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Os laços de parentesco

CAPÍTULO 2 ESTRELA: SITUANDO A COMUNIDADE

2.2 Os laços de parentesco

O parentesco em Estrela está estritamente ligado ao sentimento de pertencimento no grupo e sua identificação como quilombola. Atualmente todos os moradores da comunidade, que vem dos principais troncos das famílias acima mencionadas, se consideram quilombolas. A identificação dos moradores parte de argumentos diferentes, ou seja, todos se reconhecem como quilombolas, mas para fundamentar essa identidade eles utilizam argumentos diferentes que se encaixem na situação dele perante o grupo. Os argumentos mais utilizados tem haver com questões pontuais no debate sobre comunidades quilombolas na Antropologia, já mencionados no capítulo 1, que são referentes à: descendência de escravos e cor negra, parentesco, ocupação tradicional da terra.

Para os moradores do sítio Estrela, a identificação se dá pela cor da pele negra e por acreditarem ser descendentes de escravos que viveram naquela região. É partindo disso que Sr. Pedro, pessoa mais velha da comunidade, explica porque eles são quilombolas.

Alice: Quando começou essa história de quilombolas aqui?

Sr. Pedro: Olhe, começou com a raiz...meus pais eram todos negros. Tudinho aqui era negro. Depois veio Adelia e fez as pesquisas por aqui. E por quilombolas nós estamos...somos todos negros.

Alice: E por que vocês são quilombolas? Sr. Pedro: Por que somos todos cativos...

O mesmo argumento serve de base para D. Sônia, moradora do sítio Imbaúba, que é negra e tem parentesco com pessoas de Estrela.

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Nós éramos descendentes de quilombos por causa das nossas famílias que eram de quilombos, que foram massacrados. Meus avós sempre comentavam. Sempre comentavam que eram massacrados não eram respeitados, muitas passavam e cuspiam. Entendesse? Mas não era nada definitivo não. Só depois do Quilombo dos Palmares que reconheceram pra lá e foram reconhecendo os outros.

Para os moradores do sítio Gejuíba, que não vêm dos troncos familiares principais e não são negros a identificação se dá pela ligação com a terra, a ocupação tradicional dos seus ancestrais, como confirma um Sr. Waldemar, morador desse sítio: “Nós somos quilombolas porque foi tudo nascido e criado aqui. A família da gente nunca saiu daqui não".

Dito isto, poderemos entender melhor a ocupação da comunidade Estrela atualmente a partir da disposição dos “núcleos” familiares em cada sítio. Lembrando que as famílias descendem também um ancestral comum, então todos são parentes, mas não foi possível identificar quem era o ancestral. Todos sabem que são parentes, muitos Alexandre‟s casaram com Vieira‟s e com Mariano‟s, por outro lado, eles delimitam bem a qual família pertencem.

2.2.1Sítio Estrela

Os moradores do sítio Estrela são em sua maioria descendentes de três troncos familiares: Alexandre, Vieira e Félix. Os moradores que não são descendentes dessas famílias moram há mais de 40 anos na comunidade. São famílias que compraram ou herdaram a terra ou trabalhadores que vieram de outros lugares para trabalhar nas fazendas ao redor e tiveram como indenização aquela parte de terra.

2.2.1.a Família Alexandre

A família Alexandre descende do Sr. Balbino Alexandre. Sr. Balbino casou-se com a senhora Maria Ana e teve nove filhos. Dos nove, dois filhos saíram da comunidade ainda jovens. Os sete restantes, Calmo, Pedro, Manoel, Sebastião, Luiza, Maria e Inês viveram e ainda vivem na comunidade. Dois já morreram, mas seus descendentes vivem na área correspondente aos seus pais. A área de terra deixada por Sr. Balbino para os filhos foi dividida em partes para cada um. Cada

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filho possui uma “parte”4

em que construíram suas casas e os seus descendentes podem construir também.

