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Pedido de auxílio jurídico em matéria civil

CAPÍTULO V DISPOSIÇÕES GERAIS

6 PARTICULARIDADES DO TEXTO JURÍDICO CASO ROGATÓRIA

6.2 CARTAS ROGATÓRIAS

6.2.2 Estrutura das amostras

6.2.4.2 Pedido de auxílio jurídico em matéria civil

O “Pedido de Auxílio Jurídico Internacional em Matéria Civil e Comercial”58, por sua vez, é apoiado pela Lei ZRHO (Rechtshilfeord- nung für Zivilsachen), de 19 de outubro de 1956, revisada em 28 de outubro de 201159. O órgão responsável pelo desempenho das tarefas associadas à assistência jurídica mútua, com outros países em matéria civil, comercial e administrativa, também é o Departamento Federal (Bundesamt), que trabalha em estreita colaboração com o Ministério das Relações Exteriores, o Ministério Federal de Justiça e Defesa do Consumidor, com a Administração de Justiça do Estado, bem como as autoridades centrais estrangeiras60.

De acordo com a Lei ZRHO, os pedidos internacionais devem ser descritos de forma clara, de fácil compreensão, não conter abreviações ou expressões idiomáticas que possam prejudicar seu entendimento ou mesmo que possam comprometer a autoridade, instituição ou mem- bros do país rogado. O juízo rogado deve ser precisamente descrito. Caso a competência não tenha sido determinada, deve-se, por exemplo, acrescentar a frase “oder an die zuständige Stelle” (“ou à autoridade competente”). Caso o juízo rogado seja completamente desconhecido, a carta deve direcionar-se a “An die zuständige Stelle für den Ort...” (“à autoridade competente de ...”).

Com efeito, também aqui a legislação da comunidade europeia é levada em consideração com relação à forma e conteúdo das cartas. A exemplo do regulamento europeu No 1393/200761, em vigor desde 13.08.2008; da Convenção de Haia, de 15 de novembro de 196562; bem

58 Internationale Rechtshilfe in Zivil- und Handelssachen.

59 Disponível em https://www.bundesjustizamt.de. Último acesso em maio de

2014.

60 De acordo com informações do Departamento Federal de Justiça alemão, dis-

ponível em https://www.bundesjustizamt.de. Último acesso em maio de 2014.

61 Verordnung des Europäischen Parlaments und des Rates vom 13. November

2007 über die Zustellung gerichtlicher und außergerichtlicher Schriftstücke in Zivil- oder Handelssachen in den Mitgliedsstaaten (Zustellung von Schriftstüc- ken) und zur Aufhebung der Verordnung (EG) Nr. 1348/2000 des Rates. Dispo- nível em http://dejure.org/gesetze/ZVO. Último acesso em maio de 2014.

como da Convenção de Haia de 18 de março de 197063.

Não só a carta, como também os anexos, precisam ser traduzidos por tradutor autorizado por lei federal, nomeado publicamente ou com certificação equivalente. Ainda de acordo com a convenção de Haia de 15 de novembro de 1965, as traduções dos documentos não precisam ser legalizadas.

6.2.4.3 Modelo de carta rogatória alemã

Em conformidade com o acordo EuRhÜbk (“Auxílio judiciário mútuo em matéria penal entre os Estados-Membros”), o Ministério das Finanças da Alemanha publicou um modelo de carta rogatória64, re- lacionada a assuntos criminais, que pode servir de apoio a tradutores iniciantes, uma vez que apresenta a estrutura e os termos comumente usados no trâmite de pedido de auxílio jurídico internacional.

Através da figura Figura 17, é possível observar que a estrutura da CR em alemão não corresponde com o padrão de uma CR brasileira, cujos termos-chave ficam em evidência. Não obstante, o que se observa é um documento sucinto, com marcas próprias da linguagem jurídica alemã.

Para demarcar os pontos mais importantes desse modelo, usou-se letras (de “A” a “L”).

A letra “A”, no canto superior esquerdo, por exemplo, apre- senta as informações introdutórias, como identificação do juízo rogante (Staatsanwaltschaft), endereço, nome do funcionário responsável (Be- arbeiter xxx).

Logo abaixo, a letra “B” aponta para os dados de identificação do documento, com uso do jargão jurídico “AZ.”, fazendo referência ao termo “Aktenzeichen” ou “número dos autos”, em português. Em seguida, através da letra “C”, é apresentado o endereço) e a identifi- cação do juízo rogado (Vereinigtes Königreich Großbritannien und

63 Disponível em http://www.datenbanken.justiz.nrw.de. Último acesso em

maio de 2014.

