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2 A PEDAGOGIA RADICAL E INCLUSIVA – ESTRUTURAÇÃO E CONSTITUIÇÃO

2.1 OS TEMAS RADICAIS – CRITÉRIOS E DEFINIÇÕES

Há outros elementos de que se precisa pesquisar, destacar e analisar, antes de partir para as conclusões, como, por exemplo, quais são os principais temas radicais que são e devem ser abordados pela Teoria de Herrán Gascón?

A pesquisa perguntou230 ao educador se, por exemplo, o perdão, como uma Pedagogia

libertadora da própria vítima não poderia ser considerado um tema radical. Ele respondeu que não, pois isso a Igreja Católica já cuida. O critério para definir se o tema é radical é explicado por ele (2015, p. 79-80) quando orienta que os pontos radicais poderiam ser diferenciados dos temas educacionais da primeira e segunda dimensão por uma série de características inerentes e, assim, ele define:

• Não estão nos discursos dos organismos internacionais da educação ou dos sistemas educativos. • Normalmente, eles não estão presentes nos currículos oficiais ou nos projetos educacionais dos centros. • Do ponto de vista curricular, cortam as intenções educacionais das outras duas dimensões. • Do ponto de vista social, refletem-se em tudo o que acontece na superfície da vida cotidiana, que nutrem e sustentam, de certo modo como raízes. • Eles são fundamentais para a formação. • Normalmente, eles não são exigidos, eles não são reivindicados. Eles são "surdos",

"silenciosos". Eles não são exuberantes na mídia, nem são conteúdos da consciência comum. • Eles são independentes de tempos, culturas, contextos, ideologias... • Convergem entre si, todos eles se contêm a si próprios, de um deles fluem para os outros. • Definem essencialmente educação e formação: a sua não inclusão padronizado na educação faz que a formação não seja como tal, nem possa se dar. • • Podem não ser estranhos a mestres e professores, especialmente conscientes, com independência do nível de aprendizado em que trabalhem. • Seu ensino fértil requer professores conscientes e internalizados com baixo egocentrismo e que sejam amadurecidos antes de si mesmo. • Cada um deles associa uma Pedagogia particular, para cujo desenvolvimento se necessita de uma abordagem ampla e profunda da educação baseada na consciência. • Com essa perspectiva, eles definem o vetor educacional essencial que iria do egocentrismo (origem) ao autoconhecimento (sentido) através da consciência (módulo). 231

A partir da explanação dos critérios para se definir um tema como radical, o autor elucida que uma questão relevante para a formação, percebida a partir dos temas radicais, é a formação ou educação de temas educacionais. Explica que, para a educação, para a consciência, um problema socialmente não exigido e chave para a formação -– por exemplo, uma questão radical, como a morte – poderia emergir, ser definida e normalizada, tornando-se uma intenção educacional comum ou básica de primeira ou segunda dimensão.

Em comunicação pessoal do autor com esta pesquisa, obteve-se alguns dos temas radicais, dentre os quais, desde já se destaca o aspecto de que há temas com abordagens positivas e negativas. Esses exemplos, que estão apresentados na Figura 16, foram relacionados em ordem alfabética, não tendo nenhuma distinção quanto a importância de cada um deles. Obviamente que essa seria uma discussão pertinente, porém o objetivo desta pesquisa é o de apenas apresentar alguns deles e, assim, ter-se exemplos concretos do que se está tratando.

A Figura 16 apresenta alguns dos temas que são considerados radicais, pelos critérios já citados anteriormente:

Figura 16 – Exemplos de temas radicais

Fonte: Adaptado pelo autor com base em comunicação pessoal de Herrán Gascón (2018).

O autor salienta que todos os tipos de questões e desafios educacionais, todas suas dimensões têm uma condição dinâmica ou estão sujeitas a alterações, muito especialmente os temas radicais. Diz, ainda, que a natureza perene de questões radicais não significa que sejam desafios formativos estáticos ou mineralizados. Sua natureza é evolutiva e depende da complexidade da consciência normal do momento não genético. Para a educação, uma questão radical poderia deixar de ser assim ou manter um certo caráter radical, ou seja, de tão complexo, pode não abandonar completamente sua natureza radical e formativa. Cita, como exemplo, a educação inclusiva, a educação ambiental, etc. que foram tópicos radicais e extraordinários na sua época. Uma vez melhor compreendidos e pesquisados, ligados à profissão docente, eles se transformam em abordagens pedagógicas, questões padronizadas ou transversais. Portanto, os

problemas que, como a educação para a morte, podem ser radicais hoje, podem evoluir no futuro, para a transversalidade. Um indicador disso será quando a maioria das pessoas se surpreender que isso passou tão longe da educação fundamental.

