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Foto 1 – Prédio onde funciona o INES desde 1915, em Laranjeiras

2. HISTÓRICO SOBRE A SURDEZ NO BRASIL

2.5. O papel do intérprete educacional

Intérprete de língua de sinais – Pessoa que interpreta de uma dada língua de sinais para outra língua, ou desta outra língua para uma determinada língua de sinais. (QUADROS, 2004, p. 7)

Historicamente, por volta dos anos 80, a presença do intérprete de língua de sinais limitava-se, em sua maioria, aos trabalhos religiosos e associações de surdos. Não havia o reconhecimento legal dessa profissão, uma vez que a língua de sinais

tão pouco era reconhecida como língua, assim não havia também nenhuma formação sistematizada para este profissional. Sua aprendizagem se dava no convívio com a comunidade surda e sua prática pela necessidade de comunicação dos surdos com os ouvintes. A prática tradutória ganha traços assistencialistas, de cumplicidade fraterna e voluntária.

No dia 24 de abril de 2002, foi homologada a Lei Federal que reconhece a Língua Brasileira de Sinais como língua oficial das comunidades surdas brasileiras. Segundo Quadros (2004, p.15), essa Lei representou um passo fundamental no processo de reconhecimento e formação do profissional intérprete da LIBRAS, bem como, a abertura de várias oportunidades no mercado de trabalho que são respaldadas pela questão legal.

Quadros (2004, p.17) comenta o resultado de uma pesquisa na Europa que concluiu que à medida que os surdos ampliam suas atividades e participam nas atividades políticas e culturais da sociedade, o intérprete de língua de sinais é mais qualificado e reconhecido profissionalmente.

No Brasil, a formação desse profissional se dava na prática de sua atividade profissional ou através de cursos em associações de surdos. Apenas no dia 1º de setembro de 2010 foi aprovada a Lei 12.319 que regulamenta a profissão de tradutor e intérprete de LIBRAS.

De acordo com o Artigo 4º desta Lei, a formação profissional deve ser feita por cursos de educação profissional, de extensão universitária ou de formação continuada promovidos por universidades e instituições credenciadas por Secretarias de Educação, inclusive organizações que representam os surdos.

A única certificação profissional do Intérprete de LIBRAS oficial no momento é o exame de Proficiência em LIBRAS (Prolibras)23.

O Artigo 3º da Lei 12.319 que previa como requisito para o exercício da profissão, a habilitação em curso superior de Tradução e Interpretação, com habilitação em LIBRAS / Língua Portuguesa, foi vetado após avaliação dos

      

23 O exame de Proficiência em Libras (Prolibras) é uma combinação de um exame de proficiência e uma certificação profissional proposto pelo MEC como uma ação concreta prevista no Decreto 5626/05 que regulamenta a Lei n. 10.436/02, chamada “Lei de Libras”. Esse exame objetiva avaliar a compreensão e produção na LIBRAS. O Prolibras não substitui a formação em todos os níveis educacionais. Os cursos de graduação para a formação de professores de Libras e de tradutores e intérpretes de Libras e Língua Portuguesa já começaram a ser oferecidos no país. No entanto, o prazo de formação e criação desses cursos é mais longo. Assim, o exame Prolibras vem resolver uma demanda de curto prazo. (informações disponíveis nos site www.prolibras.ufsc.br)

Ministérios da Justiça e do Trabalho e Emprego. Também foram vetados os Artigos 8º e 9º que tratavam da regulamentação da profissão.

As razões para o veto, de acordo com a Subchefia para Assuntos Jurídicos em Mensagem número 532, de 1º de setembro de 2010 ao Presidente do Senado Federal são:

O projeto dispõe sobre o exercício da profissão do tradutor e intérprete de libras, considerando as necessidades da comunidade surda e os possíveis danos decorrentes da falta de regulamentação. Não obstante, ao impor a habilitação em curso superior específico e a criação de conselhos profissionais, os dispositivos impedem o exercício da atividade por profissionais de outras áreas, devidamente formados nos termos do art. 4o da proposta, violando o art. 5o, inciso XIII da Constituição Federal.”

A questão da formação do intérprete de língua de sinais é um tema bastante preocupante, uma vez que dele se demandam inúmeras atribuições sem que ele seja adequadamente formado para desempenhá-las. (LACERDA e BERNADINO, 2009, p.66)

De acordo com dados do relatório do último Prolibras (p. 19) realizado em 200924, a maioria dos intérpretes não tem formação universitária, como podemos constatar na tabela a seguir25.

