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Na condição vivida pelo Brasil colônia, no período que vai do século XVI ao século XVIII, o ensino só era visto como instrumento posto a serviço da metrópole para exploração da colônia. Deve-se entender tal situação relacionada à conjuntura econômica e política daquela época. No Brasil colônia, seria ilusão querermos encontrar nos seus primeiros dominadores algum empenho para o desenvolvimento em qualquer área, que não tivesse como objetivo garantir à metrópole a acumulação mercantilista pois este era o princípio norteador da política colonialista portuguesa.

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Para que a metrópole pudesse manter o processo de exploração da colônia, guiado pela doutrina mercantilista, foi montando um eficiente aparelho repressivo, acompanhado por outro aparelho ideológico que, na época, se fazia presente nas ações dos integrantes da Igreja Católica. A atuação deste aparelho se fez sentir na difusão das ideologias que legitimavam a exploração colonial, reforçando a aceitação do domínio mediante o reconhecimento do rei de Portugal e até no trabalho intencional de ressocialização do índio para transformá-lo em força de trabalho escravo,(Cunha, 1980)

Neste contexto aparecem nitidamente relações entre a ideologia de dominação colonialista e a ação da igreja, contrariando os princípios cristãos que eram a matriz da confessionalidade católica.

Embora no início do período de colonização várias ordens religiosas estivessem empenhadas no trabalho missionário, a Companhia de Jesus destacou-se em número de missionários e pela organização de seu sistema educativo. A principal atividade no Brasil era a catequese dos índios. A Companhia de Jesus, além desta missão, mantinha nos centros urbanos um sistema de ensino que garantia a força de trabalho necessária para o serviço missionário e em seus colégios também se formavam em situação de privilégio, os quadros para o aparelho administrativo e repressivo, pois lá estudavam os servidores do estado para os mais diversos cargos da administração da colônia a serviço da metrópole. Da mesma forma, nos cursos superiores freqüentados pelos filhos dos proprietários de terra e de minas e mesmo por reinóis residentes na colônia, beneficiavam-se os ilustres da classe dominante.

A Companhia de Jesus com todas essas ações organizou um sistema de ensino cujo conteúdo satisfazia à cultura das elites dominantes e atendia à demanda que a eles interessava.

O trabalho educativo dos jesuítas tinha como a missão inicial a catequese e a conversão dos índios, mas esta missão foi perdendo importância e intensidade na medida em que o trabalho promovido pelos colégios, através do método pedagógico próprio, sistematizado na Ratio atque Instituto Studiorum Societas

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do sistema educacional na colônia.

O conteúdo da Ratio Studiorum refletia toda ideologia do cultivo da autoridade e o ensino jesuítico soube adaptar-se, à realidade local. Assim, o curso de humanidades com duração de 2 anos realizado em latim, substituiu o grego e o hebraico pelo tupi-guarani, visando a utilização desta língua pelos missionários a serem formados.

O curso de artes abrangendo as ciências naturais e a filosofia com duração de 3 anos, era considerado como um curso superior, pois conferia graus de bacharel e licenciado e formava os que exerciam o magistério.

O curso de teologia com duração de 4 anos, conferia o grau de doutor. Tinha com base as matérias de teologia moral abordando casos e teologia especulativa de natureza dogmática. Todos os cursos, elementares e humanidades funcionavam em colégios para alunos externos e nos seminários estudavam alunos internos. Os cursos com alunos internos eram freqüentados também por jovens que não pretendiam ser sacerdotes. A confessionalidade cristã-católica estava integrada à cultura da época e era considerada como a religião oficial e como tal referendava a formação das elites.

Os cursos de artes atuavam como o propedêutico para a universidade, e estavam abertos para atender à demanda externa formada por jovens que pretendiam se ilustrar. Um testemunho, escrito na obra de Serafim Leite, retrata o quanto o ensino jesuítico servia à elite:

“ A freqüência dos Colégios era constituída por filhos de funcionários públicos, de senhores de engenho, de criadores de gado, de oficiais mecânicos e, no século XVIII, também de mineiros, o que representava no Brasil a nobreza e a burguesia européia, embora estas duas denominações sejam um tanto fictícias transportadas ao Brasil dos primeiros séculos” (Cunha,1980:218).

