• Nenhum resultado encontrado

3.1. Década de 1930: avanços no campo da educação

Na Era Vargas (1930-1945), inicia-se um período de centralização do poder que, apesar da Constituinte de 1934, culminará no Golpe de Estado de 1937. Getúlio, que fica no poder até

1945, diante da nova conjuntura internacional, principalmente com o avanço da indústria, assume a função de “modernizar” o Brasil. Essa modernização exigia mais educação.

O Decreto Federal 19.852/1931, elaborado pelo ministro Francisco Campos, inclui a Faculdade de Educação, Ciências e Letras na reorganização da Universidade do Rio de Janeiro, criada em 1920, definida como modelo para as universidades e institutos equiparados. Embora o ministro tenha, num primeiro momento, dado a impressão de estar criando uma escola de estudos desinteressados do ponto de vista profissional, acaba por constituir um instituto de caráter utilitário e prático, para a formação de professores para o ensino normal e secundário. O debate em relação à formação de docentes ou de pesquisadores ou outros profissionais da educação será recorrente na definição dos cursos de Pedagogia até a elaboração das atuais diretrizes curriculares. Por disputas com o Colégio Pedro II, que reivindicava o direito de formar professores, o impasse em relação à competência para tal tarefa contribuiu para tornar mais difícil a trajetória da implantação de uma política e de uma estrutura pertinentes.

Um grande salto em termos de formação do pedagogo é dado com o Decreto Estadual 4.888/1931, elaborado por Lourenço Filho (1897-1970), em São Paulo, que transforma a Escola Normal de São Paulo (Escola Normal da Praça) em Instituto Pedagógico, inspirado nas ideias da Escola Nova. As ideias educacionais fervilhavam e se transformavam em propostas concretas (como o Manifesto dos Pioneiros de 1932), nem sempre realizadas, devido aos tumultuados anos da Revolução Constitucionalista de 1932, à Constituição de 1934, ao golpe e ao Estado Novo de 1937, à Segunda Guerra Mundial, à queda de Getúlio e à Constituição de 1946 etc. que Lourenço Filho31 instituiu a Diretoria Geral do Ensino, a Inspeção Médica nas escolas, a Biblioteca Central, o Museu da Criança, o Serviço de Assistência Técnica e Inspeção Escolar. Passados apenas dois anos, pelo Decreto Estadual 5.884/1933 de São Paulo, preparado por Fernando de Azevedo, criou-se o Instituto de Educação, que se compunha de Jardim de Infância, Escola Primária, Escola Secundária, Centro de Psicologia Aplicada à Educação e Centro de Puericultura. No mesmo Instituto estava a Escola de Professores, destinada a formar professores primários (Escola Normal), dar formação pedagógica para professores secundários e especialização para diretores e inspetores (o que seria praticamente uma Escola Normal

31 Lourenço Filho foi chefe de Gabinete de Francisco Campos, então ministro do recém-criado Ministério da Educação e da Saúde.

Superior). Em 25 de janeiro de 1934, com o Decreto Estadual 6.283, criou-se a Universidade de São Paulo (USP), à qual é incorporado o Instituto de Educação, criado por Fernando de Azevedo.

Outro passo importante na formação de professores foi dado pelo Decreto 5.513, de 4 de abril de 1935, da Prefeitura do Distrito Federal, preparado por Anísio Teixeira e assinado por Pedro Ernesto do Rego Batista (1884-1942)32, que cria a Universidade do Distrito Federal33, incorporando o Instituto de Educação do Distrito Federal como um dos seus órgãos, tendo por finalidade prover a formação do magistério, em todos os seus graus (Art. 2º, alínea e). Nessa Universidade, a proposta de formação de professores ocupava lugar de destaque. No discurso de inauguração dos cursos, Anísio Teixeira diz que este seria um centro de resistência democrática. Segundo Cunha (1986, p. 277),

A universidade teria uma importante função a cumprir, a um tempo técnica e política: a de cúpula do sistema de ensino, onde se formariam e se aperfeiçoariam os professores e administradores das escolas dos graus inferiores. Assim concebida, a universidade era definida como tributária do ensino primário e médio. Ao contrário de Fernando de Azevedo, supondo possível a civilização com elites instruídas e massas ignorantes, Anísio Teixeira se apoiou no exemplo de Thomas Jefferson, um dos fundadores dos Estados Unidos da América, também criador da Universidade de Virgínia. Jefferson teria declarado, certa vez, que se tivesse de escolher entre fechar escolas de ensino primário ou escolas de ensino superior, não hesitaria em poupar as primeiras, tal era a importância atribuída à educação popular na construção da democracia.

No mesmo ano de 1935, Anísio Teixeira, acusado de ser comunista34, perseguido por Vargas, deixa a Instrução Pública Carioca35, sua universidade de educação, que será incorporada

32 Pernambucano, por imposição dos tenentes, foi nomeado prefeito-interventor do então Distrito Federal, sendo aclamado Prefeito em 1935, por ter sido eleito o Vereador mais votado do Partido Autonomista que conquistara 18 das 20 cadeiras da Câmara do DF. Com o auxílio de Anísio Teixeira promoveu a educação no Distrito Federal. 33 Sobre a Universidade do DF, consultar: http://cpdoc.fgv.br/producao/dossies/AEraVargas1/anos30- 37/RadicalizacaoPolitica/UniversidadeDistritoFederal. Acesso em: 30 nov. 2011.

