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Os precatórios no Direito Tributário: compensação e garantia em

Após todas as explicações necessárias, especificando pontos importantes como a definição de precatório, como ele nasce, qual seu regime de pagamento, chegamos enfim, ao tema do problema, objeto do presente trabalho de estudos.

Os precatórios atualmente são uma poderosa moeda paralela utilizada de forma comercial, gerando imensuráveis lucros para aqueles que participam de negociações financeiras envolvendo eles.

Comum hodiernamente o conhecimento da compra e venda precatorial, sendo os valores de compra muitas vezes ínfimos, motivados por todo o atraso nos pagamentos já exaustivamente mencionado. Assim, credores que perderam a esperança de receber seus títulos, acabam vendendo-os para receber qualquer valor, ou até mesmo credores que passam por dificuldades financeiras podem ser vítimas destas malfadadas transações, podendo ainda serem as principais vítimas, credores que tenham idade avançada e não vislumbrem esperar ainda mais para receber os seus valores.

Seguindo com o tema proposto, existem inúmeras tentativas de quitação de tributos mediante a compensação com precatórios. Inclusive se feita a busca jurisprudencial neste sentido, no endereço eletrônico do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (www.tj.rs.gov.br), são encontrados inúmeros recursos, os quais, em sua grande maioria, desprovidos, ou seja, não dando continuidade à esta tentativa, evidenciando o que já fora exposto anteriormente neste trabalho.

No âmbito dos regimes de pagamentos dos precatórios, quer seja pelo artigo 100 da Constituição Federal, ou pelo regime especial do artigo 97 do ADCT, são evidenciados dois momentos onde se pode encontrar regulamentação sobre o instituto da compensação. A oceânica distância entre o parágrafo nono (§9º) do artigo 100 da CF e o inciso II, do parágrafo nono (§9º) do artigo 97 da ADCT, demonstra a diferença no trato entre cidadão credor e cidadão devedor.

Enquanto credor da Fazenda Pública, o cidadão tem seus eventuais débitos tributários imediatamente compensados no momento do pagamento de seu precatório. Porém, quando se volta ao ente público, na tentativa de compensar

tributo/precatório, esbarra na necessidade de tal medida ter que partir de iniciativa do Poder Executivo, fato que, evidentemente, é raro acontecer.

A compensação no Direito Tributário, estabelecida no artigo 156, II do Código Tributário Nacional, assim estabelece:

Artigo 156. Extinguem o crédito tributário [...]

II - a compensação.

Assim, a compensação é meio hábil para extinguir as dívidas tributárias, entretanto não há legislação que evidencie e habilite os precatórios no rol de possibilidades de utilização deste mecanismo.

A compensação, seguindo o raciocínio lógico da palavra, é entendida como a extinção de determinada obrigação, onde ambas as partes têm a pagar e a receber uma da outra, assim, nada mais simples que ―compensar‖ as dívidas.

O artigo 170 do CTN assim prescreve:

Art. 170. A lei pode, nas condições e sob as garantias que estipular, ou cuja estipulação em cada caso atribuir à autoridade administrativa, autorizar a compensação de créditos tributários com créditos líquidos e certos, vencidos ou vincendos, do sujeito passivo contra a Fazenda Pública.

Parágrafo único: Sendo vincendo o crédito do sujeito passivo, a lei determinará para os efeitos deste artigo, a apuração do seu montante, não podendo, porém, cominar redução maior que a correspondente ao juro de 1% ao mês pelo tempo a decorrer entre a data da compensação e a do vencimento.

No mesmo sentido, o artigo 170-A:

Art. 170-A. É vedada a compensação mediante o aproveitamento de tributo objeto de contestação judicial pelo sujeito passivo, antes do trânsito em julgado da respectiva decisão judicial.

Com a perfeita análise dos dois artigos referidos, presentes no Código Tributário Nacional, somente poderá ser admitida a compensação quanto se

conhecer de lei ordinária que a autorize, dentro do âmbito de cada ente federativo. Assim, não há o que se falar em compensação de tributos, quer seja com precatórios ou qualquer outro meio, se não houver lei que assim o determine.

