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[O menino coloca o ouvido junto da boca do Dragão, apurando a atenção e olhando para o público].

VINÍCIUS-MENINO TRADUTOR –Entendi! O nome dele é João Lumiar.

MENINO GUERREIRO JOÃO [Com intimidade]

– João Lumiar, você ajuda a gente a atravessar a Floresta do Fogo?

[O Dragão concorda com um aceno de cabeça e sons guturais. A Labareda que está ao seu lado entrega as fitas coloridas que saem da cabeça do Dragão nas mãos de cada Menino Guerreiro. Com esse gesto, firma-se o pacto de amizade com o bicho. As outras crianças se aproximam e todos seguem em fila dançada, marcada pelos pés, atrás do Dragão, que conduz e é conduzido com alegria pelas crianças em voltas sinuosas pela Floresta do Fogo. O Viajante, junto de Aurora-Aninha , observa tudo, acompanhando o ritmo do Dragão em seu tamborzinho. A música desse pacto de amizade é cantada com palavras-estalos e pulos pelo Dragão e pelo grupo de crianças:]

Tac-tapac-papa Tac-tapac-papa Tac-tapac-papa Fogo! Tac-tapac-papa Tac-tapac-papa Tac-Tapac-papa Fogo! Tac-tapac-papa Tac-tapac-papa Tac-Tapac-papa

[Depois de três voltas no palco, o Dragão vai embora. Os meninos param na saída do palco e despedem-se do bicho, com saudades].

CRIANÇAS

– Até logo, João Lumiar!

[Após a saída do Dragão, a Labareda que o conduzia volta com seus movimentos ondulantes e leva as crianças a formarem uma fila que gira numa espiral decrescente até estarem sentadas à sua volta, no meio do palco. As outras duas Labaredas voltam e se agrupam formando a Fogueira. Movimentando seus braços com tecidos esvoaçantes, amarelos, vermelhos e laranjas, a Fogueira crepita para a surpresa e encantamento das crianças à sua volta. Elas reconhecem o que veem].

CRIANÇAS [Com euforia]

– Olha! É uma fogueira. Aqui em volta está quentinho. Afasta, pode queimar! Olha que bonita aquela fagulha.

A Onça e o Fogo

ÍRIS

– Pronto, conseguimos fazer uma fogueira.

FELIPE

[O Viajante senta com o grupo em torno da Fogueira, com o tamborzinho de Aurora-Aninha nas mãos].

VIAJANTE

– Vocês estão em volta do fogo que arde. O que germina arde, o que arde germina, como as plantas e as ideias19. Querem saber a história de como surgiu o Fogo?

CRIANÇAS [Entusiasmadas] – Queremos!

[A cabeça de uma onça aparece, no fundo do palco, entre as dobras da cortina preta, sem que os meninos vejam. Ela observa de longe o que acontece em volta da fogueira. O Viajante, com uma voz pausada, marcada de toques de tambor, conta a história].

VIAJANTE

– Era uma vez uma floresta. A floresta é a casa dos índios. Nessa floresta, moravam muitas tribos de índios. Um dia, um índio de uma dessas tribos avistou, em cima de uma palmeira alta da floresta, um ninho de araras e resolveu pegar algumas de suas penas para fazer um cocar para enfeitar sua cabeça. Ele estava com seu pequeno cunhado, o irmãozinho de sua mulher. O curumim pediu para ajudar a pegar as penas, pois queria ganhar algumas penas de recompensa. Trato feito, eles pegaram palhas e fizeram uma escada. O curumim subiu lá no alto, pela escada de palha até chegar ao ninho das araras, mas não tinha nenhuma lá dentro, somente três ovos. O curumim gritou lá de cima: “Cunhado, aqui só têm ovos”. O índio respondeu: “Então, joga os ovos!” O menino, então, jogou os ovos, mas os ovos eram encantados e se transformaram em pedras e machucaram o índio. O índio ficou muito zangado com o menino, ficou cego de raiva, porque pensou que o curumim tinha jogado as pedras de propósito. Por isso, puxou a escada de palha e deixou o menino lá em cima da palmeira bem alta de castigo, sem que pudesse descer, e voltou para a sua tribo. O curumim, então, ficou muitos e muitos dias lá em cima da palmeira, no sol, na chuva, no vento, recebendo cocô de passarinho na cabeça, com sede e com muita fome. Um dia, ele sentiu um vento de mudança e prestou atenção naquilo. Olhou lá pra baixo e viu um vulto amarelo e pintado: era uma onça. Um Onça, ele verificou, pois carregava arco e flecha e outros apetrechos como os índios de sua tribo. O menino ficou com muito medo e, de tanto medo, não conseguiu gritar. O Onça farejou, farejou e viu no chão a sombra do menino. Olhou para cima e disse: “Menino, você está aí em cima magro e triste, sem conseguir descer, não é? Eu vou te ajudar”. O menino ficou com mais medo, mas este era o único jeito de sair dali, de cima daquela palmeira tão alta, então concordou. O Onça rapidamente consertou a escada, jogou lá em cima da palmeira e o indiozinho desceu. Então, disse ao menino: “Curumim, sobe nas minhas costas que vou te levar pra minha casa, lá, vou te dar uma carne assada bem gostosa para você comer. “Assada? O que é assada?”– perguntou o menino. O Onça não respondeu. Ofereceu suas costas para o menino subir. O menino subiu e seguiram para a casa do bicho. Quando chegaram na toca, o curumim viu logo na entrada, um toco de pau com um brilho diferente por dentro, da cor do pôr do sol. O Onça, então, pegou uma varinha e futucou o brilho, que era a brasa, e o fogo subiu alto, bonito, como este aqui que vocês estão vendo.

[O Viajante aponta para a fogueira, e as crianças começam a aquecer as mãos, olhando encantadas para as labaredas que dançam].