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O papel dos relatórios e indicadores na criação de hierarquias no circuito de arte

Mapa 3 – Origem das galerias participantes da SP-Arte em 2018

1.3 A produção de informações sobre o circuito de arte: relatórios de mercado e

1.3.4 O papel dos relatórios e indicadores na criação de hierarquias no circuito de arte

A inconstância e a seletividade das informações apresentadas pelos relatórios dificultam um real conhecimento sobre o circuito de arte. Em relação aos índices de

19 O relatório do Projeto Latitude será comentado no tópico 3.3, “A participação brasileira no circuito de arte internacional”.

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artistas, cada um segue determinadas orientações para organizar as posições, e a análise desses dois ranqueamentos indica que a escolha das variáveis consideradas não se dá de forma aleatória. Conforme comentado anteriormente, a lista Top 500, por exemplo, representa a iniciativa de consultorias de origem francesa e chinesa, Artprice e Artron respectivamente, e a participação positiva desses dois países no mercado de leilões reforça a consideração dessa variável para elaboração do índice.

Portanto, a origem desses estudos de mercado e dos ranqueamentos de artistas também deve ser considerada para uma melhor compreensão do circuito de arte. Apesar das particularidades consideradas por cada índice, é notável que indicam certa homogeneidade, e, sobretudo, ressaltam as hierarquias observadas em outros aspectos do circuito. Os países que lideram as vendas de obras de arte, que possuem mais feiras e exposições20, coincidem com os artistas mais bem avaliados, por exemplo. Essa situação, longe de ser aleatória, é sintomática do funcionamento do circuito. Assim, os relatórios e indicadores servem como dispositivos que reafirmam as posições e papéis dos territórios no circuito de arte.

Tendo em conta as características, fontes de dados e divergências apresentadas entre os relatórios sobre mercado de arte, evidencia-se no circuito de arte uma produção de informações que tende a valorizar determinados lugares em detrimento de outros. Daí concordarmos com Santos (2012 [1996], p. 203), ao afirmar que “as informações que constituem a base das ações são seletivas, buscando incidir sobre os lugares onde se possam tornar mais eficazes”. Nesse sentido, países como EUA, Alemanha, Inglaterra, França e Suíça têm posições reafirmadas no circuito, já que as informações veiculadas tendem a fortalecer e aumentar sua capacidade de influência.

Também, os relatórios de mercado e índices de artistas evidenciam, além das casas de leilão, galerias e feiras – onde se dão as vendas – a importância de outros integrantes do circuito de arte, como museus e grandes exposições. O relatório Art & Finance, por exemplo, ressalta o aumento do número de grandes exposições no sul da Ásia, fato que tem contribuído para a maior participação da região no mercado de arte global (ART & FINANCE, 2018). Segundo o relatório Artprice de ano de 2018, o crescimento do número de museus tem contribuído para o crescimento do mercado de arte e compõe a chamada indústria museística:

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Com mais de 700 novos museus por ano, esta indústria tornou-se uma realidade econômica global do século XXI. Entre 2000 e 2014, mais museus foram construídos do que nos séculos XIX e XX juntos. Essa indústria que devora peças de museu é um dos principais fatores que explicam o crescimento espetacular do mercado de arte. O museu tornou-se, com efeito, a catedral do nosso tempo, e é hoje um ponto de encontro para indivíduos de diferentes gerações e mídias sociais, todos em busca da singularidade que as obras de arte oferecem em face da normalização de todos os bens (ARTPRICE ART MARKET REPORT, 2018, s/n, tradução nossa)21.

Assim, as informações veiculadas pelos relatórios são, sobretudo, informações geográficas (SILVA, 2001). Promovem o circuito de arte como um todo, reafirmando a importância de outros agentes além daqueles que se ocupam diretamente das vendas de obras de arte, e agem de forma a criar e reforçar as posições dos diferentes países, estabelecendo tendências e hierarquias.

1.4 Eventos do circuito: exposições e feiras

Os eventos, tais como feiras e exposições, têm sido estudados nas ciências econômicas e sociais como uma forma de organização espacial – propositalmente temporária – que propõe dinâmicas específicas de negociação e troca de conhecimentos. Diferentes abordagens teóricas auxiliam a reflexão sobre os eventos, como clusters temporários (MALKELL et al., 2006), clusters cíclicos (POWER; JANSSON, 2008) e eventos de configuração de campo (MEYER et al., 2005; LAMPEL; MEYER, 2008).

Além disso, essas propostas retomam discussões acerca da importância do contato face-a-face (STORPER; VENABLES, 2003; MASKELL et al., 2006) para alguns tipos de comércio, auxiliando o entendimento sobre as especificidades e o papel desses eventos para diversos ramos, inclusive para o circuito de arte. Nesse item, abordaremos os eventos de forma teórica, trazendo alguns conceitos e propostas que procuram explicar sua função e modo de organização, e discutiremos os eventos do circuito de arte a partir dessas contribuições teóricas, que facilitam a compreensão não só dos eventos em si, mas

21 Con más de 700 museos nuevos al año, esta industria se ha convertido en una realidad económica mundial del siglo XXI. Entre 2000 y 2014 se construyeron más museos que en los siglos XIX y XX juntos. Esta industria devoradora de piezas de museo es uno de los principales factores que explican el espectacular crecimiento del Mercado del Arte. El museo se ha convertido, en efecto, en la catedral de nuestra época, y es hoy un punto de encuentro de individuos provenientes de distintas generaciones y medios sociales, todos ellos en busca de la singularidad que las obras de arte ofrecen frente a la normalización de todos los bienes (ARTPRICE ART MARKET REPORT, 2018, s/n).

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também de todo o circuito. Depois, os eventos do circuito de arte serão mais aprofundados.