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Figura 2 Fachada antiga da igreja de Nossa Senhora do Carmo

2.6. A festa de Nossa Senhora do Carmo

2.6.2. Outras celebrações

A irmandade de Nossa Senhora do Carmo realizava e participava em outras celebrações. Em 1820, num termo de Mesa foi mencionado o Lausperene.285 O Lausperene foi introduzido em Braga no tempo do arcebispo D. Rodrigo de Moura Teles (1704-1728), e pretendeu desenvolver o culto eucarístico, tal como a prática devocional das Quarenta Horas, em que o Santíssimo era exposto em Hóstia e louvado.286

Do pouco que sabemos desta cerimónia na instituição, percebemos que os irmãos eram convocados rotativamente para que estivessem sempre dois a honrar o Santíssimo Sacramento durante uma hora. Esta era uma estratégia que garantia assistência permanente à Hóstia sagrada. Toda a Mesa assistia à exposição e reposição do Santíssimo Sacramento.

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Sobre os sermões e sua importância leia-se Marques, João Francisco, “A palavra e o livro”, in Azevedo, Carlos Moreira (dir.),

História Religiosa de Portugal…, pp. 402-406.Veja-se ainda Gouveia, António Camões, “O enquadramento pós tridentino e as

vivências do religioso”, in Mattoso, José (dir.), História de Portugal, vol. 4…, pp. 295-301.

284 ACCD, Livro de Termos de 1758 a 1786, fls. 77v.-78. 285 ACCD, Livro de Termos de 1786 a 1822, fls. 127v.-128.

286 Sobre este assunto leia-se Milheiro, Maria Manuela de Campos, Braga: A cidade e a festa no século XVIII…, p. 332. Ainda sobre

esta celebração, consulte-se Martins, Fausto Sanches, “Trono eucarístico do retábulo barroco português: origem, função, forma e simbolismo”, in Atas do congresso internacional do barroco, vol. II…, p. 30.

A irmandade carmelita marcava ainda presença noutras procissões na cidade. Tendo Braga muitas confrarias, tornavam-se numerosas as celebrações e festas assinaladas ao longo do tempo litúrgico.

Sabemos que a irmandade acompanhava a procissão do Corpo de Deus da cidade.287 O Corpus Christi era uma celebração oficial da Câmara e uma das mais importantes da cidade. A participação da corporação carmelita demonstrava a importância que a instituição detinha na vida social e religiosa da cidade.

A festa do Corpus Christi era uma celebração que se realizava em praticamente toda a Europa católica, bem como, em muitas localidades portuguesas,288 e também em territórios coloniais.289

Esta festividade surgiu para exaltação do Santíssimo Sacramento, que celebrava a Eucaristia, a presença real de Cristo na Hóstia consagrada.290 Esta celebração remontava à Idade Média, período em que se difundiram pelo continente europeu as heresias. A partir do Concílio de Trento (1545-1563), esta transformou-se na principal festividade da Igreja no período da Contra-Reforma.

Na Península Ibérica, a festa e procissão do Corpus Christi tinham grande participação popular, onde se incorporavam elementos populares e litúrgicos, misturando o sagrado e o profano.291 Todavia, no princípio do século XVIII esta celebração adquiriu um caráter mais religioso em detrimento do popular. As procissões espelhavam uma sociedade hierarquizada, com a presença das dignidades civis e religiosas nos lugares mais importantes do cortejo.292

287 Relativamente a esta festa em Braga veja-se Feio, Alberto, Coisas Memoráveis de Braga, Universidade do Minho, Biblioteca

Pública de Braga, 1984, pp. 130-132. Sobre a procissão do Corpo de Deus em Braga veja-se ainda Freitas, Bernardino José de Senna, Memórias de Braga, vol. V…, pp. 316-317.

288 Para o caso de Ponte de Lima em que esta festa reunia a população, e integrava os organismos locais, a participação dos mesteres

e confrarias da cidade, leia-se Cardona, Paula Cristina Machado, O perfil artístico das confrarias em Ponte de Lima na Época

Moderna, Ponte de Lima, Município de Ponte de Lima, 2010, pp. 51-53.

289 Veja-se Santos, Beatriz Catão Cruz, O Corpo de Deus na América: A festa de Corpus Christi nas cidades da América

portuguesa- século XVIII, s.l., Annablume, 2005, pp. 22-56.

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Sobre esta questão confira-se Valiente Timón, Santiago, “La fiesta del “Corpus Christi” en el Reino de Castilla durante la Edad Moderna”, in Ab Initio, Núm. 3 (2011), pp. 45-57. Leia-se ainda Lléo Cañal, Vicente, Fiesta grande el Corpus Christi en la Historia

de Sevilla, Sevilla, Servicio de Publicaciones del Ayuntamiento de Sevilla, 1992, p. 17.

