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Outros bloqueadores criativos relevantes para a inovação de marca

3.3 As pedras: bloqueadores do processo de inovação de marca

3.3.2 Outros bloqueadores criativos relevantes para a inovação de marca

Todos os entrevistados citaram de forma espontânea outros bloqueadores relevantes para o processo de inovação de marca. A maior parte deles refere-se ao contexto organizacional, mas tocam também a dimensão individual do processo de criação.

Relevância dos bloqueadores criativos apresentados - processo de inovação de marca

A visão de curto prazo: busca por lucro e rentabilidade imediatos

A busca pela diferenciação, não pela autenticidade bloqueadores mais relevantes Liderança: em time que está ganhando não se mexe bloqueadores menos

relevantes

A mudança superficial: variações do mesmo tema A inovação técnica sem propósito

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A fragmentação da estrutura organizacional, que faz com que as diferentes áreas envolvidas no processo de inovação de marca atuem de forma separada e sejam dirigidas por objetivos de negócios diferentes, quando não conflitantes, é, para Savaget, um importante bloqueador para a inovação de marca no âmbito organizacional. A partir do conceito de cultura de marca, em que um propósito, uma essência única se manifesta em tudo o que é feito por aquela marca, quem é o responsável pela marca? Quem harmoniza os diferentes esforços de uma marca, garantindo coesão e coerência?

Savaget aponta que, embora o conceito de cultura de marca sugira a sinergia da atuação à luz da marca, as estruturas organizacionais das empresas continuam, em sua maioria, divididas em grandes feudos paralelos. Ela lembra que, com o fortalecimento do conceito de cultura de marca na última década, esforços foram empenhados para adequar as estruturas organizacionais a essa visão. Segundo ela, a ação mais comum foi subordinar os departamentos responsáveis pela marca diretamente ao CEO (em inglês,

chief executive officer, o principal executivo de uma empresa) ou ao presidente de uma

empresa. Entretando, analisa ela, a função do CEO, quando se trata de estratégia de inovação de marca, não é de executar, mas sim de engajar. Mas em uma estrutura fragmentada, a função de execução se espalha pelas diferentes áreas da organização, como marketing, logística, produtos e é dirigida por seus executivos técnicos, sem um fio condutor único, que traga clareza e unidade.

Em se tratando dos bloqueadores do contexto organizacional, a lógica do controle que impera nos sistemas de gestão das empresas é outro campo citado por Bianchi, Pommez e Savaget como responsável por significativo bloqueio à ação criadora. O excesso de controle e de pensamento lógico aplicado ao processo de inovação de marca se manifesta nos filtros a serem aplicados, modelos a serem preenchidos e quantidade de rituais de aprovação a serem vencidos em uma jornada de criação.

Essa extrema processualização da criação é interpretada pelos atores da inovação como um desejo de controle de cada etapa do processo, da busca pelo entendimento cognitivo estruturado o tempo inteiro, de forma objetiva e numérica. Bianchi destaca o impacto negativo desse controle de processo na criação:

inúmeros processos de inovação em várias empresas começam super ambiciosos e acabam com resultado pífio, porque os filtros internos são tantos, o medo de apostar em algo novo é tanto, que você vai perdendo pouco a pouco ao longo do caminho.

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Pommez concorda. Segundo ele, processos, modelos, ferramentas e rituais de aprovação devem existir em função de te ajudar a organizar e a sistematizar o seu trabalho, mas jamais devem servir para estruturá-lo ou controlar a forma como ele deve nascer. “Nas empresas, esses processos viraram a estrutura da criação, mas a criação precisa ser não- linear, caótica. O pensamento organizado é a etapa final da história”, complementa. Bianchi adiciona o impacto deste excessivo controle do processo no tempo levado para que uma inovação seja lançada, ressaltando que uma inovação, quando não vem à vida em seu próprio tempo, perde força e envelhece. Ela contrapõe o ímpeto inovador e empreendedor de pequenos empresários à morosidade dos processos em grandes organizações:

desenvolvemos um projeto completo, do briefing ao lançamento, de uma marca de produtos de beleza com uma empresária local em 8 meses. Em uma grande empresa como Unilever, Nestlé, esse prazo não seria suficiente nem para a primeira etapa do projeto.

A existência de muitas ferramentas para sistematizar a identidade da marca pode, inclusive, atuar como um bloqueador criativo reforçando o excesso de controle nesses casos. Pommez reflete que, quando há muitos instrumentos para definir o que se é e como fazer, muitas listas de coisas a que se atender, há o risco de que as pessoas se percam no caminho e desviem daquilo que elas “sabem” que é a marca. Savaget acrescenta que as ferramentas de gestão de identidade de marca, se utilizadas sem contexto, podem também gerar uma atuação entrópica ou dogmática, excluindo a dimensão do outro na construção da marca.

