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OUTRAS VIOLAÇÕES AOS DIREITOS FUNDAMENTAIS DOS CONTRIBUINTES

2 OS DIREITOS FUNDAMENTAIS DOS CONTRIBUINTES E O DIREITO TRIBUTÁRIO BRASILEIRO

2.3 O DIREITO TRIBUTÁRIO BRASILEIRO E OS DIREITOS FUNDAMENTAIS DOS CONTRIBUINTES

2.3.2 OUTRAS VIOLAÇÕES AOS DIREITOS FUNDAMENTAIS DOS CONTRIBUINTES

A Emenda Constitucional n.º 62 constituiu, nesta pesquisa, apenas um estudo de caso. Porém, a doutrina vem há muito apontando diversas violações aos direitos fundamentais dos contribuintes.

Machado, por exemplo, critica “[…] o estreitamento injustificável do alcance do art. 138 do Código Tributário Nacional, cujo sentido político […] resta quase inteiramente anulado pelo entendimento fazendário […]”, com o aval do Judiciário.238

O autor também chama atenção para a desobediência ao comando constitucional da segurança jurídica com flagrante violação da regra da irretroatividade da lei tributária, mediante aumento de alíquota do imposto de importação sobre importação de automóveis.239

Menciona, ainda, a ausência de fundamentação adequada dos atos que aumentam alíquotas de impostos extrafiscais, permitindo o desvio de finalidade quanto à ressalva ao direito fundamental do contribuinte da estrita legalidade.240

Como se não bastasse, Machado denuncia as violações à legalidade, tais quais instituição e cobrança de tributo oculto, de taxa a título de tarifas, a adoção de critérios inadmissíveis de determinação de base de cálculo de imposto, bem como a não restituição do tributo pago indevidamente.241

No mesmo sentido da necessidade de instituição dos Estatutos dos Contribuintes em âmbito estadual e federal, o autor, aponta as violações ao devido processo legal no âmbito administrativo.242

No mesmo sentido, Ávila afirma que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, por exemplo, pode ser descrita como jurisdição restritiva, destacando que ao avaliar a jurisprudência em matéria tributária, também de outros tribunais, nota-se que os direitos fundamentais dos contribuintes vêm sendo ignorados reiteradamente.

238 MACHADO, 2009, p. 99. 239 MACHADO, 2009, p. 99. 240 MACHADO, 2009, p. 99. 241 MACHADO, 2009, p. 99. 242 MACHADO, 2009, p. 99.

Como fundamento de sua afirmação, critica a possibilidade de instituição de tributos por meio de medidas provisórias, em flagrante afronta à segurança jurídica e à democracia (arts. 1º, 5º, e 150, I e II, da CF/88).243

Além disso, aponta a possibilidade de alteração do Imposto sobre a Renda no término do ano, visto que não há restrição para controlar a alteração retroativa da hipótese de incidência, uma vez que se obedece a norma vigente no momento da declaração e não da prática do fato gerador.244

Ávila ainda ressalta a entrada em vigor de leis um dia após a sua publicação, pois muitas vezes em matéria tributária a lei é publicada no dia 31 de dezembro do exercício financeiro, entrando em vigor em 1.º de janeiro do ano subsequente, tornando a anterioridade meramente formal.245

Ademais, por mais de dez anos foi necessário pagamento para utilização da segunda instância do processo administrativo, apesar do artigo 5.º, inciso LV, da Constituição Federal prever um processo administrativo justo e o dever dos órgãos estatais de observar direitos fundamentais. Ainda assim, levou mais de uma década para o Supremo Tribunal Federal declarar que a exigência de depósito ou arrolamento prévio de bens e direitos como condição de admissibilidade de recurso administrativo constitui obstáculo instransponível, para consideráveis parcelas da população, ao exercício do direito de petição. 246

Importante destacar que as pesquisas desses autores não foram feitas de acordo com o marco teórico aqui adotado, qual seja, a Teoria Geral do Garantismo. Porém, seus exemplos são pertinentes.

2.3.2.1 O MINISTÉRIO PÚBLICO E O DIREITO TRIBUTÁRIO Como visto anteriormente, a Constituição Brasileira é considerada por Ferrajoli a mais avançada das constituições de terceira geração, porque contém um amplo catálogo de direitos sociais, por ser absolutamente rígida quanto às cláusulas pétreas, por prever a Defensoria Pública, o Tribunal Eleitoral, além de ter o duplo controle de constitucionalidade (concentrado e difuso), vinculação orçamentária e o Ministério Público como defensor dos interesses públicos.

