• Nenhum resultado encontrado

1. Introdução

1.2. Estimativa da energia livre de Gibbs por métodos computacionais

1.2.5. Outros métodos computacionais

Vários outros métodos têm já sido apontados como soluções para o cálculo da energia livre de Gibbs em reações bioquímicas. Entre os que serão abordados nas

próximas linhas, contam-se métodos com o dado comum de serem muito exigentes a nível computacional, apesar de produzirem resultados com elevada exatidão, obtidos com base em princípios físico-químicos rigorosos e bem conhecidos, que viabilizam uma cobertura de praticamente 100 % das reações metabólicas. Por este motivo, é também comum encontrar na literatura a sugestão de poderem ser aplicados enquanto métodos complementares, nomeadamente em casos para os quais não seja possível a obtenção de estimativas através dos métodos já descritos. Adicionalmente, as abordagens que se seguem podem também possibilitar a validação de valores experimentais obtidos a partir de um número reduzido (ou mesmo único) de medições.[20, 40]

1.2.5.1. MECÂNICA MOLECULAR E DINÂMICA MOLECULAR

Mecânica Molecular (MM) e Dinâmica Molecular (MD) são termos que se referem a métodos de simulação computacional que permitem estimar determinadas propriedades moleculares, normalmente relacionadas com aspetos estruturais e energéticos. Ambos se baseiam em funções da energia potencial deduzidas a partir da mecânica clássica, bem como em parâmetros inferidos pela via experimental (por exemplo, espetrometria de infravermelhos ou cristalografia de raios-X) ou pelo cálculo, de acordo com os princípios da mecânica quântica. É frequente a atribuição da expressão Campo de Forças ao conjunto das funções da energia potencial e dos parâmetros que lhe estão associados.

MM é normalmente aplicado quando se pretende calcular as energias relativas

entre diferentes conformações geométricas para a mesma molécula. Estas diferentes conformações estão habitualmente relacionadas com fenómenos como rotações em torno de certas ligações químicas ou a formação de complexos intermoleculares. Frequentemente, MM é aplicado tendo em vista o cálculo de mínimos energéticos, pelo que também poderá ser utilizado em conjugação com algoritmos de otimização.[41]

As simulações computacionais por MD constituem uma metodologia que permite uma modelação detalhada de um sistema à escala atómica e são uma ferramenta poderosa, largamente aplicada em química e em física. Esta técnica permite acompanhar a evolução do sistema em estudo ao longo do tempo e fazer previsões sobre as propriedades estáticas ou dinâmicas das mais variadas substâncias a partir de uma monitorização das interações entre moléculas. Estas simulações operam através da resolução numérica das equações de movimento que descrevem os movimentos

executados pela molécula, fornecendo assim informação sobre propriedades estruturais e termodinâmicas. Através de MD é então possível coligir informação sobre a magnitude das variações de posição e de velocidade, bem como sobre a forma como estas variam ao longo do tempo. Dentro deste tipo de abordagens, é ainda possível referir o método de Monte Carlo, focado principalmente nas mudanças de posição, mas fornecendo pouca informação sobre a sua dependência face ao decorrer do tempo. Dependendo do nível de rigor desejado, as equações de movimento a serem resolvidas por estes métodos podem seguir o modelo clássico de Newton ou derivar para modelos mais complexos, tais como o movimento estocástico de Langevin, o modelo Browniano, ou mesmo combinações entre métodos de mecânica clássica e mecânica quântica.[42]

Estas metodologias revelam-se particularmente úteis no estudo de reações que decorrem em ambientes aquosos, como é o caso da grande maioria das reações metabólicas. Em particular, possibilitam a simulação pormenorizada das interações dos reagentes com o solvente e a obtenção de informação sobre aspetos como a eventual predominância de uma forma ionizada sobre outras, o que pode ser preponderante na análise de reações onde intervém grupos ionizáveis ou cuja termodinâmica seja especialmente influenciável por variações no pH, ainda que ligeiras. Contudo, as equações para a energia potencial utilizadas nestes métodos dificilmente podem ser adaptadas ao estudo de casos que envolvam a quebra e formação de novas ligações químicas.[43] Este último aspeto torna-se um obstáculo claro à aplicação destes modelos no contexto desta dissertação, pelo menos sem a sua conjugação com outras metodologias.