O instituto da compensação, enfim, não pode ser utilizado de forma livre. Neste sentido Sabbag (2011, p. 872) explica:

A compensação não pode ser feita ao bel-prazer do contribuinte, pois carece de lei autorizativa e, mais especificamente, de uma autorização do Poder Executivo (com respaldo naquela lei para efetuá-la). Exemplo: a Lei n. 8.383/91 (Art.66 c/c art. 39 da Lei n. 9.250/95) permite a compensação dos tributos federais com a mesma destinação constitucional ou quando arrecadados pelo mesmo sujeito ativo.‖

Assim, a questão da compensação deve ser entendida como uma situação que deve ser estabelecida em lei, não podendo, como citado por Eduardo Sabbag, ser feita ao bel-prazer do contribuinte.

Já quanto ao fato desta situação ser justa ou injusta para com o cidadão, é outra coisa, se o contribuinte, parte hipossuficiente nesta relação ante à Fazenda Pública deveria ter suas opções de compensação mais amplas, é questão a ser estudada e comentada de forma própria, em uma pesquisa que vise a garantia aos direitos deles.

De outra banda, existente e também com longínquo horizonte, a realização da garantia do crédito tributário presente no artigo 183 do Código Tributário Nacional, que assim descreve:

Art. 183. A enumeração das garantias atribuídas neste Capítulo ao

crédito tributário não exclui outras que sejam expressamente

previstas em lei, em função da natureza ou das características do tributo a que se refiram.

Parágrafo único. A natureza das garantias atribuídas ao crédito

tributário não altera a natureza deste nem a da obrigação tributária a

Assim, o particular pode buscar a entrega de determinado título que satisfaça a obrigação tributária, como poderia ocorrer por exemplo com uma hipoteca ou até mesmo um precatório. Entretanto, como expressamente mencionado no parágrafo único do artigo 183 do CTN, essa garantia não modifica a natureza tributária original, por conseguinte, uma dívida tributária permanecerá tendo esta natureza, não importa qual a espécie de bem ou título que lhe foi dado em garantia.

A doutrina, aqui representada por Sabbag (2011. p. 953) ratifica este pensamento:

Vale dizer que a natureza da exação tributária – e da obrigação a ela

correspondente – permanece incólume, ainda que a natureza da

garantia atribuída ao crédito deste gravame seja de índole não tributária.

Norteando à conclusão do entendimento deste subitem, e principalmente do tema proposto a este trabalho de pesquisa, evidentemente notório que o tema que abrange a utilização dos precatórios será sempre extremamente polêmica. Atualmente não há o que se falar em tentativas de compensação ou garantia de execução fiscal mediante a utilização deles, basta acessar o acervo jurisprudencial dos Tribunais de Justiça em busca de informações acerca da compensação, como por exemplo o extraído do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:

Ementa: AGRAVO. APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO TRIBUTÁRIO. AÇÃO DECLARATÓRIA. COMPENSAÇÃO DOS DÉBITOS DE ICMS COM CRÉDITOS DECORRENTES DE CESSÃO DE CRÉDITOS DE PRECATÓRIOS, ORIGINADOS DE AÇÕES CONTRA O IPERGS. IMPOSSIBILIDADE. ART. 78, § 2º, DO ADCT. NECESSIDADE DE LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL. REVOGAÇÃO DA LEI ESTADUAL Nº 11.472/00 E DO CAPÍTULO IV DO TÍTULO IV, ABRANGENDO O ART. 134, "CAPUT" E PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI Nº 6.537/73, PELA LEI ESTADUAL Nº 12.209/04. Não é possível a compensação de crédito de ICMS com débitos de precatórios devidos pelo IPERGS, obtidos mediante cessão de direitos creditórios, observada a natureza diversa das parcelas, bem como a diversidade de credor e devedor, além de implicar quebra na ordem cronológica de pagamentos, não se tratando de créditos oriundos do mesmo sujeito passivo. Precedentes do TJRGS, STJ e STF. Não auto-aplicabilidade do art. 78, § 2º, do ADCT, diante da necessidade de legislação infraconstitucional. Ausência de fundamento legal, observada a revogação da Lei Estadual nº 11.472/00, que autorizava a utilização de precatórios para a compensação de créditos inscritos

em dívida ativa, bem como do Capítulo IV do Título IV, abrangendo o art. 134, "caput" e parágrafo único, da Lei nº 6.537/73, relativo à compensação, pela Lei Estadual nº 12.209, de 29/12/04. Inaplicabilidade da EC 62/09. Agravo desprovido. (Agravo Nº 70062235080, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Carlos Eduardo Zietlow Duro, Julgado em 30/10/2014)

Assim, a questão sempre partirá da premissa já estudada anteriormente: para poder ser exigida a compensação com precatórios, necessária a existência de legislação que a autorize, não havendo outro modo para proceder.