34 Ligou-se o nome de Anísio Teixeira ao levante comunista de novembro de 1935. O Prefeito do Distrito Federal, Pedro Ernesto, viu-se obrigado a demiti-lo em dezembro de 1935. Depois o próprio Pedro Ernesto acabou sendo preso.

35 Em carta a Pedro Ernesto, Anísio reafirma confiar que a educação e não o uso da violência é capaz de melhorar a realidade. “Lavro contra tal suspeição o meu protesto mais veemente, parecendo-me que tem ela mais largo alcance que a minha pessoa, porque importaria em não se reconhecer que progredir por educação é exatamente o modo adequado de se evitarem as revoluções”. Reafirma seu espírito democrático, republicano e constitucional: “[...] Conservo, em meio de toda a confusão momentânea, as minhas convicções democráticas, as mesmas que dirigiram e orientaram todo o meu esforço, em quatro anos de trabalho e lutas incessantes, pelo progresso educativo

pelo governo central autoritário em 1939, resultando naquilo que educadores chamarão de utopia vetada36.

Pela Lei 452, de 5 de julho de 1937, por iniciativa de Gustavo Capanema, ministro da Educação, a Universidade do Rio de Janeiro foi novamente reorganizada, passando a se chamar Universidade do Brasil, atual Universidade Federal do Rio de Janeiro, constituída por 15 escolas superiores e 14 institutos, de maior prestígio e chamados de nacionais, dentre elas a Faculdade Nacional de Educação, instituída pelo governo autoritário de Getúlio como modelo padrão para todo o país. Esta faculdade, embora prevista em lei, não chegou a ser implantada.

Em São Paulo, o Decreto Estadual 9.269, de 25 de junho de 1938, extingue o Instituto de Educação, que é absorvido pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras37, como uma seção de Educação.

3.2. A criação do Curso de Pedagogia

No Rio de Janeiro, o Decreto 1.063, de 20 de janeiro de 1939, incorpora os cursos da Universidade do Distrito Federal à Universidade do Brasil, com prédios, professores e estudantes. E, pelo Decreto-lei Federal 1.190, de 4 de abril de 1939, a Faculdade de Educação da Universidade do Brasil é transformada em duas seções: uma denominada Pedagogia38 (curso

do Distrito Federal e reivindico, mais uma vez, para essa obra que é do magistério do Distrito Federal, e não somente minha, o seu caráter absolutamente republicano e constitucional e a sua intransigente imparcialidade democrática e doutrinária”. Íntegra da Carta a Pedro Ernesto: Disponível em: http://www.bvanisioteixeira.ufba.br/cartas/apeb.htm. Acesso em: 16 dez. 2011.

36 Universidade de educação é uma expressão usada por Saviani (2008, p. 35) para referir-se à universidade criada por Anísio Teixeira com o objetivo primeiro de formar educadores. Utopia vetada é expressão utilizada por Maria de Lourdes Fávero, citada na mesma página de Saviani, para referir-se ao decreto que vetou a proposta de Anísio, fechando sua universidade.

37 A USP surgiu em 25 de janeiro de 1934, da união da recém-criada Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras (FFCL) com as já existentes Escola Politécnica de São Paulo, Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz", Faculdade de Medicina, Faculdade de Direito e Faculdade de Farmácia e Odontologia.

de bacharelado); e outra denominada Didática, para complementar a formação pedagógica de bacharéis em outras áreas, com estudos de administração, psicologia, didática, sociologia e biologia, licenciando-os para lecionar no ensino secundário. A cisão entre teoria e prática perdurará até as atuais divisões da educação em “fundamentos” e “metodologias”, com grande dificuldade para o diálogo entre as áreas, tanto na graduação quanto na pós-graduação. Inicia- se, assim, a história dos cursos de Pedagogia no Brasil.

Grande avanço foi dado em 1938, com a criação do Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos (INEP), atual Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, por iniciativa de Gustavo Capanema, tendo como primeiro diretor Lourenço Filho. Esse Instituto torna-se peça importante na constituição de uma tradição de pesquisas para a criação de uma cultura de debates mais aprofundados nas questões pedagógicas. Em 1941, é criada a Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro e, em 1946, a Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Dos intensos debates ocorridos na década de 1930 entre liberais e católicos, debates que continuarão fortes até a promulgação da LDB de 1961, surgem, como reação da Igreja, essas universidades católicas, juntamente com a produção de material didático para orientar os estudos, principalmente na formação de professores. É a ocupação do espaço da educação pela Igreja Católica.

Para a compreensão do desenvolvimento da legislação do ensino, torna-se importante examinar as Leis Orgânicas do Ensino, preparadas por Capanema e baixadas por decretos-leis da presidência, entre 1942 e 1946. Enquanto não existe uma codificação unificada da educação, são esses decretos do governo autoritário39 que determinam os seus rumos num período denominado por Buffa e Nosella (1997, p. 93) de “Debate reprimido”.

4. Da Constituição de 1946 ao início da década 1980: a consolidação e as ameaças à