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Capítulo 3 − Revisão Bibliográfica

3.5. Os varistores de SnO 2

O projeto de cerâmicas eletrônicas requer o conhecimento das características físico-químicas dos materiais dos quais se pretende utilizar. Como mencionado anteriormente, na obtenção de varistores é importante compreender as reações de formação de defeitos porque eles favorecem a difusão dos átomos durante a sinterização promovendo a densificação da cerâmica. Além disso, podem formar estados eletrônicos e alterar a condutividade elétrica dos materiais. Por isso, na primeira parte desta seção são apresentadas as características físicas do SnO2. Em seguida, são apresentadas as reações de formação dos defeitos encontrados neste óxido, e como eles contribuem para a concentração de portadores de cargas elétricas. Depois é apresentada uma revisão literária sobre a obtenção de varistores baseados em SnO2

O SnO2 apresenta estrutura cristalina tetragonal do tipo rutilo com grupo espacial P42/mnm[10]. Sua célula unitária contém dois átomos de estanho e quatro de oxigênio como mostra a figura 3.12. Cada átomo de estanho está localizado no centro de um octaedro regular ligado a seis átomos de oxigênio, um em cada vértice desse poliedro. Por sua vez, cada átomo de oxigênio está ligado a três átomos de estanho situados nos vértices triângulo eqüilátero. Os raios iônicos do oxigênio O2- e do estanho Sn4+ são respectivamente 0,14 nm e 0,071 nm. A coordenação da estrutura do SnO2 é de 6:3, os parâmetros de rede são a = b = 0,474 nm e c = 0,318 nm[36].

c

a

O-2

Sn+4

Figura 3.12 – Célula unitária do SnO2.

O SnO2 é um semicondutor do tipo n porque as vacâncias de oxigênio, Vo, e os

átomos de estanho intersticiais, Sni, presentes no cristal se comportam como

doadores. Neste trabalho, as reações de formação de defeitos são escritas de acordo com a notação de Kröger e VinK[13]. Nesta notação os defeitos são definidos em relação ao cristal perfeito, o ponto (•) representa as cargas positivas, a linha (') representa as cargas negativas, x é utilizado para indicar a neutralidade elétrica, e os colchetes são usados para representar a fração molar. De acordo com essa notação, as reações de formação de defeitos no SnO2 são[13, 36, 48, 49]:

↑ + + + ⇔ '' Ox O.. 2 Sn 2 O 2 1 V O Sn SnO (3.69) ↑ + ⇔ ix 2 2 O 2 1 Sn SnO (3.70)

A pressão parcial do oxigênio na faixa de temperatura entre 1370 a 1600oC é de 10-2 a 1 atm. Assim, o aquecimento do SnO2 nestas condições favorece a formação de vacâncias duplamente ionizadas de acordo com as reações[13, 36, 48, 49]:

↑ + + ⇔ .. ' 2 O x O O 2 1 e 2 V O (3.71)

' e 2 V

VOxO.. + (3.72)

Para manter a neutralidade elétrica é necessário que:

[ ]

V

[ ]

e'

2 O.. = (3.73)

Pelas equações acima, a formação de defeitos no SnO2 depende da pressão parcial do oxigênio. Na seção 3.2 é visto que a condutividade elétrica é proporcional à concentração de portadores, e a formação de defeitos altera esta concentração. Logo, a condutividade elétrica também é proporcional à pressão parcial do oxigênio. Considerando que as vacâncias de oxigênio sejam predominantes, a dependência da condutividade elétrica com pressão de oxigênio pode ser obtida da equação da constante de equilíbrio para a equação 3.71[13]:

[ ]

[ ]

12 2 O 2 ' .. O .. O V V .e P K = (3.74)

Substituindo a equação 3.73 na equação 3.74, temos:

[ ]

2 P e K 2 1 O 3 ' V 2 .. O = (3.75)

Porém, o que nos interessa é a reação de formação de vacância. A constante de equilíbrio para reação inversa é ..

O x O V ' V 1 K K = . Então,

[ ]

12 O 3 ' ' V 2 .. O P e 2 K = (3.76)

Da equação 3.76 temos que a concentração de elétrons é:

[ ]

16 ' O 3 1 .P .K 2 ' e = −2 (3.77)

Portanto, a dependência da condutividade elétrica com a pressão de oxigênio é: 6 1 2 − ∝PO σ (3.78)

Da mesma maneira pode ser obtida a dependência da condutividade elétrica com a pressão de oxigênio, quando se considera que a concentração de estanho intersticial,Sni...., é predominante na rede de SnO2. Num semicondutor intrínseco, a concentração de elétrons é igual à concentração de buracos (lei de ação das massas), assim a reação de ionização do x é:

i Sn ' e 4 Sn Snx i.... i ⇔ + (3.79)

Se for usada juntamente com a condição de neutralidade elétrica:

[ ]

Sn

[ ]

e'

4 i.... = (3.80)

A dependência da condutividade elétrica com a pressão do oxigênio passa a ser:

5 1 2 − ∝PO σ (3.81)

Vacâncias de oxigênio e estanho intersticiais são incorporados a rede durante o tratamento térmico, e suas concentrações dependem da pressão de vapor do oxigênio. A faixa de pressão de vapor do oxigênio que favorece a formação desses defeitos muito estreita, por isso é difícil definir qual o tipo de defeito é predominante no SnO2[36].

