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CAPÍTULO I – FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

1.7 As formas de controle da informação

1.7.1 Os três componentes do processo de agendamento

Rogers, Dearing e Bregman (1993), que chegam até mesmo a considerar a investigação sobre o processo de agendamento como uma forma de estudar como ocorre a mudança social na sociedade moderna, como funciona a opinião pública numa democracia, elegem três componentes do processo de agendamento: a) agenda midiática; b) agenda pública; e c) agenda das políticas governamentais.

É importante destacar que quase toda a literatura sobre o processo de agendamento ao longo da história tem se baseado na influência da agenda midiática noticiosa, ou seja, no conteúdo da produção dos jornais e noticiários televisivos. Cabe aqui neste estudo particularizar a discussão para a agenda midiática radiofônica, a partir de duas emissoras representativas da cobertura de uma campanha política de abrangência nacional. A agenda midiática pode ser designada aqui como a agenda jornalística, especificamente através da linguagem radiofônica. De modo semelhante, Molotch e Lester (1974) identificavam três categorias de pessoas posicionadas de forma diferente em relação ao campo jornalístico: a) os promotores de notícias (news promoters) são constituídos por membros que propõem a agenda governamental e também aqueles outros agentes do campo político que ajudam a construir a agenda política; b) os news assemblers, que são os profissionais que “transformam um perceptível conjunto finito de ocorrências promovidas em acontecimentos públicos através de publicação ou radiodifusão”, ou seja, são aqueles que determinam a agenda jornalística; e c) os consumidores de notícias (news consumers), definidos como os membros sujeitos à influência da mídia e que ajudam a constituir a agenda pública. Pela estrutura, capilaridade e poder de influência das fontes junto ao campo jornalístico, a agenda governamental acaba se tornando a mais importante das agendas políticas.

Vários autores reconhecem que existe uma concorrência entre acontecimentos e questões (LANG; LANG, 1981), como no Caso Watergate19, quando outros assuntos dominavam a

19 Um dos maiores escândalos políticos da história dos Estados Unidos, conhecido como Caso Watergate, em referência ao edifício onde situava-se a sede do Partido Democrata. A partir da matéria de capa publicada pelo jornal Washington Post (18 jun.1972), os jornalistas Bob Woodward e Carl Bernstein descobriram a ligação entre o presidente da República, o republicano Richard Nixon, e as cinco pessoas detidas ao tentarem fotografar documentos e instalar escuta telefônica no escritório do Partido Democrata, em plena campanha eleitoral. As

agenda política, mas grande parte do eleitorado sabia do caso. Enquanto isso, Hilgartner e Bosk (1988) também reconhecem que há concorrência em torno das várias formas de enquadrar (frame) a situação. Neste mesmo sentido o termo é empregado por Mauro Porto ao analisar como a audiência percebia a política a partir do enquadramento oferecido pelo Jornal Nacional:

...uma questão (issue) surge quando há pelo menos duas partes que têm

acesso aos mass media. Assim, existem utilizações diferentes para as

ocorrências, ou seja, existem diferentes necessidades de acontecimento (event needs) por parte dos diversos agentes sociais. (MOLOTCH E LESTER apud TRAQUINA 2001:23).

Os autores também identificam a existência de diferentes interesses em promover ou encobrir certas ocorrências, no sentido de torná-las ou evitar que se tornem acontecimentos públicos. É neste cenário que surgem os chamados pseudo-acontecimentos, muito comuns no campo político. A “criação de fatos políticos” costuma alimentar em parte a necessidade de acontecimentos de profissionais do campo jornalístico:

Assim, no contexto da comunicação política, o campo jornalístico constitui um alvo prioritário da ação estratégica dos diversos agentes sociais, em particular, dos profissionais do campo político. Um objetivo primordial da luta política consiste em fazer concordar as necessidades de acontecimento com as dos profissionais do campo jornalístico (TRAQUINA, 2001:24).

Por outro lado, é preciso reconhecer a especificidade do campo jornalístico, seja do ponto de vista das organizações, do aspecto profissional da atividade, das rotinas de trabalho dos jornalistas nas redações e também do ponto de vista empresarial gerador de lucros:

Para além do ethos profissional, existe um conjunto de normas, rituais e

valores (a objetividade, a independência, o imediatismo) que formam uma

ideologia profissional, cimento essencial na definição do ser jornalista. [...]

Um aspecto fundamental dessa cultura profissional é a partilha de valores quanto à importância ou interesse que uma ocorrência ou questão poderá ter; são os critérios de noticiabilidade, constituídos por um conjunto de valores-notícia. (TRAQUINA, 2001:28).

matérias realizadas pelos dois jornalistas, que recuperaram o caso graças a um informante da Casa Branca, conhecido como Garganta Profunda, levaram Nixon a renunciar em agosto de 1974.

http://noticiasdefato.wordpress.com/reportagem-especial-caso-watergate-o-jornalismo-em-sua-verdadeira-essencia/o-que-foi-o-caso-watergate (acesso em 12 abr. 2009).

Quem determina a agenda jornalística? Para autores como Molotch e Lester, o acesso ao campo jornalístico (“estar na mídia”) contribui para que o agente social ou político se mantenha nas relações de poder. Quem não tem acesso regular aos mass media precisa fazer notícia, entrar em conflito com o sistema de produção jornalística, provocar choque. A correlação de forças entre os agentes sociais e políticos, quase sempre assimétrica, constitui uma disputa discursiva que resulta na capacidade maior ou menor de moldar a agenda pública, passando pelos meios de comunicação.

Miguel Rodrigo Alsina classifica o agenda-setting como “a teoria da construção do temário”, e avalia o discurso jornalístico informativo como capaz não de persuadir o público (fazer crer) ou manipular (fazer fazer), mas fazer saber, como parte do seu próprio fazer comunicativo (ALSINA, 1993:14). O autor reforça, no entanto, que para entender o processo comunicativo, é necessário levar em conta as três fases da construção da notícia: a produção, a circulação e o consumo, embora seu estudo esteja centrado na primeira instância. No caso desta dissertação, a análise do objeto empírico busca chegar até a fase de circulação das mensagens no ar, como resultado do processo e as condições de produção da notícia na CBN e na Band News FM. A presente pesquisa não tem a pretensão de estudar os efeitos da cobertura eleitoral de 2006 na audiência dessas duas estações, embora abra caminhos e questões que podem ser investigadas em trabalhos futuros.

Várias pesquisas ao longo das últimas décadas, a partir do conceito de agenda-setting elaborado por McCombs e Shaw em 1972, concluíram que a capacidade de agendamento da mídia jornalística é maior sobre os espectadores que dispõem de pouco acesso aos acontecimentos da vida política, por isso procuram mais os meios de comunicação para se orientarem durante as campanhas eleitorais.

A evolução do conceito de agendamento fez seus próprios autores, McCombs e Shaw, reverem suas primeiras formulações. Eles agora concluem que as ocorrências e questões enfatizadas pelo campo jornalístico podem influenciar diretamente a opinião pública, na medida em que tanto a seleção dos assuntos quanto o enquadramento com que são dados a interpretar configuram o poder de agenda dos meios. Passamos, então, a trabalhar também com esse conceito.