Ao mesmo tempo, os temas radicais – principalmente egocentrismo e a consciência – podem definir a educatividade de questões educacionais de outros eixos. Exemplificando-se o que o autor se refere, em todos os lugares, pode ser lido sobre a importância da criatividade, da empatia, da cooperação, de aprendizagem significativa e relevante, etc., em que todas são, geralmente, consideradas competências fundamentais e desejáveis, porém ele afirma que essa consideração não tem sentido, porque a questão fica incompleta sem os temas radicais.

Embora se considere a solidariedade ou a colaboração como valores desejáveis, as mais comuns são as colaborações interessadas ou as solidariedades restritas. Herrán Gascón cita Vegas (2007) que oferece como exemplo negativo de solidariedade o corporativismo ou a máfia. Há o caso, também, da própria criatividade, a qual é um elemento fundamental para o desenvolvimento de todos os terrorismos e todas as religiões que a doutrinam. Desse modo, Herrán Gascón conclui que nem sempre é uma referência desejável, visto que isso sempre dependerá do seu caráter, se for egocêntrico, consciente ou generoso.

Essa conclusão do autor vem diretamente ao encontro da proposta de um estado mais consciente, como tal, de modo que os dez elementos que são tratados por ela, podem estar presentes de forma concomitante, absorvidos pela sua essência, pois só assim se pode esperar pelos resultados que se delineiam após sua constituição, conforme poderá ser observado no capítulo seguinte. Isso denota que, além de não ser um processo simples – fator que se justifica da utilização da Pedagogia Radical e Inclusiva para sua formação – o caráter sempre será um elemento vital para a constituição das virtudes.

É possível obter a compreensão desses temas transversais que, quando cruzados por radicais como o egocentrismo ou a consciência humana, mudam completamente sua interpretação. Herrán Gascón explica que “a maior complexidade apontada desde a terceira dimensão curricular serve para esclarecer sua positividade e educatividade.” (HERRÁN GASCÓN, 2015, p. 80).

Como se pode perceber, até este momento da pesquisa, parece que todo o conjunto de ações – sua constituição, formação, articulação e prática – da Pedagogia Radical e Inclusiva formam um arcabouço pedagógico e filosófico que tendem a revolucionar e impulsionar o desenvolvimento do ser humano, a partir de cognições mais adequadas, próprias e efetivas.

A propósito, sobre alguns temas radicais ou perenes possíveis, Herrán Gascón e Cortina Selva (2006) citam que a educação para a morte poderia ser, com efeito, um exemplo

de um tema radical. Explicam que a morte passa por todas as questões transversais e áreas de conhecimento ou assuntos instrutivos, sem ser uma área ou assunto prescrito. Sobre isso, Herrán Gascón e Cortina Selva (2006) apresentam uma citação do próprio HERRÁN GASCÓNde uma outra obra de sua autoria: "Ou talvez não existam relações óbvias entre a morte e os ciclos

biológicos, a educação para a paz, para o consumo, para o progresso social, para a saúde, para a igualdade de oportunidades, ou educação ambiental, sexual, trânsito, etc.?"232 (HERRÁN

GASCÓN; SELVA, 2006, p. 100).

O que os autores questionam é se não pode haver relações de igualdade entre a morte e a biologia, a história, a matemática, a química, a Filosofia, as artes e assim por diante. Portanto, eles creem que se comportam como uma espiral ou radical para todos eles. Em suma, a educação para a morte não poderia mais ser apresentada como uma área ou assunto curricular, mas não se encaixaria exatamente nas características de temas transversais comuns, ligados a expressar necessidades sociais.

