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Pós-Graduação Lato Sensu: um pouco da trajetória no Brasil

A chegada de D. João VI ao Brasil em 1808 faz surgir as primeiras faculdades como a Escola de Direito, Escola de Medicina e Escola Politécnica. Tratava-se de escolas isoladas mantidas pelo Estado e objetivavam a formação de profissionais para atendimento ao próprio Estado e à sociedade.

Segundo Samways Filho (1998, p. 4) no Decreto nº 1.874, de criação da Escola Politécnica, “o Poder Executivo fazia menção a cursos especiais de caráter profissionalizante, referindo-se aos primeiros cursos de especialização, porém, em nível de graduação, em forma de educação continuada nos moldes atuais”.

Contudo, somente na década de 20 – decorridos quase 100 anos da independência do Brasil – era criada pelo Decreto nº 14.343, a primeira universidade

brasileira, a Universidade do Rio de Janeiro, como resultado de uma conglomeração de escolas de nível superior basicamente do tipo profissional.

Nessa mesma década, em 1925, através do Decreto nº 16.782-A, de 13 de janeiro, ocorre a “Reforma João Luiz Alves”, também conhecida como Reforma Rocha Vaz. Essa reforma que teve como propósito o estabelecimento do concurso da União para a difusão do ensino primário, organiza o Departamento Nacional de Ensino, reforma o ensino secundário e o superior e dá outras providências. Trata-se da quinta reforma do ensino1 e, em cujo teor, segundo Machado (2003, p.28),

1) o referido Decreto também criou o Curso Especial de Higiene e Saúde Pública, cujo objetivo era o aperfeiçoamento técnico de médicos que viessem a desempenhar funções sanitárias. Tratava-se de um curso de especialização.

2) ...exigia, para a matrícula no Curso Especial de Higiene e Saúde Pública, o diploma de medicina, estabelecia o período de 12 meses para a duração do curso e garantia o diploma de higienista aos aprovados nos exames.

Quanto à formação de professores, Oliveira (1995b, p. 20) informa que o

Art.284 faz menção aos cursos de aperfeiçoamento, facultando aos professores catedráticos de qualquer instituição de ensino realizar cursos de aperfeiçoamento, remunerados ou não, para diplomados, nos estabelecimentos oficiais de ensino.

Vale ressaltar que nesse Decreto aparece, pela primeira vez, a figura da Universidade e, muito embora não apareça nenhuma menção a cursos de pós- graduação, especialização ou formação continuada, pode-se depreender que diante desses fatos fazia referência a cursos dessa natureza, correspondendo, inclusive, o estabelecido em 1965 através do Parecer 977/65.

O Brasil inicia a década de 1930 com grandes turbulências tanto no campo econômico, quanto no campo político e também no social, resultado inclusive, da Depressão de 1929 que afetou o mundo inteiro. Nesse contexto e já contando com mais uma universidade pública, a Universidade de Minas Gerais, ocorre a chamada Reforma Francisco Campos através do Decreto nº 19.851 de 11

1 As reformas anteriores mostradas pela História da educação brasileira foram: 1) A reforma

Benjamim Constant (1891); 2) A Reforma Epitácio Pessoa (1901); 3) A Reforma Rivadávia Correa (1911); 4) A Reforma Carlos Maximiliano (1915)

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de abril de 1931. E é nesse momento que a “investigação científica” aparece como um dos objetivos do ensino universitário no Brasil.

Para Romanelli (1991, p. 134)

Era a primeira vez que uma reforma atingia profundamente a estrutura do ensino e, o que é importante, era pela primeira vez imposta ao território nacional. Era, pois, o início de uma ação mais objetiva do Estado em relação à educação.

No que diz respeito aos cursos de aperfeiçoamento e de especialização, no referido decreto pode-se destacar os artigos abaixo, de acordo com Machado (2003, p. 30),

Art.20- o referido decreto relaciona os diplomas conferidos pela universidade do RJ e acrescenta em seu parágrafo único os certificados conferidos após a conclusão de cursos de aperfeiçoamento e especialização.

Art.39- permite a organização e realização dos cursos de aperfeiçoamento e especialização a professores catedráticos ou pelos docentes livres, e estabelece ao Conselho Técnico-Administrativo a função de autorizar esses cursos, aprovar os respectivos programas e expedir instruções relativas ao seu funcionamento.

Art.67- permite a frequência em mais de um curso de especialização.

Art.68- aos concludentes além do certificado, é garantida a preferência a cargos públicos da respectiva especialização.

Art.70- estabelece que os candidatos aos cursos de especialização e aperfeiçoamento poderão ser médicos ou estudantes que tenham realizado anteriormente o curso normal da respectiva cadeira.

Art.82- permite aos matriculados em qualquer curso seriado a frequência de aperfeiçoamento ou de especialização e

Art.89- garante o direito a certificado expedido pelas universidades aos concludentes destes últimos.

Verifica-se que até aqui os cursos de aperfeiçoamento e de especialização não estão inseridos no contexto de uma pós-graduação. Não aparece, até então, o termo pós-graduação.

No Brasil, os cursos de pós-graduação têm seu nascimento no período em que o ensino superior entra num processo mais acelerado de expansão. De acordo com Oliveira (1995b, p.22), a expressão “pós-graduação” aparece no cenário da educação superior brasileira em 18 de junho de 1946, pelo Decreto 21.231 que trata da criação da Universidade do Brasil, nos termos do artigo 76,

Art. 76- Os cursos de pós-graduação, destinados aos diplomados, terão fim especial a formação sistemática de especialização profissional, de acordo com o que for estabelecido pelo regimento.