      

24 Por motivos que desconhecemos, o Prolibras não foi realizado no ano de 2010, embora o MEC garantisse sua realização anual. A quinta edição do Exame, denominado PROLIBRAS 2010, será realizado em maio de 2011.

25 A tabela apresenta o desempenho dos candidatos submetidos à 2ª etapa do Prolibras 2009, com direito à Certificação na LIBRAS, considerando-se os habilitados presentes. A prova constou de uma 1ª Etapa (prova objetiva), onde os candidatos habilitados foram submetidos à 2ª Etapa (prova prática) que é esta que se encontra na tabela representada. O relatório encontra-se no site

Tabela 1: Candidatos aprovados em relação aos habilitados presentes à 2ª etapa do Prolibras/2009, de acordo com a certificação e Categoria. Fonte: www.prolibras.ufsc.br

Em estudos realizados na Austrália tal dado é semelhante. Daqueles que trabalham como intérpretes em universidades, apenas 60% concluíram a universidade, ou seja, trabalham para a formação de pessoas num nível para o qual eles mesmos não foram qualificados. (NAPIER, 2002, apud LACERDA e BERNADINO, 2009, p. 66).

Há diferenças entre o intérprete para eventos, palestras e assuntos jurídicos e o intérprete educacional. E dentro do âmbito escolar também é singular a interpretação de níveis diferentes de escolaridade. Há muitas diferenças nos processos de inserção do intérprete de língua de sinais em uma sala do ensino superior, do ensino médio e em uma sala do ensino fundamental ou infantil.

No ensino infantil, por exemplo, o intérprete não pode apenas ter o papel de interpretar o que é dito em sala de aula. Sua postura e modos de participação interferem de maneira muito significativa na inserção da criança surda que está adquirindo valores éticos e sociais.

Além disso, as crianças, principalmente as mais novas têm dificuldades em entender que a pessoa que está passando a informação e que acaba estabelecendo maior contato com ela, é apenas aquele que está intermediando a relação entre o professor e ela. (QUADROS, 2004, p.60)

Na sala de aula o papel do intérprete de língua de sinais assume diversas funções (atender as demandas pessoais do aluno, atuar frente ao comportamento do mesmo, estabelecer uma posição adequada em sala de aula em relação aos discentes surdos e ouvintes, atuar como educador frente à dificuldade de aprendizagem do aluno quando o professor desconhece as particularidades do surdo e não apresenta um método adequado ao mesmo e é preciso adaptar a informação) que acabam aproximando-o muito de um educador e o distanciando de seu papel tradicional de intérprete, gerando-se muitas polêmicas. (LACERDA e BERNADINO, 2009, p.67)

Quadros (2004, p.60) ressalta que ao intérprete educacional lhe é permitido oferecer um feedback do processo ensino-aprendizagem dos alunos ao professor. Se existe essa possibilidade, se poderia prever que o intérprete assumiria a função de tutoria mediante a supervisão do professor, o que em outras circunstâncias de interpretação não seria permitido. Tal fato tem levado à criação de um código de ética específico para o intérprete educacional, mas que geram muitos problemas:

Os intérpretes-tutores deveriam estar preparados para trabalharem com as diferentes áreas do ensino. Se a eles fossem atribuídas as responsabilidades com o ensino, eles deveriam ser professores, além de serem intérpretes. E se estiverem assumindo a função de professores, por que estariam sendo contratados como intérpretes? Considerando tais questões, poder-se-ia determinar que o intérprete assumirá somente a função de intérprete que em si já se basta e caso seja requerido um professor que domine língua de sinais que este seja contratado como tal. (QUADROS, 2004, p. 60-61)

Todas essas demandas necessitam uma preparação profissional mais apurada. Além disso, a inserção de um intérprete na sala de aula não garante outras necessidades referentes à sua educação, tais como: questões metodológicas, reajustes no currículo escolar que contemple as especificidades do surdo. Desta forma, mesmo com a presença do intérprete, os surdos podem estar à margem da vida escolar quando não têm uma real participação e integração da mesma. (LACERDA e BERNADINO, 2009, p. 66)

Outro recurso humano necessário para uma educação com bilinguismo, onde a cultura e a identidade surda sejam construídas e valorizadas, é a presença do Instrutor surdo, um surdo adulto que domine a língua de sinais responsável por

divulgar esta língua e a identidade surda, servindo como um modelo identitário para as crianças.