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Parâmetros Curriculares Nacionais

No documento SUZAMARA WEBER (páginas 142-150)

CAPÍTULO III- AS POLÍTICAS DE CURRÍCULO DA DISCIPLINA DE ARTE

3.2 Parâmetros Curriculares Nacionais

Quem assumiu o governo do Paraná, de 1995-2002, foi Jaime Lerner. Período de acirramento nas relações do governo com os organismos internacionais, que passaram a financiar programas que tivessem amplitude setorial, o que permitia interferir nas decisões do conjunto do setor. A consequência desse processo não foi a inovação da escola pública, como se anunciou, mas a crescente precarização da mesma (SAPELLI, 2003).

Embora se considere diversos avanços do Currículo Básico na perspectiva crítica, a proposta na prática não foi avaliada naquele governo, pois já se organizava a nível nacional uma proposta curricular em resposta ao compromisso assumido na Conferência Mundial de Educação para Todos, que culminou na publicação dos Parâmetros/ Referenciais Curriculares Nacionais- PCN (HIDALGO; MELLO; SAPELLI, 2010).

Em 1988, com a reelaboração da Constituição, foram iniciadas as discussões sobre a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, sancionada somente em 1996, ―convictos da importância de acesso escolar dos alunos de ensino básico também à área de Arte, houve manifestações e

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protestos de inúmeros educadores contrários a uma das versões da referida lei que retirava a obrigatoriedade da área‖ (BRASIL, 1998, p. 28).

A proposta dos Parâmetros/Referenciais Curriculares Nacionais foi extremamente detalhada e somava mais de 25 volumes, representando na prática o acordo feito na Conferência Mundial de Educação para Todos. Outro documento que se originou dessa Conferência foi o Plano Nacional de Educação para Todos, com o objetivo de estabelecer metas também para as diretrizes do currículo nacional. Para cumprir tais objetivos, o Brasil, por intermédio do Ministério da Educação e Cultura (MEC), trouxe da Espanha o psicólogo César Coll para assessorar e construir a versão preliminar do currículo, principalmente, baseada no construtivismo piagetiano. No Paraná, a adoção aos referenciais nacionais se deu pela equipe do governo Lerner, (1995-2002), durante encontros e seminários de formação, na Universidade do Professor, em Faxinal do Céu, com o intuito de sensibilizar os educadores, obrigando-os a adotá-lo (HIDALGO; MELLO; SAPELLI, 2010).

No documento dos Parâmetros Curriculares de Arte, não é possível identificar quem sistematizou a proposta da disciplina de Arte, pois o documento traz a lista geral, que contém o nome dos/das consultores/as, mas não especifica quem coordenou qual disciplina. A única identificação possível de se fazer é que Ana Mae Tavares Bastos Barbosa atuou como consultora e que foi pesquisadora da denominada Metodologia Triangular, pois a proposta dos PCN para a Arte traz essa referência. A referida metodologia teve origem na DBAE (Discipline Based Art Education- Arte Educação como Disciplina) que veio dos Estados Unidos no final dos anos 1960 (PARANÁ, 2008).

Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) de Arte, para o ensino fundamental, foram publicados em 1998. O texto se divide em duas partes: a primeira refere-se a Arte no ensino fundamental e a segunda ao ensino da Arte no terceiro e quarto ciclo do ensino fundamental.

Na parte introdutória do documento, denominada ―apresentação‖, está descrito, rapidamente, sobre a elaboração e sistematização da proposta da disciplina de Arte para o ensino fundamental (terceiro e quarto ciclos do ensino fundamental – 5ª a 8ª séries), destacando que o documento também tem como objetivo orientar os/as professores/as;

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Os Parâmetros Curriculares Nacionais de Arte foram constituídos a partir de estudos e discussões que versaram sobre dois aspectos básicos desta área de conhecimento: a natureza e a abrangência da educação de arte e as práticas educativas e estéticas que vêm ocorrendo principalmente na escola brasileira. Ao estruturar-se o documento, procurou-se fundamentar, evidenciar e expor princípios orientações para os professores, tanto no que se refere ao ensino e à aprendizagem, como também à compreensão da arte como manifestação humana. O processo de concretização deste documento teve a contribuição de educadores de todo o país, cujas reflexões foram consideradas nesta elaboração (BRASIL, 1998, s/p).

