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Faço, aqui, um parêntese para salientar que existem pesquisas na área médica de extrema relevância ao tema, que também discutem a eficácia dos testes padronizados para obtenção de determinados diagnósticos. Em relação à SXF destaco os trabalhos de Steiner (1998; 2002) que preocupado com o grande número de condições associadas ao Autismo, buscou estabelecer um protocolo de avaliação que as diferenciassem de forma mais efetiva. A justificativa reside no fato de que existem inúmeras doenças com mecanismos de transmissão ligados ao cromossomo X e que apresentam como manifestação principal a deficiência mental; além disso, muitas dessas afecções apresentam características, segundo a literatura, bastante semelhantes – o que resulta em dificuldades e confusões no diagnóstico preciso. O trabalho do autor fortalece a crítica aqui desenvolvida aos testes

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É importante ressaltar que não negamos a possibilidade de existirem comorbidades associadas à SXF. Se há uma questão orgânica que afeta o funcionamento cerebral é possível que haja Déficit de Atenção ou Hiperatividade. O que levantamos como discussão, assim como outros trabalhos já discutiram (Coudry, 1987, 2010, 2009, 2011, 2013; Bordin e Coudry, 2010; Antonio, 2011; Baradel, 2010; Muller, 2010 para citar alguns) a partir dos pressupostos da ND, é a banalização sobre esses diagnósticos.

14 Para aprofundar a discussão sobre a medicalização na infância, consulte-se o livro Medicalização de Crianças e Adolescentes - conflitos silenciados pela redução de questões sociais a doenças de indivíduos,

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psicométricos, que na maioria das vezes é limítrofe e não revela o que o sujeito é capaz de fazer.

Como vimos na descrição da SXF, uma das comorbidades associada à doença é o Autismo. Entretanto, nem sempre o diagnóstico de Autismo é confirmado no indivíduo com a SXF, muito embora ele possa apresentar características comportamentais que também são descritas e observadas em autistas – tais como dificuldade de contato físico com outra pessoa, contato visual escasso, ansiedade social, resistência a mudanças no ambiente, ecolalia, movimentos estereotipados (flaps), entre outros. Muitos pesquisadores constataram as similaridades entre essas duas afecções (BROWN et al., 1982; MERYASH

et al., 1982), havendo até mesmo aqueles que sugerissem uma possível associação entre

elas (GILBERG et al., 1988; KLAUCK et al., 1997; MEYER et al., 1998). Nesses casos, o autismo é do tipo secundário, presente também em casos de deficiência mental. Nesse contexto, Steiner destaca a importância de uma avaliação minuciosa de indivíduos com hipótese diagnóstica inicial de autismo.

Em seus estudos (STEINER, 1998; 2002) utiliza-se de diferentes métodos, já consagrados pela literatura, para diagnosticar indivíduos com Transtornos Globais do Desenvolvimento15: avaliação neuropsicológica, avaliação genéticoclínica e neurológica, triagem para erros inatos do metabolismo, análise cromossômica, estudo molecular das mutações FRAXA, FRAXE e FRAXF, eletroencefalograma, ressonância magnética e SPECT cerebral. Sobre a avaliação neuropsicológica, baseada na bateria Luria-Nebraska, constata o autor:

É oportuno destacar a possibilidade de ocorrer um viés na avaliação da capacidade intelectual de indivíduos autistas que se distraem com facilidade, respondem pouco aos comandos verbais do

15 Segundo o DSM-IV-TR, os Transtornos Globais do Desenvolvimento (TGD) caracterizam-se por um

comprometimento grave e global de diversas áreas do desenvolvimento: habilidades de interação social recíproca, habilidades de comunicação ou presença de estereotipias de comportamento, interesses e atividades. Os prejuízos qualitativos que definem estas condições representam um desvio acentuado em relação ao nível de desenvolvimento ou idade mental do indivíduo.

Segundo a CID-10, os TGD são um grupo de transtornos caracterizados por alterações qualitativas das interações sociais recíprocas e modalidades de comunicação e por um repertório de interesses e atividades restrito, estereotipado e repetitivo. Essas anomalias qualitativas constituem uma característica global do funcionamento do sujeito, em todas as ocasiões.

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examinador, ou ainda não estão motivados em revelar seu melhor desempenho, fornecendo resultados que não refletem sua verdadeira capacidade cognitiva (RAPIN, 1991), como foi observado na presente amostra (STEINER, 2002, p. 23).

Acrescento à constatação do autor que não apenas com indivíduos autistas isso pode ocorrer, como com qualquer criança que seja colocada em situação de teste – cujas atividades descontextualizadas e sem sentido (cf. nota 8) pouco motivam o sujeito a fazer o que se pede e pouco avaliam o que ele sabe.

Fato interessante, e que merece atenção, é que os testes psicométricos aplicados nos sujeitos estudados pelo pesquisador não puderam ser realizados com todos os indivíduos, uma vez que não correspondiam à realidade de grande parte desses sujeitos. Por essa razão, o autor, sensível à realidade da criança, propôs uma avaliação discursiva (informal), o que possibilitou analisar melhor cada indivíduo. Esse fato revela a restrição que tais testes apresentam e o parâmetro paradoxal sobre o qual eles se alicerçam: pautados em atividades padronizadas e descontextualizadas, busca-se avaliar um sujeito idealizado que não existe na prática. Sujeitos reais ficam à parte desse sistema de avaliação e os que conseguem responder sofrem um viés que não mostra a capacidade real do sujeito. Fica, assim, a pergunta: com que finalidade esses testes são, então, aplicados?

Steiner, em seu estudo, destaca ainda a importância dos exames citogenéticos e, mais particularmente, moleculares para o diagnóstico da SXF – concluindo que, juntamente a um exame físico meticuloso, trazem um retorno mais imediato aos pais e familiares do que testes e avaliações complementares (tais como as baterias de testes padronizadas que são utilizadas para se avaliar linguagem, QI, memória, função motora, etc.), que são de difícil realização e pouca utilidade prática no sentido de confirmar o diagnóstico de indivíduos com transtornos globais do desenvolvimento.

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CAPÍTULO 3

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