O SnO2 quando sinterizado sem aditivos apresenta baixa densificação, que segundo alguns pesquisadores[8, 11, 62] está relacionada com o domínio de mecanismo não densificantes, como evaporação-condensação. Entretanto, a adição de alguns óxidos pode promover a densificação do SnO2. O estudo da

densificação desse óxido não é uma tarefa muito fácil porque os mecanismos não densificantes são os mesmos que promovem a densificação. Reinhard e Duvigneaud[20] obtiveram a densificação do SnO2 adicionando os óxidos de zinco e cobre. Os resultados de Pennisi[61] mostraram que estes óxidos levam à formação de vacâncias de oxigênio, que durante a sinterização promovem o transporte de massa por difusão ou por evaporação-condensação, facilitando densificação da cerâmica. Cerri et al.[12] observaram que a adição CoO e MnO2 pode proporcionar a densificação do SnO2 de até 98,4% da sua densidade teórica. Estes óxidos também aumentam a concentração vacâncias de oxigênios, aumentando a taxa de difusão dos íons de oxigênio. Este aumento é suficiente para promover a densificação e impedir que o mecanismo de evaporação-condensação domine o processo de sinterização.

Pianaro[62] obteve a densificação do SnO2 adicionando 1% em mol de CoO, este sistema apresentou comportamento altamente resistivo e linearidade entre corrente e tensão até valores de tensão da ordem de 3000 V. Adicionado 0,05% Nb2O5 em mol neste sistema, obteve características varistoras com α = 8 e Er = 1870 V.cm-1. Um aumento significativo do valor de α = 41 e Er = 4000 V.cm-1 foi conseguido com a adição também de 0,05% em mol de Cr2O3 ao sistema ternário SnO2.CoO.Nb2O5 preparado sob as mesmas condições.

Leite et al.[42] evidenciaram que as propriedades não-ôhmicas no sistema ternário SnO2.CoO.Nb2O5 são dependentes da atmosfera e da taxa de resfriamento durante a sinterização. O aumento das taxas de resfriamento diminui os valores de α, enquanto que um resfriamento lento provoca um aumento significativo dos valores de α e um decréscimo do campo elétrico de ruptura. O aumento do coeficiente de não linearidade foi relacionado ao aumento do potencial da barreira eletrostática, e a diminuição do campo elétrico de ruptura com o aumento no tamanho médio de grão. Os efeitos da taxa de resfriamento e da temperatura de sinterização foram também estudados por Oliveira et al.[9], e seus resultados concordaram com os resultados obtidos por Leite et al.

Santos et al.[73] adicionaram 0,05% em mol de Ta2O5 ao sistema SnO2.CoO.Cr2O5, e obtiveram valores α = 44. Isto sugere que os dopantes com estado de valência +5 aumentam a condutividade eletrônica do grão semicondutor de SnO2, devido à substituição do Sn+4 pelo elemento de valência +5.

Pianaro et al[62] estudaram a adição de Bi2O3 no sistema SnO2.CoO.Nb2O5. O tamanho médio de grão aumenta com a adição deste óxido, diminuindo o campo de elétrico de ruptura. Além disso, o Bi2O3 não aumenta significativamente os valores de α. O sistema mostrou-se monofásico, e ao contrário do que ocorre com os varistores de ZnO, o Bi2O3 não formou uma segunda fase no contorno de grão. Wang et al[82] estudaram o efeito da adição de diferentes concentrações de Nb2O3 no sistema SnO2.ZnO. Eles concluíram que o campo elétrico de ruptura aumenta até uma concentração ótima deste óxido, valores acima desta concentração não influenciam este parâmetro. Concentrações acima de 0,8% em mol de Nb2O3 diminuem o coeficiente não de linearidade. Segundo os autores, o valor de α diminui devido ao aumento da largura da camada de depleção que influenciará no transporte eletrônico por tunelamento.

Oliveira et.al[57] recentemente estudaram o efeito da adição dos óxidos Al 2O3, Pr2O3, La2O3 e CeO3 nas propriedades elétricas do sistema SnO2 + 1%CoO + 0,025%Cr2O3 + 0,035%Nb2O5 + 0,025%Pr2O3. Os sistemas amostraram-se bastante estáveis a degradação por temperatura. Os resultados obtidos com o praseodímio por esses pesquisadores são de grande interesse, por servir de comparação com os resultados deste trabalho. A microestrutura do sistema dopado com Pr2O3 apresentou porosidade, mesmo assim foi obtida uma alta não linearidade, α = 62 e Er = 6866 V.cm-1. Segundo os autores, a precipitação deste óxido nos contornos de grãos pode aumentar a porosidade da cerâmica. Através de análises por microscopia de transmissão observaram a presença de uma fase precipitada no contorno de grão e grãos com diferentes orientações. Esta fase tem característica cristalina própria, é rica em metal de transição M+3 (Pr) e tem mais oxigênio que o grão. Esses pesquisadores consideram que a influência direta desta fase secundária na não linearidade da corrente é provavelmente desprezível,

principalmente quando elas estão presentes em junções triplas. De qualquer forma este excesso de espécies de oxigênio oferecem abundância de estados eletrônicos no contorno de grão. Eles ainda supõem que, se esta fase contribuir de alguma forma na propriedade não linear, devem ser realizados estudos para verificar as alterações na estrutura de banda.

Vários autores têm relatado que a adição de alguns óxidos aumenta a concentração de espécies de oxigênio no contorno de grão, e modificam a barreira de potencial do tipo Schottky formada nesta região[8, 18, 48, 82], a mesma encontrada em varistores de ZnO.

Os varistores de SnO2 vêem despertando o interesse de vários pesquisadores. Apesar das diversas pesquisas realizadas com esses materiais, ainda não se sabe ao certo o efeito dos dopantes nas suas propriedades elétricas, e também, ainda não há um modelo completo para o mecanismo de transporte eletrônico através das barreiras de potencial formadas no contorno de grão. Por isso, o desenvolvimento de novos trabalhos é de grande importância para o avanço do conhecimento sobre esses varistores.

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