64 Disponível em: http://www.bundesfinanzministerium.de. Último acesso em

Nordirland), com adição da frase fixa comentada anteriormente, na subseção 6.2.3 (oder die sonst zuständige Behörde), “ou autoridade competente”.

A letra “D” dá sequência à identificação do documento, apon- tando seu título (Rechtshilfeverkehr in strafrechtlichen Angelegenhei- ten auf der Grundlage des Europäischen Rechtshilfeübereinkom- mens), em negrito.

A partir da letra “E” é apontado o direcionamento do dis- curso (Ersuchen um Durchsuchung/Beschlagnahme bzw. Auskünfte in dem Ermittlungsverfahren gegen [...]/“Pedido de busca/apreensão e informações no inquérito judicial contra [...]”).

Logo abaixo, se observa a frase pronominal (Sehr geehrte Damen und Herren, / “Prezados Senhores e Senhoras,”), que pouco ou nada tem a ver com as frases pronominais prolixas típicas das CRs brasileiras (como, por exemplo, EXCELENTÍSSIMO SR. DR. JUIZ TITULAR DA VARA [...]). Ela abre o discurso sobre o processamento de um ação contra o réu em questão (gegen den deutschen Staatsagehörigen xxx), assinalado com a letra “F”. Nota-se aqui que não há presença de fraseologismo fixo como o “FAZ SABER” em português.

A letra “G”, por sua vez, dá detalhes sobre todo o processo (Dem Beschuldigten wird vorgeworfen), inclusive seu esteio legal.

Na indicação da letra “H” apresenta-se a finalidade da rogatória, com pedido formal de busca de documentos na casa do réu em Londres, etc. (demarcadas no documento pelas letras “a” e “b”), com indicação em anexo de decisão judicial de busca e apreensão (apontada com a letra “I”).

Já o espaço demarcado com a letra “J” faz menção à tradução para o inglês da respectiva carta, em documento anexo.

A letra “K” sinaliza o módulo de finalização da CR, com frase de encerramento (Mit vorzüglicher Hochachtung / “Com a mais alta consideração”), seguida da assinatura, nome, cargo e carimbo do res- ponsável.

Figura 17 – Modelo de carta rogatória alemã.

listagem dos documentos anexos à carta.

Esse modelo de CR apresenta também algumas informações adi- cionais no final do texto (dos números 1 ao 11, sinalizados entre pa- rênteses ao longo da carta), cuja continuação pode ser conferida na

Figura 18 – Modelo de carta rogatória alemã (continuação).

Figura 18.

Um exemplo desse informe pode ser observado no ponto de no1, que faz referência ao artigo 14odo acordo EuRhÜbk (“Auxílio judiciário mútuo em matéria penal entre os Estados-Membros”). Esse indicativo aponta quais são as informações mínimas que uma CR deve conter:

1. autoridade emissora da rogatória (juízo rogante);

2. objeto e motivo da rogatória;

3. identidade e nacionalidade do réu (se possível); e

4. nome e endereço do destinatário da rogatória (juízo rogado).

6.2.4.4 Modelo de carta rogatória suíça

Em adição ao modelo do Ministério da Justiça da Alemanha, a Figura 19 apresenta uma amostra de carta rogatória criminal suíça, disponibilizada pelo Departamento Federal de Justiça da Confederação

Suíça65, com quem o Brasil também mantém reciprocidade em pedidos judiciais66.

De acordo com a macroestrutura da CR, apresentada na Figura 19, o modelo suíço de carta rogatória é mais aproximado ao mo- delo brasileiro. Um exemplo é a aparente evidência dos termos-chave, dispostos na amostra em questão, em negrito e com texto sublinhado. Não obstante, esse destaque não menciona claramente termos- chave, como “juízo rogante” e “juízo rogado”, que representam marcação típica das CRs emitidas no Brasil. Com efeito, essas informações, obri- gatórias nas CRs67, são dispostas ao longo do documento (sinalizadas pelas letras “B” e “E”).

De fato, conforme indicado com a letra “A”, a rogatória é iniciada com informações de local e data de sua expedição e não com informa- ções sobre o juízo rogante, como nas amostras brasileiras, descritas na subseção 6.2.2. Em seguida, de acordo com a letra “B”, há demarcação do destinatário da CR (ao juízo rogado), com a frase “An die für xxx (Ort/Land) zuständige Gerichtsbehörde oder an jede andere zustän- dige Gerichtsbehörde” (“À autoridade judiciária competente de xxx (local/data) ou a qualquer outra autoridade judiciária competente”).

