• Nenhum resultado encontrado

PARTE I – ENQUADRAMENTO TEÓRICO

CAPÍTULO 3 – O Papel Parental na Adolescência: Perceções Parentais

3.2. Parentalidade e Competência Parental Percebida

A literatura tem realçado a importância das perceções parentais de competência, eficácia e satisfação na parentalidade dos pais. A parentalidade é, na opinião de Cruz (2005, p. 13), “conjunto de acções encetadas pelas figuras parentais (pais ou substitutos) junto dos seus filhos no sentido de promover o seu desenvolvimento da forma mais plena possível, utilizando para tal os recursos de que dispõe dentro da família e, fora dela, na comunidade”.

Segundo Bornstein e colegas (2003), existem quatro atributos essenciais para o sucesso parental: a competência, a satisfação, o investimento e o equilíbrio dos diversos papéis vitais (e.g., pai, cônjuge e trabalhador). Deste modo, a parentalidade positiva envolve o sentido de competência no papel de cuidador, a satisfação obtida pela prestação de cuidados, o investimento proporcionado e a capacidade em equilibrar o papel parental com outras funções sociais.

As perceções dos pais sobre as suas capacidades parentais são fundamentais na compreensão da parentalidade, já que estas motivam e moldam as condutas parentais e proporcionam organização e coerência nas tarefas parentais (Coleman & Karraker, 1998; Shumow & Lomax, 2002).

Os estudos têm demonstrado que uma elevada competência e eficácia parental percebida, numa perspetiva funcional, traduzem-se em estratégias, comportamentos e práticas parentais positivas e eficazes (Bogenschneider et al., 1997; Brody et al., 1999; Coleman & Karraker, 1998, 2000; Gondoli & Silverberg, 1997; Hill & Bush, 2001; Johnston & Mash, 1989; Raikes & Thompson, 2005; Teti & Gelfand, 1991), enquanto uma baixa competência e eficácia parental percebida têm sido associadas a práticas e estratégias desajustadas e inadequadas (Bor & Sanders, 2004; de Haan et al., 2009; Hill & Bush, 2001; Sanders & Woolley, 2005).

Deste modo, a elevada competência parental pode influenciar positivamente os menores através de práticas parentais adequadas, nomeadamente, uma maior responsividade, monitorização e estimulação (Bogenschneider et al., 1997; Coleman & Karraker, 2000; Gondoli & Silverberg, 1997), menos disciplina punitiva (Coleman & Karraker, 2000; Sanders & Woolley, 2005), atenção aos sinais infantis, aceitação parental (Coleman & Karraker, 1998, 2000; Gondoli & Silverberg, 1997) e interações parentais mais ativas e diretas (Coleman & Karraker, 1998). Desta forma, a perceção de competência parental torna-se central para a parentalidade positiva.

Além disso, a perceção de eficácia parental tem sido estabelecida como um forte preditor de condutas parentais (Elder et al., 1995; Teti & Gelfand, 1991), enquanto outros estudos não verificam efeitos significativos (Sanders & Woolley, 2005). Por exemplo, Elder e colaboradores (1995) evidenciaram que a eficácia parental era um indicador de quanto os pais se envolvem em estratégias de promoção e de prevenção. As estratégias de promoção envolveram os esforços para criar experiências positivas nas crianças e ajudar os filhos a desenvolver competências e interesses, enquanto as estratégias preventivas estavam direcionadas para a redução do risco e adversidades. Assim, é possível afirmar que a elevada eficácia parental está fortemente relacionada com a capacidade parental em proporcionar e promover um ambiente saudável, estimulante e carinhoso aos filhos.

Noutros estudos, a eficácia parental percebida tem surgido como um mediador poderoso entre os efeitos de algumas variáveis psicossociais (e.g., dificuldades económicas, temperamento das crianças, suporte social e conjugal, stresse situacional, depressão parental) e a competência e a satisfação parental (Coleman & Karraker, 2000, 2003; Elder et al., 1995; Gondoli & Silverberg, 1997; Knoche et al., 2007; Teti & Gelfand, 1991).

A evidência de que diferentes variáveis psicossociais não prejudicam diretamente o funcionamento parental, mas sim através da sua capacidade de enfraquecer as perceções parentais, fornece uma clarificação importante sobre um dos meios através dos quais determinados fatores parentais, familiares e contextuais influenciam a parentalidade.

Por outro lado, os mecanismos através dos quais as crenças de competência e eficácia parental afetam o comportamento dos pais não parecem representar um processo simples. Em vez disso, estas crenças influenciam, potencialmente, as respostas parentais através de uma complexa interação das vias afetivas, motivacionais, cognitivas e comportamentais (Coleman & Karraker, 1998).

