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Pedras no caminho: os bloqueios da inovação de marca

2.3 Marca e inovação: o que sou e o que posso ser

2.3.2 Pedras no caminho: os bloqueios da inovação de marca

O processo de inovação de marca, assim como qualquer processo de inovação, é resultado da ação criadora e impactado por uma série de bloqueadores criativos. Sem dúvida, uma vez que conduzido por pessoas e realizado nas diferentes formas de inteiração entre essas pessoas, este processo pode ser impactado direta ou indiretamente por todos os níveis de bloqueadores criativos, sejam eles classificados em pessoais, ambientais, culturais ou organizacionais (Sanmartin, 2012); perceptivos, emocionais e de contexto (Person, 2011) ou inconsciente, semi-consciente, da consciência racional ou supra-consciente (Prado, 2006, p.1-12).

No ambiente organizacional, contudo, onde o processo de inovação de marca é desenvolvido, os bloqueadores relacionados ao contexto, conforme definição de Pearson ou os racionais, conforme definição de Prado, são aqueles que apresentam impacto de forma mais direta. Esses bloqueadores se manifestam na forma da cultura e estrutura de poder, normas e valores reforçados e ainda nos hábitos e respostas automáticas, da autoridade impositiva, do referendo social, da ordem social externa e imposta e da ordem moral dos valores socialmente aceitos.

Retomando a lista dos “inimigos da inovação nas empresas”, de Predebon (2006, p.204- 205, cit in Sanmartin, 2012, p. 83) encontramos exemplos de bloqueadores que impactam diretamente no processo de inovação de marca: segmentação total dos processos e excessiva especialização; excesso de normas; estratégias rigidamente frontais, que desprezam novos olhares, ângulos e atalhos; estrita obediência a números; obediência cega ao consenso, mantendo as coisas dentro dos parâmetros e normas já pré-estabelecidos. A lista de bloqueadores de Prado (ibidem) faz eco a esses bloqueadores: a visão incompleta ou parcial do trabalho da organização, a burocracia e o excesso de normas, a inflexibilidade e a rigidez, a falta do espírito de autonomia e iniciativa, a ausência de desafios, ousadia e melhoria contínua, a falta de apoio de novas ideias e procedimentos, o excesso de medo do fracasso, o desejo de lucro e rentabilidade imediata.

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Para detalhar o impacto desses bloqueadores na inovação de marca, classificamo-los em cinco grupos, significativamente presentes no universo das organizações contemporâneas, que tratam de sintomas relacionados tanto a uma visão limitada e míope do contexto mercadológico em que estão inseridas quanto a uma visão limitada de seus próprios potenciais e possibilidades de inovação.

a) A visão de curto prazo: busca por lucro e rentabilidade imediatos

Em cenários cada vez mais competitivos, é fácil deixar-se levar pela visão de curto prazo e desejo de recompensa imediata, e afastar-se de inovações mais relevantes e profundas, cujos resultados nem sempre são observáveis no primeiro momento. Essa visão de curto prazo, focada na ampliação das transações, e não no fortalecimento da lealdade e de relações de longo prazo, leva a táticas de estímulos e benefícios geralmente comerciais, como preço, promoção, manipulação na comunicação. Estes artifícios produzem muitas novidades, incrementais, mas pouca inovação de fato.

b) A busca pela diferenciação, não pela autenticidade

Sinek (2009, p.46) alerta para o fato de que apenas empresas que se veem como commodities (mercadorias sem diferenciação) são guiadas pelo desejo de diferenciação. Ser única em sua relação com os diferentes públicos é um anseio legítimo de toda marca, mas a armadilha está em colocar o foco totalmente no contexto externo e perseguir o objetivo de fazer diferente dos concorrentes, e não de fazer de diferentes formas aquilo que se faz de melhor. Sinek (ibidem) atesta que organizações com clareza de seu porquê não se preocupam em ser diferentes porque elas não se veem de forma parecida com as outras marcas, elas tem clareza de seu valor e daquilo que as torna única. Semprini (2010, p.225) resume: “uma inovação estritamente ligada a um projeto de marca específica pode ela também ser copiada, mas só associada a se próprio projeto de marca ela encontra sua coerência e sua manifestação naturais”. A falta desta clareza, por sua vez, e a busca pela diferenciação tendo como referência apenas o universo externo dos competidores, pode levar as marcas a táticas de convencimento baseada em elementos diferenciadores sem relevância de sentido.

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c) A mudança superficial: variações do mesmo tema

Semprini chama a atenção para um bloqueador criativo relevante, disfarçado de ativador. “Às vezes, as marcas em crise de inovação em nível de seu projeto utilizam a comunicação como isca para ingênuos e inovam em seus códigos ou em seus modos de comunicação” (2010, p.149). Agindo dessa maneira, eles deslocam a problemática da marca do centro (o projeto) para a periferia do sistema, quer dizer, no nível de uma de suas manifestações. Como agravante deste bloqueador – colocar a comunicação no centro da inovação de marca – está ainda o uso indiscriminado de pesquisas com o consumidor para determinar o que deve ser mudado em um posicionamento histórico. Alerta Semprini (ibidem): “geralmente, procura-se junto aos consumidores a resposta a essa pergunta, ao passo que precisaria ser procurada, em primeiro lugar, no próprio projeto da marca e em sua história”.

d) Liderança: em time que está ganhando não se mexe

Em teoria uma posição desejada e benéfica para as marcas, a liderança pode ser um poderoso bloqueador criativo para a inovação. Sinek lembra que pequenos empreendedores costumam pensar, agir e comunicar-se motivados pelo porquê, pela essência, e na medida em que crescem e atingem o sucesso, revertem esse processo, preocupando-se mais com o que fazem e com os processos e sistemas que possibilitarão resultados tangíveis. Uma marca líder, contudo, apesar da posição de conforto e das inquestionáveis vantagens que ela oferece (notoriedade, forte presença em comunicação e em distribuição, recursos que favorecem a inovação), tem uma pressão ainda maior de seus públicos para manter a dianteira no mercado, muitas vezes tendo sua credibilidade ancorada em sua capacidade de ousar e inovar. Semprini lembra que “esse lugar dominante e suas vantagens são sistematicamente questionados, recolocados em dúvida. (...) No universo das marcas pós-modernas, o sucesso alimenta o sucesso, mas se alimenta também, e sobretudo, de investimentos, de ideias, de criatividade e de audácia” (2010, p.111).

e) A inovação técnica sem propósito

A inovação tecnológica ou funcional não está excluída da inovação de marca, ao contrário, desempenha nela um papel muito importante. Mas ao localizar a fonte de inovação apenas no desenvolvimento tecnológico ou técnico, corre-se o risco de

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negligenciar outras pistas de inovação, que podem se concretizar tão importantes ou mais. Semprini afirma que “um projeto de marca claro permite traçar os percursos de inovação técnica dos produtos concebidos como a principal manifestação da marca” (2010, p.228). Ao contrário, continua, quando a dinâmica de inovação está diretamente localizada no nível técnico de desenvolvimento de produto, ela arrisca a seguir uma linha puramente técnica, na qual se pratica a inovação pela inovação.