Nesse mesmo item de apresentação são destacadas os objetivos de cada parte do documento. A primeira ―[...] tem por objetivo analisar e propor encaminhamentos para o ensino e a aprendizagem de Arte no ensino fundamental‖ (BRASIL, 1998, p. 15). Na segunda parte que compõe o documento são destacadas quatro linguagens: Artes Visuais, Dança, Música e Teatro. Ao final, o texto destaca como as partes em conjunto auxiliam o trabalho docente;

As duas partes formam um conjunto de modo a oferecer aos educadores um material sistematizado para as suas ações e subsídios para que possam trabalhar com a mesma competência exigida para todas as áreas do projeto curricular (BRASIL, 1998, p. 15).

Na primeira parte, o item inicial ―Arte no ensino fundamental‖ possui uma introdução que indica que o ensino de Arte é fundamentado no fazer, perceber e apreciar.

O aluno desenvolve sua cultura de arte fazendo, conhecendo e apreciando produções artísticas, que são ações que integram o perceber, o pensar, o aprender, o recordar, o imaginar, o sentir, o expressar, o comunicar. A realização de trabalhos pessoais, assim como a apreciação de seus trabalhos, os dos colegas e a produção de artistas, se dá mediante a elaboração de idéias, sensações, hipóteses e esquemas pessoais que o aluno vai estruturando e transformando, ao interagir com os diversos conteúdos de arte manifestados nesse processo dialógico (BRASIL, 1998, p. 19).

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O item a ―Arte e a educação‖ faz uma abordagem histórica, apontando as tendências que referenciaram o ensino de Arte no século XX, mais precisamente nos anos de 1960 e 1970. Assim como no item subsequente, ―Histórico do ensino de Arte no Brasil e perspectivas‖, que apresenta como objetivo;

[...] identificar o espaço da área no currículo escolar e as tendências pedagógicas e estéticas predominantes nas práticas artísticas têm por fim conhecer melhor cada situação pela qual passou o ensino de Arte e como esse conjunto de fatores pode ter influenciado o momento atual (BRASIL, 1998, p. 23).

A parte que complementa o histórico do ensino da Arte no Brasil é finalizada com a descrição do ensino de Arte no currículo escolar. Sua legislação e prática expõe como se regulamentou a disciplina de Arte, principalmente, desde a aprovação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1971, até a LDB 9.394 do ano de 1996.

No item ―Teoria e prática em Arte nas escolas brasileiras‖, discute-se a distância entre a produção teórica e a prática, expondo que isso é motivado pela falta de livros editados e divulgados na área de Arte, pela falta de formação continuada de professores/as e pela utilização de práticas e modelos repetidos e apreciados em sala de aula, bem como pela polivalência (BRASIL, 1998).

Na sequência, o documento apresenta a concepção de Arte na qual a proposta dos PCN é fundamentada, e no qual, diferentemente do CB, a Arte é considerada como forma de conhecimento, tendo como base o trabalho com a leitura e a fruição da obra. No item ―o conhecimento artístico como produção e fruição‖ é discutido a relação do artista com a obra, e defende-se que uma obra é ―síntese subjetiva‖. Complementa-se, ainda, que ―a arte não representa ou apenas reflete a realidade, mas é também realidade percebida, imaginada, idealizada, abstraída‖ (BRASIL, 1998, p. 32).

Para especificar a concepção da Arte como conhecimento, se utilizou repetidas vezes dos termos fruir, imaginar, pensar, sentir, emoção, sensibilidade, entre outros, de modo que esses termos remetem à centralidade

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da subjetividade na Arte. Desse maneira, segundo o que consta nos PCN, a condição necessária para o conhecimento parte da percepção;

Diante de uma obra de arte, intuição, raciocínio e imaginação atuam tanto no artista como no espectador. A experiência da percepção rege o processo de conhecimento da arte, ou seja, a compreensão estética e artística. O processo de conhecimento advém, então, de significações que partem da percepção das qualidades de linhas, texturas, cores, sons, movimentos, temas, assuntos, apresentados e/ou construídos na relação entre obra e receptor (BRASIL, 1998, p. 33).

A percepção passa a ser amplamente abordada, ganhando destaque expressivo no documento.