No que diz respeito à esfera afetiva, a crença na própria capacidade parental é suscetível de afetar o nível de stresse e/ou depressão experienciada em situações parentais exigentes (Bandura, 1989). Por exemplo, no estudo conduzido por Knoche e colegas (2007), com mães adolescentes,

verificaram que quando estas têm elevados níveis de depressão, a elevada competência parental percebida funcionava como atenuador e protetor dos efeitos da depressão maternal nas crianças.

Além disso, os pais que exibem fracas crenças sobre a sua competência parental são incapazes de pôr em prática os seus conhecimentos sobre as tarefas parentais e mostram pouco esforço e persistência quando confrontados com obstáculos, devido às suas expectativas de fracasso (Coleman & Karraker, 1998). Esta caracterização é consistente com a teoria de autoeficácia geral elaborada por Bandura (1982, 1989), que sublinha que as crenças de ineficácia enfraquecem a motivação e o desempenho.

De acordo com esta conceptualização, os indivíduos com um baixo sentido de autoeficácia visualizam cenários de insucesso, acabando por desistir facilmente perante as dificuldades, confirmando, assim, as suas crenças de incapacidade. Além disso, Bandura (1982, 1989) realça que quando o insucesso ocorre, estes sujeitos perdem rapidamente a confiança em si mesmos, atenuando, assim, as suas crenças de eficácia; porém, uma parentalidade eficaz tende a reforçar o sentimento de eficácia pessoal como figura parental (Bandura, 1997, cit. por Coleman & Karraker, 1998).

Este modelo conceptual também destaca que as pessoas que têm um elevado sentido de eficácia visualizam cenários de sucesso que fornecem orientações positivas para o desempenho e estes indivíduos ensaiam cognitivamente boas soluções para potenciais problemas (Bandura, 1982, 1989). Além disso, o autor refere que a baixa eficácia pode não só suprimir o desempenho das habilidades existentes mas também pode impedir a aquisição de novas competências.

Em geral, a baixa competência e eficácia parental têm implicações negativas para os pais e os seus filhos, já que esta tem sido relacionada com a depressão parental (Bor & Sanders, 2004; Knoche et al., 2007; Jackson et al., 2009; Teti e Gelfand, 1991), o elevado stresse parental (Ardelt & Eccles, 2001; Elder et al., 1995), as condutas parentais controladoras e agressivas (Sanders & Woolley, 2005), os problemas comportamentais em menores (e.g., Elder et al., 1995; Johnston & Mash, 1989; Lovejoy, Verda & Hays, 1997; Ohan et al., 2000), as perceções de dificuldades em crianças (Coleman & Karraker, 2003; Johnston & Mash, 1989; Lovejoy et al., 1997) e os métodos disciplinares punitivos e severos (Coleman & Karraker, 2000; Elder et al., 1995; Sanders & Woolley, 2005).

Importa ainda referir que em circunstâncias de vida stressantes, as perceções parentais, nomeadamente, a competência e eficácia parental, podem exercer um grande impacto sobre a qualidade parental (Coleman & Karraker, 1998). Assim, os pais com elevada perceção de eficácia parental, em meios economicamente desfavorecidos, estão mais determinados em ultrapassar as barreiras que impedem o sucesso (Ardelt & Eccles, 2001; Elder et al., 1995).

Em meios socioeconómicos desfavorecidos, a eficácia parental pode ser um recurso parental indispensável que ajuda a atenuar o impacto do distress emocional dos pais, consequente das

dificuldades económicas, nas estratégias educacionais dos pais (Ardelt & Eccles, 2001; Elder et al., 1995).

Como foi já mencionado anteriormente, as perceções de eficácia também exercem a sua influência sobre a satisfação parental. Atendendo que a satisfação procede, frequentemente, do cumprimento de metas valorizadas, os pais que possuem um sentido de ineficácia na sua própria capacidade parental têm menos prazer com suas experiências parentais do que pais que percecionam uma maior eficácia (Coleman & Karraker, 1998). Assim, a eficácia parental tem um impacto direto, não só na qualidade parental prestada, como ainda no grau de prazer derivado da experiência parental.

Além disso, quando os pais estão satisfeitos com a sua parentalidade podem atender os seus filhos de um modo mais positivo, reforçando, assim, as suas crenças de competência e eficácia parental (Ohan et al., 2000). No entanto, uma menor satisfação com o papel parental está associada a maior disciplina severa (Mammen, Kolko & Pilkonis, 2003), podendo, então, afetar negativamente o desenvolvimento dos seus filhos.

Em suma, as perceções parentais têm emergido tanto como preditores de específicas práticas parentais positivas, como ainda mediadores dos efeitos de determinadas variáveis psicossociais (e.g., depressão parental, temperamento infantil, stresse parental) na qualidade parental. Além disso, as perceções pessoais dos pais permitem uma melhor compreensão da parentalidade e estas cognições refletem aspetos importantes sobre a experiência parental e desempenham um papel fundamental no desenvolvimento dos filhos. Deste modo, nas seções seguintes procura-se explorar a influência das perceções parentais na adaptação escolar e psicossocial dos menores.