243 ÁVILA, 2012, p. 633. 244 ÁVILA, 2012, p. 633. 245 ÁVILA, 2012, p. 634. 246

Nesse sentido são os artigos 127, caput, e 129, inciso III, da Constituição Federal:

Art. 127. O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. [grifo nosso] Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:

[…]

III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos; […].

§ 1º A legitimação do Ministério Público para as ações civis previstas neste artigo não impede a de terceiros, nas mesmas hipóteses, segundo o disposto nesta Constituição e na lei.

Logo, é cristalino que ao Ministério Público incumbe a defesa dos interesses individuais indisponíveis (caput, artigo 127, CF), dentre outros, com o fito de evitar ações de massa, ou seja, inúmeras ações judiciais discutindo o mesmo tema, alcançando, assim, a maior efetividade da justiça com maior economia.

Anteriormente, foi verificado que os direitos fundamentais dos contribuintes têm a característica de indisponibilidade e consistem (i) na estrita legalidade; (ii) na anterioridade; (iii) na irretroatividade da lei tributária; (iv) na tipologia tributária; (v) na proibição de tributo com efeito de confisco; (vi) na capacidade contributiva; (vii) na uniformidade geográfica; (viii) na não discriminação; (ix) na indelegabilidade da competência tributária; e (x) na não-cumulatividade.

Portanto, em todos os casos em que há violação desses e de outros identificados direitos fundamentais dos contribuintes, estaria o Ministério Público legitimado a deduzir em juízo a obediência aos mesmos.

Nesse diapasão, o artigo 25, inciso IV, alínea a da Lei n.º 8.625/1993, que institui a Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, é categórica:

Art. 25. Além das funções previstas nas Constituições Federal e Estadual, na Lei Orgânica e em outras leis, incumbe, ainda, ao Ministério Público:

[…]

IV - promover o inquérito civil e a ação civil pública, na forma da lei:

a) para a proteção, prevenção e reparação dos danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, aos bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico, e a outros interesses difusos, coletivos e individuais indisponíveis e homogêneos; […]. [grifamos] Ainda mais específica é a Lei Complementar n.º 75/1993, que dispõe sobre a organização, as atribuições e o estatuto do Ministério Público da União que em seu artigo 5.º, inciso II, alínea a, assinala que

Art. 5º São funções institucionais do Ministério Público da União:

[…]

II - zelar pela observância dos princípios constitucionais relativos:

a) ao sistema tributário, às limitações do poder de tributar, à repartição do poder impositivo e das receitas tributárias e aos direitos do contribuinte; […]. [grifamos]

O caráter de direitos individuais dos direitos fundamentais tributários é inegável, conforme explica Derzi:

A grande massa das imunidades e dos princípios consagrados na Constituição de 1988, dos quais decorrem limitações ao poder de tributar, são meras especializações ou explicações dos direitos e garantias individuais (legalidade, irretroatividade, igualdade, generalidade,

capacidade econômica de contribuir etc.), ou de outros grandes princípios estruturais, como a forma federal de Estado (imunidade recíproca dos entes públicos estatais). São, portanto, imodificáveis por emenda, ou mesmo revisão, já que fazem parte daquele núcleo de normas irredutível, a que se refere o art. 60, § 4º, da Constituição.247

No entanto, o Supremo Tribunal Federal entende que o Ministério Público não possui legitimidade ativa ad causam para deduzir em juízo pretensão de natureza tributária, com o fito de questionar a inconstitucionalidade ou legalidade de tributo. Nesse sentido:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO.

DELIBERAÇÃO VIRTUAL DO PLENÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA E REAFIRMADA A JURISPRUDÊNCIA. DESCABIMENTO. PRECEDENTES. ERRO

MATERIAL. POSSIBILIDADE DE

CORREÇÃO DE OFÍCIO (ART. 463, II, DO CPC). EMBARGOS ACOLHIDOS PARA DETERMINAR DE OFÍCIO A CORREÇÃO DE ERRO MATERIAL. […] 2. In casu, o acórdão embargado assentou: “DIREITO

CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO.

APELAÇÃO INTERPOSTA EM FACE DE SENTENÇA PROFERIDA EM SEDE DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA QUE DISCUTE MATÉRIA

TRIBUTÁRIA (DIREITO DOS

CONTRIBUINTES À RESTITUIÇÃO DOS VALORES PAGOS A TÍTULO DE TAXA DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA SUPOSTAMENTE INCONSTITUCIONAL). ILEGITIMIDADE ATIVA "AD CAUSAM" DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA, EM AÇÃO CIVIL

PÚBLICA, DEDUZIR PRETENSÃO

RELATIVA À MATÉRIA TRIBUTÁRIA.