Em síntese, a obra de arte pode significar coisas diferentes, resultantes da experiência de apreciação de cada um. [...] A obra que provoca impacto no apreciador faz ressoar, dentro dele, o movimento que propicia novas combinações significativas entre as suas imagens internas em contato com as imagens da obra de arte. Nos dois casos, tanto no artista como no apreciador, a obra de arte favorece o conhecimento de si e do mundo, por intermédio de uma síntese criadora (BRASIL, 1998, p. 33/34).

Dessa forma, a utilização da percepção como ponto-chave para subsidiar o trabalho pedagógico tem origens na teoria da livre-expressão, que emergiu no início do século XX, com Franz Cizek em Viena, e foi divulgada no Brasil por Herbert Read (1893-1968) e Vitor Lowenfeld (1903-1960), também amplamente divulgada no Brasil nas escolinhas de Arte (NUNES, 2003).

A ênfase na interpretação através da hermenêutica consiste no culto a subjetividade. Nesse sentido, Nanda (1999) afirma:

Essas teorias [...] corroeram a distinção entre crenças cientificamente justificadas e crenças e/ou ideologias populares. O que solapou essas distinções foi a tese fundamental do construtivismo social, que declara que todas as crenças são igualmente justificadas pelo consenso da comunidade, que em si mesma baseia-se no poder social, na retórica, e no costume. Não haveria verdade objetiva sobre o mundo real, à qual o conhecimento cientificamente justificado poderia aspirar alcançar; toda ―verdade‖ sobre a ―realidade‖ seria literalmente construída com opções entre interpretações,

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igualmente justificáveis, feitas por um ―coletivo mental‖ (NANDA, 1999, p. 85).

Assim, podemos verificar que os PCN-Arte tem como fundamento filosófico o existencialismo e a fenomenologia que, segundo Craver & Ozmon (2004), corresponde a uma educação que enfatiza a individualidade, que dá ênfase na experiência vivida; o que encobre o conflito, gerando conformismo.

Parece-nos contraditório apresentar uma concepção de Arte como forma de conhecimento, mas este centrado na percepção do sujeito e, ao mesmo tempo, utiliza da pedagogia do ―aprender a aprender‖ para orientar a prática pedagógica.

[...] se o ato de conhecer depende das particularidades do ponto de referência no qual se situa o sujeito cognoscente e se é impossível situar-se para além dessas particularidades, então estariam inevitavelmente comprometidas a universalidade e a objetividade do conhecimento (DUARTE & MARTINS, 2010, p. 36).

Os conteúdos da disciplina de Arte para o ensino fundamental são apresentados de forma específica para Artes visuais, Dança, Música e Teatro. Assim, cada especificidade apresenta também critérios de avalição próprios que consiste em conhecer, apreciar e criar (BRASIL, 1998).

A proposta dos PCN de Arte adota a perspectiva baseada nos princípios da pedagogia do ―aprender a aprender‖, uma vez que aparecem de forma explícita no documento, conforme o seguinte trecho:

O importante é que a escola possa ensinar arte com propostas que, além de ensinar variedade e profundidade nos conteúdos, ensinarão ao aluno prosseguir aprendendo por si — como aprender a pesquisar, por exemplo — que garantirão a ele poder aprender por toda a vida (BRASIL, 1998, p. 44).

Nesse sentido, a opção pela pedagogia do ―aprender a aprender‖, explícita nos PCN de Arte, não é feita ao acaso, mas é reflexo das concepções e objetivos atribuídos à educação da época. Assim como reflete as orientações e assessorias feitas sobre a própria elaboração do documento síntese. Isso pode ser verificado na afirmação do próprio Coll (1994), que foi responsável

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pela assessoria da proposta dos PCN no Brasil, logo após ter feito a reforma curricular na Espanha.

Numa perspectiva construtivista, a finalidade última da intervenção pedagógica é contribuir para que o aluno desenvolva a capacidade de realizar aprendizagens significativas por si mesmo numa ampla gama de situações e circunstâncias, que o aluno ―aprenda a aprender‖ (COLL, 1994, p. 136).

Na análise de Duarte (2001), a adoção dessa corrente pedagógica contemporânea traz consequências no que diz respeito ao acesso ao conhecimento.

