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4. Da Constituição de 1946 ao início da década 1980: a consolidação e as ameaças à

4.1. Os primeiros currículos do Curso de Pedagogia

Depois da valiosa, mas logo abortada experiência da Universidade da Educação, de Anísio Teixeira, na Universidade do Distrito Federal, o curso de Pedagogia será criado, como se viu acima, pelo Decreto-lei Federal 1.190, de 4 de abril de 1939, na vigência do Estado Novo. Como as universidades e faculdades do Brasil tinham que seguir o modelo padrão da Universidade do Brasil, em todos os lugares o diploma de licenciado seria obtido com o acréscimo ao bacharelado de um ano de estudo de didática, dando origem ao famoso modelo 3+1.

A Faculdade de Educação da Universidade do Brasil, dividida em duas seções, Pedagogia e Didática, tinha o seguinte currículo obrigatório:

Quadro 1 - Currículo do Curso de Pedagogia (1939) 1º ano Complementos de matemática

História da filosofia Sociologia

Fundamentos biológicos da educação Psicologia educacional

2º ano Psicologia educacional Estatística educacional História da educação

Fundamentos sociológicos da educação Administração escolar

3º ano Psicologia educacional História da educação Administração escolar Educação comparada Filosofia da educação

Fonte: a autora 2019

Quadro 2 - Currículo do Curso de Didática (1939)

1 ano Didática geral

Didática especial Psicologia educacional

Fundamentos biológicos da educação Fundamentos sociológicos da educação Administração escolar

Os bacharéis em Pedagogia, por já terem as outras disciplinas no seu currículo, deveriam cursar apenas Didática Geral e Didática Especial para obterem o diploma de licenciatura. O currículo pleno do curso de Pedagogia, antes que a profissão de pedagogo estivesse definida, restringiu a sua função à de técnico em educação, num curso de bacharelado semelhante aos de Filosofia, Ciências e Letras. Mas também não estava constituído o campo profissional da educação para definir o papel profissional do pedagogo. Sobrava pouco espaço para seu trabalho na Escola Normal, porque a Lei Orgânica de 1946 previa um curso que privilegiava os conteúdos de cultura geral no lugar das disciplinas de caráter profissional. Assim como os outros bacharéis, também o pedagogo se tornaria professor cursando a complementação didática. E, ao mesmo tempo, os outros licenciados também podiam lecionar nas Escolas Normais. Como uma espécie de prêmio de consolação, os licenciados em Pedagogia poderiam lecionar filosofia, história e matemática nos cursos de nível médio. Isso mostra uma volta ao diletantismo, pois os professores poderiam lecionar disciplinas para as quais não foram especificamente preparados.

Por outro lado, não se abre caminho, no curso de Pedagogia, para a constituição e desenvolvimento do espaço acadêmico de pesquisas, debates, aprofundamentos sobre a própria Pedagogia, o que, possivelmente, só seria feito se houvesse preocupação e investimentos financeiros na investigação de problemas e temas da educação. O investimento nas pesquisas sobre educação deu-se em outro nível com a criação da CAPES (inicialmente “Campanha Nacional de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior”) pelo Decreto nº 29.741, de 11 de julho de 1951 (início do 2º governo Getúlio Vargas). Só a partir de 1961, com a Lei 4.02445, é que se prevê a importância da pesquisa na formação dos educadores em nível de Ensino Normal (hoje nível médio). O Artigo 52 dessa lei determina que:

O ensino normal tem por fim a formação de professores, orientadores, supervisores e administradores escolares destinados ao ensino primário, e o desenvolvimento dos conhecimentos técnicos46 relativos à educação da infância.

45 A Lei 4.024/1961 definia, no seu artigo 52, que o “ensino normal tem por fim a formação de professores, orientadores, supervisores e administradores escolares destinados ao ensino primário, e o desenvolvimento dos conhecimentos técnicos relativos à educação da infância”. No artigo 53 permitia que a formação de docentes para o ensino primário poderia ser feita até em Escola Normal de grau ginasial, com, no mínimo, quatro séries anuais, onde, além das disciplinas obrigatórias do curso secundário ginasial (séries finais do ensino fundamental), seria ministrada também preparação pedagógica. Além, é claro, da Escola Normal de Grau Colegial, em prosseguimento ao grau ginasial.

46 Entende-se que esse “desenvolvimento dos conhecimentos técnicos relativos à educação da infância” se faça pela pesquisa.

A lei continua definindo que as funções de direção, orientação, supervisão e inspeção escolar serão preenchidas por profissionais com cursos de especialização nos Institutos de Educação (antiga Escola Normal) e que tenham demonstrado experiência no ensino. Dos artigos 116 ao 118, nota-se um enfraquecimento da profissão do educador, pois dizem que “enquanto não houver número suficiente de professores primários [...], de professores licenciados em faculdades de filosofia [...], número de profissionais formados pelos cursos especiais de educação técnica [...]”, a habilitação poderá ser feita por outros profissionais liberais, ou leigos, mediante exame de suficiência.

Valnir Chagas, relator do Parecer 252/69, ao comentar o Parecer anterior (251/62) do qual ele também tinha sido o relator, dá conta desse quadro confuso em relação à formação de professores e de especialistas:

A parte relativa ao magistério normal não ofereceu maiores dificuldades, ensejando mesmo que se lançassem pressupostos para uma futura preparação do mestre primário em grau superior. A formação dos especialistas, entretanto, acabou revestindo uma fluidez que era a da própria lei. O Conselho fez então o que estava ao seu alcance: determinou uma parte comum e outra que levasse aos dois objetivos. Como não era possível determinar áreas obrigatórias de habilitação, deixou-as apenas implícitas na exigência de matérias a serem escolhidas, pelas universidades e escolas, de uma lista mais ou menos variável de opções. Esperava-se que a evolução do mercado de trabalho conduzisse ao passo imediato; mas só como exceção tal aconteceu, exatamente pela falta de validade legal da especificação que se fizesse. Isto explica muito do que hoje se pode considerar imprecisão do Parecer. A Orientação Educacional, por exemplo, foi curiosamente excluída do curso; e a duração estabelecida não apresentou alternativas ajustáveis às características do trabalho educacional, encarado em si mesmo e em função de peculiaridades regionais47.