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2. MEMÓRIA, EDUCAÇÃO E TURISMO: INTERFACES NA

2.5 Outras Caminhadas

Práticas que promovem essas vivências de reconhecimento de espaços cotidianos têm acontecido de forma sistemática em diversas cidades, comumente atividades ou roteiros relacionados a ambientes em busca de revitalização, como centros urbanos e históricos. Costa (2009) cita que Viena, Londres e Paris foram as primeiras cidades a contar com excursões em formato de caminhada. Aponta como outros exemplos as cidades americanas como Boston, Filadélfia, São Francisco e Nova York, além de cidades europeias como Oxford, York, Chester e Berlim.

Estas atividades estão presentes também no Brasil, em São Paulo, Fortaleza e Porto Alegre. Na capital paulista, o arquiteto Marcio Mazza desenvolveu roteiros com o objetivo de desvendar aspectos históricos, culturais e, especialmente, arquitetônicos da cidade. Desde 2007, os roteiros do Arq!Tours, promovidos pelo portal de arquitetura Arq!Bacana, atraem amantes de São Paulo em geral. Na agenda estão passeios que contemplam navegações pelo Rio Tietê, visitas às curvas e cores kitsch das obras arquitetônicas de Artacho Jurado, as galerias modernistas do centro, as vilas operárias e o Farol do Jaguaré à beira do Rio Pinheiros. Segundo a Revista da Cultura (2010), os passeios ocorrem uma vez ao mês e são repetidos quando a procura é grande. Cada roteiro tem um valor diferente, dependendo dos locais visitados e do meio de transporte necessário, pois pode ser todo a pé ou com trechos de ônibus fretado.

Além da iniciativa de empreendedores, há também atividades gratuitas, oferecidas em parceria com órgãos governamentais. Em Fortaleza, o historiador e guia de turismo Paulo Probo decidiu criar um roteiro de bicicleta pelo centro da capital inspirado em uma viagem a Buenos Aires, na Argentina. Segundo a mesma reportagem da Revista da Cultura (2010), desde o começo de 2010, em parceria com a direção do Theatro José de Alencar, Probo promove o passeio Viva o Centro!, levando fortalezenses e turistas a pontos históricos da capital do Ceará. No último domingo de cada mês, às 16h, o público, formado por moradores e turistas, se reúne no jardim do teatro. O passeio dura duas horas, e a cada edição oferece um roteiro diferente.

Em Porto Alegre, após o início da ação Viva o Centro a Pé, objeto deste estudo, outros roteiros também têm ocorrido. Desde maio de 2009, são realizados os roteiros chamados Caminhos da Matriz, desenvolvidos pelo Memorial do Ministério

Público em parceria com as instituições instaladas em prédios históricos do entorno da Praça Marechal Deodoro, comumente chamada pelos porto-alegrenses de Praça da Matriz. Os roteiros ocorrem no último sábado de cada mês, de maio a novembro, com duração de 2h15min. Os grupos são orientados pelos mediadores de cada instituição e a participação é gratuita.

De maio de 2009 a maio de 2011, ocorreram 14 roteiros. Em função da grande quantidade de prédios históricos participantes, a partir de 2011, o projeto oferece dois tipos de roteiros alternados. O primeiro roteiro inclui visitação ao Memorial do Ministério Público, Memorial do Judiciário e Museu Julio de Castilhos. O segundo roteiro inclui o Palácio Piratini, o Solar dos Câmara e o Arquivo Público do Estado. De acordo com o material de divulgação distribuído sobre os Caminhos da Matriz, o projeto busca “aproximar a população do patrimônio histórico e cultural da cidade de Porto Alegre”.

A prática de caminhadas de reconhecimento tem se ampliado inclusive na iniciativa privada. Recentemente, a artista plástica Vera Lago12 conduziu duas caminhadas orientadas. Segundo a artista,

“O ato de caminhar mais vagarosamente pode nos permitir observar detalhes que deixamos de perceber quando andamos rapidamente pela cidade, em nossos trajetos cotidianos. Poderemos enriquecer ainda mais esta experiência se o fizermos em pequenos grupos, caminhando pela cidade com o objetivo exclusivo de desfrutar sua paisagem.”

A primeira Caminhada Orientada aconteceu em 29 de outubro de 2010, com roteiro nos Bairros Independência e Bom Fim. O segundo roteiro ocorreu em 09 de abril de 2011, visitando na Av. Independência a Casa Godoy e o conjunto de casas tombadas (visitação externa); a Rua Dr. Barros Cassal; Av. Alberto Bins; Rua Otávio Rocha e Rua Marechal Floriano, encerrando-se no Chalé da Praça XV.

Outro roteiro, em elaboração, é chamado de Museu do Percurso do Negro13, que objetiva resgatar a memória dos afro-brasileiros em Porto Alegre. O projeto é financiado pelo Monumenta, em colaboração com o movimento negro e vários órgãos públicos. Segundo o Monumenta, o Museu do Percurso é pensado,

12 http://www.veralago.com.br/pag1.html em 09/09/2011

13 Os dados para o projeto começaram a ser compilados em 2000. Em 2010 o trajeto já havia sido definido e a

equipe de monitores foi qualificada. No mesmo ano foi feito roteiro piloto com os participantes do Projeto Leituras da Cidade. Para mais informações sobre o tema, ver: BITTENCOURT JUNIOR, Iosvaldyr. Territorialidade Negra Urbana: a evocação da presença, da resistência cultural, política e da memória dos negros, em Porto Alegre, delimitando espaços sociais contemporâneos. In: POSSAMAI, Zita. (Org). Leituras da Cidade. Porto Alegre: Evangraf, 2010.

organizado e acompanhado a partir de um conselho gestor representativo de segmentos do movimento negro, e por representantes do poder público municipal.

O Museu consistirá em uma série de marcos em diversos locais do centro histórico – construções, ruas e praças – para lembrar a existência da comunidade. A intenção é que os marcos venham a ser feitos por artistas negros, e as visitas orientadas por jovens monitores. O roteiro guiado passará por dez importantes locais da cidade, e está previsto que quatro deles recebam monumentos. O primeiro monumento, um tambor com temas africanos, foi instalado em 2010 na Praça Brigadeiro Sampaio, antigo local de enforcamento de escravos. Os roteiros não foram ainda sistematizados, mas a previsão é de que sejam realizados mediante agendamento.

Estas ações, se consideradas em conjunto, podem demonstrar uma tendência em níveis internacionais, nacionais e regionais de valorização de espaços representativos da cultura, ao mobilizarem pessoas na busca do conhecimento ou reconhecimento destes. Em Porto Alegre, o mesmo espírito, além de dar origem às ações já citadas, resultará na criação do Viva o Centro a Pé, apresentado de forma mais aprofundada no próximo capítulo.