Por mais que esta situação parece vir em prejuízo do cidadão, há que se concordar que a mesma é uma proteção benéfica, pois se fosse aceita a compensação, em que pese estar diminuindo a ―babilônica‖ dívida do ente público das condenações judiciais, estar-se-ia ferindo a ordem de pagamento dos credores, fazendo com que devedores do Estado acabassem por receber seu crédito decorrente de precatório antes dos demais, que agonizam por muitos anos no aguardo do recebimento de seus créditos.

Destarte, certo que se tem que pensar numa solução para a quitação dos precatórios, mas aceitar o instituto da compensação, pura e simplesmente, não seria a melhor hipótese.

CONCLUSÃO

A execução partida do privado em face da Fazenda Pública, não segue os procedimentos normais das execuções. A partir do momento que o particular se insurge contra o Poder Público judicialmente, eventual questão vencida irá gerar a indenização mediante o surgimento das RPVs ou dos precatórios, diferenciados pelo seu montante, cada um tendo seu regime de pagamento.

No que tange ao precatório, a sua já conhecida morosidade no adimplemento é tema controverso, gerador de polêmicas e revolta de seus credores. A promulgação das Emendas Constitucionais nº 30/00 e nº 62/09 trouxe diversas mudanças no regime dos pagamentos, e, de certa forma, levando privilégios ainda maiores para a Fazenda Pública.

Neste sentido, a intenção do presente foi uma análise, passo-a-passo, verificando de forma individual cada modificação trazida pelas referidas emendas, inclusive demonstrando que ambas foram alvo de Ações Diretas de Inconstitucionalidade, evidenciando assim a natureza inconstitucional de vários itens exposto, que assim foram julgados e removidos haja vista a sua inconstitucionalidade.

De forma mais superficial, importante também o destaque para o regime especial de pagamentos presente no artigo 97 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. A criação de conta especial para adimplir parceladamente os precatórios vencidos e vincendos, juntamente com a abertura da possibilidade de pagamento em até 15 anos, trouxe à baila maiores discussões e repercussão quanto ao referido regime, uma vez que pretendeu atrasar ainda mais

os pagamentos dos precatórios que já se encontravam em enorme atraso. Partindo deste entendimento é que tal regime partiu da emenda com a alcunha ― Emenda do Calote.‖

Diante de tamanhas dificuldades em receber os valores oriundos dos precatórios, partiu-se então para uma nova tentativa: a quitação de tributos mediante a compensação com precatórios. O que ocorreu aqui, foram que estas tentativas esbarraram na necessidade de o ente devedor legislar sobre este tema, assim, somente partindo por iniciativa dele a compensação poderia ocorrer, fato que pela sua simples natureza, é sabido, não irá ocorrer.

Por conseguinte, foi visto que apesar de o cidadão credor ser a parte mais frágil nesta relação com a Fazenda Pública e sofrer diversas penalidades indiretas com os instituídos regimes de pagamentos (alguns removidos pelas ADIns), não há o que se falar em quitação de tributos mediante a compensação com precatórios, pois não há lei específica que regule o tema de forma geral e apenas seria possível com a implementação de legislação infraconstitucional por iniciativa do próprio ente devedor.

Assim, a lei é precisa ao demonstrar de forma simples os requisitos para a habilitação do instituto da compensação, devendo ser esta a regra, não existindo melhores juízos. O perigo é que eventual criação de lei geral que permita a compensação, ao invés de promover maiores e melhores garantias ao cidadão credor de precatórios, possa abrir precedentes para a criação de uma máfia comercial de compra e venda de precatórios, agindo de forma natural em nossa sociedade.

REFERÊNCIAS

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