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OS PROCEDIMENTOS PARA ANÁLISE DOS DADOS – A ANÁLISE

3 COMPREENSÕES SOBRE A ÁLGEBRA E SEU ENSINO

4.4 OS PROCEDIMENTOS PARA ANÁLISE DOS DADOS – A ANÁLISE

Os dados coletados por meio de vídeo (imagem e som de voz), anotações do pesquisador e dos participantes da pesquisa, foram analisados minuciosamente a partir de recortes de curta duração, seguindo a metodologia de análise microgenética.

O método microgenético examina a mudança à medida que esta ocorre (FLYNN; PINE; LEWIS, 2006). Consiste em uma análise minuciosa da pesquisa por meio de recortes, não restrita apenas a processos mais evidentes, mas também àqueles que se encontram nos detalhes da interação entre sujeitos e/ou objetos, nas condições sociais da situação, aquilo que à primeira vista não pôde ser observado.

Goes (2000) define a microgenética de modo bem sucinto

Em resumo, essa análise não é micro porque se refere à curta duração dos eventos, mas sim por ser orientada para minúcias indiciais – daí resulta a necessidade de recortes num tempo que tende a ser restrito. É genética no sentido de ser histórica, por focalizar o movimento durante processos e relacionar condições passadas e presentes, tentando explorar aquilo que, no presente, está impregnado de projeção futura. É genética, como sociogenética, por buscar relacionar os eventos singulares com outros planos da cultura, das práticas sociais, dos discursos circulantes, das esferas institucionais. (GOES, 2000, p. 15).

O termo micro se refere então ao estudo dos detalhes, aos recortes de curta duração da situação de pesquisa, como se fosse observado um determinado momento com uma lupa. Mas é também sociogenética, assim considera não apenas o momento, mas todo o movimento, é analisado cada gesto, fala, registro do sujeito pesquisado, mas não somente, busca relacionar o presente com o passado, com a cultura.

Segundo Wertsch18 (1998 apud TOMIO; SCHROEDER; ADRIANO, 2017), a abordagem microgenética faz parte da pesquisa sociocultural que procura “[...] entender a relação entre o funcionamento mental humano, por um lado, e o contexto cultural, histórico e institucional, por outro” (WERTSCH apud TOMIO; SCHROEDER; ADRIANO, 2017, p. 37).

Ou seja, o método de análise microgenética não considera apenas o caráter biológico, mas principalmente a cultura, história, que trouxe o sujeito até o momento da situação de pesquisa. Goes, a partir de textos de Vygotsky, considera que a análise não pode se apresentar separada da visão sociogenética, histórico-cultural e semiótica do ser humano. Goes compreende que Vygotsky, em relação ao método

18 WERTSCH, J. V. A necessidade a ação na pesquisa sociocultural. In: WERTSCH, J. V.; DEL RÍO, P.; ALVAREZ, A. Estudos sociais da mente. Porto Alegre: Artmed, 1998. p.56-71.

Argumenta pela necessidade do exame da dimensão histórica e alerta para o fato de que privilegiar a história não é estudar eventos passados, mas sim o curso de transformação que engloba o presente, as condições passadas e aquilo que o presente tem de projeção do futuro. (GOES, 2000, p. 12-13).

Portanto, apesar da necessidade dos recortes da situação de pesquisa, a análise não se restringe a tal, percorre todo o caminho que trouxe o sujeito pesquisado até aquele instante e as transformações psicológicas que ocorreram.

Siegler e Crowley (1991) definem três propriedades-chave da abordagem microgenética:

x As observações abrangem todo o período de pesquisa do início até a estabilidade do fenômeno: Todos os quatro encontros realizados tanto para entrevista diagnóstica quanto para a intervenção, foram gravados em vídeo (imagem e som de voz), além disso, todo o material produzido pelo pesquisador e sujeitos pesquisados foi arquivado para posterior análise. x As observações se acentuam à medida que o fenômeno se intensifica:

além da gravação em vídeo foram realizados registros pontuais de algumas situações em uma espécie de ‘diário de bordo’ do pesquisador, a fim de ressaltar momentos que apresentaram compreensão de conceitos algébricos.

x O comportamento observado é submetido a uma análise intensiva com o objetivo de inferir o processo que dá origem a aspectos quantitativos e qualitativos do fenômeno.

Pela necessidade de análise intensiva, se fez necessária posterior transcrição do som de voz contido na videogravação, a transcrição ocorreu de forma fidedigna mantendo até mesmo erros de linguagem e equívocos.

Os arquivos de som e vídeo transcritos citados ao longo da análise estarão indicados da seguinte forma: Tipo de registro (vídeo ou áudio), número do encontro, identificação do estudante, tempo de vídeo (ou áudio) onde se inicia a transcrição.

Os dados transcritos foram organizados em categorias conforme indicam:

a) Conceitos algébricos explicitados: variável, incógnita, dependência entre gradezas, entre outros;

b) Formas de pensamento: abstração, generalização, formação de conceitos;

c) Formas de representação nos materiais usados, sendo estes: Multiplano, balança de pratos, computador com software leitor de tela, além de outros materiais confeccionados;

d) Possibilidades metodológicas de ensino: quando o estudante requer outras formas de compreensão;

Tais categorias foram pensadas a partir de resultado obtidos em pesquisa anterior (Matemática pra cegos: uma possibilidade no ensino de polinômios) além de considerar categorias de análise levantadas pelo próprio Vygotsky ao longo de suas pesquisas.

Durante o processo de análise a gravação em vídeo, transcrição, e demais registros, foram revistos várias vezes de modo que os detalhes tenham sido devidamente estudados e analisados.

Na análise microgenética não há critérios quanto ao tempo de pesquisa e de recortes temporais, entretanto, por se tratar de uma análise cuidadosa, uma pesquisa muito extensa onde são necessários vários encontros com os sujeitos pesquisados, torna-se inviável pela quantidade de material para posterior análise, motivo este que justifica os quatros encontros utilizados na pesquisa.

Após o processo de transcrição e organização dos dados obtidos, estudo e análise foram realizados conforme a revisão da literatura realizada nos capítulos 2 e 3.

Opta-se pela utilização do método microgenético por se mostrar eficaz em pesquisas da área de ensino e aprendizagem permitindo a análise de características humanas que se desenvolvem por meio de interações verbais e não verbais entre alunos e professores.

[...] permite observar como ocorre o processo ensino-aprendizagem, quais são as qualidades do contexto de determinada sala de aula, e assim detectar quais são as habilidades comunicativas necessárias

durante os processos de interação que facilitam ou dificultam a ocorrência da aprendizagem. (KELMAN; BRANCO, 2004, p. 95).

Flynn, Pine e Lewis (2006) consideram que o método permite respostas que outros métodos não permitiriam, pois oferece uma oportunidade para identificar diferentes grupos, que podem exigir diferentes estilos de tratamento ou intervenção. É um método que não se restringe apenas a respostas prontas, mas se debruça a analisar todo o processo percorrido pelos sujeitos até chegarem às mesmas.

Assim, considerando a atenção necessária ao se analisar a constituição de conceitos, ou seja, o desenvolvimento psicológico do estudante, e ainda, sendo este deficiente visual, o método microgenético se apresenta, para esta pesquisa, como o mais seguro no sentido de evitar possíveis equívocos de análise.