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2- INTRODUÇÃO

2.5 O Papel social da Mãe

A reprodução social dos modelos masculino e feminino tem sua base na maternagem, termo que significa cuidados da mãe, e que tem um significativo valor cultural na disseminação do que corresponde ao masculino e ao feminino, e, por isso, está também associada à produção da desigualdade entre os sexos. Isto implica dizer que as mulheres, como mães, são agentes importantes na esfera da reprodução social,

pois são elas que educam e repassam aos filhos os valores vigentes na sociedade (Freitas et al., 2007).

É na vida familiar que serão transmitidos os valores culturalmente determinados do que compete ao masculino e do que compete ao feminino. São as qualificações do gênero masculino e do gênero feminino que definem o modo de inserção do sujeito na cultura a qual ele faz parte, estabelecendo um padrão de comportamento a ser seguido por cada gênero (Freitas et al., 2007).

Foi assim que os atos de conceber e criar filhos foram se constituindo como experiências humanas culturalmente atribuídas às mulheres, nas quais o pai é inserido de forma parcimoniosa (Lyra da Fonseca, 1997). O cuidado com os filhos é uma atividade relacionada à produção e reprodução da vida humana e, portanto, uma atividade do gênero feminino, sendo desenvolvida basicamente por mulheres. Durante séculos e até os dias atuais, esta associação entre gênero feminino e atividades de cuidado vem sendo naturalizada, sendo culturalmente entendido que a maternidade e o amor à criança pequena são da natureza dos instintos femininos (Perosa & Pedro, 2009).

Culturalmente, a maternidade está intimamente ligada ao cuidar e à expressão do afeto pelos filhos, e o que caracteriza uma boa mãe são justamente os atos de cuidar, dar afeto e alimentar a criança (Freitas et al., 2007).

Segundo Lyra da Fonseca (1997), a normatização da pertença do cuidado da criança ao gênero feminino chega atingir formas tão intensas que as próprias mulheres esquecem que se trata apenas de uma norma social, passível de ser rompida. O autor ainda afirma que o sistema ocidental de representação dos papéis dos sexos na procriação engana as mulheres, levando-as a acreditar que a experiência da gravidez seja realizadora e até gloriosa, enfrentando um pós-parto em que se espera que ela

estabeleça imediatamente um vínculo de fusão com a criança, de tal forma que, por exemplo, já reconheça os tipos de choro e seus significados (Lyra da Fonseca, 1997).

A partir do movimento feminista, principalmente durante a década de 60, a mulher foi conquistando alguns espaços que contribuíram para determinadas decisões na sua vida, como por exemplo, a busca por espaços de trabalho fora do ambiente familiar, o uso do anticoncepcional, entre outros (Perosa & Pedro, 2009). Podem-se listar outros avanços da participação feminina na vida pública que vão além da sua participação no mercado de trabalho, como, por exemplo, sua participação nas organizações políticas e sindicais, o usufruto de benefícios – como licença maternidade, por exemplo – e de recursos econômicos. Em decorrência da ampliação da participação da mulher na esfera pública de trabalho foram geradas novas situações de relações parentais e do relacionamento homem/mulher no cenário social contemporâneo (Freitas et al., 2007).

As mudanças no papel social da mulher implicaram em mudanças no papel da mãe, que a passou a ser também responsável pela participação no sustento da família, incorporando mais essa função à sua função de cuidadora dos filhos e do lar, e, em vez de abdicar de uma função para assumir outras, ela acaba acumulando atribuições ao seu papel (Freitas et al. 2009).

Perucchi e Beirão (2007) apontam que, no Brasil, o número de lares chefiados por mulheres tem crescido vertiginosamente, o que revela que, no atual contexto familiar brasileiro, as mulheres têm cada vez mais ocupado a posição social de provedoras do sustento da família, contrariando os preceitos do patriarcado e contestando os modelos tradicionais de parentalidade.

Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apontam que, em 2010 as mulheres tiveram um ganho real de 13,5% de aumento em seu rendimento

médio, enquanto os homens tiveram um ganho real de 4,1% (apesar de considerar que, mesmo diante desse significativo aumento de rendimento mensal, a mulher continua recebendo apenas 73,8% do rendimento médio mensal do homem, faltando ainda muitos anos para chegarmos a uma equivalência de salários de homens e mulheres).