O filho Calmo teve cinco filhos, 4 mulheres e um homem, todos estão casados. As três filhas mulheres moram em casas construídas próxima a dele, o filho mora perto da casa dos sogros, também na comunidade. Logo após a de Sr. Calmo está a casa de Dona Inês. Ela casou e teve quatro filhos, dois homens e duas mulheres, apenas um é casado. Todos, inclusive o casado com sua família, moram com ela na mesma casa. Ao lado da casa de Dona Inês, está a casa de Dona Maria, que não casou, sempre morou com os pais, mas criou a filha de um primo e mora com ela e seus dois filhos. Depois da casa de Dona Maria há a parte do Sr. Manoel, já falecido, mas que teve seis filhos, cinco filhas e um filho, todos casados. O outro filho, Sr. Sebastião, teve sete filhos, cinco filhas e dois filhos. Cincos são casados, quatro moram na comunidade e um em São Paulo. A última parte é a do Sr. Pedro, que teve sete filhos, todos casados morando na comunidade. A filha de Sr Balbino, Luiza, já falecida, não casou mas criou um filho que mora em São Paulo.

2.2.1.b Família Vieira

A família Vieira Outro grupo familiar é o descendente da Senhora Maria Vieira, que casou-se com o Sr. Joaquim Félix e teve oito filhos, sete filhas e um filho. Dos oito, duas casaram-se e ainda vivem na comunidade. Os outros foram para outras cidades. Das duas filhas que ficaram na comunidade, uma é Dona Ciliu, casada com Sr. Pedro filho de Sr Balbino, a outra já falecida é Dona Turreco que teve onze filhos.

2.2.1.c Família Mariano

A família Mariano é a menor em Estrela. Os moradores são descendentes de D. Joaninha que casou-se com o Sr. João Mariano e Tiveram apenas uma filha. Esta filha, D. Téta, casou-se com Sr. Miguel. Eles tiveram seis filhos, cinco mulheres e um

4 Os habitantes de Estrela usam o termo “parte” para designar a área de terra deixada pelo pai de

herança para cada filho. É na parte de cada um que seus descendentes podem construir as casas e fazer algum roçado.

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homem. Três filhas vivem em São Paulo, os outros três são casados e moram na comunidade.

Como mencionado anteriormente, cada descendente das famílias vivem na “parte” deixada por seus pais. Atualmente com o crescimento da população essa regra não está sendo rigorosamente seguida tendo em vista que não há espaço suficiente para a construção de casas. A maioria dos moradores só possui o espaço da sua casa e o terreiro. No desenho abaixo é possível visualizar as casas dos descendentes de cada família.

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2.2.2 Sítios Imbaúba e Gejuíba

No sítio Imbaúba vive a família Nogueira. Os Nogueiras tem parentesco com as famílias Vieira e Alexandre de Estrela. São poucos os descendentes que vivem no sítio atualmente, apenas o Sr. João Nogueira e seus filhos e alguns dos seus sobrinhos filhos de sua irmã já falecida. Os outros moradores de Imbaúba são, do mesmo modo que em Estrela, pessoas que compraram a terra. A família de D. Luzinete, por exemplo, veio trabalhar nas fazendas e receberam a terra que vivem do fazendeiro para o qual trabalhavam.

O mesmo acontece no sítio Gejuíba. Há uma família mais numerosa que veio do estado de Alagoas e se estabeleceu naquele sítio. Há também outras pessoas que chegaram recentemente por conta da compra de terras ou indenizações que receberam de fazendeiros para quem trabalhavam.

É importante frisar que quando menciono o fato de algumas famílias que moram nos sítios não serem do tronco familiar de Estrela ou terem vindo de outros lugares e se estabelecido na comunidade, seja por compra de terras ou indenizações recebidas, não quero dizer que são moradores novatos, pois esse processo de novos moradores aconteceu há no mínimo quarenta anos.

As famílias de Estrela são formadas geralmente por pai, mãe e filhos pequenos ou adultos e solteiros como a família do Sr. Tião que mora com a esposa e duas filhas. Outras famílias são formadas por mães e filhos como a de Ivanilda e D. Sônia que não são casadas e moram com seus filhos. E há as famílias composta por pai, mãe, filhos solteiros e casados, noras e/ ou genros e netos, como o caso de D. Inez que mora com o esposo, três filhos solteiros, um filho casado, sua esposa e sua filha.

O número de casas aumentou muito nos últimos anos e a comunidade não tem mais espaço para construir as casas pelo que se observa o aumento no número de famílias extensas, ou seja, os filhos se casam e continuam morando com os pais. Geralmente é a mulher que vai morar na casa da família do marido, como alguns casos de mulheres da comunidade que casaram com membros de outras

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comunidades, e foram morar lá, como também de pessoas de outras comunidades que vieram morar com na casa das famílias dos seus maridos em Estrela.