• Nenhum resultado encontrado

5. O CAMINHO ESCOLHIDO

5.1 OS PASSOS A SEREM SEGUIDOS

A adoção das supracitadas direções para a pesquisa levou-nos à utilização da abordagem qualitativa que, segundo Bogdan e Biklen (1994, p. 47-50), caracteriza-se pelos seguintes aspectos básicos:

1- na investigação qualitativa, a fonte direta de dados é o ambiente natural, constituindo o investigador o instrumento principal. Sendo assim, para a realização do presente estudo, optamos por manter um envolvimento com o ambiente pesquisado, o que nos permitiu rever a história e seus principais pontos e, a partir disso, analisar e avaliar as propostas elaboradas;

2- a investigação é qualitativa é descritiva. Buscamos reunir o maior número possível de dados do objeto estudado, com vistas a melhor compreendê-lo e analisá-lo;

3- os investigadores qualitativos interessam-se mais pelo processo do que simplesmente pelos resultados ou produtos. Os documentos orientadores das políticas, o contexto internacional e nacional da educação especial/inclusiva serão também objetos de análise;

4- os investigadores qualitativos tendem a analisar os seus dados de forma indutiva. A direção da análise dos dados foi concebida com os indicadores

principais advindos dos próprios dados. Não houve um caminho fechado a ser seguido; pelo contrário, um caminho aberto que foi sendo contornado conforme os indicadores iam emergindo dos dados coletados, do processo vivido;

5- o significado é de importância vital na abordagem qualitativa. Os sujeitos da pesquisa trazem consigo seus significados e, na formulação, implementação e avaliação das políticas públicas da qual são participantes, deixam seus significados; são, portanto, agentes determinantes do processo. É necessária a identificação desses sujeitos, bem como de suas contribuições no processo.

Seguindo tais características, durante a realização desta pesquisa, o processo das políticas públicas de educação especial/inclusiva no município estudado foi um fator que predominou nas minhas buscas e olhares.

Para clarificar o que entendemos de avaliação, trazemos o conceito trabalho por Belloni, Magalhães e Souza (2007, p. 15):

O conceito de avaliação, aqui adotado, refere-se à análise de processos e de produtos ou resultados de uma atividade, fatos ou coisas. Está construído tendo como objeto de avaliação, primordialmente, instituições ou políticas. Nesse caso, contempla a atividade a ser avaliada de um modo global, a saber: os processos de formulação e desenvolvimento, as ações

implementadas ou fatos ocorridos, assim como os resultados alcançados, histórica e socialmente contextualizados. Não se trata, desse modo, apenas

do exame comparativo entre o proposto e o alcançado. Esta metodologia, que aprecia o grau de consecução de objetivos e metas pré-definidos, é considerada insuficiente, pois não possibilita a contextualização da atividade ou fato, seja de sua formulação e implementação, seja de suas consequências e implicações (grifo dos autores).

Assim sendo, esta pesquisa enfoca a análise da formulação, implementação e resultados da política de educação especial/inclusiva no município de Vila Velha/ES. E, para isso, solicitamos permissão para desenvolver a pesquisa no Núcleo de Educação Especial do respectivo município, tendo contato com os documentos a serem analisados, com parte das pessoas a serem entrevistadas, e com espaço e o processo a ser estudado.

Percebemos que essa opção metodológica pode contribuir para o avanço na maneira de entender a realidade vivida pelo pesquisador. Investigações dessa natureza possibilitam a busca, a descoberta e a interpretação dos fatos, valorizam a

indução e levam em conta os componentes de uma situação em suas interações e influências. No decorrer dos nossos estudos, como instrumentos de coleta de dados, utilizamos concomitantemente a observação participante, entrevistas, questionários, análise de documentos, informações resultantes de reuniões, encontros e conversas informais. Alguns dos participantes são: Secretário de Educação, Superintendente de Educação, Técnicos do Núcleo de Educação Especial, Técnicos dos diversos setores da Secretaria Municipal de Educação, Professores de Educação Especial e do Ensino Regular, Diretores e Pedagogos da rede de ensino.

Para o desenvolvimento dessa pesquisa, optamos pela combinação de duas vertentes de dados: qualitativa e quantitativa. Quanto às informações quantitativas, foram considerados, em relação ao campo de investigação: dados censitários, dados educacionais, registros numéricos das ações de implementação da própria política conforme ações propostas, cronograma de formação, números de professores, de alunos, de escolas, dentre outros. Em relação às informações qualitativas, foi utilizada a proposta da análise de conteúdo documental, por meio dos documentos orientadores, do projeto geral, dos materiais subsidiários à política e dos relatórios.

Dados primários

a) Entrevista semiestruturada. Foi utilizada a entrevista semiestruturada com o objetivo de perceber quais concepções que os sujeitos tinham sobre o contexto da política nos seguintes eixos: formulação, implementação e avaliação. “[...] a entrevista é utilizada para recolher dados descritivos na linguagem dos próprios sujeitos, o que permite ao investigador desenvolver intuitivamente uma ideia sobre a maneira como os sujeitos interpretam o mundo” (BOGDAN; BIKLEN, 1994, p. 134). Foram entrevistados: Secretário Municipal de Educação (2); Superintendente Municipal de Educação (1); Superintendente Administrativo (1); Técnicos de diversos setores (educação infantil, ensino fundamental) da Secretaria Municipal de Educação (2); Técnicos do Núcleo de Educação Especial (7); Diretor Escolar (2); Professor de Educação Especial (2).

