito ano foi baptizado no Oratório da Barra do Figuêredo, in articulo mortis, pelo reverendo Padre Ambrosio Rodrigues Machado e Silva, de licença minha escripta: forão seus padrinhos Tito Pompeu e sua mulher Francisca de Paula Paiva Vasconcellos. E para constar faço este em que me assigno.

O Vigário Joaquim Rodrigues de Menezes Silva. 213

Pelas distâncias que separavam a vila dos povoados e as fazendas destes, é muito provável que várias outras crianças tenham sido batizadas, “in articulo mortis,” inclusive por pessoas leigas e seus registros não se encontrem nos livros de batismos da freguesia. Um dado a ser observado sobre os três registros encontrados é que, além deste citado, outro indica que a criança nasceu aos 20 de abril de 1880, tendo sido batizada aos 3 de maio do mesmo ano, portanto com menos de um mês. No terceiro caso, a criança nasceu em outubro de 1871 e foi batizada em janeiro de 1872, ou seja, três meses após o nascimento. Tendo em vista a possibilidade da morte precoce, o que de fato acontecia com muita freqüência, uma das normas das Constituições Primeiras era de que as crianças fossem batizadas até os oito dias de nascidas.214 Não

era prática comum, mas nas certidões de batismos de Limoeiro, encontramos dois registros em que essa regra foi extrapolada ao máximo, pois em um dos casos, Plácido foi batizado com 27 anos de idade e no outro, Francisca com praticamente 11 anos e seis meses.

Plácido, branco, filho legitimo de Antonio Ferreira Nobre e Rita Maria de Sta. Anna, nasceu a 3 de outubro de 1843, foi baptizado solenemente a 3 de julho de 1870, pelo Padre João Leite de Oliveira, na Fazenda Arreia Branca, desta Freguesia de São João do Jaguaribe. Foram padrinhos: Boaventura Nepomuceno de Freitas e D. Francisca Maria da Conceição. E para constar mandei fazer o presente em que mim assigno.

O Vigário Francisco Ribeiro Bessa. 215

Francisca, parda, filha legitima de Pedro de Alcântara e Gertrudes Maria da Conceição, nasceu a 4 de dezembro de 1858, foi baptizada solenemente a 23 de julho de 1870, pelo Padre João Leite de Oliveira, na Fazenda Arreia Branca, desta Freguesia de São João do Jaguaribe. Foram padrinhos: Francisco Rabello Ferreira Nobre e D. Saturnima

213 (ADNL) - Livro batismo nº 06, p. 01.

214 VIDE, D. Sebastião Monteiro da. Op. Cit p. 14.

Maria da Conceição. E para constar mandei fazer o presente em que mim assigno.

O Vigário Francisco Ribeiro Bessa.

Esses casos constituem exceção. De uma maneira geral, a partir do cruzamento das datas de nascimentos com as de batismos temos condições de chegar a conclusões a respeito da relação temporal entre ambos. Como podemos observar na tabela 11, as distâncias temporais que separavam esses dois momentos eram amenas.

TABELA 11: Relação mensal entre os nascimentos e a realização dos batismos em Limoeiro, (1870 a 1880).