Não discordo da afirmação de que a educação escolar deva desenvolver no indivíduo a capacidade e a iniciativa de buscar por si mesmo novos conhecimentos, a autonomia intelectual, a liberdade de pensamento e de expressão. Mas o que estou aqui procurando analisar é outra coisa: trata-se do fato de que as pedagogias do ―aprender a aprender‖ estabelecem uma hierarquia valorativa na qual aprender sozinho situar-se num nível mais elevado do que a aprendizagem resultante da transmissão de conhecimentos por alguém. Ao contrário desse princípio valorativo, entendo ser possível postular uma educação que fomente a autonomia intelectual e moral através justamente da transmissão das formas mais elevadas e desenvolvidas do conhecimento socialmente existente (DUARTE, 2001, p. 36).

Assim, a consequência para uma prática pedagógica, que se ampara em princípios do ―aprender a aprender‖, é o relativismo.

Dessa negação da totalidade decorre um dos princípios centrais das pedagogias contemporâneas: o relativismo. Em primeiro lugar, trata-se de um relativismo epistemológico: o conhecimento seria sempre dependente do ponto de referência espacial e temporal a partir do qual o sujeito procura compreender os fenômenos naturais e sociais (DUARTE & MARTINS, 2010, p. 35).

Essa afirmação dos autores pode ser verificada no próprio texto quando indica uma suposta formulação pessoal de concepções acerca da Arte.

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Para tanto, é necessário trabalhar com a leitura de textos e obras que mostrem a relação entre arte e cultura, história e contemporaneidade, por meio dos quais poderá criticar e encarar a história como diferentes enfoques de um fato, fenômeno ou objeto. Tal perspectiva incentiva a pesquisa e a formulação de concepções pessoais (BRASIL, 1998, p. 46).

É de certa forma uma retomada das concepções de Arte baseada na expressão e na liberdade criadora, difundidas no Brasil, por Augusto Rodrigues38, quando iniciou a divulgação do Movimento Educação pela Arte, após ter mantido contato com o formulador dessa teoria expressa na obra A Educação pela Arte de Robert Read (1943) (FERRAZ & FUSARI, 2001).

Somadas às pedagogias do construtivismo, compõe juntas uma gama de orientações condizentes com a proposta neoliberal para a educação nos anos de 1990.

Embora na atualidade seja utilizada a expressão pedagogia de projetos, o mais correto seria considerar o método de projetos como um dos métodos escolanovistas, o qual foi revitalizado e incorporado ao universo pedagógico contemporâneo. A ideia central do método de projetos é de que o conhecimento deve ser buscado pelos alunos a partir de necessidades de sua vida real, opondo-se aos currículos preestabelecidos nos quais o conhecimento é organizado numa sequência lógica e temporal. O pragmatismo de John Dewey é sem dúvida a base filosófica do método de projetos (DUARTE & MARTINS, 2010 p. 41). Em relação à presença também da pedagogia das competências nos PCN de Arte, o próprio texto utiliza diversas vezes o termo ―o aluno poderá desenvolver seu conhecimento estético e competência artística nas diversas linguagens da área de Arte (Artes Visuais, Dança, Música, Teatro) (BRASIL, 1998 p. 47).

A pedagogia das competências aponta para a mesma direção do aprender fazendo, da resolução de problemas e do espírito pragmático. O que há de específico nela é a tentativa de decomposição do aprender a aprender em uma listagem de habilidades e competências cuja formação deve ser objeto da avaliação, em lugar da avaliação da aprendizagem de conteúdos (DUARTE & MARTINS, 2010 p. 42).

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Os PCN, adotados também pelo estado do Paraná, em relação à Arte, indicam ruptura com a proposta apresentada pelo CB, pois nos PCN, o ensino de Arte é inspirada na – Discipline Based Art Education-, ou seja, na Arte Educação como Disciplina, uma metodologia norte-americana proposta para recuperar os conteúdos da Arte que estavam sendo diluídos. Na avaliação de Penna (2001), essa proposta é reducionista na medida em que enfatizava uma metodologia para ensino de Artes Visuais em detrimento das demais linguagens.

Na visão de Stori (2011), os PCN dão ênfase à emoção e aos aspectos subjetivos da Arte, ligada a uma concepção de que a Arte por si só é justificável, deixando de lado sua dimensão emancipadora capaz de proporcionar ao educando/da uma leitura crítica da realidade.

No documento SUZAMARA WEBER (páginas 142-150)