Quanto aos cursos de especialização e aperfeiçoamento constam dos artigos 73 e 74 da seguinte forma:

Art.73- Os cursos de aperfeiçoamento serão destinados à revisão e desenvolvimento dos estudos feitos nos cursos normais, pela forma estabelecida no regimento.

Art.74- Os cursos de especialização serão destinados a ministrar conhecimentos aprofundados nos diferentes ramos de estudos filosóficos, científicos, artísticos ou técnicos, pela forma estabelecida no regimento e de acordo com programa previamente aprovados pela congregação.

Cunha (1988, p.10) ressalta que

Nas décadas de 40 a 60, justamente quando a conjuntura mundial estava marcada pelas guerras de libertação nacional, pelas lutas anti-imperialistas e pela vitória do socialismo em metade do planeta, a sociologia burguesa procurava mascarar essa realidade com as teorias de modernização. Com elas, o capitalismo avançado era colocado como meta de todos os países, e o caminho para se chegar até lá seria o mesmo já percorrido pelas metrópoles de então...

“O caminho” seria a preparação de recursos humanos. Sob a égide de uma pressão mundial e de vestígios de uma política populista, era necessário para o Brasil, chamado de “gigante adormecido” e “país do futuro” (clichês da época), que os recursos humanos fossem atualizados, objetivando atender às novas tecnologias. “Essas novas tecnologias determinaram especial atenção para saúde e para a educação” que, segundo Campos (1972), “são condições mínimas para que a

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máquina humana – esse misto admirável de corpo e espírito – alcance pleno desenvolvimento”.

Fazer emergir as potencialidades econômicas brasileiras dependia, naquele momento, do desenvolvimento técnico e científico. E a vinculação economia-ciência e técnica era necessária, o que só poderia acontecer através da melhoria qualitativa e quantitativa dos recursos humanos.

Foi assim que no final dos anos 50 e na década de 60, para atender à indústria, o mercado de trabalho exigiu profissionais com diferentes habilitações. Às universidades públicas e privadas e às faculdades isoladas coubera a diversificação de seus cursos e, como a demanda tornou-se intensa, logo foi possível perceber-se que a educação superior brasileira experimentava a expansão e, também, a necessidade de reforma.

Em 1961 foi promulgada a lei nº 4.024 de Diretrizes e Bases (LDB) que teve por objetivo o estabelecimento de diretrizes e bases para toda a educação nacional. Embora tivesse sido uma lei orientadora da educação (com abrangência em todos os graus de ensino), segundo Fávero (1991, p.53) “o ensino superior foi um tema de importância menor”.

No entanto, no título IX (Da Educação de Grau Superior), capítulo I (Do Ensino Superior) dos 11 (onze) artigos que foram aprovados, apenas o artigo 69, alínea b, menciona a pós-graduação da seguinte forma:

Art.69. Nos estabelecimentos de ensino superior podem ser ministrados os seguintes cursos:

b) de pós-graduação, abertos à matrícula de candidatos que hajam concluído o curso de graduação e obtido o respectivo diploma;

A legislação de 1961 apenas se limitava a declarar que as universidades poderiam oferecer cursos de pós-graduação, cuja matrícula seria para aqueles que tivessem concluído o curso superior. E a legislação que antecede esse período nada estabelecia para os cursos de pós-graduação, significando que, até essa ocasião, qualquer decisão em relação aos cursos realizados após a conclusão da graduação ficava sob a responsabilidade das Universidades.

A definição dos cursos de pós-graduação só é apresentada através do Parecer 977 do Conselho Federal de Educação (CFE), aprovado em 03 de dezembro de 1965.

Para analisar o “vivido por professores em cursos de pós-graduação lato sensu” entende-se que enfatizar o Parecer 977/65 torna-se de fundamental

importância porque esse instrumento legal se propôs a definir os cursos de pós- graduação.

Esse documento chama de pós-graduado todo e qualquer curso que se segue à graduação distinguindo-os como sensu stricto e sensu lato. Nos primeiros,

objeto de maior atenção por parte deste parecer, estão incluídos os cursos de mestrado e doutorado, onde a natureza acadêmica e de pesquisa tem objetivos essencialmente científicos. Quanto ao sensu lato, o referido parecer apenas deixou

subentendido tratar-se de especialização e aperfeiçoamento, especificando que

Normalmente têm objetivo técnico profissional específico sem abranger o campo total de saber que se insere a especialidade. São cursos destinados ao treinamento nas partes de que se compõe um ramo profissional ou científico....Sua meta é o domínio científico e técnico de uma certa e limitada área do saber ou da profissão, para formar profissional especializado.

Apresentou, ainda, algumas características desses cursos. O Parecer 977/65 qualifica a natureza e a destinação específica dos cursos:

a) podem ser eventuais.

b) oferecem certificados de eficiência ou aproveitamento que habilitam ao exercício de uma especialidade profissional.

c) podem ser oferecidos em instituições não universitárias. d) podem ter caráter regular e permanente.

e) brevidade de duração. Para Sucupira (1965, p.44):

O Parecer n° 977/65 não impôs um sistema de cursos inteiramente estranho ao ensino superior brasileiro, mas veio ao encontro de experiências que já se generalizavam, embora vacilantes... Correspondeu, assim, a uma das exigências profundas do movimento da reforma universitária deflagrado na segunda metade da década de 50.

Os cursos de pós-graduação lato sensu apresentam-se como uma

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área do conhecimento e que atenderia, mais imediatamente, as ações profissionais, contrariamente aos cursos stricto sensu, que teria como característica maior a

realização da pesquisa e desenvolvimento da ciência.