291 Relativamente aos elementos, podiam-se encontrar a tarasca, gigantes, anjos e evangelistas, animais, diabos e judeus, danças e

carros alegóricos. Veja-se Rodríguez González, Alfredo; Martínez Gil, Fernando, “Del barroco a la ilustración en una fiesta del Antiguo Régimen: el Corpus Christi”, in Cuadernos de Historia Moderna Anejos, nº 1, 2002, pp. 151-175.

292 Acerca desta questão no caso da procissão de Sevilha veja-se Lléo Cañal, Vicente, Fiesta grande el Corpus Christi en la Historia

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No período barroco, todos os habitantes eram convidados a participar e a colaborar nestas celebrações, transformando-as em momentos públicos grandiosos.293 Todavia, a estrutura organizativa pertencia às câmaras, mas a Igreja tinha um lugar de destaque.294 As confrarias participavam nestas procissões representando os ofícios, oragos e insígnias a que pertenciam.

Na América portuguesa, esta festa era celebrada sob o apoio da monarquia portuguesa e da Igreja. Tal como na metrópole, eram as câmaras que organizavam a celebração e todos os grupos sociais participavam, organizados hierarquicamente.295

Voltando novamente à festa em Braga, encontramos uma alusão à procissão do Corpo de Deus nos atos de Mesa, mas não pelos melhores motivos. A irmandade de Nossa Senhora do Carmo entrou em conflito com a irmandade das Almas da Sé devido à precedência de lugares que estas duas irmandades ocupavam na procissão.296 Levada às instâncias jurídicas, esta contenda alongou-se por um tempo significativo, durando cerca de oito anos (1822-1830).

Como podemos depreender, as procissões tinham grande destaque nas atividades desenvolvidas pelos irmãos.

A corporação era também convidada a marcar presença em procissões de outras irmandades da cidade. De igual forma, a irmandade carmelita convidava determinadas confrarias para participarem na procissão solene de Nossa Senhora a 16 de julho. Entre as confrarias mencionadas nos termos de Mesa e livros de receita, que solicitavam a presença dos irmãos carmelitas encontramos a irmandade de Nossa Senhora de Guadalupe,297 a de Nossa Senhora das Angústias,298 do Santíssimo Sacramento299 de S.

293 A propósito da festa nas cidades e suas características, leia-se Tedim, José Manuel, “A festa e a cidade no Portugal barroco”, in

Atas do II congresso internacional do Barroco, Porto, Faculdade de Letras, 2003, pp. 317-324. Sobre a festa e procissão de Corpus Christi de Madrid, celebração municipal, que mobilizava toda a população e que conjugava figuras lendárias com elementos

barrocos, veja-se Bernáldez Montalvo, José María, Las tarascas de Madrid, Madrid, Ayuntamiento de Madrid, Delegación de Cultura, 1981, pp. 11-24.

294 Para o caso da cidade do Porto veja-se Barros, Amândio Jorge Morais, “A procissão do Corpo de Deus do Porto nos séculos XV

e XVI: A participação de uma confraria”, in Separata da Revista da Faculdade de Letras, vol. 10, 2ª série, 1993, pp. 117-136. Leia- se ainda Gonçalves, Iria, “As festas do «Corpus Christi» do Porto na segunda metade do século XV: A participação do concelho”, in

Separata de Estudos Medievais, Porto, nº5, 6, 1985, pp. 3-23.

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Sobre as influências portuguesas desta festa nas cidades coloniais confira-se Santos, Beatriz Catão Cruz, O Corpo de Deus na

América: A festa de Corpus Christi…, p. 50.

296Relativamente à organização e definição da ordem de atitudes nos cortejos religiosos consulte-se Gouveia, António Camões,

“Procissões”, in Azevedo, Carlos Moreira (dir.), Dicionário de História Religiosa…, pp. 336-337. Sobre os conflitos de precedência na festa do Corpo de Deus, nomeadamente entre o senado de Belém e párocos do Pará, confira-se Santos, Beatriz Catão Cruz, O

Corpo de Deus na América: A festa de Corpus Christi…, pp. 102-104.

297Esta confraria pertencia à capela com o mesmo nome, sita na paróquia de S. Vítor. Consulte-se Gomes, Paula Alexandra de

Lázaro e de Nossa Senhora da Torre.300 Das irmandades convidadas pela irmandade de Nossa Senhora do Carmo encontramos a irmandade da Boa Morte,301 igualmente a de Nossa Senhora de Guadalupe, a de Nossa Senhora a Branca,302 a de Nossa Senhora do Parto303 e a de Nossa Senhora da Ajuda.304

Estas representações começam a acontecer regularmente e a ser cobradas tanto pela irmandade de Nossa Senhora do Carmo, como pelas outras que eram convidadas. O valor estipulado era, normalmente, de 6.400 réis para cada uma.