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Participação como alavanca da educação inclusiva e iliminação da exclusão

Parte I – Enquadramento Teórico

2. Quadro Conceptual

2.2. Rasgos constituintes da Escola

2.2.3. Participação como alavanca da educação inclusiva e iliminação da exclusão

A educação é a força humana e social motora que pode mudar, de um modo durável, a face de cada país e a face do mundo (…) O desenvolvimento sustentável não pode ser reduzido às suas dimensões económicas e políticas: é essencial ter em conta os aspetos culturais, sociais, ecológicos, humanos e espirituais, os quais tornam o papel da educação ainda mais crucial (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento [PNUD], 2003, pp.13-14).

Considerando que a realidade educativa deve operar uma transformação e, que, para que tal aconteça, é essencial a envolvência de todos os atores, os órgãos de gestão das organizações educativas têm que colocar especial ênfase na questão da participação. A preocupação pela gestão participativa é um dos propósitos consagrados na Lei de Bases do sistema Educativo Português, como se descreve no art.º 43 da Lei de Bases do Sistema Educativo Português):

2- O sistema educativo português deve ser dotado de estruturas de âmbito nacional, regional e autónomo, regional e local, que assegurem a sua interligação com a comunidade mediante adequados graus de participação dos professores, dos alunos, das famílias, das autarquias, de entidades representativas das atividades sociais,

66 económicas e culturais e ainda de instituições de caráter científico. 3- Para efeitos do número anterior serão adotadas orgânicas e formas de descentralização e de descentração dos serviços, cabendo ao Estado, através do ministério responsável pela coordenação da política educativa, garantir a necessária eficácia e unidade de Ação.

A participação, surge assim, como um vetor amplamente consagrado no âmbito da administração escolar, apesar de nem sempre existir consenso sobre um tema tão abarcante e decisivo para as práticas democráticas. Parafraseando Demailly (1991), os pilares em que assenta a gestão participativa, um modelo de gestão perfilado para a gestão empresarial, carateriza-se pela divisão de tarefas e funções, substituição de uma hierarquia de autoridade por uma hierarquia de competências, criação de espaços de negociação, avaliação e progressão na carreira, criação de ilhas de produção e utilização da preocupação pela qualidade. (Demailly, 1991, citado por Barroso, 1995, p.8). A adoção deste modelo gestão para a educação, situação que se poderá aprofundar noutro estudo, contem, a nosso ver amplos segmentos de evolução para a gestão participativa. O que por vezes “atrapalha” é a catadupa de processos burocráticos, por vezes antagónicos, decorrentes de interesses políticos e administrativos que são adversários duma efetiva participação democrática.

No artº 45, 2, podemos ler: “Em cada estabelecimento ou grupo de estabelecimentos de educação, a administração e gestão orientam-se por princípios de democraticidade e de participação de todos os implicados no processo educativo, tendo em atenção as caraterísticas específicas de cada nível de educação e ensino.” (Lei Nº 46/1986, de 14 de Outubro, com as alterações introduzidas pela Lei Nº 115/1997, de 19 de Setembro, e com as alterações aditamentos introduzidos pela Lei nº 49/2005 de 30 de Agosto).

Acrescem à não concretização destes ideais da participação legislados, algumas realidades desafiadoras ao nível interno: resistência à mudança por parte dos atores educativos; pouca consciência da comunidade escolar de que faz parte ativa do processo de gestão participativa e que o horizonte possível requer de todos os membros a perceção desse mesmo horizonte, como nos refere Cabral (1999, p. 10): ”para que uma escola autónoma possa perseguir o seu horizonte possível, é mister que todos os seus membros tenham a perceção de um mesmo horizonte. (…) A capacidade de uma organização olhar e perseguir um mesmo horizonte depende da capacidade de partilhar uma visão comum.”; o perfil dos gestores escolares que nem sempre é o mais desejável para uma mobilização de vontades e como organizador de talentos e efetiva liderança participada.

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Destacamos alguns factos demonstrativos do caminho que se vai fazendo, apesar de muitas vezes o processo não ser de todo credível (Barroso, 1995):

- descentralização da administração da educação com o objetivo de dotar as autarquias de maior participação;

- restituição por parte da administração central ou regional, de poderes e competências, aos órgãos de gestão das escolas;

- incremento de uma “gestão participativa” nas escolas com a concomitante criação de dispositivos e processos que potenciem o envolvimento dos trabalhadores na toma de decisões e modos de funcionamento da organização.