Para dar conta de todas essas atribuições, a mulher tem assumido múltiplas jornadas de trabalho, dividindo sua rotina entre o cumprimento da carga-horária do seu trabalho remunerado e os afazeres relativos aos cuidados com a casa e com os filhos (Perucchi & Beirão, 2007). Vale a pena ainda especificar que essas mulheres assumem a responsabilidade pelo cuidado com os filhos no que diz respeito à manutenção financeira, à educação, às atividades no tempo livre, de lazer e de auxílio nas atividades escolares.

O atual desafio de assumir o papel dessa mãe contemporânea que acumula funções é justamente desenvolver estratégias para conseguir conciliar na sua múltipla jornada de trabalho, as responsabilidades da vida profissional com as responsabilidades da vida doméstica e de cuidado com os filhos (Carvacho, Mello, Morais & Silva, 2008; Carvalho, Merighi & Pinto de Jesus, 2009; Perucchi & Beirão, 2007).

Observa-se, então, que o que acontece ainda nos dias atuais é que a mulher continua a assumir, de forma desproporcional, a maior parte das responsabilidades familiares, especialmente referente aos filhos e à casa, além de ser, em muitos casos – principalmente em famílias de nível socioeconômico médio – a responsável primária pelo provimento financeiro e material da família (Carvacho et al., 2008; Carvalho et al., 2009; Perucchi & Beirão, 2007).

A conquista do mundo do trabalho pela mulher sem a diminuição das atividades no espaço doméstico e as consequentes dificuldades provenientes das múltiplas jornadas revela, então, um conflito existente entre os avanços da participação da mulher na esfera

pública – culturalmente ocupada pelos homens – e a lógica patriarcal ainda vigente (Perucchi & Beirão, 2007).

As práticas sociais dessas mulheres chefes de família contrariam a lógica patriarcal, mas encontram-se ainda resquícios dessa lógica na sua responsabilização quase que exclusiva pelos cuidados com o lar e com filhos. Revela-se, então, que as construções de gênero baseadas no modelo patriarcal relacionam a maternidade à submissão e ao cuidado, e é inegável o peso que essas construções sociais têm sobre a sociedade, principalmente nas definições dos papéis de mulher e de mãe como detentora da responsabilidade pelos cuidados domésticos e pela educação dos filhos (Carvacho et al., 2008; Carvalho et al., 2009; Perucchi & Beirão, 2007).

Se, por um lado, as mulheres conquistaram mais espaço na esfera pública, por outro, acabaram aumentando sua carga de responsabilidades, pois às responsabilidades do âmbito doméstico – culturalmente atribuídas as mulheres – somaram-se as responsabilidades do âmbito público (Perucchi & Beirão, 2007).

As mudanças sociais no desempenho do papel feminino e as consequentes transformações nas configurações familiares trazem mudanças na forma de entender as funções que os sujeitos desempenham nos papéis sociais que assumem. Ao mesmo tempo em que existe a superação da expectativa de que o pai seja o único provedor financeiro da família, existe ainda manutenção de valores da lógica patriarcal, influenciando no desempenho das funções de pai e de mãe, fazendo com que mesmo as mulheres chefes de família mantenham a expectativa de que o pai desempenhe a função de figura de autoridade com os filhos (Perucchi & Beirão, 2007).

A luta pela divisão igualitária das atribuições aos papéis de gênero continua, e enquanto a nossa sociedade for regida pelo princípio da divisão do trabalho por gênero, continuaremos a enfrentar barreiras no que diz respeito a uma maior ocupação da esfera

pública pela mulher, e uma maior ocupação da esfera privada pelos homens (Arilha, 1999; Lyra da Fonseca, 1997).

De toda forma, o papel social da mãe é bem definido, enquanto o pai, após o coito fecundante, enfrenta uma grande lacuna quanto ao seu papel, tendo uma definição mais clara da sua atuação apenas quando a criança chega à idade pré-escolar (Arilha, 1999; Lyra da Fonseca, 1997). Principalmente nos lares chefiados por mulheres, a paternidade parece ocupar outros lugares no universo de significações dessas mulheres (Perucchi & Beirão, 2007).

A seguir, passamos para uma discussão teórica sobre o papel do pai.

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