Ressaltamos que, para garantir a preservação da identidade dos entrevistados, quando se tratar de secretário de educação, superintendente

administrativo, superintendente de educação, estes serão todos identificados como gestores municipais; para os técnicos dos setores da secretaria, usarei o termo técnico da secretaria para identificá-los; para os técnicos que atuam no Núcleo, estes serão identificados como técnicos do Núcleo; e com os demais entrevistados, usarei as próprias denominações: diretor, professor de educação especial. Senti essa necessidade, pois há alguns cargos que são ocupados por uma só pessoa. Por exemplo, Superintendente de Educação, Secretário de Educação, só há uma pessoa que responde por esses cargos. Desta forma, a sua identidade seria muito fácil de ser identificada, e temos de resguardá-la para mantermos a ética na pesquisa. Os entrevistados serão aqui tratados como secretário de educação (para os secretários de educação), superintendente (para denominar superintendente administrativo ou de ensino), profissional do núcleo (para quem atua no Núcleo de Educação Especial), profissional da Secretaria de Educação (para quem atua nos diversos setores da secretaria de Educação), ou professores, pedagogos diretores, conforme as posições que ocupam.

b) Observações diretas e indiretas: A observação nos setores ocorreu em caráter participante, mas com a pretensão de não provocar muitas alterações no comportamento do grupo observado. Considerando que o Núcleo de Educação Especial era o meu local de trabalho no momento da coleta de dados da respectiva pesquisa, não havia como fugir de ser participante. Estava presente no cotidiano do Núcleo, nas demandas do dia a dia, nas tensões que surgem naturalmente em qualquer setor de trabalho, nas reuniões, nas formações de professores, enfim, era parte integrante e participante, literalmente, do contexto da política pública.

A observação, na maior parte do tempo, ocorreu no Núcleo e nas suas atribuições (reuniões, formações, demandas...), e em outros momentos estendeu-se para outros setores (Educação Infantil, Educação Fundamental do 1º ao 4º e do 5º ao 9º ano) da Secretaria Municipal de Educação de Vila Velha, considerando e acreditando que a política de educação especial/inclusiva não pertence e não ocorre somente dentro do Núcleo, mas nos demais setores que compõem a Secretaria de Educação.

O período da observação participante aconteceu no decorrer dos meses de maio a dezembro de 2008. Foi um dos momentos mais difíceis, pois não me era possível ser pesquisadora o tempo todo, visto que precisava me investir da postura de profissional que ali trabalhava. Por outro lado, por que não ser pesquisadora no próprio local de trabalho?

Em minha experiência, vivenciei situações em que o lado pesquisadora falava mais alto; em outras, era o lado profissional que se sobrepunha. Ora aproximava, ora distanciava, tentando manter uma postura analítica de quem observa, devido à necessidade de evitar tomar partido em algumas situações um pouco mais tensas que são frequentes nos espaços em que a política é formulada. Por mais que eu tentasse manter um certo distanciamento nessas horas, reconheço que, por muitas vezes, não consegui, e parte da minha escrita no projeto de dissertação tem presente estas influências que tomam conta do pesquisador, influências compartilhadas com o grupo de trabalho envolvendo alegrias, tristezas, solidariedade, união, decepção mas, sobretudo, a crença na pesquisa, na Universidade, com a certeza de que cada momento, seja ele de sorriso ou choro, valeu a pena. Cada momento fez, faz e sempre fará parte dos espaços que são responsáveis pela formulação e implementação de políticas, pois representam os contextos da política em ação; é a política nua e crua. E foi essa política viva que observei e que muito veio a contribuir para a análise e o fechamento deste trabalho. Sei que, por um lado, muitos acharão desnecessárias estas palavras; por outro, estou aqui a falar de política! E esses são alguns dos contextos que a envolvem.

c) Pesquisa documental: “Estamos a falar de coisas como memorandos, minutas de encontros, boletins informativos, documentos sobre políticas, propostas, códigos de ética, dossiês, registros dos estudantes, declarações de filosofia, comunicados à imprensa e coisas semelhantes.” (BOGDAN; BIKLEN, 1994, p. 180). Nesta perspectiva, analisamos: CIs (Comunicação Interna); no âmbito federal, coleta de dados estatísticos, documentos orientadores da política de educação especial/inclusiva, legislação, documentos produzidos pela SEESP/MEC; no âmbito municipal, ofícios para diversos segmentos; Pautas e Atas de reuniões; Documento

Orientador do Núcleo das Políticas de Educação Especial/Inclusivas; Plano Municipal de Educação etc.