Dada a disciplina cultivada dentro de padrões militares, os jovens que freqüentavam os colégios jesuítas tinham o privilégio de não serem recrutados à força para o serviço militar, como acontecia com outros colégios.

O primeiro colégio jesuíta onde funcionaram os curso de artes e teologia foi o da Bahia, em 1572, sendo interessante se observar que em todos os cursos, no colégio da Bahia, ao menos num dado colhido do ano de 1589, a maioria dos

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estudantes eram “de fora” os quais não estariam se preparando para o sacerdócio. Mesmo no curso de teologia, de 15 estudantes, apenas 4 eram “de casa”.

Apesar de todos esses aspectos os cursos superiores do Brasil, embora idênticos aos da metrópole, não gozavam do grau de reconhecimento igual aos da metrópole. Tanto que, para prosseguirem os estudos na universidade de Coimbra, era exigido dos estudantes da colônia que repetissem o curso ou prestassem exame de equivalência. (Cunha,1980:31)

Esta situação gerou protestos que culminaram com o início de processo reivindicatório para que se concedesse aos colégios daqui os mesmos privilégios dos colégios da metrópole. Este fato pode ser destacado como o despertar de uma consciência nacional, o que já se fazia sentir no interior das ordens religiosas, na medida em que foram estabelecidas Províncias autônomas nas quais era concedido aos filhos da terra ocuparem os cargos mais importantes e igualmente os postos de destaque no ensino (Cunha,1980:31).

O movimento reivindicatório da equivalência de graus acadêmicos foi uma luta que envolveu representantes do Estado e membros da Companhia de Jesus. Neste contexto, a “questão dos moços pardos”, que não eram aceitos nos colégios dos jesuítas, foi parte dos argumentos que apoiavam o ministro de Portugal a negar o privilégio à colônia.

A Companhia de Jesus alimentava o preconceito de cor para favorecer os filhos dos brancos que freqüentavam seus colégios e este fato era tão gritante que atendendo à pressão dos brancos, assumiu uma atitude discriminatória expulsando todos os “moços pardos” de seus colégios. Nesta época era, igualmente, vetado o ingresso dos mesmos como membros das congregações religiosas.

Tal fato ocasionou uma disputa entre o Estado que subvencionava os colégios jesuítas, os quais argumentavam que estas medidas eram causadas pelo excessivo número de alunos.

A expansão dos colégios jesuítas, no século XVII em diante se deu da seguinte forma: Em 1638 o Colégio do Rio de Janeiro começou oferecer o curso de Filosofia.; Em Olinda, um colégio iniciou seus cursos superiores em 1687. No

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Maranhão o curso superior de Teologia foi oferecida a partir de l688. No Pará foi em l695 que se estabeleceu o curso superior de Artes, sendo integrado ao Maranhão pelo pequeno número de estudantes presume-se. Para São Paulo, os cursos de filosofia e teologia foram instalados em 1708. O último curso superior instituído pelos jesuítas antes da sua expulsão foi o de Mariana, em Minas Gerais, em 1750.

Podemos concluir desse período inicial do ensino superior na colônia que, dadas as circunstâncias da influência da companhia de Jesus, os cursos todos foram criados e administrados por eles e consequentemente eram instituições confessionais e pelas circunstâncias da época, era assumida como natural esta situação.

O aspecto da confessionalidade católica não se defrontava com outra alternativa, uma vez que o próprio Estado era de denominação cristã e católica.

Esta situação manteve-se com pequenas alterações até que a partir de 1750 se iniciou uma transformação no contexto da política e da economia da metrópole, que repercutiu no campo educacional também das colônias. Esta crise teve origem no fato de que Portugal ficou unido à Espanha no período de 1580 a 1640, o que lhe causou grande decadência como potência colonizadora. Posteriormente aliou-se à Inglaterra e também não conseguiu se refazer em sua economia.