Na sequência, Herrán Gascón e Selva (2006, p. 101) apresentam alguns dos tópicos que constituiriam a família de áreas perenes ou de (r) evolução educacional em todos os níveis de ensino, incluindo a universidade (Eles estão apresentados desde a letra “a” até a “l”, na sequência). Ao tratar de temas, processos básicos e/ou conteúdos de consciência, eles apontariam para a construção de um currículo transdisciplinar com base e orientação na (educação da) consciência. Eles poderiam constituir o terceiro eixo radical ou profundidade, e ser um construtor-chave para a promoção da mudança social em direção à evolução humana. O primeiro é “a) O ego(centrismo), humano como chave para o desenvolvimento individual, grupal e social.” 233

Este primeiro tema apresentado pelos autores, referindo-se ao ego humano, reveste-se de características que beiram à própria vergonha humana, no sentido de que se considera, maravilhado com sua complexidade proporcionada pela natureza, um ser especial, e via de regra, superior aos demais seres vivos, sem ter fundamentações filosóficas e científicas para tanto. Além disso, é egocêntrico com os próprios semelhantes, o que o torna ainda mais desfocado do que se poderia considerar como bons propósitos, ao ponto de se produzir, por exemplo, grupo de mafiosos, entre tantos outros. Não parece que o ser humano nasce com essas características egocêntricas, ao menos não no nível que se percebe na fase adulta.

232 Tradução nossa. 233 Tradução nossa.

O segundo tema é: “b) O autoconhecimento, como o aprendizado mais importante que pode ser descoberto, adquirível desde o “reconhecimento da adição”, como dizia A. de Mello, ainda e também admite outras vias de acesso.” 234(HERRÁN GASCÓN; SELVA, 2006, p. 101).

Herrán Gascón (2018, comunicação pessoal) explicou para esta pesquisa que praticamente o único caminho para se chegar ao autoconhecimento é através da meditação, embora os autores citem três possibilidades. Além disso, salientou que praticamente ninguém consegue isso, ficando relegado a poucas pessoas que atingem esse nível máximo de sabedoria, ao menos ao ponto permitido que se imagina existir na condição de ser humano.

Como terceiro tema, Herrán Gascón e Selva (2006, p. 101) definem a “c) A

complexidade da consciência desde o conhecimento, como enfoque voltado ao

desenvolvimento de capacidade em que reside a evolução interior. 235

Praticamente não se tem noção da complexidade da consciência do conhecimento nos demais animais, porém, ao menos pensa-se que se tem uma noção no caso do homem. Assim, como os próprios autores definem, há uma unidade de medida da possível evolução humana. Dessa forma, tratá-la de modo especial e particular só poderá conduzir o ser humano para situações melhores, sendo um caminho dos mais sensatos possíveis para envidar esforços. Isso que a abordagem se refere especificamente à consciência do conhecimento, pois se fosse ampliada para a consciência como fenômeno de manifestação, quem sabe poderia ser outro tema específico. No entanto, aí reside uma complexidade tão grande que parece não ser possível algum avanço significativo, ao menos no atual estágio evolutivo.

Herrán Gascón e Selva (2006, p. 101) apontam o quarto tema: “d) A evolução interior, como consequência da redução do ego e aumento de consciência”. 236

Ora, nada mais lógico que o desenvolvimento interior só pode resultar em um progresso exterior, como consequência decorrente da própria evolução interior, embora essa sempre será mais importante para o sujeito do que o próprio resultado de crescimento na exterioridade. A busca pela maturidade, diminuindo a presença do ego e com o aumento da consciência, só pode proporcionar uma mudança das capacidades cognitiva e pessoal.

O quinto tema descrito pelos autores é:

e) A humanidade, como um conteúdo do qual devemos falar muito mais do que aquilo que se faz e sobre o que os alunos em todas as fases devem pensar, por ser muito mais real do que qualquer de seus participantes, ou, como diria Eucken, a única realidade. Pode-se dizer que devemos agir e trabalhar como prioridade para a melhoria da

234 Tradução nossa. 235 Tradução nossa. 236 Tradução nossa.

humanidade. Este é o grande slogan para participar a partir do concreto. 237(HERRÁN

GASCÓN; SELVA, 2006, p. 101).

A própria diminuição do ego já afetará positivamente a preocupação com os outros, ou seja, com a humanidade. Porém, especificamente este tema trata de dar um polimento às preocupações do homem, de forma que a vida possa se tornar mais leve, na medida em que essa sensibilidade afete mais pessoas, direcionando-as a ter, desde a posturas de gentileza e compaixão, como para com medidas efetivas de respeito e justiça, tudo alicerçado em valores virtuosos e não pela cultura instalada do “ter”, que predomina na contemporaneidade.

Herrán Gascón e Selva (2006, p. 101) definem o sexto tema: “f) A universalidade, como uma questão raiz de sementes ou expressão natural de uma consciência originada e conscientemente recuperada e atualizada como um importante objetivo interno-externo, mais além do parcial.”238

A universalidade já é um tema mais profundo do que o anterior – a humanidade –, já que busca uma integração completa, na medida em que visa uma ampla sintonização do eu com o todo, superando toda e qualquer barreira nesse sentido. Como é mais complexo, na medida em que está próximo ao nível da autoconsciência, é de difícil alcance, o que não pode inibir sua busca. Ao contrário, deve-se multiplicar os esforços nessa direção.

