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Os princípios sócio-interacionistas permeando a aprendizagem de Inglês em CALL

CAPÍTULO 1: PRESSUPOSTOS TEÓRICOS

1.7 Os princípios sócio-interacionistas permeando a aprendizagem de Inglês em CALL

Conforme exposto na última seção, escolhemos trabalhar nesta pesquisa com o e-mail por reconhecermos que essa ferramenta pode representar oportunidades significativas de interação com comunidades multilingües, o que possibilita ao aprendiz de Inglês enxergar a língua alvo como meio de comunicação, e não como um objeto, segundo Souza (2002).

A Internet representa, de fato, uma revolução impactante na vida dos seres humanos, na medida em que derruba barreiras de tempo e espaço. O

ambiente de interação e de aprendizagem com o meio virtual ficou do tamanho do mundo. No que diz respeito à aprendizagem de Inglês, Souza (2002) defende que as interações interculturais podem representar um forte estímulo para o envolvimento do aprendiz no processo de negociações significativas de conhecimento durante as atividades de comunicação.

Os princípios sócio-interacionistas são fortemente defendidos por Vygotsky (1989). O autor afirma que a aprendizagem escolar e o desenvolvimento do ser humano em todos os níveis estão inter-relacionados. Conforme o autor, para se entender o processo de aprendizagem são necessários dois níveis de desenvolvimento, sendo o primeiro o ‘nível de desenvolvimento real’ e o segundo a ‘zona de desenvolvimento proximal’.

O nível de desenvolvimento real é o “nível de desenvolvimento das funções mentais da criança que se estabeleceram como resultados de certos ciclos de desenvolvimento já completados” (VYGOTSKY, 1989, p. 95). Em outras palavras, é o estágio cognitivo atual em que se encontra o ser humano.

O segundo nível, de caráter revolucionário na teoria vygotskiana, é o conceito de ‘zona de desenvolvimento proximal’ (ZDP), que caracteriza o nível de desenvolvimento mental em potencial “determinado através da solução de problemas sob a orientação de um adulto ou em colaboração com companheiros mais capazes” (VYGOTSKY, 1989, p. 97). Esclarecendo, a ZDP é a distância entre aquilo que a pessoa já sabe e aquilo que ela pode vir a saber em cooperação com outros seres.

Por exemplo, quando o aluno em estágio de aprendizagem interage com colegas ou outra pessoa mais capaz cognitivamente em relação ao que o aluno ainda não internalizou, a aprendizagem estimula vários processos internos de

desenvolvimento, os quais, segundo Vygotsky (1989, p. 101), uma vez internalizados, “tornam-se parte das aquisições do desenvolvimento independente da criança”. Dessa forma, podemos dizer que a ZDP é um ciclo infindável, pois a aprendizagem nunca termina, e quando a pessoa atinge o nível de desenvolvimento real, haverá outra ZDP a ser amadurecida.

Antunes (2004, p. 27) destaca que a ZDP tem uma importância social inerente a toda pessoa que aprende com outras pessoas. Para o autor, parafraseando Vygotsky, o desenvolvimento humano é totalmente social, envolvendo “interação e uma mediação qualificada entre o educador (pai, mãe, avô, avó, irmão, colega, professor) e o aprendiz”.

Complementando o conceito de Vygotsky, o autor argumenta que

A ZDP pode ser definida como a distância entre o nível de resolução de um problema (ou uma tarefa) que uma pessoa pode alcançar atuando independentemente e o nível que pode alcançar com a ajuda de outra pessoa (pai, professor, colega, etc.) mais competente ou mais experiente nessa tarefa. Em outras palavras, essa ZDP seria o espaço no qual, graças à interação e à ajuda de outros, uma determinada pessoa pode realizar uma tarefa de uma maneira e em um nível que não seria capaz de alcançar individualmente (ANTUNES, 2004, p. 28).

O autor aponta ainda que cada ZDP é diferente para cada aluno, ou seja, ela não é única para todos os aprendizes, uma vez que a mesma é amadurecida em conformidade com a tarefa e o conteúdo. No entanto, o autor advoga que “o que em uma ZDP se realiza com assistência de outra pessoa mais especializada, no futuro se realizará com autonomia, sem necessidade dessa assistência” (ANTUNES, 2004, p. 29).