1.2.5.2. MÉTODOS QUÂNTICOS / AB INITIO

Os métodos quânticos ou Ab Initio debruçam-se sobre cálculos de mecânica quântica, derivados unicamente de princípios teóricos e ignorando qualquer tipo de conhecimentos resultantes da via experimental. Estes métodos procuram resolver a equação de Schrodinger, através da posição do núcleo dos átomos envolvidos e do respetivo número de eletrões – dos quais é possível obter densidades eletrónicas, energias e outras propriedades do sistema. Entre estes métodos, as abordagens de Hartree-Fock e Post-Hartree Fock são algumas das mais conhecidas e têm já sido referidas como parte integrante de soluções para a problemática das estimativas da

energia livre de Gibbs.

Os métodos Ab Initio oferecem a possibilidade de convergência para uma solução exata, embora o custo computacional de uma tal simulação seja frequentemente um entrave. Apesar do desenvolvimento de processadores e computadores modernos e com melhores capacidades, é habitual que o tempo requerido para computação pelos métodos Ab Initio leve a que em algumas aplicações específicas seja ainda preferível a opção por métodos menos rigorosos como MM.[44]

1.2.5.3. MÉTODOS HÍBRIDOS – MECÂNICA QUÂNTICA / MECÂNICA MOLECULAR

Os métodos computacionais baseados em mecânica quântica constituem a abordagem mais rigorosa e com resultados mais próximos da realidade quando se trata de estudar as propriedades de reações químicas. No entanto, no que toca a reações bioquímicas – que envolvem a participação de enzimas e, frequentemente, a transformação de proteínas e/ou ácidos nucleicos – o tamanho do sistema em análise facilmente ultrapassa os limites práticos da computação actual. Esta questão pode ser simplificada através do enfoque apenas no substrato e no local ativo da enzima, e ignorando o restante contexto. Ainda assim, o restante da estrutura proteica e o solvente podem alterar significativamente os parâmetros energéticos do sistema, pelo que se torna necessário encontrar uma forma de incluí-los na análise.

O aparecimento de métodos híbridos Mecânica Quântica – Mecânica Molecular (QM-

MM) trouxe uma forma de responder ao problema. A base desta metodologia está na

divisão do sistema entre uma região mais pequena – onde decorre a principal interação com o substrato – e que é tratada por QM; e o restante sistema, que é modelado pelos métodos menos exigentes da mecânica clássica. Estes métodos são também frequentemente designados como semi-empíricos.

Naturalmente que a principal vantagem destes métodos está em poderem ser aplicados a sistemas vastos a um custo computacional mais reduzido. Por outro lado, além do rigor reduzido face aos métodos puramente quânticos, os métodos semi- empíricos apresentam a desvantagem de regra-geral serem parametrizados para refletir as propriedades das moléculas no seu estado fundamental, o que torna difícil a sua aplicação em muitas reações químicas. A resposta a estas limitações está frequentemente na aplicação de métodos Ab initio ou de teoria dos funcionais da densidade na região que é resolvida por mecânica quântica. Ambas as abordagens

possibilitam um maior rigor quantitativo e a teoria dos funcionais da densidade fornecem uma forma mais prática de incluir correlações eletrónicas na análise.[45]

A aplicação de abordagens híbridas em múltiplos contextos está cada vez mais enraizada e são disso exemplo vários estudos em física e ciências de materiais[46], bem como a sua utilização na descrição do comportamento de moléculas e reacções bioquímicas[43, 47, 50], incluindo ao nível dos seus aspectos termodinâmicos[40, 48, 49].

Documentos relacionados