Já o sétimo tema é abordado pelos pesquisadores nos seguintes termos:

g) A linguagem universal como inversão para o melhor aproveitamento da energia

humana, nunca excludente com as línguas locais.Seu fundamento se assenta na

verdadeira língua materna, a saber, a comunicação de consciência a consciência. Depois de duas ou três gerações, supõe-se ganhar em compreensão e em unidade, e o fim dos imperialismos linguísticos atuais.239(HERRÁN GASCÓN; SELVA, 2006, p.

101).

Se houvesse uma linguagem universal, os ganhos seriam quase que inimagináveis, dada a enorme proporção que abarcaria a sua adoção. Como será abordado no capítulo seguinte, o agir comunicativo, tratado especialmente por Habermas, é uma das maiores deficiências do ser humano, a qual consiste em sua extrema dificuldade de elaborar processos comunicativos efetivos. Assim, o Agir Comunicativo sugere que por meio de uma racionalidade cada vez mais avançada e de uma abdicação entre os comunicadores de suas principais metas individuais, em

237 Tradução nossa. 238 Tradução nossa. 239 Tradução nossa.

favor de uma concretização de pontos de interesse comuns, iniciar um processo de aprimoramento contínuo.

Dentro dessa panorâmica, uma linguagem universal seria o maior e melhor antídoto para essa enorme fraqueza do ser humano, antes de mais nada. Mesmo que possa se considerar que, mesmo assim, os problemas de comunicação persistiriam em um nível ainda considerável, a sua redução por meio da adoção de uma única linguagem teria um valor e um impacto importante. Todos os demais ganhos, nos mais diversos aspectos, mesmo que significativos, parecem que seriam menores do que a melhora do processo de comunicação. Por outro lado, essa hipótese da adoção de uma única linguagem poderia ser gradativa, de forma que nos primeiros anos (mesmo que fossem cem anos), ela poderia ser a segunda língua de cada povo, para em um segundo momento transformá-la na primeira.

Herrán Gascón e Selva (2006, p. 101) pontuam o oitavo tema como sendo: “h) a

convergência e a cooperação não seletivas (não narcisista), como atitudes sãs e superiores de

toda ordem: pessoal, institucional, etc.” Identifica-se essa abordagem dos autores como um desenvolvimento de equipe de um modo global, em que sentimentos de compaixão, amizade e de ajuda indiscriminada predominem. Com isso estabelecido, os ganhos seriam múltiplos e para todos, o que seria um aspecto fenomenal de desenvolvimento comportamental.

O nono tema é descrito pelos teóricos como sendo: “i) o amor240 como consciência

aplicada, e a consciência, como amor aplicado. A consciência ou é amor ou não é consciência.” (HERRÁN GASCÓN; SELVA, 2006, p. 101). Todos os aspectos desse tema direcionam-se para um aperfeiçoamento do caráter, que leva para um estágio evolutivo superior, proporcionando a si próprio um aumento do potencial da sua inteligência intelectual e emocional e, para os próximos, um polimento relacional com consequências benéficas que podem atingir níveis extraordinários de amorosidade. Porém, o que foi mais impactante na descrição do tema trata-se da afirmativa de que a consciência é amor, ou não é consciência, o que leva a uma legítima fusão dos conceitos em uma qualificação máxima.

Como décimo tema, Herrán Gascón e Selva (2006, p. 102) descrevem: “j) O

preconceito e o ódio como lastros relacionados a soltar, através do conhecimento, a empatia e

o projeto evolutivo comum, e não somente com alianças egocêntricas e defensivas”. Essa é uma

240 Saramago (2005), Nobel de Literatura em 1998, desenvolveu em sua novela “As intermitências da morte” a

ideia de que a “única defesa da morte é o amor”. Nós discordamos dele por duas razões complementares as que damos resposta nesta obra: o amor não é a única, senão que, se se quiser, pode ser uma defesa entre

várias, que por sua vez estão entrelaçadas. Em segundo lugar, não nos parece que diante da morte a mais

sábia atitude seja uma defesa: este enfoque é dual e nosso caminhar é dialético, complexo e evolutivo (HERRÁN GASCÓN; SELVA, 2006, p. 101).

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