Para Barroso (1995, p. 10) “numa organização como a escola, a gestão é uma dimensão do próprio ato educativo…o professor emerge como um “gestor de situações educativas”...um organizador e disponibilizador de recursos, em conjunto com os seus colegas…, funções de gestão que, naturalmente, o professor não pode desenvolver sozinho e fora duma organização.” Barroso (1995) enfoca o papel central da participação dos professores, um processo que tem que ser acompanhado da correspondente formação. Quanto aos trabalhadores não docentes, Barroso (1995) refere a necessidade da reconversão dos perfis profissionais, sempre no sentido da maior especialização e valorização de dispositivos e dos processos da sua participação. No que se refere ao aluno, para Barroso, para que ocorra a verdadeira participação, é urgente olhar o aluno como parte intrínseca do próprio ato educativo: “ o aluno é sempre visto como algo extrínseco à produção do próprio ato educativo, limitando-se a “sofre-lo” ou a “consumi-lo” Nesta alinhamento, não haverá “alunos-formados” todos os que exercem funções na escola e os próprios alunos, são todos “produtores”, ainda que diferentemente qualificados e especializados, mas igualmente responsáveis.” De acordo com Barroso, na ótica da participação, os alunos devem ser considerados como “trabalhadores”. (Barroso, 1995, p. 11).

Segundo Bolívar (2013, p. 82):

Se la realidad educativa há de sufrir una transformación, dicho cambio no provendrá de nuevas normativas, sino de la constucción de nuevos modos de regulación o gobernanza en que los indivíduos e instancias afectadas puedam participar y coordenar sus acciones. Ademas de gestionar se há de implicar a la

68 ciudadania en general y a los atores concernidos en particular en la gobernanza de

los problemas educativos, com el fin de lograr actuaciones integradas.

Não basta, portanto, desenhar ou planificar centralmente a educação, mas criar caminhos integrativos das diversas sinergias, previstas e imprevistas, localmente, situando-se para além dos argumentos racionais e valorizando o papel do afetivo e emocional, ou seja a “política da vida” (lebenswelt). Bolívar realça a necessidade da complementaridade e interdependência entre política educativa e política da vida. Na atual modernidade é necessária uma estreita articulação entre as pretensões das reformas educativas e as incidências das mesmas nas identidades e dimensões emocionais dos professores.

Referindo-se à importância da passagem de uma liderança burocrática para uma liderança educacional e transformadora, Bolívar (2014) menciona o imperativo de dar voz aos professores, coresponsabilizando-os na construção de projetos de ação conjunta. Isto requer a otimização de situações organizacionais de trabalho, estruturas, tempos e modos facilitadores das dinâmicas de reflexão e tomada de decisões conjuntas (Bolívar, 2014).

Para que a participação se torne efetiva e produtiva na escola, toda a comunidade educadora tem que estar focada no projeto educativo, denotando um verdadeiro interesse na sua execução, valorizando a comunicação que deve circular em todas as direções e contar com um ambiente positivo e de proximidade que favoreça os encontros. Quanto melhor for o ambiente mais forte será a vontade de participação:

A vontade de participação facilita as decisões a assumir, em harmonia com o projeto educativo e, no respeito pela autoridade, torna também possível a avaliação crítica acerca do andamento da Escola, com o concurso de educadores, alunos, famílias no objetivo comum de trabalhar para o bem de todos. (Congregação para a Educação Católica, 2007, p. 100-101).

Como salienta Cabral (1999), a participação não se dá nem se recebe, antes passa por um constante equilíbrio de forças instáveis, das quais decorre uma dinâmica de evolução e de crescimento, não sendo nem um direito nem uma conquista, o que seria demasiado redutor, mecanicista e dependente. No seu entender a autonomia das escolas, como a de qualquer ser humano, tem um caráter dinâmico, alimentando-se do que se faz, como se faz e para que se faz, ou seja acontece na procura do sentido. (Cabral, 1999).

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A participação deve ser vivida como um projeto em constante desenvolvimento exigindo o afastamento de posições educacionais monopolistas, e requerendo a consciência da nossa interdependência e das questões que atualmente mais nos afetam como a própria sustentabilidade face às ameaças globais. A participação deve constituir-se como o melhor antídoto à exclusão nas suas diversas perspetivas.