Adotando os princípios sócio-interacionistas no contexto de aprendizagem de Inglês, Leffa (2005) contrasta a interação virtual com a interação presencial. Conforme o autor, a interação típica da sala de aula presencial é marcada por ciclos

que envolvem três momentos: 1) ‘elicitação’; 2) ‘resposta’ e 3) ‘avaliação’. Na elicitação o professor pergunta, na resposta o aluno responde e na avaliação, o professor reforça a resposta do aluno. A interação, na realidade, é iniciada e mantida sempre pelo professor.

No contexto virtual, a interação é fundamentalmente diferente. Conforme o autor,

[...] o sujeito é percebido nas suas relações com o objeto a ser aprendido, relação essa feita através de um instrumento de mediação. Esse sujeito não está isolado no espaço, mas situado dentro de um contexto em que interage com outras pessoas, formando uma comunidade para atingir um determinado objetivo, que é compartilhado por todos (LEFFA, 2005, p. 2).

Na interação virtual, como a própria palavra refere, o contato físico entre os alunos é ausente. No entanto, a troca de e-mails entre os aprendizes de Inglês e a professora norte-americana em nossa investigação se configura como instrumento de mediação entre o grupo. O papel do professor nesse ambiente também sofre alterações.

Se na interação presencial o professor é visto como sendo o ‘centro da interação’, no contexto virtual, em nosso caso o ambiente de aprendizagem mediado pelo uso da Internet, o professor pode assumir o papel de facilitador, visto que agora ele é procurado pelo aluno para esclarecer dúvidas quanto ao conteúdo e ao instrumento. Os princípios interacionistas no ambiente mediado pela Internet deve levar em consideração, de acordo com Leffa (2005), a interação professor-aluno, interação aluno-aluno, interação com o instrumento e, por fim, interação com o conteúdo a ser internalizado.

Discutiremos no capítulo das análises dos dados coletados, em conformidade com Freire (1992), Leffa (2005) e Paiva (1999), que na relação

professor-aluno o papel do professor é ser o ‘animador’ da interação, motivando os participantes durante as aulas; na interação aluno-aluno, os participantes se engajam com os colegas tanto presenciais quanto a distância, no desenvolvimento de um trabalho colaborativo; na interação com o instrumento, os alunos apresentam suas experiências e atitudes, às vezes negativas, em relação ao computador e à troca de e-mails; e, por fim, na interação com o conteúdo, os participantes expõem as diferenças que eles percebem ente os dois ambientes de aprendizagem de Inglês, que são a sala de aula do cotidiano e o laboratório de informática da escola.

A interação no meio virtual via e-mail permite que os alunos colaborem e trabalhem juntos com outros colegas, aprendizes ou falantes nativos de Inglês. Nas palavras de Lopes (2000, p. 30), “o trabalho em rede liberta os alunos das limitações do exercício passivo tradicional de ouvir, para uma experiência de descoberta e exploração”. Percebemos vantagens na interação eletrônica, pois neste contexto o aluno deixa de ser visto apenas como receptor de informações para assumir uma reação contrária: a de produtor de informações, podendo ele mesmo apresentar trabalhos criativos na Rede.

Finalizamos esta seção com a visão de Leffa (2005), ao esclarecer os princípios da interação em meio virtual:

O que realmente conta para o ser humano não são os instrumentos de que dispomos mas a oportunidade de interagir com as pessoas que nos cercam, seja na família, seja no trabalho, seja na sala de aula presencial ou no ambiente de educação a distância. Em casos extremos, podemos interagir apenas com o artefato, o que rigorosamente falando não seria interação mas interatividade [...]. Preferimos, entretanto, não ficar apenas no artefato, na interatividade, mas usar o artefato para através dele chegar à interação com as pessoas. A interação virtual, que no fundo é real, na medida em que sabemos que há do outro lado uma pessoa de carne e osso trocando mensagens conosco, não deve ser vista como uma versão limitada da interação face a face, mas como uma opção a mais de interação. Não é nem inferior, nem superior; é apenas diferente. Pode ser igualmente intensa e envolvente na criação de uma comunidade de aprendizagem (LEFFA, 2005, p. 9).