Logo abaixo (letra “C”), aparece o termo “DRINGLICHKEIT” com estrutura de título. Sua tradução, “URGENTE”, demarca que se trata de documento com prioridade (o exemplo dado “HAFTSACHE- EILT” remete à urgência de prisão do réu).

Sinalizado com a letra “D”, o gênero do documento é finalmente apresentado, com a citação em negrito “Internationale Rechtshilfeer- suchen in Strafsachen”, ou seja, “Carta rogatória criminal internacio- nal”.

65 Disponível em três idiomas (alemão, francês e italiano) em http://www.rhf.

admin.ch. Último acesso em maio de 2014.

66 Conforme acordo 0.351.919.81, assinado pelo governo suíço e brasileiro,

em 12 de maio de 2004 (última alteração em 27 de julho de 2009). Dis- ponível em http://www.admin.ch/opc/de/classified-compilation/20051639/ index.html. Último acesso em maio de 2014.

67 Cf. artigo 24o do acordo 0.351.919.81. Disponível em http://www.admin.ch.

Figura 19 – Modelo de CR suíça.

Abaixo, indicado pela letra “E”, é expresso o juízo rogante com a frase “vorgelegt vom Untersuchungsrichter des Amtsbezirkes xxx” (“[CR] expedida pelo juiz de instrução da Comarca xxx”) em continu- ação à demarcação do documento.

em negrito e sublinhado (Name, Vorname), seguido do restante das informações sobre o investigado.

Na sequência, a letra “G” sinaliza o “resumo dos fatos”

(Zusammenfassung des Sachverhaltes) e aapreciação jurídica

do delito“ (Rechtliche Beurteilung der Tat), ambos em negrito e sublinhado.

A letra “H”, por sua vez, aponta para o “objeto e motivo da rogatória” (Gegenstand und Grund des Ersuchens), igual- mente em negrito e sublinhado.

Em seguida, a letra “I”, indica mais um termo-chave, as “medidas cautelares” (Vorsorgliche Massnahmen), como bloqueio de conta corrente, investigações na casa, etc., bem como o termo “perguntas”

(Fragen) ao final, podendo eventualmente ser inserido nos anexos.

Como demarcação de encerramento da CR, é apresentada a frase “Mit freundlichen Grüssen” (Atenciosamente), sem maiores formali- dades, com assinatura do responsável.

A letra “K”, aponta para a sugestão de local para indicação dos anexos (Beilagen) e a letra “L”, é uma orientação aos emissores das CRs, para que verifiquem o “Checkliste” detalhado, com maiores informações sobre como emitir uma CR68.

6.3 OBSERVAÇÕES FINAIS

Considerando as diferenças entre as CRs apresentadas (brasi- leira, alemã e suíça), parece complexo estabelecer padrões de procedi- mentos para se atingir com precisão todas as nuances da L2. No entanto, se o tradutor iniciante dispor de um modelo original para contraste, souber identificar os termos e palavras-chave, bem como tiver um ope- rador do Direito (de preferência, que entenda as particularidades das línguas envolvidas, ou pelo menos dos sistemas jurídicos envolvidos) à sua disposição, parece possível imaginar uma tradução legítima, sendo a mais aproximada possível do original (estrangeiro). Neste caso, uma

tradução funcionalista, direcionada à sua função, configura-se a mais indicada.

Dentro deste escopo, é preciso trabalhar o conflito entre produzir uma tradução legítima, que se assemelhe a uma carta rogatória original, com a realidade da execução do ofício (acesso aos documentos originais estrangeiros, conhecimento profundo das línguas envolvidas e das bases do Direito, bem como ter acesso a juristas para consulta).

Desta forma, procurou-se, no desenvolver deste capítulo, suavi- zar a problemática, no que tange à tradução de cartas rogatórias do português para o alemão, através da demarcação de termos-chave, su- gestão de sua tradução e apresentação de correlatos originais (através de exemplos de CRs da Alemanha e Suíça). Essas informações contri- buem para delimitar a função da tradução, qual seja reproduzir, na medida do possível, uma rogatória dentro dos moldes do original (L1), com termos aceitos pelos receptores (leitor real) da língua de chegada (L2).

Não obstante, essas características denotam apenas uma pequena amostra da complexidade da linguagem jurídica, associada às rogatórias e suas traduções. De fato, a problemática das CRs não se restringe ao pedido de auxílio jurídico (apresentados ao longo do capítulo), mas estende-se aos documentos anexos às rogatórias (na maioria petições, sentenças, procurações e despachos judiciais), que são parte integrante das CRs brasileiras analisadas. Eles, por essência, representam textos jurídicos brasileiros, com particularidades linguísticas brasileiras, que contribuem para dificultar o processo tradutório.