Por outro lado, ponderando a mesma questão, os próprios Pommez e Savaget destacam que o fato de as ferramentas de gestão de identidade de marca fundamentais para o processo de inovação serem pouco disseminadas em muitas empresas também é um importante bloqueio para a inovação de marca. Se o papel da marca é iluminar o caminho da inovação, é necessário que a organização conheça os elementos que definem a marca e tenham discernimento para utilizá-los e julgar quando estão presentes ou não.

Quando essa competência organizacional não está instalada – a marca não é conhecida por todos, em todos os seus aspectos, tampouco é conhecida a expectativa de que ela atue no processo de inovação dessa forma – há um bloqueador criativo significativo.

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Savaget provoca: “onde mora o manual, o book da marca?”. Se ele fica em um lugar que chama “obrigação”, ela completa, que você conhece apenas quando entra na empresa e nunca mais tem contato, ele fica distante e sem uso.

Pommez complementa que, além de conhecer a essência fundadora da marca e seu papel no processo de inovação, é preciso que os profissionais estejam capacitados para operá-los, utilizá-los na prática de forma criativa e não linear. Muitas vezes, lembra ele, o responsável pela inovação é o gerente júnior de produto que não conhece o suficiente o campo que ele está tratando para julgar se está alinhado ou não. Mais do que disseminação dos instrumentos de gestão de identidade de marca, é preciso renovação constante do conhecimento relacionado a ele.

Mas também não haverá potencialização da ação criadora se, além de a competência organizacional sobre gestão de marca estar instalada, não estiverem também os profissionais capacitados com repertório individual para operá-las. Mota e Bianchi reforçam a relevância deste bloqueador, que se refere à dimensão individual do processo criativo.

Mota alerta que não há ferramenta de gestão, por melhor que seja, que consiga suprir o despreparo de quem a está aplicando. Ele destaca o impacto negativo da falta de repertório individual na dimensão técnica, relacionada aos campos clássicos da gestão de marca (como identidade gráfica, design, artes visuais) e também a falta de repertório cultural mais amplo, relacionado à estética de forma mais geral e ao desenvolvimento da sensibilidade. Segundo Mota, a falta de repertório dos profissionais os impede de identificar oportunidades, compreender as propostas mais inovadoras e consequentemente tomar a decisão em favor do ousado e do novo.

Bianchi aponta que, além das questões de formação pessoal e profissional dos executivos, contribui para que este bloqueador esteja presente a constante movimentação de cargos e posições nas empresas. Ela ressalta a dinâmica de mudança constante predominante nas organizações e considerada com sucesso de carreira, que levam os profissionais a terem pouco tempo para aprofundamento nas questões relacionadas ao cargo.

Moore destaca como um importante bloqueador criativo a falta de engajamento da liderança nos processos de inovação de marca, bloqueador que fica em uma fronteira

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tênue entre o contexto organizacional (ausência de cultura de inovação) e o contexto individual (bloqueadores individuais à ação criadora). Moore afirma que não faz sentido investir em um projeto de inovação radical se a liderança não estiver engajada e não apoiar o movimento. Normalmente, atesta, em marcas que não tem cultura de inovação, é preciso fazer antes um projeto de design organizacional, para alterar hábitos, comportamentos e modelos mentais.

Os bloqueadores citados espontaneamente pelos entrevistados são também relevantes para o processo de criação em direção a uma inovação de marca. Três deles - a estrutura organizacional fragmentada, as ferramentas de gestão de identidade de marca pouco disseminadas e a falta de repertório técnico e cultural – estão diretamente relacionados à evolução do conceito de marca. Na perspectiva do mix de marketing, em que a inovação de marca estava subordinada a um pilar do marketing, o produto, e a própria disciplina do branding era um incipiente desdobramento do marketing, esses fatores poderiam nem chegar a se configurar como bloqueios.

Na atualidade, a perspectiva do mix de marca coloca o conceito de marca como orientador de todas as manifestações concretas, incluindo e transcendendo o produto, e a disciplina do branding evolui como que regência da criação de valor e significado da marca. Neste contexto, fatores como a fragmentação do olhar, a pouca fluência nas ferramentas de gestão de identidade de marca e no repertório técnico e cultural do branding passa a impactar negativamente de forma significativa.

Os dois outros bloqueadores levantados pelos entrevistados – o processo de inovação excessivamente lógico e controlado e a falta de engajamento da liderança – são reflexos diretos de bloqueios criativos organizacionais, aplicados aos processos de inovação de marca. É natural que, como um processo que se desenvolve nas organizações, os bloqueios organizacionais mais relevantes também sejam sentidos no processo de inovação de marca.

Em uma visão consolidada que traz os bloqueadores apresentados e os bloqueadores citados espontaneamente pelos entrevistados, vê-se a ocorrência de bloqueadores em três dimensões: do contexto organizacional, do contexto mercadológico e principalmente relacionados à mudança de paradigma do conceito de marca, do mix de marketing para a cultura de marca.

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Tabela 6: Dimensões dos bloqueadores criativos para inovação de marca