d) Questionário. Foi utilizado com o intuito de tentar captar o discurso próprio do sujeito, para que possa ajudar a analisar o contexto/processo de questões pertinentes à política estudada. “[...] as grelhas de entrevista permitem, geralmente, respostas e são suficientemente flexíveis para permitir ao observador anotar e recolher dados sobre dimensões inesperadas do tópico do estudo” (BOGDAN; BIKLEN, 1994, p 108). Participaram dessa dinâmica: diretor escolar (10); professor de sala regular (30); professor de educação especial (20) e pedagogos (10). Nesse processo, optei por não solicitar aos participantes que se identificassem com seus nomes nos questionários, e sim, só com suas funções: se era diretor, pedagogo, professor de sala regular ou professor de educação especial. Acredito que, assim, o entrevistado tenha ficado mais à vontade para escrever sua opinião, sem o receio de ser identificado posteriormente.

Dados secundários

Os dados secundários foram compilados a partir de três fontes distintas: 1) dos formuladores e executores, por meio da produção de documentos oficiais e relatórios gerenciais de formulação, execução e acompanhamento da política em questão; 2) dos órgãos ou instituições, por meio da produção de estudos e estatísticas sociais, econômicas, demográficas e educacionais relacionadas à política examinada, indicadores de matrícula obtidos pelo Censo Escolar INEP/MEC; 3) de estudos relacionados ao objeto de avaliação, contemplando artigos acadêmicos produzidos no âmbito das instituições de educação superior.

Em relação ao horizonte de abordagem na investigação educacional, ressaltamos um posicionamento que perpassa toda a dinâmica metodológica da pesquisa, que trata a investigação em política educativa como:

[...] um terreno de luta no qual o contexto político actual exerce uma influência poderosa: é insuficiente pensar a metodologia como apenas preocupada com procedimentos técnicos e com as narrativas mais amplas [...] reflectem escolhas que se baseiam na orientação da investigação sobre política, que por sua vez influencia o tópico e as fontes (OZGA, 2000, p. 201).

Concordamos com Muller e Surel (2002) quando destacam que em pesquisa, exige-se uma postura investigativa que se mantém a distancia de dois extremos – impasses teórico-metodológicos – na compreensão da ação pública: o primeiro considera que somente se está na presença de uma política pública quando as ações e as decisões estudadas formam um todo coerente, o que jamais acontece; o segundo nega qualquer racionalidade da ação pública, em função das incoerências que ela mesma manifesta. A saída para esta dificuldade reside em colocar a análise à luz das lógicas de ação e em ação às lógicas de sentido do processo de implementação, levando-se em conta a intenção dos formuladores da decisão política e os processos de construção de sentido na prática do desenvolvimento da ação pública.

Não se trata, portanto, de examinar comparativamente o proposto e o realizado, ou seja, constar o simples atingimento ou não das metas estabelecidas em uma política ou plano. Há de se ter em vista que a avaliação deve subsidiar o processo de formulação e implementação de uma política e, portanto, oferecer elementos para o sistemático aperfeiçoamento das atividades da área (BELLONI, MAGALHÃES e SOUZA, 2007, p. 86-87).

Retomando, portanto, podemos dizer que a formulação e a implementação de políticas públicas constituem-se eixos centrais para sua análise. Nesse sentido, utilizaremos as seguintes definições apresentadas por Castro (1989, p. 3):

Formulação: refere-se à escolha de uma determinada política, a partir de princípios que fundamentam o seu conteúdo, indicando os “valores” embutidos nos objetivos pretendidos com a sua execução; neste âmbito é importante perceber a dinâmica do processo decisório, permeada por „constantes barganhas, pressões, contrapressões, e não raro por definições do próprio objeto das decisões. [...] Questões relacionadas à formação da agenda governamental, tipo de processo decisório, mecanismos de participação política, centralização/descentralização, mecanismos de captação de recursos, relações entre o Estado e o setor privado, critérios quanto à destinação de recursos, hierarquização de programas, seletividade x universalização dos benefícios, estão entre as principais dimensões que devem ser avaliadas no processo de formação das políticas sociais [...]. Implementação: [...] diz respeito aos problemas surgidos durante a implementação ou execução de políticas. Constrangimentos buracrático- administrativos, institucionais e econômicos podem obstaculizar os objetivos previstos e desejados com a implementação de uma dada política [...]. Avaliação: [...] é o instrumento de análise mais adequado para sabermos se uma política está sendo implementada, no sentido de observar criticamente a distancia entre as consequências pretendidas e aquelas efetivadas, detectando as disparidades entre metas e resultado [...].

Apoiaremo-nos nessas definições ao analisarmos os dados coletados, buscaremos compreender os movimentos das políticas públicas de educação especial nestas três etapas da política. Vale ressaltarmos que a avaliação será aqui tratada não como forma de julgamento se determinada política deu certo ou errado; pelo contrário, nosso objetivo é de compreender o processo, observar as mudanças, e apresentar os resultados obtidos, realizando uma ligação com os seguintes eixos vinculados aos direitos: o acesso, a permanência do aluno deficiente na rede regular de ensino, bem como a qualidade do ensino.